– E o que tu disse?
– Falei que ela vive me humilhando, mas do Hamilton tentei disfarçar.
– Senhor! Isso ainda vai dar muito rolo.
A caminho de casa, Paloma recebeu mais uma ligação de Terezinha lhe cobrando aluguel. Sem paciência nenhuma, ela apenas avisou que já tinha dito sobre o dinheiro para o marido, e desligou.
Lucas por sua vez estava na loja preocupado. Rogério disse que iria pegar o dinheiro emprestado no banco, e que enviaria para o filho assim que o tivesse em mãos. O que só ocorreu três dias depois.
Naquela noite jantou com a esposa, que preferiu não discutir sobre o dinheiro do aluguel. Apenas conversaram vagamente sobre o andamento da loja, e Paloma comentou que andava muito sonolenta nos últimos dias.
Ela preferiu não falar sobre sua idéia de deixar o emprego, mas a partir dali começou a passar na loja todos os dias após o serviço, e foi lá também na sua folga semanal.
Dona Eliete retornou do Rio no dia 5, e aparentemente tudo havia voltado ao normal. Aparentemente.
Quando chegou o dia 10, por volta de 9 da manhã, Paloma estava trabalhando e um cliente comentou que havia um burburinho na rua.
O escritório onde Beth trabalhava ficava no mesmo quarteirão do serviço da irmã, e quando Paloma saiu na rua viu Beth e todos os seus colegas parados na calçada como patetas.
– O que houve? – Perguntou ela gritando.
Seus colegas, que também conheciam os funcionários de lá, começaram a rir, não entendendo a gravidade da situação.
Elizabeth veio até a irmã, e explicou que Eliete havia ido embora do Rio Grande do Sul, – ninguém sabia para onde – e encerrou o aluguel com o proprietário sem avisar ninguém. Também não havia um centavo de dinheiro na empresa, pois a velha levara tudo.
– Então era isso.
– Isso o que Paloma?
– Isso né Beth! Ela descobriu que o cara traía ela com a querida lá, e fez isso pra se vingar.
Beth suspirou.
– Olha, não sei nem o que pensar. Vamo na polícia agora ver o que a gente faz.
Na hora do almoço Paloma bateu o cartão e foi ver se a irmã estava lá, mas todos já haviam saído. Ela almoçou no refeitório e foi ouvir um pouco de música.
Ficou pensando no quanto estava cansada. Lucas só vivia para a loja, ela tinha que trabalhar fora e ainda cuidar da casa, e nos últimos dias andava sentindo um cansaço descomunal. Iria falar com Lucas sobre sair dali, pois ela e o marido poderiam se revezar no funcionamento da loja, e assim ela não trabalharia tanto. Além de poder cuidar das finanças da loja mais de perto.
Antes de voltar ao expediente telefonou para o marido. Contou sobre a situação do escritório, e o rapaz também ficou surpreso.
Lucas fechava a loja ao meio-dia para almoçar, e retornava uma hora depois. Havia chegado recentemente, e estava aguardando ansiosamente a chegada de Helen, mas as três horas vieram e ela não apareceu.
Chegaram as quatro, cinco, e nada. Ligou e ela não atendeu. Mandou mensagem, mas a última visualização do w******p foi às 11:13 da manhã. Teve que ficar até às 21 horas e fechar a loja, e ficou com o coração na mão.
Quando chegou em casa, Paloma não estranhou, pois achava que o companheiro estava se dedicando mais ao negócio.
– Oi amor, boa noite.
– Oi Paloma, tudo bem.
– Que que foi? Tá tão nervoso.
– A Helen não apareceu hoje, e deu na TV que tinha dado um tiroteio lá no bairro dela.
– A bruxa tá solta hein?! Primeiro lá na empresa da Beth, agora tiroteio.
Na verdade Lucas inventou a história do tiroteio, apenas para alegar preocupação com a funcionária sem levantar suspeitas.
No outro dia de manhã, Helen telefonou para Lucas quando teve certeza de que ele já estaria na loja.
– Alô!
– Oi Helen.
A garota gelou: era Paloma.
– Oi dona Paloma. – No nervosismo até esqueceu que não precisava do “dona” – Eu liguei pra avisar que eu não fui ontem por que deu um problema aqui com a minha irmã. Mas já tô resolvendo.
– Ok. Tu vem hoje?
– Sim. Três horas tô aí.
Quando Paloma era adolescente e estava no ensino médio, ela cursou técnico em Contabilidade, assim como sua irmã. Como já não aguentava mais aquele mercado, decidiu que pediria demissão e cumpriria aviso prévio.
Soube que numa escola da prefeitura estavam oferecendo diversos cursos gratuitos, entre eles o de auxiliar administrativo. E ela decidiu fazê-lo para reciclar os conhecimentos.
Anotou no telefone que na Segunda-feira seguinte deveria ir até lá ver as inscrições, e conversaria com Lucas sobre sua decisão quando ele chegasse.
Após ter passado aqueles dias com Helen, Lucas não andava se sentindo muito bem. Não conseguia se concentrar nos negócios, andava errando coisas simples, e a convivência com Paloma havia se tornado insuportável.
Ele nunca havia traído a esposa antes, embora vivesse inventando histórias para os amigos. Ele também sentia muita vontade de traí-la, vontade essa que se acentuou quando conheceu Helen. Na verdade ele já havia decidido trair quando conversou com a funcionária, lá na entrevista. Só faltava a oportunidade.
Porém, agora depois de ter consumado, e dos dias terem se passado ele se sentia estranho. Era como se um vazio tomasse conta dele, e ele não sabia explicar o porquê. Era uma mistura de sentimentos: como se não pudesse ver Helen em sua frente, e ao mesmo tempo sentia remorso quando enxergava Paloma. Por que a vida não é a gente ter tudo que quer sem haver consequências? Aliás, por que não podemos ter tudo que queremos? Mas que babaquice, afinal ele nem sabia direito o que queria.
Em Abril ele e Paloma fizeram um ano juntos, e não comemoraram por que Lucas queria um festão e eles não tinham dinheiro pra isso.
Helen lhe sorria, buscava ser agradável, mas ele não estava mais querendo isso. Ela percebeu, e começou a se preocupar.
Lucas chegou em casa, e Paloma havia comprado pizza.
– Oi amorzinho. Boa noite minha princesa! – Disse ele indo abraçá-la. Há tempos não fazia isso.
– Boa noite meu bebê!
Lucas detestava ser chamado de “meu bebê” e Paloma evitava isso, mas a fala havia lhe saído sem querer. Porém, além de não reclamar, ele ainda lhe abraçou apertado.
– A gente vai comer pizza?
– Sim. Comprei portuguesa. Tudo bem?
– Tudo ótimo amor!
Os dois foram se sentar, e Lucas logo quebrou o silêncio.
– Eu tava pensando uma coisa: a gente não comemorou nosso um ano juntos né? Em Agosto a gente podia viajar.
Paloma riu.
– Viajar Lucas? Pra onde?
– Ah, a gente podia ir no Rio né? Eu fui lá uma vez com o pai e a mãe, quando eu tinha 14 anos. A gente podia parcelar a viagem.
– Ah meu amor, pra isso tem que ter dinheiro.
– Eu sei, mas...
– Calma, deixa eu falar.
Era sua deixa, e Paloma decidiu aproveitar.
– Eu vou sair do serviço. Vou pedir demissão e vou trabalhar contigo na loja. Gostou?
Lucas sentiu-se como que jogado para trás, mas sorriu pra disfarçar.
– Ai Loma nem acredito. Era tudo que eu queria ouvir. – Ele levantou e abraçou a mulher. Novamente, em menos de 15 minutos.
Paloma estava estranhando aquele comportamento, mas decidiu tomar aquilo como felicidade.
Naquela noite transaram como como há tempos não faziam. Ressuscitaram o assunto do filho que gostariam de ter, e Paloma ouviu um Lucas animadíssimo com os planos futuros da loja. Era como se todas as inseguranças que andava tendo nos últimos tempos estivessem sendo sanadas.
No dia seguinte Paloma conversou com o chefe, comunicou a decisão, e seu aviso prévio se iniciou. No fim do dia ela foi toda feliz até a loja.
Helen estava no caixa, e viu a patroinha chegar toda cheia de si, balançando os longos cabelos.
– Oi Helen!
– Oi Paloma. Que animação!
– Pois bem, eu vou sair do serviço e vim trabalhar aqui.
As pernas de Helen amoleceram.
– Olha amor, a Helen tá de boca aberta! – Disse a loira apontando para a funcionária.
Lucas apenas olhou a cena de cara feia.
– Calma. Eu não sou uma chefe demônia não, tá?
– Não, né isso não. – Falou Helen com um sorriso que disfarçava o ódio que ela estava sentindo.
– A gente tava conversando e vamo fazer umas mudança aqui. Eu tava vendo que o Zarattini ali da fachada tá apagando. Vou mandar pintar de novo. E o que que tinha dado com a tua irmã?
– Fechou o escritório que ela trabalhava.
Paloma pensou um pouco.
– Tua irmã trabalha naquele escritório da 20 de Setembro? Aquele perto do cartório?
– Esse! Esse mesmo.
– Não brinca! Minha irmã trabalha lá também. Como é o nome da tua irmã?
– Karina. Ela era chefe de setor. – Disse Helen num tom de superioridade.
Paloma engoliu em seco. Chegaram alguns clientes e ela foi atender, e Helen percebeu que ela não gostou muito de ouvir o nome de Karina, mas resolveu deixar pra lá.
“Então a Helen é irmã da megerinha que vivia humilhando a Beth? Não tô gostando disso não.”
Após as clientes terem ido embora, ela e Lucas foram também.
Helen observou o casal sair pela porta.
“Mas se ele pensa que me comeu de graça e que eu vou sair no preju ele tá redondamente enganado. Nem comecei a tirar o meu ainda.”
Pensou a moça.
Havia um enorme calendário na parede, próximo ao PC. Helen viu que o aniversário de Luan estava chegando, mas não iria rolar presente. Precisava arrancar dinheiro de Lucas, mas o propósito da grana havia mudado, já que Karina precisava viajar com urgência. Ai ai, se pelo menos já fizesse um mês da furunfada ela poderia alegar suspeita de gravidez e pedir um dinheirinho.
– Mas também, a Karina me mete em cada uma. Podia pelo menos dar pro cara sem deixar o dela na reta. – Falou sozinha.