Veigh
Fiquei ali deitado e nem me dei conta de que a noite tinha chegado. A minha mente estava tão apertada que eu já tinha me esquecido de que tinha que sair desse lugar hoje, porque os cu azul pediram a minha transferência para um presídio federal que fica lá onde Judas se enforcou, porque as botas ele perdeu primeiro.
O amigo fez sinal com a cabeça para mim, ele tinha comprado dois guardas e nós íamos meter o pé juntos. Alguns guardas tentam piorar as nossas vidas aqui dentro, tá ligado, mas tem outros que só pensam no malote que vão ganhar colaborando, e esses dois foram espertos, ficaram ricos com a nossa fuga.
Já passei a visão para o amigo de que é para sair daqui limpo, sem matar ninguém, mas se alguém atravessar nosso caminho, não vai ter jeito. Ele me mandou ficar atento, e a adrenalina começou a tomar conta do meu corpo quando o silêncio tomou conta do corredor e as luzes se apagaram. O mano se aproximou de mim, me entregando uma roupa de carcereiro. Troquei de roupa correndo.
- A minha cela se abriu sozinha e eu dei um tiro na mão de um dos caras agentes que estavam ajudando a gente, fazia parte do plano. Se eu sair daqui sem um deles estar ferido, ele será preso.
O amigo já veio na minha direção, também vestido, e me entregou duas armas. Coloquei as duas na cintura e fui andando até o portão. Quando estava quase saindo, um filho da p**a gritou: "Fugitivo!"
Tirei a arma da cintura, mirei na cabeça dele e atirei sem pena. Ele caiu duro no chão e o parceiro saiu me puxando em direção ao portão.
- Corre, porr@! Se colocarem a mão na gente, serão mais vinte anos nas costas e um esculacho que não vai esquecer nem se nascer de novo!
O outro agente que também estava comprado abriu o portão para nós, e a minha tropa já encostou o carro. Ele saiu dali a milhão, deixando qualquer um para trás, pelo menos foi o que eu achei, até nós entrarmos na Avenida Brasil. O bagulho tinha mais cu azul do que na delegacia. Eu peguei o fuzil e comecei a atirar na direção deles, na tentativa de sair dali, e o amigo estava fazendo o mesmo. A trocação estava frenética, quando o meu reforço chegou, eu já tinha perdido dois homens.
Para a gente sair dali, tínhamos que sair do nosso carro para trocar pelo que os aliados trouxeram, mas como sair se eles estavam sentando o dedo firme em cima da gente?
- Irmão, vai primeiro que eu te dou cobertura - meu mano gritou.
- Tá maluco porr@, isso aqui não é uma missão suicida não.
- Eu sei o que estou fazendo, vai logo, c@ralho! - ele gritou e me encarou firme.
Eu saí de dentro do carro correndo, dando tiros na direção dos canas, enquanto ele foi me dando cobertura. Senti minha barriga arder, eu tinha tomado um tiro, mas cheguei no carro.
- Gritei para ele vir, mas nada dele se mexer. Os cu azul foram avançando e quando ele correu, levou um tiro no peito e caiu no chão se debatendo. Eu tentei pular no caô, mas os meus vapores me seguraram e saíram dali, dando fuga. Nós botas, eu comecei a gritar e a surtar para tentar voltar, mas não adiantou. Eles entraram em uma favela aliada, me levaram pro postinho e dali eu apaguei.
...
No dia seguinte, eu acordei com uma p**a dor de cabeça, abri os olhos com dificuldade. Quando olhei para o lado, a Dona Sandra estava boladona. Quando ela viu que eu acordei, ela se levantou, veio até mim e deu um tapa em cima de onde eu tinha levado o tiro.
- Qual é, coroa? Tá de marola com a minha cara? O bagulho tá doendo e tu tá nessa.
- Falei para tu não colocar a tua vida em risco e sou acordada de madrugada com n**o falando que tu virou peneira.
- Que mané peneira! Foi só um tiro. Para virar peneira, eu tenho que tomar pelo menos uns cinco. Chama um dos meus vapores para mim.
Ela saiu com a cara fechada e voltou com um dos meus vapores. Eu já fui logo botando ele na parede, perguntando onde estava o Russo. Ele falou que eles tinham dado fuga nos botas e que o Russo ficou no chão, que eles até pensaram que ele tinha passado dessa para melhor, mas que ele estava no hospital e que eles estavam desacordados. Me senti culpado na hora, o mano agilizou o bagulho para eu sair de lá vazado e acabou caindo nas mãos deles de novo, mas esse bagulho não vai ficar assim não. Eu vou tirar ele daquele hospital pra Bangu, meu cria não volta.
.....
Fiquei uma semana no postinho me curando do tiro de raspão. O bagulho foi doido mesmo e a minha mãe falou muito na minha cabeça. Ela disse que não ia mais para Minas porque estava preocupada comigo. Agora tu vê, Dona Sandra fica arrumando ideia e fica me usando para fazer o Flávio embarcar nas maluquices dela. Já falei que pode ir, mas ela quer ficar aqui apertando a mente de vagabundo.
Entrei na casa que eles arrumaram para mim aqui no morro do Barata e era até bonita, mano. Eu ia subir direto, mas o cheiro que veio da cozinha fez minha barriga doer. Deu mó saudade da infância.
- Tá fazendo o que para nós comer, coroa?
- Tô fazendo aquele baião de dois que tu gosta.
- Agora eu dei valor em.
- Deu sim, se valorizasse, ia para Minas comigo, não ficava aqui se enchendo de buraco no corpo.
- Tava bom demais para ser verdade, mas quando a esmola é demais o santo desconfia e tu tava muito calma em relação a isso.
- Eu sou tua mãe, eu vou falar disso até entrar na tua mente.
- Sabe que não vai entrar nunca, cabeça de vagabundo é blindada.
- Mas, mãe, cara, não, porque ainda bem que é nela que eu vou virar a minha mãe, pra ver se tu toma jeito na vida.
- Tá marola com a minha cara - eu falo e ela me dá um porradão nas costas.
- Esse foi só pra ficar esperto, se falar assim de novo vai ficar sem dente.
- Tá fazendo teste pra pedreiro porque a mão pesada já tem - eu falo e ela gargalha.