Lucas
Santos Almeida… esse era o sobrenome que faziam muitos estremecerem, mas eu, com apenas treze anos não sabia muito bem o que significava, só que fazia parte de um legado importante
A minha família mexia com o mercado financeiro, era essas coisas de venda de ações, investimentos imobiliários e transações com os fundos imobiliários, nada que eu pudesse entender, só que por conta disso, eu não tinha aquilo que podia chamar de família funcional
Minha mãe tinha morrido no parto, pelo o que meu pai me contou, ela foi a maior de todas as guerreiras que já existiu na face da Terra. A doença dela era uma coisa que fazia os órgãos irem parando aos poucos, só que quando ela me descobriu dentro dela, lutou até o fim, o problema foi que eu ganhei a vida que deveria ter sido dela
Meiga, carinhosa, alegre, é isso que a minha babá sempre me contou sobre a minha mãe, que ela era a melhor de todas as mulheres, que eu lembrava um pouco ela, no jeito de virar a cabeça e as vezes de sorrir
Pode-se dizer que eu fui criado mais pela minha babá do que pelo meu pai mesmo, ele se preocupou mais em me dar boa vida, trabalhar que nem louco para me dar o melhor dos melhores, que gastou todo o seu tempo no trabalho
Só que eu não me preocupava, os poucos momentos que conseguia ficar com ele, eu era feliz, ele me fazia me sentir assim
Aquele serviço dele muitas vezes fazia a gente mudar os planos, os que eu ficava sonhando por dias, sempre surgia um reunião no meio da tarde, justo aquela que ele planejava me levar no cinema, no parque aquático
Naquele dia, o que eu encontrei a menina no shopping foi um desses dias, só que eu agradeci por isso ter acontecido, se eu tivesse assistido o filme no cinema, tinha perdido a oportunidade de colocar meus olhos na menina mais linda que eu já tinha visto na face da Terra
Eu gostava de assistir à sessão da tarde, sabe aqueles filmes que repetiam e repetiam na globo, às três horas da tarde e que as crianças conseguiam se apaixonar como adultos? Tipo aquele filme, “Meu primeiro amor”, nossa, eu assisti ele muitas vezes, mas não acreditava não, para mim era mais uma coisa inventada só para a tela de televisão mesmo
Só que com meus treze anos, mais velho do que o Macaulay Culkin aparentava ter, eu conheci um sentimento que julguei ser o meu primeiro amor, podia ser até o primeiro da minha adolescência, mas aconteceu
Eu tentei puxar o máximo de conversa com ela, mas a menina era de poucas palavras, uma vez ou outra me dava resposta completa, e eu ficava lá, todo abobalhado por ouvir o som da sua voz
A tarde passou que eu nem vi e também nem me preocupei com o tempo, como eu disse, eu estava bobo com ela do meu lado, só me preocupei mesmo em curtir o dia ali com ela. Me senti bem, era difícil isso acontecer, o mais comum era eu ficar me lamentando porque meu pai não tinha conseguido achar um espaço na sua agenda para curtir a tarde comigo do jeito que ele tinha me prometido
Eu sabia que era coisa de imprevisto, mas não conseguia deixar de ficar chateado, na minha cabeça de adolescente, era muito mais importante que ele estivesse ali comigo do que conversando com gente que eu não conhecia e fazendo os negócios que ele gostava de bater no peito dizendo que era para garantir o meu futuro
Em outros dias eu não via a hora do Ted, meu segurança particular, aquele que fazia muito mais o papel do meu pai do que meu próprio pai, dizer que já era a hora de voltar para casa, mas naquele dia não, eu queria ficar ali, eu queria ficar perto dela, uma pena…
De onde surgiu aquela ideia eu não sei, só sei que disse que a gente podia continuar se falando, com a ajuda daquela ideia mirabolante de troca de cartas, eu esperava que desse certo, só esqueci de um pequeno detalhe, como a menina se chamava mesmo? Como eu podia chamar ela de meu primeiro amor se não consegui nem saber o seu nome?
Mais um segredo… a gente já estava começando a colecionar coisas só nossas, pelo menos na minha cabeça
Só que eu não fui procurar se aquilo tinha realmente acontecido logo de cara, esperei três dias, na verdade, tive medo de descobrir que tudo o que eu imaginava estava só comigo, que a menina sem nome tinha me esquecido e que eu ia fazer papel de palhaço indo para a o Parque Ibirapuera atrás de uma carta escondida no meio de arbustos
Mais do que ansiedade, eu senti medo… por isso esperei aqueles três dias, mas depois daquilo eu não aguentei mais
Lucas - Ted, será que a gente pode passar rapidinho ali no parque?
Ted - O senhor é quem manda
Senhor, eu já tinha pedido várias vezes para ele não me chamar assim, mas depois das broncas do meu pai que insistia em dizer que os empregados tinham o seu lugar e deveriam permanecer neles, eu desisti
Assim que chegamos no parque, desci e fui de encontro ao local combinado, mas não fui direto procurar a carta não, no caso, parei na frente do arbusto e fiquei olhando ali por uns minutos, nem sei quantos, minha mente ainda estava me deixando na dúvidas se eu estava ou não fazendo papel de palhaço
“Você já chegou até aqui e o não você já tem, vai lá, vê se ela te deu um sim…”
Respirei fundo, me agachei e coloquei minha mão num vão que tinha bem no pé do arbusto, era uma buraco tapado com um pedaço de pedra feito de concreto, eu sabia que aquilo estava ali porque tinha perdido minha bolinha de gude no mesmo lugar há uns meses atrás
“Por favor… por favor… por favor…”
Minha mão alcançou um pedaço de papel e meu coração começou a errar as batidas, ela tinha escrito para mim, tinha cumprido com o combinado, ela realmente tinha estado comigo ali, naquele shopping, totalmente comigo
Assim que eu puxei para fora do buraco, vi uma coisa que me chamou a atenção, um símbolo feito como selo na carta, com uma letra estampada, um “V” todo trabalhado
“Muito criativo”
Agora só me restava ler o que eu tanto esperei e devolver o papel dizendo tudo aquilo que eu estava guardando no meu peito, só esperava que a menina que aparentava ser ainda mais nova que eu, acreditasse nos sentimentos de uma adolescente