Capítulo Oito

1575 Words
Sarah saiu para o jardim e sentou-se maravilhada nas cadeiras de ferro forjado. Ao seu redor, o quintal era como uma selva, com plantas nativas e ervas que haviam se espalhado pelos canteiros, crescendo com pouca intervenção. No centro do jardim, havia um plataforma na altura da cintura. Em um gancho ao lado, havia um pequeno balde de metal. Enquanto Sarah tomava seu chá, Ya-Ya coletava objetos do balde, colocando-os em sua cesta antes de encher a plataforma com amendoins, trigo, pistache, uvas, passas e uma mistura de milho e sementes. Em seguida, ela levava sua cesta para a pequena mesa de bistrô para sentar na cadeira em frente a Sarah. Elas desfrutaram do silêncio companheiro, ouvindo a música jazz que flutuava pelo ar. As celebrações do Mardi Gras, os bailes de máscaras e os desfiles estavam acontecendo há duas semanas e, embora o bairro permanecesse relativamente quieto, a música se espalhava livremente sem se preocupar com barreiras. Depois de algum tempo, Sarah perguntou: "Então, o que eles te deram desta vez?" Ya-Ya colocou a cesta na mesa e incentivou Sarah a ver por si mesma. Dentro havia bolas de gude, seixos lisos do rio, uma pequena pedra facetada que poderia ser um diamante, um pedaço de vidro quebrado, uma pena preta brilhante e até uma nota de dez dólares. "Eles estão te dando dinheiro agora?", perguntou Sarah. Ya-Ya riu. "Eles são espertos, não são, os Lwas?" Enquanto falavam, um corvo pousou na plataforma. Olhou para elas por um momento, antes de mergulhar o bico e selecionar seu prêmio antes de voar para longe. "Morgana.", Ya-Ya repreendeu. "Ela é tão impaciente. E aqui vem a Delphine. Ela é quase tão ruim." Sarah levantou uma sobrancelha quando outro corvo, talvez o mesmo, pousou na plataforma. Ele bicou a comida antes de voar para longe. Ya-Ya balançou a cabeça. "Como você os diferencia?", perguntou Sarah. "Todos parecem iguais." "Oh, se você os observar por tempo suficiente todos os dias, você verá a diferença.", disse Ya-Ya. "Tamanho, postura, hábitos, personalidade. Os corvos são muito individualistas. Não é mesmo, Rosa?" Sarah olhou para baixo e viu um gato preto se aproximar de debaixo de uma planta e deitar-se no pátio de pedra. Ele as observava com os olhos entreabertos, desfrutando do sol da manhã. Como todos os gatos de Ya-Ya, este tinha um pedaço da orelha esquerda faltando, indicando que estava castrado e vacinado. Embora os gatos fossem selvagens, Ya-Ya levava a saúde deles a sério. Sempre que ela encontrava um novo, ela o pegava com uma armadilha e o levava à clínica para ser castrado, vacinado e desverminado antes de liberá-lo onde o encontrara. Sarah ouviu falar de outras pessoas fazendo programas semelhantes para gatos que eram muito selvagens para serem domesticados. Isso estabilizava as colônias locais e ajudava a controlar a população. Embora os gatos geralmente comessem selvagens, eles logo aprenderam a confiar em Ya-Ya, permitindo que ela se aproximasse o suficiente para acariciá-los e até pegá-los por um curto período, assim como os corvos, que às vezes comiam diretamente da mão dela. "Como ele se chama?", perguntou Sarah, quando outro corvo pousou na plataforma de alimentação. Ao contrário dos outros, ele tinha algo brilhante no bico e olhou diretamente para elas antes de deixá-lo cair no balde de coleção de Ya-Ya. Em seguida, ele se virou e calmamente comeu na plataforma. "Esse é Laveau.", disse Ya-Ya, sem hesitar. "Ela é a fêmea dominante deste grupo familiar. Eu já vi os mais jovens, como Toups e Max, se curvarem para ela. Ela sempre se certifica de que eu saiba quais presentes são dela." Ao contrário dos pássaros anteriores, este levou seu tempo selecionando as ofertas que mais lhe agradavam. Parecia não se importar com a presença delas ou com o gato. "Grupo familiar?", repetiu Sarah. "Isso mesmo, os corvos geralmente vivem em grupos familiares, especialmente durante a temporada de reprodução.", explicou Ya-Ya. "Normalmente, você tem o casal reprodutor, neste caso Laveau e seu parceiro King, e seus filhotes de anos anteriores. Delphine tem quatro ou cinco anos agora. Ela é a mais velha que continua por aqui. Os filhotes mais velhos ajudam a criar a nova ninhada. Eles reúnem materiais para o ninho, ajudam a alimentar a mãe quando ela está sentada nos ovos e até alimentam os filhotes depois que nascem." "Mesmo?", Sarah sorriu com o pensamento, observando o corvo comer tranquilamente. Era bom pensar que um casal desfrutava de tantos ajudantes enquanto criavam suas ninhadas. "Agora, observe com atenção.", disse Ya-Ya. "Assim que ela terminar, ela vai pular para aquele gárgula e se empoleirar lá, fazendo um grande alvoroço para se limpar." Assim que o corvo terminou, selecionou uma última guloseima e, exatamente como Ya-Ya havia previsto, voou uma curta distância para pousar no gárgula de pedra, aninhado no verde do jardim. Lá, ele terminou sua última porção antes de limpar o bico na pedra, verificar suas garras e começar a se acicalar. "Agora, observe a plataforma.", disse Ya-Ya alguns momentos antes de outro corvo descer.           Este parecia menos brilhante do que os visitantes anteriores, especialmente Laveau que era particularmente lustroso. Uma asa parecia não se dobrar corretamente no lugar e ela andava ao redor da plataforma mancando. "Aquela é Mama Odie." Ya-Ya respondeu à pergunta silenciosa de Sarah. "Ela é a coruja mais velha que visita. Ela não pode voar longe. Eu acho que ela vive naquela árvore agora, na verdade. Como ela não consegue se deslocar bem, os presentes que ela deixa normalmente são penas, cápsulas de carvalho e coisas assim." Sarah assentiu. "Mas isso é a parte interessante." disse Ya-Ya. "Enquanto Laveau estiver lá, as outras não se aproximam, por respeito. Então, depois que ela termina de comer, ela fica lá como uma guarda para que Mama Odie possa comer em paz." "Sério?" perguntou Sarah, olhando duvidosamente. "Por que tenho a sensação de que você está brincando comigo?" "Não é brincadeira." Ya-Ya balançou a cabeça. "Essas duas podem ser mãe e filha. Os jovens ajudam seus pais a cuidar de seus irmãos, então faz sentido que eles ajudem a cuidar dos idosos também." "Então... qual delas deixa dinheiro?" perguntou Sarah, apontando para a nota de dez dólares. "Ah, isso provavelmente é o Merlin." Ya-Ya riu. "Ele some de vez em quando. Pode passar meses longe, mas antes de partir, sempre deixa algo especial na xícara. De alguma forma, ele descobriu que os humanos gostam de dinheiro, então é isso que ele costuma trazer. Ele começou com moedas, mas agora deixa notas se consegue encontrar. Acho que ele faz isso para ter certeza de que não me esqueço dele." Elas riram juntas pensando na possibilidade de um pássaro ficar chateado por ter sido esquecido. Ya-Ya suspirou, observando Sarah de perto. Já fazia quase um mês desde que Sarah chegou à porta delas. Ela não entrou em detalhes sobre o que aconteceu para acabar com seu casamento, pelo menos não com Ya-Ya. Aubrey parecia saber mais, mas tudo o que dizia era que o bastardo sujo a traiu. Ya-Ya não fez perguntas. Em vez disso, deu a Sarah espaço para se recuperar e curar. Nos últimos dias, Sarah começou a florescer novamente. A cor voltou às suas bochechas, assim como os sorrisos quando ela segurava Jamie. De vez em quando, ela caía em silêncio, com um olhar pensativo, mas isso felizmente era raro. Ya-Ya ainda se preocupava que as cicatrizes que Sarah carregava fossem mais profundas do que ela admitia, mas isso teria que ser enfrentado mais tarde. Era o suficiente que ela recuperasse sua força e ganhasse peso, já que ainda estava muito magra. "Então, meninas, vão se divertir esta noite?" perguntou Ya-Ya. Era terça-feira e a última noite de Mardi Gras. Ela sabia que o casal planejava sair mais tarde e se divertir. "Sim." suspirou Sarah. "Espero não estragar tudo." "Estragar? Querida, como você planeja estragar o Mardi Gras?" riu Ya-Ya. "Eu simplesmente... não sei como vou lidar com isso." "De qualquer maneira que você lidar, estará tudo bem." disse Ya-Ya. "Saia. Divirta-se e não se preocupe com o resto." Sarah sorriu. Deixar que Ya-Ya fizesse parecer tudo tão simples. Depois de um tempo, ela perguntou: "E você? Não quer sair?" "Já tive meus dias de Mardi Gras." sorriu Ya-Ya. "E o bar? Você não precisa estar lá? É uma noite bastante movimentada." "Nah. A Louise e as garotas estão cuidando disso." disse Ya-Ya. Ela mantinha o bar por pura memória de sua irmã e deixava a administração nas mãos de Louise, que tinha anos de experiência em administrar um bar. Louise e os bartenders recebiam salários generosos, então sua lealdade e paixão estavam bem financiadas e asseguradas. Ya-Ya apenas aparecia ocasionalmente para fazer leituras de palma ou cartas de tarô para os clientes, além de oferecer amuletos e joias, algumas das quais estavam à venda no bar. Mas esses amuletos não incluíam as ofertas de suas corujas. Amuletos feitos com esses itens eram especiais e só eram dados a alguns escolhidos. Um desses amuletos tinha sido dado a Aubrey assim que sua gravidez foi confirmada. Ya-Ya insistiu para que ela o carregasse consigo onde quer que fosse. Agora ele pendia sobre o berço de Jamie. Era um colar de contas, pedras polidas, um fecho de metal com uma fita e uma grande pena preta, tudo presente das corujas. De acordo com Ya-Ya, ele concedia proteção, sorte e abundância. "Vocês se divirtam." disse Ya-Ya. "Eu vou ter uma noite tranquila com Jamie."
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