Leticia Narrando
Saí da loja quase saltitando, nem parecia que eu tinha passado o dia inteiro correndo atrás de cliente. A animação pela festa da lancha tava me deixando elétrica. Subi o morro com um sorriso no rosto, e já no pé da ladeira vi o Guga encostado na moto, me esperando com aquela cara de quem sabe que vai fazer alguma gracinha.
— Aí, princesinha da Zona Sul, chegou animada, né? — ele disse, dando um meio sorriso enquanto eu me aproximava.
— Animada pra c*****o, Guga! Tu não tem ideia! — ri, ajeitando a bolsa no ombro. — A festa da lancha tá confirmadíssima. Final de semana vai ser estourado.
Ele ergueu a sobrancelha, curioso.
— Festa na lancha? Que p***a é essa, Letícia? Tá se achando gringa agora?
— Ah, vai te f***r, Guga! — gargalhei, dando um tapa de leve no ombro dele. — A Lívia enlouqueceu, vai fazer uma festa pra comemorar o ano da loja, e meteu essa de alugar uma lancha. Acredita?
Ele abriu um sorrisão, mostrando os dentes.
— p***a, aí sim! E eu vou, né?
— Claro que vai, animal! — respondi, revirando os olhos. — Não vai perder a chance de meter o bedelho, né?
Guga ligou a moto e eu subi na garupa.
— Claro pô. Minha mulher vai ta de biquini com sei lá quem vai ta e tu acha que eu vou ficar de fora?
— Nem fodendo. — me segurei nele enquanto a moto começava a subir. — Certeza que tu vai querer pagar de piloto da lancha, eu conheço teu tipo.
Ele riu, acelerando um pouco. O vento batia no meu rosto, mas a sensação era gostosa, ainda mais com aquela expectativa de um rolê diferenciado chegando.
Chegando perto da boca, vi o Arcanjo parado na calçada, com um baseado na mão, encarando o movimento como se fosse o dono do mundo. Guga deu uma diminuída na velocidade e parou perto dele.
— Aí, viado! — Guga chamou, dando aquele sorriso maroto. — Sábado tem festa na lancha do trabalho dela. Me dá uma folga aí, c*****o, fala tú
Arcanjo levantou o olhar, interessado.
— Festa na lancha? do seu trabalho?
Eu comecei a rir, balançando a cabeça.
— Pois é, Arcanjo. Tu não tá ligado no babado que vai ser. Vai ser p**a, sério. Bebida, comida, música e o marzão. A Lívia surtou muito e tem que ver tudo que ela contratou
Ele deu uma tragada no baseado, soltando a fumaça devagar.
— Lívia?
Guga deu de ombros.
Arcanjo olhou direto pra mim, com aquele olhar que eu não conseguia decifrar muito bem.
— Então, Letícia, rola de eu colar também? Coé Leticia, me leva pô. É a minha chance
Senti que ele tava jogando indireta, mas fingi que não entendi.
— Por mim, rola sim, Arcanjo. A lancha não é minha, mas a Lívia não vai se importar se eu levar mais gente. Na real, quanto mais, melhor.
Ele abriu um sorrisinho, satisfeito.
— Fechou então. Mas ó, me ajuda a entrar no clima. Não vou chegar lá de qualquer jeito, né? Você tem que me ajudar a me com´portar, a ver como eu vou falar, tudo direito pô. Ela não pode sonhar quem sou eu
Meu coração acelerou por um segundo. Então era isso. Ele queria conhecer a Lívia. Eu sabia que ela era outro nível, mas, c*****o, Arcanjo querendo se misturar? Nunca imaginei.
— Posso tentar, Arcanjo. Mas a Lívia não é da nossa praia, tu tá ligado, né? Ela é meio fresca, meio patricinha… Se tu aparecer do nada dizendo que é da comunidade, sei lá.
Ele levantou a mão, interrompendo.
— Relaxa, Letícia. Eu sei me virar. Só preciso que você me dê uma moral. Apresenta a gente e deixa o resto comigo.
Guga, que até então só observava, soltou uma risada.
— Arcanjo, tu é descarado mesmo, hein? Já quer chegar pegando a madame?
Arcanjo revirou os olhos, impaciente.
— Cala a boca, Guga. Ninguém tá falando de pegar ninguém. É só trocar uma ideia, ver qual é a dela. A p***a é que a mina não pode me ligar ao morro, ao tráfico, nada disso. Então, Letícia, o Guga só vai ter folga se eu for junto
Eu suspirei, pensando no rolo que podia dar. Mas ao mesmo tempo, que m*l tinha ajudar? A festa era pra geral curtir, e se o Arcanjo queria se misturar, eu não ia barrar.
— Tá bom, Arcanjo. Vou tentar ajudar. Mas não vem me culpar depois se ela te ignorar.
Ele deu um sorriso de canto, confiante.
— Ignorar? Ela não vai ignorar. Pode apostar.
Guga acelerou a moto de leve, impaciente.
— É isso então? Já enrolamos demais. Bora, Letícia, se não vamos ficar aqui até amanhã dando trela pra essa obessessão do Arcanjo..
— Passa la na casa do Guga pra gente pelo menos ensair o jeito de falar, né? Vai chegar cheio de giria ai, ela não é i****a também — acenei, e ele balançou a cabeça, satisfeito.
Seguimos subindo, e eu não parava de rir da ideia. A festa da lancha ia ser um babado e tanto. Tava vendo que ia ter mais emoção do que eu imaginava. Fechei os olhos um segundo, sentindo o vento e pensando no que ia acontecer quando Lívia e Arcanjo se cruzassem. Se ela soubesse a real dele, com certeza ia torcer o nariz. Mas se ele soubesse jogar, quem sabe?
Guga virou a cabeça pra trás, falando alto por cima do barulho do motor:
— Vai ser divertido, hein, Letícia. Tua amiga e o Arcanjo na mesma festa. Esse final de semana promete.
Eu gargalhei, abraçando a cintura dele pra não cair.
— Promete mesmo, Guga. Vai ser da hora. Que venham as aventuras!