O ambiente da lanchonete estava viva com o som de conversas animadas e o cheiro convidativo de comida sendo preparada. Cristine, com seus olhos brilhando de entusiasmo, folheava o cardápio com uma energia contagiante.
— Gosto tanto dos lanches daqui — ela disse, uma genuína antecipação em sua voz, que trazia uma leveza que contrastava fortemente com o peso que eu carregava no peito.
Forcei um sorriso, tentando me conectar com aquele momento de leveza, mas meus olhos traíam minha preocupação, desviando-se involuntariamente para o visor do meu celular. A espera por uma mensagem de Túlio era como uma âncora, puxando minha mente de volta para o mar agitado de dúvidas e incertezas.
Cristine notou minha distração e seu tom carregava uma leve impaciência quando disse:
— Você pode deixar esse celular um pouco de lado para escolher o seu lanche? — A razão estava do lado dela, mas o coração teimoso raramente segue a razão facilmente.
— Tudo bem, ele deve estar com o Murilo, ele disse que tinha um jogo hoje — respondi, soltando o aparelho com relutância e pegando o cardápio. Minha voz soava distante, refletindo o conflito interno que eu lutava para esconder.
Cristine, com uma ponta de ceticismo, rebateu:
— Acredito que esteja enganada, com certeza ele não está com o Murilo — suas palavras, embora ditas casualmente, caíram sobre mim como um balde de água fria.
— Por favor, Cristine, pode parar de implicar com ele? — Pedi, minha voz trêmula escondendo m*l minha frustração crescente. Um nó apertado se formava em minha garganta, sinal da luta interna entre defender Túlio e enfrentar as verdades que eu temia admitir.
— Desta vez não é implicância, só disse porque o Murilo acabou de entrar e não está com ele — ela explicou, seu olhar se desviando para a porta. Movida por um impulso, virei-me para seguir seu olhar.
Murilo e Marcelo entravam na lanchonete, conversando descontraidamente, completamente alheios ao turbilhão de emoções que se desencadeava em mim. Um suspiro involuntário escapou dos meus lábios antes que eu me levantasse.
Olhei para Murilo, no mesmo momento que os olhos dele me encontraram. Nossos olhares se encontraram, e por um momento, senti como se Murilo pudesse ver diretamente através de mim, lendo cada uma das minhas inseguranças e medos. A sensação era desconcertante, como se estivesse desnuda em meio a uma multidão. Não sei por qual motivo sentia-me estranha na presença dele, mas sentia.
Apesar disso, sabia que precisava ir até ele; era a única maneira de ter alguma notícia de Túlio. Hesitante, dei o primeiro passo em sua direção, cada batida do meu coração parecendo ecoar na imensidão da lanchonete.
— Onde você vai, louca? — A voz de Cristine cortou o ar, repleta de preocupação e ceticismo, enquanto seu aperto em meu braço me impedia de me afastar precipitadamente da nossa mesa.
— Pode ser que eles saibam onde o Túlio está, eles são amigos — expliquei, minha voz vacilante transmitindo mais esperança do que convicção. Havia uma parte de mim que queria correr na direção oposta, mas a outra, movida por uma necessidade desesperada de respostas, me puxava para frente.
Cristine revirou os olhos, um gesto que se lia como um livro aberto de desapontamento e resignação. No entanto, como a verdadeira amiga que sempre foi, ela se levantou e caminhou ao meu lado, um pilar de suporte mesmo em face do que ela considerava ser uma decisão questionável.
Meu passo em direção à mesa de Murilo e Marcelo foi carregado de hesitação. O frio na barriga que senti não era apenas nervosismo; era uma mescla de medo, ansiedade e uma dose inesperada de esperança.
— Boa noite, Murilo. Você sabe do Túlio? — Minha pergunta saiu mais firme do que eu esperava, embora minha voz interior tremesse sob o peso de sua intensa presença.
— Boa noite, July. Estive com ele mais cedo — respondeu Murilo, com uma calma que não chegava a tocar seus olhos. Havia algo na tensão do seu olhar que me inquietava, um mistério não revelado que jazia sob a superfície de suas palavras.
— Vocês têm jogo hoje? — Continuei, buscando manter um tom casual, enquanto lutava contra a correnteza de emoções que sua proximidade despertava.
— Foi adiado para amanhã. Alguns dos meninos não podiam vir hoje — ele explicou, sua voz tranquila contrastando fortemente com o turbilhão dentro de mim.
Por um momento, me perdi na profundidade de seus olhos. Meu coração batia a um ritmo frenético, um arrepio inesperado percorreu minha espinha, e senti minhas bochechas se aquecerem com um rubor involuntário. Foi um momento de vulnerabilidade que eu não estava preparada para enfrentar.
Cristine, sempre atenta, percebeu minha distração e me apertou discretamente na cintura, um lembrete silencioso da realidade que enfrentávamos. Naquele instante, a gratidão que senti por sua presença foi imensa, uma âncora me mantendo aterrada quando mais precisava.
Sob a análise do olhar de Murilo, forcei-me a desviar a atenção, cumprimentando Marcelo numa tentativa de dispersar a tensão que se acumulava, como nuvens de tempestade, prontas para desabar.
A lanchonete estava mergulhada em uma luz suave, criando uma atmosfera quase acolhedora, que contrastava fortemente com o turbilhão de emoções dentro de mim. Virei-me para Marcelo, tentando esconder minha inquietação sob uma máscara de cortesia.
— Boa noite, Marcelo.
Marcelo olhou para mim, um brilho de reconhecimento e simpatia em seus olhos.
— Boa noite, July. Tudo bem com você? — Seu tom era genuíno, preocupado, o que só aumentava minha ansiedade de que minha fachada de calma fosse descoberta.
— Tudo bem, e você? — Minha resposta foi automática, mas meu olhar involuntariamente varreu o ambiente, pousando brevemente em Murilo antes de voltar a Marcelo, revelando minha inquietude.
Marcelo parecia relaxado, indiferente ao meu desconforto.
— Estou muito bem — ele então virou-se para Cristine com um sorriso travesso, um contraste marcante com a tensão que eu sentia. — Boa noite, gatinha.
Cristine, imperturbável como sempre, respondeu com um aceno de cabeça e um sorriso educado.
— Boa noite, Marcelo. Boa noite, Murilo — sua voz era calma, uma âncora de estabilidade em meio à minha confusão emocional.
— Boa noite, Cristine — Murilo se juntou à conversa, seu sorriso era gentil, mas seus olhos carregavam uma profundidade que sempre me desconcertava.
Me sentindo cada vez mais como uma intrusa em seu mundo, murmurei uma desculpa.
— Desculpa incomodar vocês, meninos — minhas palavras flutuavam no ar, carregadas de um embaraço que eu não conseguia ocultar.
Murilo me lançou um olhar tranquilo, quase reconfortante.
— Você nunca incomoda, July. Não se preocupe — seu sorriso, simples e sincero, trouxe um breve alívio ao meu coração apertado, e encontrei-me sorrindo de volta, um gesto tímido e involuntário.
Ainda assim, a razão de minha abordagem não podia ser esquecida. Respirei fundo, reunindo a coragem que me restava.
— Se vocês encontrarem com o Túlio, podem avisar que preciso falar com ele? — Minhas palavras saíram apressadas, tingidas de uma urgência que eu tentava, em vão, disfarçar.
Marcelo acenou, um sorriso prestativo iluminando seu rosto.
— Pode deixar, combinamos de ir à quadra às nove. Se ele aparecer, entrego seu recado — seu tom era de pura disposição, uma oferta de ajuda que me era extremamente valiosa.
Murilo, por outro lado, parecia mais reservado, como se um mar de pensamentos o afastasse da conversa.
— Obrigada, meninos — minha gratidão foi sincera, acompanhada de um suspiro de alívio. Com um último olhar de agradecimento, me afastei com Cristine.