Angelos dormiu como uma pedra depois de jantar o arroz e feijão com batatas fritas e carne que seu tio havia preparado.
A luz do sol entrava no quarto quando ele acordou.
Nove horas.
Sorriu feliz por estar ali e se espreguiçou na cama. Nem o cheiro de umidade na casa lhe incomodava.
Levantou-se e pisou descalço no piso frio. Retirou a tela e abriu a janela.
O sorriso se ampliou quando seus olhos deram com a praia deserta banhada pelo sol, onde o mar verde esmeralda o aguardava. Vestiu suas roupas de ontem louco para trocá-la por uma bermuda, chinelos e camiseta.
Agora que ele iria até o carro retirar sua mala. Como ontem chovia muito só retirou as coisas de geladeira que havia comprado para não estragar.
Saiu do quarto e avistou seu tio Jonas na cozinha americana preparando café.
—Bom dia meu tio.
—Bom dia meu filho, dormiu bem?
—Muito bem.
—Não estranhou o colchão?
—Não tio. Está tudo ótimo. Vou retirar a minha mala do carro. O resto das compras chegarão ainda hoje.
Ele sorriu.
—Tem mais coisas?
—Sim, fiz uma lista para a minha secretária de coisas específicas que gosto de comer e beber e algumas coisa que sei que o senhor gosta. O resto das compras foi por conta dela. Nem sei o que irá chegar. Espero que não se ofenda.
—Filho, não precisava.
—Eu sei disso meu tio, mas eu quis ajudar.
—Se é assim, tudo bem. Será tudo bem-vindo.
Angelos sentiu uma alívio quando o irmão de sua mãe disse isso. Não queria ofendê-lo de maneira nenhuma, nem ostentar nada. E não se importava de passar os dias comendo arroz e feijão e ovo, mas queria proporcionar o melhor para o seu tio nos dias que ficaria ali.
Angelos já o convidara várias vezes para trabalhar na Natus, mas seu tio sempre negava, ele gostava desse lugar e segundo ele, não o trocaria por uma vida na cidade grande.
No fundo puxara por ele.
Também amava tudo isso.
Enquanto seu tio aprontava o café, foi retirar sua mala. Sim, apenas uma mala. Aqui iria andar o mais livre possível. Sem se preocupar com seus trajes ou com regras de etiqueta.
Mais tarde as compras chegaram. Elas se espalharam pela mesa e pelo chão da casa. Coisa de brasileiro que adora entupir os armários. Compras para o mês inteiro e ainda sobraria.
—Você exagerou meu filho. Não tem nem onde guardar.
—Culpa a minha secretária. Eu dei apenas alguns itens o resto foi por conta dela.
Ele riu.
—Não me admiro. Mulheres! Se não tomarmos cuidado, elas carregam o mercado para dentro de casa.
Angelos riu.
—Tio, pode deixar que eu ajeito tudo isso. Não se prenda a mim. Sei que quer dar uma passada no bar.
—É verdade, então a arrumação de tudo é por sua conta.
Angelos o encarou com relutância.
—Tio...eu gostaria de te presentear com móveis novos. O senhor se ofenderia se eu comprasse tudo novo?
Ele sorriu sem graça.
—Filho... não precisa....
—Eu gostaria de recompensá-lo de alguma maneira.
—Ah, você e esse seu coração.
—Posso então?
Ele soltou o ar e sorriu.
—Pode.
Angelos abriu seu grande sorriso.
—Ótimo. Farei isso então!
—O que fará com os móveis velhos?
—Não se preocupe com isso tio. Eu cuidarei de tudo.
Tão logo seu tio saiu, Angelos tratou disso. Pegou seu celular e comprou tudo que achou que a casa precisava pela internet depois ajeitou as coisas nos lugares que encontrou nos armários. O resto ficou espalhado num canto do chão.
Tomou seu café tranquilamente com os petiscos que havia comprado e depois de ajeitar a cozinha foi até o quarto e se trocou. Carregou então consigo uma toalha, protetor, uma cadeirinha e pronto!
Agora era hora de curtir a praia, o verde, as montanhas e o cheiro maravilhoso da maresia. O sol aquecendo a pele, o vento soprando no rosto.
Os dias se passaram, Angelos se dividiu em gozar a vida ao ar livre a praia e comandar a repaginada da casa de seu tio. Para isso chamou alguns homens que conhecia- tipo faz tudo- e que imediatamente atenderam seu chamado.
Os móveis velhos então foram retirados e levados. As coisas que estavam neles foram para dentro de grandes caixas, à espera da mobília nova. As paredes foram pintadas, e depois a casa passou por uma faxina.
Depois de três dias à noite, seu tio olhava tudo ao lado de Angelos admirado pela rapidez que as coisas aconteceram. Só não fora mais rápido por causa da demora na entrega dos móveis.
Lindos armários em madeira maciça, feitos para durar por causa da maresia, cobriam as paredes da cozinha.
Sofás cinza-claros na sala.
Uma grande televisão no raque também novo.
Nos quartos, lindos guarda-roupas cobriam um dos lado das paredes.
Fora tudo isso, havia o fogão, a grande geladeira, freezer, mesa com seis cadeiras, colchões e travesseiros novos.
—Isso é uma pegadinha? Eu estou dentro daquele programa doce lar do Luciano Huck?
Angelos riu alto e com uma braçada envolveu os ombros do tio.
—O senhor gostou?
—Ficou tudo maravilhoso. Nem parece que estou na mesma casa. —Ele disse emocionado.
—Fico feliz tio. Gostaria de ter escolhido tudo com o senhor, mas do jeito que poupa meu dinheiro, achei melhor eu mesmo comprar tudo.
—Nem sei o que dizer...
—Não diga nada!
Uma senhora surgiu na porta.
—Senhor Marinho?
Seu tio a olhou intrigado.
—Sim, sou eu.
—Eu contratei para nos ajudar com os serviços de casa. — Angelos esclareceu no ouvido do tio e se virou para ela.
A senhorinha de sessenta anos muito bonita sorriu constrangida.
—Eu fui enviada pela agência.
—Sim, está no lugar certo. A senhora pode iniciar quando?
—Eu vim preparada para começar hoje mesmo.
—Ótimo. —Angelos se virou para Jonas. —Tio, domingão, vamos pegar as cadeirinhas e irmos para a praia. O almoço é por conta daaa?
— Conceição. —A senhorinha completa.
Angelos sorriu para ela.
—Conceição! Então fique à vontade. Sou Angelos e esse é meu tio, Jonas Marinho. Como viu a casa está limpa, hoje é só deixar o almoço pronto. Faça o bastante para alimentar dois homens famintos no almoço e no jantar.
—O que eu faço para o almoço?
Angelos só sabia escolher o que comer, ele não tinha ideia nenhuma do que pedir.
Pensou por um tempo.
—Tio, que tal um salpicão ou maionese com peixe empanado, salada e arroz?
—Filho, eu faria o almoço tranquilamente....
Angelos pegou os ombros do tio.
—Tio, o senhor já trabalha demais. Vamos! Coloque uma bermuda e vamos curtir a praia. Vou encher o isopor de cerveja e petiscos.
Sim, Angelos dormiria numa cama mais ou menos, estaria num lugar mais ou menos e não se importaria com isso, afinal, seriam apenas alguns dias. Ciente disso Jonas sorriu feliz para o sobrinho. Ele fizera tudo para agradá-lo, lhe proporcionar conforto e resolveu não ficar implicando com tudo e gozar dos benefícios de ter um sobrinho com tão bom coração.
Jonas se virou para ela.
—Faça esse cardápio que meu sobrinho sugeriu. E ao invés do salpicão, faça maionese.
—Isso aí, meu tio.
Mais uma semana se passara, já foram quinze dias passando férias na casa de seu tio. Do jeito que estava gostando, pensava em ficar mais uma semana do que o combinado. Tinha então mais vinte dias para curtir o lugar.
Angelos já estava com a barba crescida, bem grande, os cabelos cresceram também ao ponto de ele ter que amarrar em um r**o de cavalo.
Há tempos, antes mesmo de tirar férias, estava evitando de cortá-los com esse propósito.
Perto do centro de Ubatuba ficava o bar do seu tio Jonas, bem em frente a estrada que ligava todas as praias. Uma ótima localização. Cinco dias atrás, quando Angelos conhecera o lugar, o achou decadente. Não resistiu à vontade de reformá-lo. Depois de muita insistência, conseguiu convencer seu tio disso.
Jonas não queria que ele gastasse mais com ele, mas não teve jeito, quando seu sobrinho colocava uma coisa na cabeça, ninguém tirava. E a localização do bar era tão boa que seu sobrinho se animou e achou que seria uma judiação deixar como estava.
Agora tudo pronto Angelos olhava o bar reformado com um sorriso no rosto ao lado de seu emocionado tio.
Trocou o velho balcão por um moderno, as cadeiras velhas por confortáveis, as mesas gastas por outras bem melhores. Colocou maquinário novo: máquinas modernas como de chope, de café expresso. Comprou também um refrigerador expositor de bebidas que deixou perto da entrada. Na lateral do bar um jukebox e ao lado dele uma máquina automática de salgados. Mandou pintar as paredes de marrom claro e outras revestiu com papel de parede com desenhos de palmeiras.
Deu uma renovada na cozinha também. Trocou o fogão de seis bocas por um industrial. A geladeira caindo aos pedaços por uma grande e o freezer velho por um novo.
Melhorou a fachada também. Agora o lugar tinha uma placa nova, bonita e chamativa.
O lugar melhorou cem por cento, mas com certeza não era nada comparado aos lugares que Angelos costumava frequentar, mas estava apresentável.
Seu tio tinha gostado da casa, mas quando ele viu o bar pronto chorou como uma criança.
—Filho, eu nem sei o que dizer...Eu nunca conseguiria fazer o que você fez aqui. Eu nem teria tamanha visão do negócio e nem dinheiro para tudo isso.
Angelos colocou as mãos nos ombros do seu tio enquanto ele limpava suas lágrimas.
—Aqui vai bombar, tio. Muitas pessoas virão conhecer o seu bar. Pensei em fazer uma pequena festa de inauguração depois de amanhã.
Seu tio o encara ainda com lágrimas nos olhos, seu rosto é preocupado.
—Não temos pessoas o suficiente para atender a todos.
—Tio, deixa comigo. Vou contratar uns freelances para ajudar na cozinha e alguns garçons. E eu darei uma força também para o senhor.
—Obrigada filho, você sem saber realizou meu sonho. Sempre quis dar um jeito nesse lugar.
—Que me dera ter podido realizá-lo antes, mas você conhecia meu pai.
Ele riu.
—Ah, se conhecia....
O pai de Angelos era muito sovina. Não era capaz de um gesto de bondade. Com sua morte, há quatro anos, Angelos passou a controlar tudo, inclusive sua vida.
Foi morar sozinho e fazia com o dinheiro o que bem entendia. Mas isso não queria dizer que esbanjava, mas não era tão controlado como seu pai. Fazia o que tinha vontade, não se privava de nada.
Mas ele sentia a falta do seu velho. Se não fosse pelo seu pai, não seria o homem bem-sucedido de hoje.