Enfim Veneza

928 Words
O voo de Nova York a Veneza era longo, quase interminável, com mais de oito horas no ar. A maior parte dos passageiros do jatinho particular, exaustos pela expectativa e tensão, acabou tirando um cochilo em algum momento. Cross, seu pai, havia resistido o máximo que podia antes de finalmente fechar os olhos e permitir que o cansaço o vencesse. Hugo, que tentara não transparecer o fascínio que sentia por Hellen, também acabou adormecendo, assim como os outros homens. Mas Hellen? Ela não conseguiu pregar os olhos por um segundo sequer. Sua mente estava a mil, incansável, rodando em torno de um único pensamento: Mateo. Ela se perguntava como seria o reencontro. Fazia meses desde que o vira pela última vez, e a saudade que sentia era quase insuportável. Será que ele estaria esperando por ela no aeroporto? Será que ficaria tão feliz quanto ela ao vê-la? E, mais importante, será que ele a pediria para não voltar mais a Nova York? A ideia arrancou um sorriso de seus lábios, um sorriso que ela não pôde conter. A simples possibilidade de Mateo lhe fazer essa proposta a fazia estremecer de emoção. Ela sabia que tanto Marcos quanto Cross ficariam furiosos. Marcos, com seu senso de dever implacável e a determinação de manter a família Didion unida, e Cross, com sua natureza protetora e a desconfiança eterna em relação aos Castilhos. Nenhum dos dois entenderia se ela optasse por ficar na Itália, e isso sem mencionar os riscos de uma guerra entre as máfias. Mas se Mateo pedisse... se ele olhasse em seus olhos e dissesse que a queria ao seu lado, Hellen sabia que não hesitaria. Deixaria Nova York para trás e construiria uma nova vida na Itália, mesmo que isso significasse deixar sua própria família desolada. Ela se lembrou de como Cross insistira para que ela aprendesse italiano. Desde cedo, seu pai a preparava para todas as eventualidades, e uma delas era falar a língua natal da família, o idioma da máfia italiana. Hellen dominava o italiano fluentemente, mas nunca tinha estado na Itália antes. E agora, ali estava ela, a caminho de Veneza, representando a máfia Didion em um evento que reuniria as maiores famílias mafiosas do mundo. Era um cenário que ela nunca tinha imaginado para si, mas que, agora, parecia tão natural quanto respirar. Quando finalmente o jatinho começou a perder altitude, anunciando a aproximação do Aeroporto Internacional de Veneza Marco Polo, Hellen sentiu o coração acelerar. A paisagem veneziana foi se revelando lentamente pela janela, com suas ilhas cercadas de água e canais que cortavam a cidade como veias de uma antiga criatura viva. Ao longe, o brilho das luzes refletindo nas águas do Mar Adriático indicava que Veneza não era apenas uma cidade; era um reino à parte, uma joia da história que resistia ao tempo. O pouso foi suave, mas a tensão no corpo de Hellen se intensificou. Estava na hora. Assim que as portas do jatinho se abriram e a brisa fria da madrugada italiana entrou, Hellen respirou fundo e se levantou. Ela não era mais apenas Hellen, a mulher apaixonada que sonhava com o reencontro com seu amante. Ali, naquele solo estrangeiro, ela representava a máfia Didion. Tinha uma responsabilidade imensa sobre seus ombros, e sabia que não poderia deixar suas emoções pessoais transparecerem. Cada passo, cada gesto deveria refletir o poder e a autoridade da família que ela representava. Enquanto desembarcava, Hellen adotou a postura de um verdadeiro soldado da máfia. O rosto sério, os passos firmes, os olhos atentos a qualquer movimento ao redor. Hugo e os outros homens a seguiam de perto, mas ela não precisou olhar para saber que Cross seria o último a sair da aeronave, observando tudo com seu olhar impassível e meticuloso. O aeroporto Marco Polo era grandioso, mas ao mesmo tempo tinha um ar de antiguidade, como se as paredes e corredores tivessem testemunhado mais do que apenas turistas entusiasmados e executivos apressados. Hellen caminhava pelo saguão, absorvendo cada detalhe. Os tetos altos, as amplas janelas que deixavam a luz natural inundar o espaço, e a mistura de vozes em diferentes idiomas. Ela era um contraste naquele ambiente: de terno ajustado e calça social, que destacavam seu corpo treinado, Hellen estava longe de ser uma figura comum. Seu andar altivo e os olhos afiados diziam ao mundo que ela estava ali em missão, pronta para qualquer desafio. Conforme o grupo avançava pelo terminal, cada detalhe do local parecia gravar-se na mente de Hellen. As estátuas renascentistas que decoravam o aeroporto, as lojas de luxo estrategicamente posicionadas, as pessoas em suas viagens cotidianas. Mas ela? Ela tinha outro objetivo. Sob aquele disfarce de civilidade moderna, Hellen sabia que Veneza seria palco de um encontro entre as maiores máfias do mundo, e isso a mantinha em alerta. Assim que pisou fora do aeroporto, sentiu o peso do momento. O ar de Veneza, levemente úmido e fresco, tocou seu rosto como um lembrete de onde ela estava. Era sua primeira vez na Itália, o país de origem de seu pai, e, no entanto, não havia espaço para deslumbre. Seu coração podia estar agitado por dentro, à beira de um colapso de excitação ao pensar em Mateo, mas, por fora, ela mantinha a fachada de uma soldada. Não havia lugar para vulnerabilidades. Hellen estava ali representando a máfia Didion, e era assim que ela iria agir. O encontro com Mateo viria em breve, e quando isso acontecesse, ela poderia, talvez, permitir-se sentir. Mas, por ora, sua mente estava focada no papel que tinha que desempenhar.
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