Você não tem um irmão gêmeo?

1254 Words
O céu lá fora está tingido de vermelho, o pôr do sol lançando sombras dançantes sobre o seu rosto. Os olhos verdes dele, iluminados pelo reflexo da luz, parecem brilhar ainda mais intensamente, mas não há calor neles. Apenas uma intensidade quase c***l, penetrante, que me faz querer desviar o olhar, mas eu não consigo. — O que ele queria? — A pergunta vem de repente, quebrando o silêncio, mas a voz dele continua baixa, carregada de algo que não consigo decifrar. A minha boca se abre e fecha, hesitante. Sinto o meu estômago dar um nó, e as palavras parecem presas, como se a minha garganta tivesse sido tomada por espinhos. Finalmente, eu respiro fundo e deixo escapar: — Nos convidar para passar a semana do Natal até o Ano Novo na casa dele. — a minha voz sai fraca, quase um sussurro. A confissão é um peso que me sufoca, uma verdade que eu preferia não dizer. Leonardo vira a cabeça, os seus olhos encontrando os meus por um instante. É como se ele estivesse tentando ler os meus pensamentos, decifrar tudo o que eu não disse. — E você aceitou? — A pergunta sai como um golpe, e cada palavra pesa como chumbo. Eu engulo em seco, o meu olhar vacila, e a vergonha me envolve como um cobertor sufocante. — Não tive como negar. Eles já tinham planejado tudo, eu só fui comunicada, e minha mãe... — a minha voz falha, quebrando-se sob o peso da culpa. Não há desculpa que justifique a minha decisão, e eu sei disso. Ele aperta o acelerador, e o carro responde imediatamente, avançando como uma fera selvagem. Meu coração pula no peito, e eu me seguro na porta, o estômago revirando com a velocidade crescente. — Não acredito que, depois de tudo que esse cara te fez, você aceitou? — Sua incredulidade é um golpe direto, uma ferida aberta que sangra com cada palavra. Eu respiro fundo, tentando encontrar a minha voz. — Eu não quis magoar os meus pais. — As palavras saem pesadas, como se estivessem carregadas de todo o arrependimento que sinto. Ele balança a cabeça, soltando uma risada amarga que reverbera pelo carro. — Depois de tudo que ele te fez passar, você ainda permite que ele entre assim na sua vida e modifique o seu destino? — Meu destino? Não exagera. E com a perda do meu irmão, os meus pais estão mais sensíveis. Eles ficariam muito chateados se eu não fosse. Acho que por isso te beijei. De raiva, de frustração. — a minha voz falha, e eu sinto-me à beira do colapso. Ele me olha de lado, os seus lábios curvando-se num sorriso cínico. — Então o que te levou a me beijar foi raiva? Frustração? — Ele lança as palavras como flechas, cada uma acertando um ponto sensível. Eu pisco, aturdida. — Olha, quando digo frustração, é por ter aceitado o convite dele. Ele balança a cabeça novamente, soltando outro riso seco. — Bem, agora ele pensa que tem um namorado. O que dirá a ele quando você for sem "seu suposto namorado" na casa dele? Eu respiro fundo, buscando forças para não desabar. Tento aliviar a tensão com uma piada, mas minha voz sai trêmula: — Você não tem um irmão gêmeo? — Você deve gostar muito desse cara ainda, para precisar de alguém para mantê-lo afastado. — As palavras dele cortam o silêncio como uma lâmina, firmes, mas carregadas de algo mais, algo que não consigo identificar. Sinto-me desafiada, provocada pela insinuação. Ele realmente acredita que preciso de alguém para afastá-lo? Meu olhar se fixa no dele, e por um instante penso em responder à altura, mas meu sorriso é uma máscara. Carrega uma leveza forçada, como se eu pudesse esconder a tempestade que suas palavras despertaram em mim. — Eu brinquei, seu bobo. Eu não preciso de ninguém. Se ele perguntar do meu namorado, digo que você teve que viajar e passar o final do ano com um parente que está doente. — Minha voz sai casual, ou pelo menos é o que tento transmitir. Mas sei que ele não compra a minha tentativa de minimizar o clima tenso entre nós. Leonardo solta uma risada seca, desprovida de qualquer humor. É um som curto, cortante, que parece zombar não só do que eu disse, mas de algo mais profundo. Ele balança a cabeça lentamente, como se estivesse lutando contra um pensamento persistente, mas não diz mais nada. O silêncio que se segue é pesado, como se estivéssemos cercados por palavras não ditas que poderiam explodir a qualquer momento. Durante o resto do trajeto até a casa de Estela, o silêncio entre nós é quase insuportável. Ele ainda parece zangado, e mesmo sem dizer nada, sua presença me incomoda de uma forma que não consigo explicar. De vez em quando, sinto seu olhar em mim, como se ele tentasse decifrar algo, mas me recuso a virar o rosto. Prefiro fingir que estou absorta na paisagem do lado de fora, mesmo que minha mente esteja a mil. Cada quilômetro que passamos só parece aumentar a tensão. Estar tão perto dele, mas ao mesmo tempo tão distante, é excruciante. Tento não me deixar afetar, mas a lembrança do beijo que compartilhamos continua viva, queimando como uma marca que não consigo apagar. Meu corpo ainda reage ao toque dele de uma maneira que me assusta, uma mistura de desejo e arrependimento que me deixa à beira de um colapso emocional. Afasto esses pensamentos rapidamente, lembrando-me de Estela e da necessidade de manter as aparências. Não posso me permitir desmoronar agora. Viro-me para Leonardo, determinada a quebrar o gelo. — Você ligou para Estela avisando sobre o atraso? — Minha voz soa mais casual do que eu esperava, mas ainda carrega um tom de incerteza. Ele me lança um olhar rápido antes de voltar a atenção para a estrada. — Avisei. — A resposta é breve, quase cortante, mas há algo em sua voz que me faz pensar que ele não está completamente desconectado de mim. Involuntariamente, passo a língua pelos lábios, tentando umedecê-los, e forço um sorriso para aliviar a tensão. Mas tudo parece fora de lugar. O silêncio entre nós não cede, e a tensão só cresce. Percebo seus olhos fixando-se nos meus lábios por um breve segundo antes de voltarem para o trânsito, mas esse momento é suficiente para acelerar meu coração. — Ela deve estar confusa com a nossa demora. — Tento mais uma vez aliviar o clima, mas minha tentativa é recebida com indiferença. — Paciência. — Sua resposta seca e direta corta qualquer esperança de que a conversa siga adiante. Solto um suspiro pesado, sentindo o peso de tudo o que está entre nós. A frustração cresce dentro de mim, e, em um impulso, decido confrontá-lo. — Posso saber por que você está tão nervoso? Se continuar assim, Estela vai achar que temos alguma coisa e aí o caldo vai entornar! — Tento soar brincalhona, mas minha voz carrega uma nota de tensão que não consigo disfarçar. — Não estou nervoso. — Ele responde rapidamente, mas a rigidez em sua expressão contradiz suas palavras. Eu rio, uma risada nervosa, quase automática. — O que fizemos não foi tão grave assim! Qual o problema de eu ter te beijado? Você só ajudou uma amiga naquela hora. E pronto! Passou! — Minhas palavras tentam dar um tom de leveza à situação, mas sei que é em vão. Nada sobre isso é leve ou simples.
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