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4809 Words
Os dois primeiros meses de aula passaram mais rápido do que eu esperava e não sabia se ficava feliz ou triste por isso. Era sempre um dilema. Quando o tempo passava rápido, eu queria que freasse e quando passava muito devagar, eu queria que acelerasse. As coisas não estavam muito estáveis na minha vida desde o ano passado e, para falar a verdade, eu não sabia mais qual era o significado de estável. O que seria minha vida estar estável novamente? Seria ainda ser amiga das mesmas pessoas, agir do mesmo jeito e querer as mesmas coisas? Porque se for... ainda bem que somos mutáveis. Ás vezes é bom se livrar de antigos hábitos e tentar se encontrar de outra maneira. Era isso que queria fazer, mas não encontrava modos aqui e isso era frustante. - Vamos amiga, agiliza! - Luíza disse me apressando para nós irmos para a sala do segundo. Estávamos no intervalo e duas provas já se foram. Há alguns anos teve uma confusão enorme com a sala do primeiro colegial da época e desde então, o diretor mandava os alunos do primeiro e do segundo se misturarem durante as provas bimestrais. Eu nem sei direito o que aconteceu, mas sei que todos os alunos envolvidos ficaram com zero em três matérias naquele bimestre. Era uma maneira de não colarem demais, mas ainda sim as pessoas conseguiam. Depende do professor que está monitorando a sala. - Espera aí! - lembrei de responder a Luíza e peguei meu material. Assim que abri a porta da sala do segundo, dei de cara com o Castanhari e fiquei com vontade de sair correndo. Também descobri há alguns dias atrás que eu sou uma i****a iludida e que preciso de um tapa para parar de ser trouxa. Pensei que ele estava afim de mim depois de dar algumas - várias - brechas, mas na semana retrasada fiquei sabendo que ele queria ficar com a Lara! Vi o João brincando com a Lara dizendo "E o Castanhari? Ficou apaixonadinha?". Logo a Natália nos contou que ele queria ficar com ela. Todos os meus conceitos sobre ele se afundaram na mesma hora. Quer dizer, se eu consegui chegar nesse ponto de uma paixonite era porque eu via algo nele. E saber que ele queria ficar com alguém como a Lara... era tão lamentável. - Dá pra você dar licença? - perguntei meio baixo. O i****a estava parado no meio da porta impedindo qualquer pessoa de entrar e sair. Essa nem era a sala dele! No sorteio maluco da professora Márcia, ele ficava bem longe de mim. - Dia r**m? - ele perguntou enquanto dava passagem para nós entrarmos e senti um sorriso no seu tom de voz mesmo sem olha-lo. Nem respondi, apenas revirei os olhos e sentei na minha carteira novamente. - Ok, o que foi aquilo? - Luíza perguntou sussurrando. - Aquilo o que? - perguntei enquanto comia uma bolacha. - Você sabe muito bem do que estou falando. Parece que... não sei. O clima ficou pesado. Claro que ficou pesado! Ele sabia - e percebia - que eu sentia alguma coisa e queria ficar com minha amiga. Ok, ela não era minha amiga, mas... nós éramos ano passado e ninguém sabia que tínhamos brigado. Claro que ele não precisava se preocupar comigo, afinal, nós não temos literalmente nada, mas eu fiquei muito irada. E nunca consigo esconder o que eu estou sentindo. Como é possível que um ser humano tão pequeno igual a mim consegue ser tão iludida? Deveria ter um limite ou, sei lá, um manual de instruções de como se desapaixonar de um cafajeste. - Não teve clima pesado nenhum, Luíza. - falei, irritada. - Olha só quem está vindo aí. - ela cantarolou e vi o Gabriel vindo em nossa direção. - E aí, gatinha. - ele sabia que eu odiava quando me chamavam assim. - Gatinha é a minha mão na sua cara. - Eu vou... vou ali tomar água rapidão. Já volto. - Luíza i****a. Eu fiquei com o Gabriel há um mês atrás mais ou menos. Foi em uma festa que eu estava bem irritada e ele tirou todo meu estresse... Eu apenas conhecia o Guilherme na festa inteira. Quero dizer, eu só conversava com ele, nem sei porque fui convidada para ir! Pedi para o Gui não sair de perto de mim, mas eu fui burra de ter ido ao banheiro e quando voltei, ele tinha sumido. Percebi que a garota que ele estava de olho também, então imaginei o que tinha acontecido. Fiquei com tanta raiva do Guilherme que quis socá-lo, mas a raiva passou bem rápido. Saí do salão de festas e liguei para a Maitê para ela me tirar do tédio, então vi uma silhueta se aproximando. Era o Gabriel. Nós conversamos por muito tempo e eu nunca percebi que ele tinha interesse em mim - além do que a Luíza me dizia o tempo todo -, mas percebi que a Luíza estava certa quando ele simplesmente me beijou durante um silêncio desconfortável. Quase não correspondi de tão surpresa. - Você está sabendo que o Castanhari quer ficar com a Lara? - ele começou a dizer. - O cara está apaixonado. Mas parece que ela não quer saber dele, está com dó de dizer não. - Uhum. - murmurei. - O que foi? - perguntou se aproximando. - Nada. Só estou um pouco preocupada com a prova de física. - respondi dando de ombros. - Você pode me deixar estudar? - pedi. - Ok, até depois. - ele beijou minha bochecha e saiu. Aí que droga, como eu era boba. O Leonardo queria mesmo que todo mundo ficasse sabendo que ele queria ficar com a Lara? Ou as notícias realmente correm por aí? Como eu disse, era bem fácil saber quando um dos riquinhos da cidade estava querendo alguém. Mesmo que esse alguém seja a insuportável da Lara. - Pensei que ia rolar uns beijinhos. - Luíza disse. - Mariana, o que está acontecendo com você? Parece triste e você nunca está triste. - Não estou triste. Estou com medo de me ferrar em física. - respondi dando de ombros. - Mas você ficou três dias seguidos estudando! - Eu sei, mas mesmo assim, né? Vai que dá algum problema. - Aham. Sei que é isso. Nunca deixei que os meus amigos influenciassem totalmente em minhas escolhas e decisões - mesmo com os inúmeros conselhos - e a primeira vez que faço isso acabo quebrando a cara. Eu tinha a mesma amiga virtual - Marcela - desde os doze anos e quase três anos depois ainda continuamos super bem. Ela sabia como eu ficava pirada e confusa em relação ao Leonardo, e sugeriu que eu pedisse ajuda para o Rafael ou para o Guilherme. Fiquei um pouco apreensiva, mas o que eu tinha a perder? Eu queria saber se eu estava sendo completamente iludida ou se tinha aquela mínima esperança. Quero desencanar logo de uma vez, quero que o Leonardo diga não de um jeito bem rude para eu parar com essa idiotice. Eu escolhi muito bem a palavras para pedir ao Rafael o que dizer. E no mesmo momento que eu disse "Quero te pedir uma coisa", ele jogou um "É sobre o Castanhari, né?". Ótimo, ele sabia. Mariana: Então, é sobre ele mesmo. Eu estou ficando maluca e você pode me ajudar a recuperar a minha sanidade. Rafael: Quer que eu pergunte pra ele? Mariana: Não!!! Pelo menos não diretamente. Você é muito amigo dele, deve falar sobre as meninas da nossa sala o tempo inteiro. Não é pra deixar claro. Rafael: Então eu vou perguntar das meninas da nossa sala e falo alguns nomes antes do seu. Mariana: Obrigada, Rafinha. E, por favor, não conte pra ninguém. Eu estou mesmo ficando maluca e você sabe que eu preciso da minha balança. Rafael: Caramba, já está assim?! Como isso aconteceu? Mariana: É que as pessoas dizem tanto sobre ele, sabe? Dizem que ele é uma pessoa r**m, dizem que ele não se importa com os outros e eu sei algumas coisas sobre ele que não deveria saber, mas sei. E eu consegui perceber que ele não é tudo isso que dizem pelas vezes que conversamos. Sei lá, vejo algo nele. E ele me causa sensações estranhas que nunca senti antes, mas não falei isso para o Rafael. Rafael: O que você sabe sobre ele? Mariana: Só fala logo, Rafa. Por favor. E me liga depois. A Marcela ficou tentando me acalmar durante quarenta minutos de espera e eu sabia que isso não era grande coisa, mas... poxa, como eu deixei chegar nesse ponto se nunca me apaixonei por ninguém? Nem sei o que é paixão pra falar bem a verdade. Quase pulei da cama quando meu celular começou a tocar e o nome "Rafinha" apareceu na tela. - Oi, Rafa. - fingi que estava super normal. - Oi, apaixonadinha. - revirei os olhos automaticamente. - Então, eu esperei o assunto surgir no nosso grupo. Eles só falam de meninas, como você deve imaginar. Eca. - E foi o Guilherme quem começou com o assunto. Você falou com ele também? - Não! - quase gritei. - O que ele disse? - Ele começou a falar de você. - me engasguei. - É que a gente viu você dançando com as meninas durante a aula vaga. Com a professora Lívia e tal. Meu Deus do céu. Isso era ainda pior. - Não me leve a m*l, mas você é muito.... - Rafael! - o interrompi morrendo de vergonha. - Todos eles me viram? Todos?! Ou só você e o Guilherme? - Nós estávamos juntos. - Meu Deus. - coloquei a mão na testa. - O que o Guilherme disse sobre a minha pessoa para um bando de meninos loucos por mulher? Aliás, eu não era a única que estava dançando! - É, mas as meninas que estavam com você não são bonitas. E você é linda demais, chamou atenção. - Você é ridículo. - falei rindo. Sabia que ele estava brincando. - Vai, conta logo que eu estou agoniada. Ou então manda print. - Não vou mandar print, vou falar mesmo. - disse. - Então, o Guilherme disse que você estava muito gostosa dançando e tal. - tão indelicados. - Os caras concordaram na mesma hora... - Quem está nesse grupo? - Guilherme, Lucas, Tomás, Daniel e o Castanhari. - ótimo. A gangue. Que vergonha! - Então, o Castanhari ficou quietinho enquanto todos nós falávamos. Achei estranho por aí. Ele sempre fala. - disse. - O Lucas mandou um áudio perguntando por que ele estava quieto como se estivesse zoando com ele. Percebi que tinha alguma coisa rolando e só o Lucas sabe. - Alguma coisa rolando? Tipo o que? Estou nervosa. - Espera aí, deixa eu terminar. - assenti como se ele pudesse me ver. - O Castanhari mandou um "Não tenho nada pra falar, ué" e eu aproveitei a brecha. Perguntei se ele mudou de ideia em relação a Lara, se queria ficar com você, mas acho que deixei meio na cara que você também queria. Desculpa. - Rafael!!!! - Desculpa, Marizinha, mas eu me empolguei. - não acredito nisso. - Falei que você até comentou dele hoje e ele ficou todo curioso. - Eu vou te matar amanhã. Você está me entendendo, né? Você vai ser um cara mortinho da silva. - falei me jogando na cama. - Mas... ele ficou curioso? - o Rafa riu. - Aham. Ficou perguntando o que você disse e pode ficar tranquila que eu não falei. Por isso ele ficou puto. - disse. - O Lucas ficou zoando demais com ele. Acho que tem alguma paixão reprimida nele, hein? - O que mais? Fala o que mais! - Eu perguntei se ele queria ficar com você, se pensou o mesmo que os amigos enquanto você estava dançando... - tão indelicado. - E ele desviou do assunto perguntando "Por que? Ela perguntou alguma coisa sobre isso?". Só mandei ele responder, e ele... está preparada? - Não. - Ele disse que te acha bonita "pra c*****o" e que, sem dúvidas, ficaria com você. - disse. - Mas se ficasse com você, ia embaçar com a Lara. - Sabia que você me encheu de esperanças e depois fez eu me afogar nelas, né? - Ele é galinha, Mari. Você merece coisa melhor. - disse. - Mas foi muito estranho. Parecia que ele queria ficar com você, mas também não queria ficar sem a outra. Entende? - Sim. - respirei fundo. - Obrigada, Rafa. - O que você vai fazer? - Nada. Vou desencanar porque isso é muito desnecessário. E era mesmo. Estou nessa desde o ano passado e não queria mais estar. Amor próprio é mais importante do que um penhasco ridículo pelo galanteador. Agora só preciso trabalhar nisso... sem olhares, sem sorrisinhos, sem longos minutos de conversa, sem nada. Queria encontrar uma maneira de não vê-lo mais, mas isso era claramente impossível. O pior de tudo era que agora não terá mais aquele achismo da parte dele em relação a mim. Ele não acha que eu quero... ele sabe. Meu Deus, ele sabe. *** Eu tinha um dom magnífico de passar vergonha e cair em público, mas nunca pensei que isso aconteceria na frente de pessoas específicas. Leonardo. Eu estava subindo as enormes escadas da fachada do colégio, mas ele estava chegando e me olhando daquele jeito que sempre deixava minhas pernas bambas. E ao me lembrar que ele sabia de tudo, tentei disfarçar e andar mais rápido para não encontrar com ele, mas tropecei no penúltimo degrau. - Você está bem? - ele perguntou tentando soar sério, mas estava rindo e eu revirei os olhos enquanto levantava sozinha mesmo com sua mão estendida para mim. - Ótima. - respondi por educação e continuei andando. Entrei na minha sala e sentei em meu lugar. A Luíza ainda não tinha chego e a Natália sentou ao meu lado perguntando do meu irmão. Sabia que era apenas o começo para o que ela ia começar a dizer logo depois. Ela estava saindo com um homem de vinte e seis anos escondido de seu pai e acha que está amando pela quarta vez no ano desde que nos conhecemos. A Natália é bem legal, mas ela era meio maluca, irresponsável e achava um máximo que saía com um cara mais velho. Eu acho isso um absurdo! Doze anos é muita coisa. Ela diz que vai para o motel com ele como se tivesse o maior orgulho, enquanto eu acho bem ridículo... tipo hello-ou! Nós temos apenas quatorze anos! Nem sei se acredito que esse lance do motel é verdade. - Natália estava falando do Carlos? - Luíza sussurrou quando chegou. - Sim. - revirei os olhos e ela soltou um riso. - Sabe que até já estou acostumada? - É, você tem paciência de ouvir... eu não muito. Mas fazer o que? Tirando isso ela até que é legal. Só é meio doidinha. - dei de ombros. - Totalmente. Logo o pessoal do segundo começou a chegar na nossa sala e o Castanhari ficou na minha sala novamente. Qual era a dele, afinal? - Aqui não é a sua sala, é Castanhari? - a professora Márcia implicou com ele. Até a professora o chamava pelo sobrenome. - Está cheio lá. Não tinha mais carteira vazia. - ele respondeu dando de ombros. Aham, sei. - Qual a ordem das provas? - Luíza perguntou. - Inglês e redação daqui a pouco e matemática depois do intervalo. - respondi. - Você sabe que vai me passar toda a prova de inglês, né? - disse e eu ri. A Luíza era péssima em inglês, enquanto eu sempre ia bem. Eu a ajudava ás vezes com algumas respostas. - Sim. - respondi rindo. O Leonardo tirou a mochila dele lá da frente e caminhou até o final da sala, colocando a mochila em cima da carteira ao lado da minha. Ah, não acredito. Qual era a dele, meu Deus?! - Vocês têm prova de que hoje? - ele perguntou se inclinando para perto da minha carteira. - Inglês, redação e matemática. E você? - Luíza respondeu. - Química e português. - respondeu. Fiquei com os olhos na minha apostila de inglês fingindo que ninguém estava falando com a gente. Avistei o Gabriel e ele sentou ao meu lado, colocando o braço em volta dos meus ombros como se fôssemos algum tipo de casal. Luíza e eu trocamos olhares e ela comprimiu os lábios para não rir. - Por que não sentou perto da Lara, garotão? - Gabriel perguntou olhando para o Leo. - Está tudo ocupado. - Luíza respondeu por ele e gesticulou mostrando que só tinham três carteiras vazias. Uma na frente, uma do outro lado da sala e essa que o Leonardo sentou. - Por que foi para a outra sala, Gabriel? Era pra você ficar aqui, não era? - Não quero ter prova com a Márcia. - Gabriel deu de ombros e ficou mexendo no meu cabelo comprido. - Bem que eu queria ir pra outra sala também. - falei. Não queria ter prova com a Márcia. - Mas está lotada, né? - Na verdade, não. Tem muitos lugares vazios. - Gabriel disse e eu olhei para o Leonardo pela primeira vez e sustentou por alguns segundos, mas logo desviou o olhar. - Ah, mas agora nós vamos ficar aqui, Mari! - Luíza disse. - Não vamos encontrar uma carteira atrás da outra da outra lá, e você vai me passar inglês. - Ok. - falei rindo. A prova começou alguns minutos depois e eu sabia todas as respostas, menos de uma palavra. O professor de inglês sempre passava umas dez palavras para traduzir para o português e eu não lembrava de uma. Wheel. Eu deitei a cabeça na mesa, virando pro lado oposto da porta e vi o Leonardo todo concentradinho fazendo a prova de português. - Precisa de alguma? - ele deitou do mesmo jeito que eu e seus lábios se moveram sem omitir nenhum som. - Sabe o que é wheel?! - fiz a mesma coisa. - O que? - W-h-e-e-l. - falei letra por letra por química labial e ele pareceu saber logo de primeira. - Roda. - Tem certeza? - ele assentiu. - Obrigada! - Mariana e Castanhari, cada um olhando a sua prova! - Márcia chamou atenção e eu fiquei sentada direito fingindo estar pensando, então logo escrevi "Roda". - É roda. - me inclinei pra frente e sussurrei para a Luíza. Já tinha passado a maioria das coisas que ela não sabia. Levantei e depois de entregar a prova, guardei as minhas coisas. - Obrigada de novo. - sussurrei para o Leonardo e ele deu um sorriso sem descolar os lábios. Por que qualquer coisa que ele fazia era de um jeito safado e ao mesmo tempo tão... intenso? Até quando ele falava, sorria, ou apenas me olhava. Esperei a Luíza sair para vir por alguns minutos, mas ela estava demorando demais e eu precisava ir embora. Hoje meu pai não poderia vir me buscar, então eu teria que ir a pé para o hospital onde minha mãe trabalha. Ela é enfermeira no hospital público do Centro da cidade. O meu pai é empreendedor, sempre está viajando pelas cidades e estados vizinhos e sempre que ele está viajando, eu tenho que ir a pé encontrar com minha mãe e íamos almoçar juntas. Segui meu caminho em direção ao hospital e meu corpo se cansou só de imaginar o longo caminho. Parei um pouco para tirar a jaqueta e, quando olhei pra frente novamente, vi o Leonardo na minha frente. Não literalmente na minha frente e sim a alguns metros de mim, também indo em direção ao centro. Ué, ele morava pro outro lado! Fiquei com medo de que ele achasse que eu estava seguindo ele, ainda mais depois da conversa com o Rafael, mas ele ainda não tinha me visto. Fomos andando normalmente por alguns minutos, ele estava distraído ouvindo música - assim como eu - e eu queria mesmo era passar dele para não ficar tão nervosa. Prendi a respiração quando o vi olhando pra trás disfarçadamente. Várias vezes. - Relaxa, eu não estou te seguindo. - falei quando nossos olhares se encontraram. - Apenas estamos indo para o mesmo lugar. - Por que você me seguiria? - ele perguntou parando de andar, certamente para esperar eu chegar até ele. - Sou uma perseguidora psicótica. Você não sabia? - falei irônica e ele soltou uma risada. - Pra onde você está indo? - Hospital. - respondi. - E você? - Eu também. Minha mãe é enfermeira lá. - disse. - Sim, eu sei, a minha também... minha mãe é amiga da sua mãe. - falei. A mãe dele era tão legal, sempre conversávamos. - Sério? - ele perguntou surpreso. Assenti. Ele disse um "Ah, sim..." e logo ficou um silêncio bem desconfortável. Pensei em qualquer coisa pra dizer, mas nós falamos ao mesmo tempo: - Então... - Sabe, eu... Soltamos uma risadinha e ele me olhou. - Pode falar. - disse. - Ah, eu ia perguntar sobre a Lara. - falei dando de ombros. Talvez ele não pensasse que eu estava afim dele. - Ela ainda não te disse nada? - Não. - ele deu de ombros como se nem ligasse. - Você não era amiga dela? - Era... - respondi. - Depois de algumas confusões, nós nos afastamos. - Não foi por causa de menino, né? - soltei um riso. - Não mesmo! - falei rindo. - Mas enfim, você vai ficar esperando ela responder? - Esperando em que sentido? Sem ficar com outras pessoas por causa dela? - assenti e ele riu ironicamente. - Não mesmo. - Eu ouvi uma conversa dela com a amiga. Sem querer, eu juro. - ele sorriu. - Ela é toda estranha em relação a isso. Parece que não quer, mas também não quer dizer não. - Estranha como? - Não sei, mas eu não consigo imaginar a Lara beijando. Ou, sei lá, namorando. Um homem. - falei. Isso era verdade. Eu até já cheguei a me perguntar se ela era lésbica. - Você quer que eu converse com ela? - Por que você faria isso? - perguntou com a voz meio rouca. Ah, a voz dele... - Por que eu não faria? - olhei pra ele também. Eu estava com tanta vontade de falar pra ele parar de ser o****o e querer alguém que também o queira, vulgo Mariana. Só queria que ele se tocasse. Mas eu deveria dizer o mesmo pra mim... preciso de alguém que me queira e ele não me quer, então isso vira um ciclo sem fim. - Você sabe por que... - parei de andar e o encarei séria. - Não, não sei. - falei. - E se você não quisesse, era só dizer não. Não precisa ficar insinuando coisas. - aí, Mariana, desliga sua gentileza de cavalo agora! - Ok, então. Eu não quero. - Beleza. - falei. - Olha. - comecei a dizer e olhei pra ele. - Não seja i****a, tá? Você é um cara legal e a Lara nem tanto. Bom, ela também não é um cara, mas você me entendeu... - me enrolei, e ele soltou um sorriso. - Estou falando sério. Não acho que vale a pena. - Ficar com a Lara? - É. Quer dizer, ela é bonita e dai? O que mais você sabe sobre ela? - perguntei. - Ela não tem valores. É vazia. Só se importa com a beleza que ela acha que tem e se acha superior. - murmurei de um jeito quase inaudível enquanto mexia na minha pulseira. - Ela é bem diferente de perto. - disse. - Ela nem é tão bonita assim como todo mundo acha mesmo. - Inclusive você. - alfinetei e ele fingiu que não ouviu. - Sabe, acho que não vale a pena ficar insistindo em algo que sabe que não vai pra frente. - me dei conta de que eu estava me ajudando. - Nossa, acabei de me auto aconselhar. - Está insistindo em alguém que sabe que não vai pra frente? - Insistindo não, porque eu não faço nada, mas... acho que não vale a pena querer alguém que não te quer, não é mesmo? - E se a pessoa também te querer? - Aí, você agarra. - falei séria, o que o fez rir. - Na realidade, vocês homens só se importam com beleza. - fiquei com vergonha assim que percebi que eu estava tentando convencê-lo a não ficar com a Lara. Droga. - Nem todos os homens. Alguns realmente só pensam na beleza, mas nem todos, né? Acho que quando a pessoa é gente boa e bonita, é um pacote completo. Merda, merda, merda! - Já vou indo, ok? Estou com pressa. Tchau. - falei assim que avistei o hospital. - Espera. - disse. - Por que vai fugir? - Não vou fugir, realmente estou com pressa. - falei. - Vou ter que tirar... - Pode ficar tranquila, não vou te envergonhar nem nada. - ele me interrompeu. - Eu não sei do que você está falando. - falei olhando para a rua. - Por que você me envergonharia? Não entendi. - Ok... - ele sorriu olhando pra frente, mas logo voltou a me olhar. - Não estou falando de nada. Deixa quieto. - Ainda bem. Achei que você estava ficando doido. - Mas e aí? Qual teu lance com o Gazola? - o sobrenome do Gabriel é Gazola. Por que ficavam chamando as pessoas pelo sobrenome? Não entendo. - O que? - minha voz soou um pouco esganiçada. - Como assim qual meu lance com ele? - Sei lá... ele sentou do seu lado hoje e ficava te olhando. - como ele reparou que o Gabriel ficava me olhando? - Ah não, não temos nada. Somos apenas amigos. - falei. Ele arqueou uma da sobrancelhas. - Ok... - ri. - Nós ficamos há um mês atrás mais ou menos, mas foi só isso. Estávamos solitários e carentes, aí rolou. - ele me olhou estranho e eu franzi o cenho. Antes que ele respondesse, vimos minha mãe e a mãe do Leo saindo do hospital juntas. Ambas ficaram surpresas quando viram o Leonardo e eu. Juntos. Conversando. Ignorei as expressões maliciosas e curiosas das duas. - Oi, Mari! - a mãe dele disse com um sorriso e me deu um beijo na bochecha. Ela me adorava. - Oi, Ana. - sorri. Minha mãe apenas acenou com a cabeça para o Leonardo. - Vocês estão indo almoçar também? - Ana perguntou. - Sim. - minha mãe respondeu. - Vocês querem ir com a gente? - NÃO! Só vi o sorrisinho do Leonardo pra mim. - Ah, tudo bem. - minha mãe disse. - Mãe, na verdade... - comecei a dizer. - Nós vamos ter que ir tirar a segunda via da minha identidade, lembra? - Ah é... - ela disse triste. - Não vai dar hoje, Ana. Combinamos mais pra frente. Minha mãe se despediu dos dois, e eu fiz o mesmo. Pensei em apenas acenar para o Leonardo, mas ia ficar ainda mais na cara todo o meu nervosismo e depois de passar essa vergonha de alheia de quase pedir para que ele não ficasse a Lara, precisava me poupar de mais vergonha. Me aproximei dele e beijei sua bochecha enquanto sua mão parou em minha cintura. - Ficou envergonhada de novo? - ele sussurrou no meu ouvido e senti tudo esquentar. Inclusive minhas bochechas. Ele riu quando viu que eu corei. E o pior é que ele não fazia ideia de como eu ficava apenas quando ele me olhava, imagina quando ele me tocava! - i****a! - falei dando um empurrão nele, que continuou rindo e piscou pra mim. Ah, meu Deus, ele era tão lindo. Merda. - Tchau! - a Fernanda acenou e minha mãe e eu fomos em direção a moto dela. Olhei pra trás por um momento e o Leo estava fazendo o mesmo, me olhando com um sorriso - cafajeste, como sempre - e eu olhei pra frente rapidamente com os olhos arregalados.  - Você está doida de aceitar ir almoçar com eles, mãe?! - comecei a dizer. - Era sua chance de conquistar ele! - a olhei indignada. - E que história essa de vocês vindo juntos, hein? Essa era a droga da minha mãe saber de tudo que acontece na minha vida sem graça. - Mãe, eu não quero conquistar ninguém. E viemos juntos sem querer. - falei. - Por favor, não vamos falar sobre isso. - Ok... - disse rindo. - Mas que você está com uma cara de apaixonada, você está. - Não, mãe. Não mesmo.
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