16. Lívia

1381 Words
Lívia narrando O movimento na loja tava daquele jeito: gente entrando, saindo, experimentando roupa, sacola indo pra lá e pra cá. A música ambiente era até gostosa, mas depois de horas parecia que o mesmo beat ficava repetindo na minha cabeça. Quando deu uma brecha, me joguei no sofá do provador e chamei as meninas. Precisava desanuviar. — Eai meninas, tá todo mundo trabalhando igual condenada, vambora organizar alguma coisa pra desestressar! — falei, esticando as pernas. Letícia, que sempre tinha uma opinião pronta, veio com o maior sorriso. — Amiga, já é! Final de ano tá aí, e a gente merece. Essa equipe arrebenta. Passou da hora de fazer um festão pra comemorar as metas. — Só se for mesmo! — completou Raquel, outra vendedora. Ela tava dobrando umas peças, mas largou tudo pra entrar na conversa. — Só esse mês a gente vendeu como se o shopping fosse fechar pra sempre. A galera começou a se animar. Até a cliente que tava no caixa deu uma risadinha quando ouviu a ideia. — Tá, mas onde vai ser isso? — perguntei, já me imaginando tendo que organizar mais uma coisa. — Porque se depender de vocês, eu vou ter que bancar tudo, né? Letícia virou os olhos, teatral como sempre. — Logico, nossa patroa é você e outra coisa, a gente merece e você sabe muito bem. É só a gente achar um lugar bacana. Tá um calor do c*****o, não vai rolar nada em ambiente fechado. — Vai dizer que tu prefere botar a gente numa laje? — zoei, gargalhando. Raquel entrou na onda. — Que laje, garota! A gente tá falando de festa, estilo, glamour... e, se pá, até piscina. — Piscina? — franzi a testa, rindo. — Vocês querem o quê? Alugar um hotel agora? — Não, melhor ainda. — Letícia parou, fazendo suspense. — Uma lancha! Varias fotos de biquini com meu silicone, oh, gostosa de garota amor A loja inteira explodiu de risada. Até a cliente no caixa não se aguentou. Eu tava chorando de rir, quase caindo do sofá. — Vocês tão de s*******m, né? É sério que eu vou ter que alugar uma lancha pra esse bando de louca? Raquel tava com as mãos na cintura, já se achando. — Ué, Lívia, não foi você que disse que queria uma festa f**a? Então, pronto. Lancha é o básico. — Básico pra quem, minha filha? Pra Anitta? — retruquei, ainda rindo. Letícia levantou a mão, como se fosse dar a palavra final. — Olha só, a gente faz o seguinte: cada uma ajuda com uma parte, tipo divisão de tarefa. Você cuida da lancha porque, né... chefe rica e poderosa. E a gente resolve o resto. Fiquei olhando pra cara delas, incrédula. — Vocês são um abuso, sabiam? Mas beleza, vou pensar no caso. Aí começaram os papos de quem ia levar quem. Raquel tava toda animada falando do namorado. — Ah, o Leozinho vai amar, certeza. Ele adora essas vibes de festa na água. — Claro, né? Deve tá achando que vai aparecer num clipe de funk. — brinquei, revirando os olhos. Letícia já entrou no embalo. — Meu boy também vai. Certeza que ele vai querer pilotar a lancha, porque homem tem essa mania, né? Nem sabe, mas quer pagar de piloto. As duas rindo, e eu só ouvindo. Foi quando Raquel virou pra mim, maliciosa. — E aí, Lívia? Quem tu vai levar? Suspirei, já sentindo o golpe vindo. — Ninguém, né? Vou ficar segurando vela pra vocês, pelo visto. A Letícia deu aquele grito exagerado que só ela sabe dar. — Qual é, amiga! Não é possível que tu não tenha um bofe na manga. — É, ué, tá solteira esse tempo todo por quê? Tá escolhendo demais? — provocou Raquel. — Escolhendo demais nada! É que não aparece ninguém que preste, c*****o. Só uns caras com papo furado ou que acham que vão me impressionar com carrinho rebaixado e som alto. Elas caíram na gargalhada. — Ah, amiga, então tu tá andando nos lugares errados. Tem que vir comigo pra uns rolês. Tu vai ver só os gatos que aparecem. — Gatos pra tu, né? Porque pra mim só vem os vira-lata. — brinquei, jogando a almofada do sofá nela. — Ó, mas presta atenção. — Letícia mudou o tom, como se fosse dar um conselho sério. — Quando rolar essa festa, vou levar uns amigos do meu boy. Quem sabe um deles não te interessa? — Que? Amigos do Guga? Aham Leticia, cala boca. Eu prefiro ficar na minha, tá ligado? — Ah, tá bom, prefere nada. Só tá falando isso agora. Mas espera até tu ver um dos amigos dele tirando a camisa na lancha. Eu revirei os olhos, rindo. Elas não largavam o osso. Mas no fundo eu sabia que elas só queriam me ver bem, e eu valorizava isso. A conversa continuou, e aos poucos a ideia da festa foi tomando forma. Apesar de eu reclamar, já tava começando a pensar que seria divertido. Afinal, final de ano merecia um brinde diferente. E quem sabe, talvez, eu encontrasse alguém legalpelo menos pra da uns beijos, não mata né? A conversa tava boa, e agora o papo já tinha mudado completamente. Era só o que faltava: elas já tavam imaginando as fotos que iam tirar na tal festa na lancha. — Tá, mas vamos combinar. — Raquel levantou o dedo, como se fosse fazer uma declaração muito séria. — A gente tem que arrasar nos looks. Tô falando de biquíni, saída de praia, chapéu, óculos... o kit completo! — Ih, lá vem ela! — brinquei, rindo. — Já tá pensando na estética do i********:. — Óbvio, né? — respondeu, sem nem piscar. — Não vou perder a oportunidade de tirar foto pra postar. É lancha, p***a! Letícia entrou na onda. — Então já vou avisando: meu biquíni vai ser aquele fio-dental que o boy gosta. Quero ver geral babando. — Credo, Letícia! — Raquel fingiu indignação, mas começou a rir. — Tá achando que é clipe de funk agora? — Se for, eu sou a estrela. — Letícia piscou, cheia de confiança. Eu só observava as duas, balançando a cabeça. — Vocês são uma peça, sabia? — E você, Lívia? — Raquel me cutucou. — Já tem biquíni em mente ou vai usar um desses que vende aqui na loja? — Ah, me deixa, vai. Não tenho cabeça pra isso agora. — Como assim? — Letícia cruzou os braços, como se tivesse ouvindo uma blasfêmia. — Tá dizendo que vai pra uma festa na lancha e não vai pensar no look? — Sei lá, gente. Qualquer coisa tá bom. As duas quase morreram de desgosto. — Lívia, pelo amor de Deus! Ela ja é acostumadas a esse tipo de rolê, por isso nem fica tão feliz Leticia — Raquel jogou as mãos pro alto. — Paroa, a gente tá falando de uma oportunidade única. Tu tem que caprichar! — Beleza, então. Depois vocês me ajudam a escolher. — Isso aí. — Letícia bateu palmas, como se fosse a diretora de estilo. — E já aviso que a gente vai fazer um ensaio fotográfico digno. — Ensaiado ainda? — perguntei, gargalhando. — Claro, né? A gente combina as poses, a luz, o ângulo... tudo! — Letícia disse, toda empolgada. — Foto espontânea é só pra amador. Raquel concordou. — Verdade. E tem que ter aquela clássica: a gente no deck da lancha, com o marzão ao fundo, segurando uma taça de espumante. — Vocês tão viajando. — Revirei os olhos, mas já tava começando a me imaginar na cena. — Imagina só: o sol batendo no cabelo, aquele brilho na pele... — Letícia já tava quase sonhando acordada. — E, claro, com os boys ao fundo pra dar aquele toque especial. — Ah, não. Já tão querendo me arrumar um par de qualquer jeito. — Vai por mim, Lívia. Essa festa vai ser um divisor de águas na tua vida amorosa. — Letícia piscou, cheia de confiança. Eu só conseguia rir delas. Mas, no fundo, tinha que admitir que a ideia de curtir uma festa diferente, com as meninas e talvez um bom drink, tava começando a me empolgar. Afinal, depois de tanto trabalho, a gente merecia.
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