CAPÍTULO 1
PEDRO
Passei o velório inteiro pensando em quais negócios o meu pai teria feito com Carlos Zanutto, eu sabia que quando mais novos eles eram amigos, porém o tempo os distanciou, e cada um seguiu seu caminho.
As horas passavam e aos poucos algumas pessoas iam embora e no momento da cremação, apenas os mais íntimos estavam presentes.
Voltei para o haras com a minha mãe, o local enorme abrigava também a sede, que era o nosso lar, uma casa grande e cheia de quartos, havia as cocheiras, os pastos, um hospital veterinário, o alojamento dos funcionários, e ainda assim muitos alqueires eram apenas cobertos pela grama verde.
Tomei outro banho e coloquei uma calça de moletom preta, preferi ficar sem camisa, já que o calor na cidade era muito grande, eu estava com fome, não havia comido nada antes do velório, a minha mãe havia tomado um calmante e já estava dormindo ela precisava descansar, olho a imensidão de terras através da grande janela da sala, o café quente na caneca e então uma voz feminina ecoa atrás de mim.
—Me desculpe, eu não sabia que o senhor estava aqui—a pequena garota diz olhando o meu corpo seminu.
— Eu moro aqui—digo analisando o pequeno corpo da garota de olhos assustados.
— Eu sei, eu só não sabia que o senhor estava aqui na sala, a minha avó me pediu para arrumar as louças e eu me perdi no tempo—ela diz.
— Você é neta da Rosa?—inquiro e a garota de cabelos loiros me sorri.
— Sim, o senhor não se lembra de mim, sou a Fernanda—ela diz.
— Tem razão, eu realmente não me lembro mesmo de você—digo tomando o café que agora esfria na caneca.
— Quando o senhor foi embora eu ainda era muito pequena, e quando vinha visitar os seus pais, a minha avó dizia para eu ficar longe do senhor—ela diz.
—Longe de mim? Por quê?—inquiro curioso.
— Deixa pra lá senhor, eu falei demais—ela diz saindo apressada, acabo rindo daquela cena.
Pelo visto a Rosa ainda me via como mau exemplo, e eu confesso que lhe dei alguns motivos para pensar assim, desde muito novo eu amava o cheiro das mulheres, o corpo feminino, os cabelos que eu podia enrolar nos meus dedos e puxar, nunca neguei isso, mas a minha conexão com as mulheres sempre foi na cama, nunca além dela, eu nunca me apaixonei por nenhuma delas, e as que resistiam as minhas fantasias e ao meu jeito bruto não chegavam ao meu coração, todas pareciam iguais, vazias.
Eu gostava mesmo dos animais, eles eram verdadeiros, gostava de ver os cavalos correndo pelo pasto, gostava das lambidas sinceras de Ícaro o meu dog alemão preto, eu confiava neles e eles em mim.
Termino o meu café e volto para o meu quarto, deito e tento dormir, mas na minha mente a mesma pergunta ainda ecoava, o que aquele homem queria comigo? O que será que meu pai acordou com ele.
O dia amanheceu lindo como quase todos em Santa Rita do Pardo, e eu só queria descobrir o que Carlos Zanutto tinha para me dizer, então me apressei em levantar.
Coloquei uma calça jeans, minhas botas, uma camisa e peguei um boné, encontrei a minha mãe na cozinha tomando café, junto com Rosa e a sua neta.
— Bom dia—digo me aproximando da garrafa de café e me servindo.
— Não vai comer nada meu filho?— a minha mãe inquire.
— Estou sem fome mãe, acabei fazendo um lanche ontem a noite, inclusive foi quando encontrei a moça aí—digo apontando para Fernanda com a cabeça, o olhar assustado de Rosa, foi muito engraçado, certamente pensou que o lanche foi sua neta, e não que ela não fosse bonitinha, mas aquela garota miúda não aguentaria o meu sistema bruto, menos ainda meus cento e vinte quilos, distribuídos num metro e noventa e seis de altura, ela sucumbiria no primeiro tapa que eu desce naquela b***a.
— Por que disse para a garota ficar longe de mim Rosa?—inquiro.
—Ah Pedro, você sabe bem, fique longe da minha neta viu—ela diz sorrindo e eu sorrio também.
— Já vou indo, há muito trabalho para fazer aqui—digo.
— Filho, resolvi passar uns dias com a sua tia na capital, acho que vai ser bom para mim— a minha mãe diz.
— Como quiser mamãe, o que decidir está perfeito, se quiser ir mesmo eu te levo a noite—digo.
—Sim, eu já decidi—ela diz sorrindo, mas era visível a sua tristeza e saudade do meu pai.
Saio da grande casa e encontro José Henrique, ele trabalha aqui a anos, e conhece o haras como a palma da sua mão, e é meu homem de confiança, a nossa amizade é de longa data.
— Bom dia Pedro—ele diz.
— Bom dia José, como estão as coisas? Tudo em ordem?—inquiro.
— Sim, mas notei a Pandora meio cansada hoje—ele diz.
— Fique de olho nela, a gestação está quase no fim, eu vou à cidade, mas volto logo e se acontecer algo me avise—digo entrando na caminhonete preta estacionada logo a frente da casa.
Sigo rumo ao escritório de Carlos Zanutto, o homem era advogado na cidade e defendia grandes fazendeiros, e claro que mesmo negando as pessoas sabiam que ele também tinha negócios ilegais,estaciono e desço.
— Bom dia, eu vim falar com o Carlos—digo a moça sentada me olhando dos pés à cabeça como se eu fosse um frango exposto na vitrine de uma padaria
— Como o senhor se chama?—ela inquire.
— Pedro Sanchez—digo e ela arregala os olhos como se eu fosse um fantasma, a minha fama na cidade era tão r**m assim?
Logo vejo o homem abrir a porta e se aproximar me olhando.
— Olá Pedro, entre vamos conversar—ele diz e eu o acompanho.
Sento-me na confortável cadeira de couro e o olho impaciente.
— O que você quer comigo?—digo.
— Pedro antes de qualquer coisa, eu sei que seu pai era um homem de palavra e que jamais voltou atrás nenhuma vez, espero sinceramente que você continue seu legado—ele diz.
— Sou um homem, não um moleque, se o meu pai tinha negócios com você, eu os cumprirei—digo olhando em seus olhos.
— Certo, Pedro a alguns anos atrás o seu pai se envolveu numa enrascada nada muito grave mas poderia lhe causar algum problema, o antigo contador do haras, fez algumas merdas, sonegou impostos, deixou te pagar algumas pessoas ali e outras acolá, enfim o seu pai estava prestes a perder o haras quando me procurou, digamos que eu dei um jeito de tudo ser esquecido, se é que me entende, no entanto, pedi algo em troca—ele diz.
—Me diga o que é eu te darei, é só me dizer o valor—digo.
— Deixa eu continuar, os Sanchez são o sobrenome mais influente de toda a cidade, me arrisco dizer que está entre os mais ricos e influentes do estado, como você sabe, a minha família não é rica, no entanto vivemos bem, e eu trabalhei muito para manter os estudos da minha filha, sendo assim, em troca dos serviços prestados ao seu pai, lhe pedi que você se casasse com a minha filha, fizemos um contrato assinado, mas também tenho guardado todas as provas que ainda o faria perder o haras, caso não venha a cumprir o acordo entre o seu pai e eu—ele diz me olhando.
—Seu merda, como espera que eu cumpra isso, eu nem gosto da sua filha, não a conheço, que tipo de pai é você que entrega a filha através de um contrato? Sem se importar se ela será feliz ou não—grito segurando o homem pelo colarinho.
— Pedro me solte, você não pode fazer nada, tem que cumprir, ou vai perder tudo que o seu pai lutou para manter, vai se casar com a minha filha e vai dar a ela seu sobrenome, não importa se vai ama-la ou não—ele diz e eu o solto com tudo.
Saio daquela sala batendo a porta atrás de mim, eu jamais me casaria com aquela mulher, eu nunca mais havia visto ela.