Helen

1721 Words
- Agora a gente vai casar e a gente que ter filho, quer ter nossa família. Mas agora com ele desempregado, como que vai ser? Ele vai assumir a loja, isso é certo. Só que ele não tem idéia do que é gerir alguma coisa. Ele quer assumir a loja por que ele quer se mostrar pros outros, pra dizer que tem. – Seguiu Paloma. Beth ouvia a irmã falando, e ao mesmo tempo prestava atenção no silêncio vindo da cozinha. Dona Soraia estava escutando tudo, com certeza. Mas para não deixar Paloma perceber, Beth afagou os cabelos da irmã. A mãe e irmã não costumavam se meter no relacionamento de Paloma e nem discordavam do mesmo. Embora dona Soraia achasse que ambos não combinavam e que a filha merecia alguém melhor, ela e Elizabeth concordavam que Lucas não era alguém r**m. E acreditando que tudo se ajeitaria com o tempo, elas mesmas estimularam a jovem a aceitar o pedido de casamento do rapaz. Os dias passaram, e o que Paloma falou acabou acontecendo: Lucas decidiu assumir a loja. O fato causou conflitos entre o casal, mas dona Regina tratou de apaziguar os ânimos. Ela sugeriu que Lucas trabalhasse sozinho e que Paloma continuasse em seu emprego. Dentro de alguns meses, caso as coisas dessem certo, ela pediria demissão e trabalharia com ele. A loja funcionava das 9 às 18 horas de Segunda a Sábado, e aos Domingos até às 13 horas. Mas Lucas decidiu que o horário seria das 9 da manhã às nove das noite, e para isto ele decidiu contratar uma funcionária, apesar de dona Regina sempre ter trabalhado sozinha. Paloma não estava concordando com nada daquilo, porém ela não via uma saída, uma vez que a crise financeira de 2014 ainda avançava e os empregos sumiam. Os pais do rapaz se propuseram a pagar o primeiro salário da pessoa que ele contratasse, e ficou acertado que a funcionária trabalharia seis horas inicialmente. Ficou acertado também que eles pagariam apenas o primeiro mês, e que se não desse certo a loja voltaria para o horário anterior e Lucas trabalharia sozinho. Paloma apenas ouvia e concordava, pois sabia que discordar ou debater era cutucar onça com vara curta. Naquele mesmo dia ele postou no f*******: um anúncio da vaga, e logo as respostas começaram a aparecer. Paloma dormiu na casa de Lucas naquela noite e os dois seguiram conversando até quase uma da manhã. Faltavam duas semanas para a mudança de Rogério e Regina, e na manhã daquele dia eles iriam até o litoral para levarem os móveis até a casa nova. Ansioso diante daquilo que acreditava ser a maior oportunidade de sua vida, Lucas viu a namorada dormir, mas ele mesmo não conseguiu pregar os olhos. Sua mãe havia inaugurado a tímida lojinha há dois anos e dois meses, e no início ele não dava muita bola, até começar a ver os resultados. Além disso Paloma vendia produtos por catálogo; roupas, perfumes, produtos para casa, lingeries. Ou seja: o assunto vendas não era estranho em sua família, mas todos à sua volta entendiam daquilo menos ele. Lucas se sentia irritado por achar que Paloma não estava lhe dando a força que ele esperava naquele momento, e iria se esforçar à ela que ela estava errada em duvidar de seu potencial. De repente o Messenger apitou. - Boa noite. A vaga de emprego ainda tá disponível? - Sim, está. Foi olhar o perfil da pessoa, e viu uma linda jovem. Sua pele era morena clara, e ela tinha longos cabelos pretos e ondulados. Tinha também uma franja em frente aos olhos e usava uma blusa preta que apenas cobria os s***s, e deixava a barriga à mostra. Olhou mais algumas fotos da moça, e todas eram no mesmo estilo: uma maquiagem bem feita, cabelos soltos de modo a chamar atenção, e roupas bonitas, mas bastante reveladoras. A jovem insistiu. - Eu me chamo Helen Alice. Tenho 19 anos e moro no bairro São Jacó. A vaga é pra trabalhar onde mesmo? Lucas saiu de seus devaneios com o toque da segunda mensagem. - Oi, vc está aí? – Insistiu a moça. - Oi, boa noite. Eu estou sim. Me chamo Lucas e sou o dono da loja Zarattini, que fica perto do colégio, depois da RS.** A vaga é pra atender no caixa e ajudar os clientes com algum calçado ou roupa que eles precisem. - Certo. E o horário de trabalho? - Serão seis horas. Das 15 às 21:20. - Me interessa. Qual é o salário? - Por ora serão 500 reais. Mas futuramente irá aumentar. - Uma folga na semana? - E um Domingo sim e outro não. - Me interessa. Posso iniciar imediatamente se você quiser. Lucas se sentiu um pouco zonzo com aquela última mensagem, e poderia jurar que ela teve um duplo sentido, mas resolveu ignorar. Marcou uma entrevista com a jovem naquela manhã mesmo, às 9:30 da manhã, já que ele e Paloma iriam trabalhar na loja naquele dia. Chegaram no estabelecimento e Paloma já foi ensinar o marido a abrir e fechar caixa. Também passou pra ele informações sobre maquininhas de cartões, e explicou que os comprovantes de p*******o com débito e crédito deveriam ser guardados. Já eram 9:50 e nada de Helen aparecer. Paloma reclamou do atraso, mas Lucas a advertiu que estava chovendo, e que nestas condições qualquer um poderia se atrasar. Antes que uma discussão se iniciasse, a jovem resolveu tomar café, pois eles haviam saído cedo de casa e ela ainda não havia comido nada. Não deu nem um minuto que ela saiu e a moça entrou. E se ela era deslumbrante nas fotos, pessoalmente era muito mais. Helen estava com a franja sobre um dos olhos, uma parte do cabelo puxada pra trás e presa. Trajava uma legging preta, botas de salto baixo e que iam até os joelhos, e uma jaqueta branca e curta que estava fechada. Ela passou pela porta, fechou o guarda-chuva e encarou Lucas muito rapidamente. - Oi, bom dia. Seu... Lucas não é? – Perguntou já sorrindo e apontando para ele tentando criar i********e. - Bom dia. Sim, sou eu. Fique à vontade. Helen né? - Helen Alice, mas pode me chamar como preferir. É aqui que vamos trabalhar? – Disse olhando a loja em volta. - Sim, sim. Como tu pode ver, uma loja pequena. Já tem experiência? - Trabalhei como caixa lá na rodoviária, numa lancheria pequena que fechou. - Então com roupas nunca trabalhou? – Questionou Lucas em um tom sugestivo. - Não. Mas preciso trabalhar, e pra trabalhar honestamente eu aprendo o que for preciso. – Disse Helen encarando-o de baixo com um olhar dócil. Ao fazer menção de pegar algo na bolsa ela abriu o casaco que estava fechado, e deixou a vista um generoso decote, tal qual Lucas havia visto em algumas de suas fotos. Helen puxou um pouco mais o casaco para os lados, e o rapaz percebeu que ela estava sem sutiã. - Calor né? Vim correndo. – Emendou a jovem pegando uma pastinha de dentro da bolsa e se abanando com ela. Em seguida entregou-a para Lucas. – Meu currículo e uma carta de recomendação da minha ex patroa. Sempre trabalhei direitinho. – Completou a jovem. Lucas pegou a pasta sem atinar direito o que fazer com ela, e desejou como nunca que Paloma demorasse a voltar. ****** Helen iria completar 20 anos dali a dois meses. Ela morava com os dois filhos e com a mãe em um bairro próximo da loja onde trabalhava. O pai de seu primeiro filho havia morrido, e o do segundo estava preso no presídio Central de Porto Alegre por tráfico de drogas. Apesar de ser inteligente e ter tido oportunidades na vida, ela largou tudo e foi morar com o primeiro marido aos 14 anos, vindo a engravidar em seguida. Ela era muito boa com números, e chegou a receber menção honrosa na OBMEP. Quando Helen tinha 13 anos, sua mãe lhe arranjou um curso de cabeleireiro numa escola que oferecia cursos gratuitos. Mas nem isso adiantou, pois logo em seguida ela conheceu o marido e abandonou tudo. Nos dias atuais dona Andréia cuidava dos netos, e sua renda vinha de tomar conta de crianças em casa. Ela trabalhou fora de casa a vida toda, mas vendo que Helen não cuidava dos filhos ela decidiu deixar o emprego e assumir as criações dos meninos. Andréia se recusava a viver do dinheiro de Helen, pois sabia que a maior parte dele era conseguido de maneira desonesta. O modus operandi da jovem consistia em arranjar emprego e logo em seguida se jogar para o patrão, de modo a ganhar regalias que outros funcionários não tinham, e posteriormente tirar dinheiro dele. Já havia feito isso em três empresas, apesar da pouca idade. Por não concordar com o que a filha fazia, Andréia se dedicava a cuidar dos netos com afinco. Essa era sua última esperança de vida, já que – ela julgava – não havia conseguido ensinar as filhas direito. Além de Helen, dona Andréia tinha mais uma filha: Karina. Diferente da mais jovem, Karina sempre foi mais estudiosa. Ela se formou em Contabilidade no ano anterior, mas não morava com a família. Havia comprado um apartamento num condomínio que fora inaugurado há pouco tempo na cidade. Ela era chefe de setor no escritório onde trabalhava Elizabeth, mas ambas não se davam bem. Na verdade ninguém no escritório gostava de Karina, pois além de ser arrogante e insuportável, ela também não fazia quase nada e era mestra em levar o crédito pelo serviço alheio. Ela só não havia sido demitida ainda por que era amante de Hamilton, o dono do escritório. Para completar ainda mais o desgosto que os colegas tinham por ela. Tendo essas duas bombas como filhas, só restava a Andréia tomar conta dos netos e pedir a Deus que a ajudasse, pois a única diferença entre Karina e Helen era o curso superior. ******** Chegou o dia dos pais de Lucas se mudarem, e Paloma já havia terminado de levar suas coisas para a nova casa. Enquanto Lucas foi até a rodoviária se despedir dos pais, Paloma jantou com a mãe e a irmã se despedindo delas. ** RS-239, que corta o município de Sapiranga.
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