Enquanto isso na Mansão Carvalho, ocorria uma festa em comemoração aos vinte quatro anos de Bianca.
—Não vejo a hora de viajarmos. Será muito bom passar uns tempos longe de casa.
— Para dizer a verdade, estou um pouco receosa que goste, é provável que ache a pior férias da sua vida. Segurará vela, frequentará uma casa simples...
—Maya, pare com isso! Claro que irei gostar. A casa pode ser simples, mas o lugar que me descreveu deve ser maravilhoso.... E quanto a segurar vela não se preocupe, eu não ligo. Só se você não quer que eu vá?
—Claro que não é isso. Eu só estou preocupada com você.
—Não se preocupe, pareço ser de cristal por acaso?
—Cristal não, mas de porcelana. —Maya brincou.
Bianca deu uma risada nervosa, um pouco insegura quanto ao lugar, mas enfrentaria seus medos.
Se Ricardo Carvalho Bellucci, o grande empresário no ramo de embalagens soubesse onde ela ficaria, com certeza não deixaria Bianca viajar. Contudo, para ela gozar de liberdade, sempre teve que melhorar a realidade e, claro, algumas mentiras acabam entrando e se infiltrando na verdade.
Infelizmente.
As mentiras sempre a salvaram, se fosse pela verdade, não estaria viajando com Maya para Ubatuba. Estava ciente de onde ficariam: No meio do mato, no meio do nada.
Fora isso, Maya lhe deixara claro que a casa dos pais de Heitor era simples. Apenas dois quartos, uma cozinha estilo americana que dividia uma pequena sala.
—Vou dançar. Nos acompanha? —Maya a convidou quando Heitor surgiu ao lado dela.
Bianca sorriu.
— Depois. Não se prenda a mim. Vou comer alguma coisa. Estou um pouco tonta por causa do champanhe.
—Está certo.
Quando Maya se afastou, Bianca deu um suspiro audível. Passou os olhos pela mansão iluminada, os convidados transitando exibindo um sorriso no rosto.
Hoje era seu aniversário, por isso a linda casa situada nos jardins estava em clima de festa.
Observou seu pai conversando com um braço nos ombros de sua mãe, e ao longe sua irmãzinha de nove anos correndo como uma maluca lá fora com os garotos da sua idade.
Nessa hora Mamãe a avistou e imediatamente se afastou de seu papai para lhe dar alguma correção.
“Tadinha, essa vai sofrer”. Disse para si mesma.
Brenda tinha um lindo coração, não sabia mentir. Costuma assumir todas as suas culpas. Seria uma garota que optaria sempre pela verdade e sua liberdade seria muitas vezes tirada.
Contudo, Bianca não iria ensiná-la mentir.
Não conseguiria.
No fundo se culpava em distorcer a verdade, a tornando em uma grande mentira. Usava sempre esse subterfúgio para conseguir o que queria.
Tentava agir corretamente, mas seu lado livre acabava sempre vencendo, lhe dizendo para não deixar sua poderosa família influenciar sua busca pela felicidade e seu bem-estar.
Quantas vezes ela fora a festas em bairros na periferia dizendo que ia a um barzinho chique.
Soltou o ar.
A empresa “Embalagens Carvalho” estava na família de seu pai desde sempre. Ele herdara de seus tataravôs. Esse legado trouxera-lhe riquezas, status. E muito dinheiro. Isso os tornava uma família de sangue azul. Em suma, não se misturavam.
Sempre fora para eles uma ótima filha- "entre aspas" - uma ótima aluna e funcionária e por isso seu pai confiava nela. m*l sabendo ele os lugares que andou e visitou.
Bianca trabalhava na empresa da família. Ela iniciou cedo na Carvalho. Se tornou gerente comercial com apenas vinte e um anos.
Mas não se iluda, ela começou por baixo e galgou posições como qualquer um.
Claro que por ser filha do dono, foi como cartas marcadas sua subida, mas seu pai só lhe promoveu quando viu que era capaz de assumir o cargo.
Um garçom alto, moreno, bonitão lhe ofereceu um canapé de ricota. Bianca pegou dois, fazendo-o rir.
—Espera. —disse para ele quando ele ia se afastar e sorrindo pegou mais um.
—Se quiser trago de outros sabores para você.
—Obrigada, mas esses são os meus preferidos. —disse sorrindo mais uma vez.
Nessa hora seu pai surgiu do nada.
Ah! Essa p******o de seu pai era sufocante. No mínimo reparou na troca de sorrisos com o garçom e isso o levou a se aproximar.
O jovem ofereceu um canapé para ele, Ricardo Carvalho acenou um não com cara fechada. Ele então se afastou.
Seu pai então a encarou com os olhos estreitos e apertou o maxilar. Estava usando uma expressão que já lhe era muito conhecida. Ele fez muito isso quando ela namorou Tiago e ela abaixara a cabeça para ele quando viu que ele faria sua vida um inferno por não aprovar sua escolha.
—Filha, por que não está dançando com Maya?
—Porque eu estou morrendo de fome. Saco vazio não para em pé. Por que espantou o garçom?
—Deus! Que palavreado chulo. Eu não espantei ninguém.
Sei...
Bianca soltou o ar.
—Perdoe-me as palavras, mas eu não comi nada até agora.
Seu pai sorriu e lhe deu um abraço forte, quase a esmagando em seu peito. O chamado abraço de urso.
— Está feliz com sua festa? —Perguntou quando se afastou dela.
Ela alargou o sorriso para seu pai.
—Sim, está linda. Não pensei que conseguiria reunir toda a família, mas todos vieram. E obrigada pelo colar de esmeraldas. —disse passando a mão nas pequenas pedras.
—Cuide bem dele. Sua avó o usou muito em eventos especiais. Sua avó tinha olhos verdes iguais aos seus, por isso esse colar era seu preferido.
—Eu sei disso, e pode deixar, eu cuidarei dele como um bem mais precioso —disse e enfiou um canapé inteiro na boca, passando uma imagem até de desleixo.
Ricardo Carvalho a fuzilou com os olhos por causa do seu gesto. Mas seu mau humor durou pouco quando ele focou em alguém.
Sorriu e então a procurou com os olhos, sua boca exibiu aquele sorrisinho de canto de lábios. Aquele que ela não gostava. Do tipo que aprontava algo.
—Termine de comer, e depois me procure. Quero te apresentar uma família que conheci no clube. Eles acabaram de chegar.
—Está certo. —disse com a boca ainda meio cheia.
—Bianca! Você parece que faz isso de propósito!
Engoliu o restante do canapé enquanto ele se afastava.
Bianca deu uma viradinha de cabeça e avistou uma senhora bonita, um senhor e um rapaz franzino que devia ser filho deles.
Ah! estava explicado.
Seu pai não perderia a oportunidade de lhe apresentar ao rapazes que ele julgava certo para ela; com certeza algum herdeiro, CEO, executivo, bem afeiçoados e de boa família.
Ele morria de medo de que ela se envolvesse com homens de outra estirpe.