Karina havia posto o apartamento à venda, o problema era achar alguém que assumisse o financiamento. Hamilton sumira do mapa e os funcionários estavam a ver navios. Com medo das ameaças que que vinha recebendo e das represálias dos colegas, Karina estava morando na casa da mãe. Ou seja, mais uma boca pra Helen sustentar.
Quinta-feira, 15 de Junho de 2017.
Helen já estava inteirada sobre o funcionamento da loja. Sabia quanto dinheiro entrava e quanto saía. Sabia valor de aluguel, internet, telefone, e sabia que os rumos da loja Zarattini estavam melhorando.
Lucas lhe evitava, e quando a encarava o fazia como se tivesse levado um susto, mudando em seguida para uma expressão retesada, de quem tenta afirmar para si mesmo que estava seguro. Helen até daria risada disso se não estivesse preocupada com dinheiro. Sem mais tempo de esperar ela o abordou.
– Lucas.
– Sim.
– Eu precisava de dinheiro. Minha irmã vai mudar pro Rio e a mulher lá do escritório não apareceu mais. Ela tá zerada.
– Sua irmã vai mudar pro Rio? – Perguntou ele interessado.
– Sim, ela recebeu uma proposta pra trabalhar lá.
– Eu sempre quis morar no Rio.
– É. Ela vai morar em Cabo Frio, na região dos lagos.
– E ela vai trabalhar lá com que?
– Secretária. Um amigo dela vai abrir um escritório financeiro.
– Poxa, que legal. De quanto ela precisa?
– 460.
Lucas se assustou.
– Ela vai de avião?
– Sim né? O ideal seria 500 reais, por que ela tem que ir de ônibus até Porto Alegre.
– Esse dinheiro eu não tenho como te dar. Sem condições.
– Desconta cem reais por mês do meu salário. – Pediu ela inocente.
– A Paloma vai desconfiar.
– Lucas, em nome de tudo que a gente viveu, me ajuda! – Pediu ela pegando uma das mãos dele entre as suas, e a colocando sobre seu peito.
– Eu não posso. – Falou rapidamente – E a gente não viveu nada. Aquilo foi só um passatempo.
– Passatempo? Passatempo? Pois sabia que você não usou camisinha? Eu posso tá grávida. Sabia disso?
Lucas gelou, e Helen não perdeu tempo.
– Se você não quer fazer isso por mim faz pela minha irmã. Eu pelo menos tenho emprego, ela não tem nada.
– Como assim grávida? – Perguntou ele ainda zonzo da afirmação anterior.
– Se eu estiver ,não quero nada do teu dinheiro. Só me ajuda dessa vez Lucas, por favor!
Lucas caminhou até o caixa, completamente desnorteado.
– Tá. – Respondeu depois de pensar um pouco – Eu te dou os 500 reais. Só deixa eu ir pra casa e fazer as contas, pra ver se dá pra eu te dá o dinheiro sem a Paloma desconfiar.
Helen se irritou ao ouvir ele mencionar a esposa de novo. Ô homem frouxo! Na hora do pega pa capá ele não lembrou que Paloma poderia aparecer na loja. Mas o dinheiro primeiro, depois a enrolação.
Ela caminhou até ele, mas ficou do outro lado do caixa.
– Não significou nada? Nadinha?
“Ô menina desgraçada!” Pensou Lucas consigo mesmo.
– Sai de perto de mim Helen.
Ela caminhou um pouco até perto de onde ficavam os chinelos de dedo, e virou pra ele cheia de si.
- Pois tu ainda vai vir atrás de mim! – Completou sem a mínima paciência – Vai sim! Quando tu enjoar daquela loira sem graça! Só cuidado pra eu não ter perdido a paciência de te esperar! Olha lá! – Falou ela apontando para o relógio na parede – Teu horário já deu! Pode ir que aqui eu me viro!
Ele saiu às seis em ponto, já que não andava mais ficando até tarde, exceto quando sua esposa estava junto.
Helen sentia raiva de quando Paloma ia lá, pois Lucas ficava igual um trouxa babando na volta da esposa. Usava isso como uma maneira de mostrar para Helen que não a queria mais. “Que patético!” Pensava ela ao ver a cena.
Em Abril Lucas havia procurado um advogado para colocar a antiga empresa na justiça. Além de terem lhe p**o apenas 500 reais de rescisão, ele descobriu após a demissão que nunca depositaram seu FGTS. Porém nos contracheques o fundo havia sido descontado desde o primeiro mês. Além disso nos últimos dois anos ele teve problemas com PIS e 13° salário. O advogado disse que fácil fácil ele ganharia mais de cem mil reais, e que faria de tudo para que a sentença saísse o mais rápido possível.
Lucas fez as contas e viu que não teria o dinheiro. Ele logo se desesperou, mas lembrou que tinha o cartão de crédito. Olhou o saldo e viu que só tinham 300 reais disponíveis. Sem pensar muito foi até o quarto, no silêncio, e pegou o cartão de Paloma que estava na bolsa dela. Ele já sabia a senha, e telefonou para Helen apenas para acordá-la. Assim que ela atendeu ele desligou.
Dali a pouco ela o chamou no w******p.
– Oi. Que foi?
– Que dia tua irmã vai viajar?
– Que? Agora?
– Sim.
Pensou em digitar que havia pego o cartão da esposa, mas não, Helen não precisava saber.
– Peguei o meu cartão. Me dá os dados dela agora e data que ela vai viajar. Agora, ou não tem passagem.
Ainda bem que Lucas não podia ouvir sua voz, pois ela o amaldiçoou até a última geração. Já era 1:47 da manhã, e ela teve que sair do quarto onde estava dormindo com Felipe, seu filho mais novo. Foi até a sala, onde Karina dormia.
– Oi mana. Mana!
– Ai, que?
– Karina acorda. Acorda Karina que eu não vou te chamar de novo!
– Mas o que que foi?
– O outro lá tá chamando aqui. – Disse apontando pro celular – Ele quer teus dados pra comprar a passagem.
Karina estava levantando do sofá sonolenta, e quase caiu pra trás.
– p***a! Mas que rápido hein?! Que que uma ameaça de gravidez não faz né?!
As duas foram até o quarto para Karina procurar os dados e repassar para o “cunhado”.
Do outro lado da linha Lucas finalizou a compra. A data? 19 de Junho, as 19:40.
No outro dia Helen agradeceu a Lucas, mas ele se limitou a continuar evitando a jovem.
No dia da viagem Helen pediu folga, pra poder acompanhar a irmã até o aeroporto que ficava em Porto Alegre. Lucas permitiu a folga, pois se sentia muito desconfortável na presença da funcionária.
Ele não queria mais nada com ela, pois sentia culpa por ter traído Paloma. Mas não se passava um dia que Helen não lhe jogasse charme. A jovem dizia que sentia muita falta do que viveram, e que não estava sabendo lidar com a distância que ele impunha à ela.
Enquanto ele estava na loja com suas lembranças e inquietude, Helen estava chegando no aeroporto com a irmã.
***
No dia 20 o chefe de Paloma pediu à ela que até o fim do aviso ela fosse mais cedo, no horário das 7:20 às 15:40. Ela aceitou, e com isso passou a chegar mais cedo na loja, logo que Helen havia iniciado o expediente.
Paloma passou a acompanhar de perto o trabalho da funcionária, e passou a limitar o acesso dela ao financeiro da loja.
Helen passava quase o dia todo no celular, e seu serviço já não rendia. O estopim foi no dia 29 de Junho.
Eram 20:30 da noite, e Paloma estava no caixa quando chegou uma cliente. Ela indicou à cliente que fosse até o fundo da loja, pois Helen estaria lá para atendê-la.
A cliente foi, mas não encontrou ninguém e voltou impaciente.
– Não tem ninguém pra me atender?
– Tem. A funcionária está lá. Ô Helen! – Chamou saindo do caixa.
Não havia ninguém lá, e ela mesma teve que atender. Quando a mulher foi embora Paloma entrou na salinha, e Helen estava sentada mexendo no celular, completamente despreocupada.
– Helen, eu te chamei. O que que houve?
– Nada. Eu tava tirando intervalo.
– Tirando intervalo sem me avisar?
– É. – Disse a menina dando de ombros, como se aquilo fosse óbvio.
– Helen, tu só fica no celular. Agora eu te chamo pra atender e tu não responde. Assim não dá!
– E se não dá a senhora vai fazer o que? – Perguntou a garota se levantando cheia de marra.
– Como é que é?
– O que a senhora vai fazer? Me demitir?
– Sim. Vou. Tu pode pegar tuas coisas e ir pra casa Helen. Eu vou conversar com o Lucas.
– Pode conversar. – Respondeu a jovem saindo da sala – Vocês não podem me demitir por que eu tô grávida.
– O QUÊ?!
– Ué, não sabe? Não pode demitir grávida.
– Tu não trabalha aqui de carteira assinada.
– A senhora que sabe. – Debochou ela dando de ombros novamente.
A jovem foi embora, e Paloma ficou fervendo de raiva. Ao chegar em casa ela conversou com Lucas.
Ele ficou apavorado na parte da gravidez, mas fez o possível pra não demonstrar. Paloma estava tão furiosa que nem notou, e ao terminar o relato falou que queria demiti-la. Lucas autorizou na hora, achando que com isso se veria livre do problema.
– Mas você fala com ela, tá amor?
– Eu?!
– Tu! Tu contratou, tu demite.
E demitiu. Helen ouviu a sentença calada assim que chegou para trabalhar. Antes de ir embora, ela não perdeu a oportunidade de destilar seu veneno.
– Engraçado né? Na hora de dizer que ia me demitir ela veio cheia da onda. Pra me demitir ela mandou tu. Essa mulher que tu quer do teu lado?
Lucas não respondeu, e passou o dia todo nervoso.
Na manhã do dia seguinte, enquanto saíam de casa, o vizinho do lado escutou o casal falando que precisavam de um novo funcionário. O rapaz correu até o carro deles antes que ambos pudessem entrar.
– Opa! Oi vizinha, oi vizinho!
– Oi. – Responderam ambos.
– Tão precisando de funcionário? Eu tenho um amigo que tá desempregado. Ele trabalhava lá no shopping com o meu pai. O nome dele é Alan.