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2538 Words
Malvadão narrando. Chuto a bola com força e faço um gol no Sherek. Comemoro dando risada e ele bufa, por perder para mim pela terceira vez seguida. É divertido fazer isso quando estou com tempo sobrando. Jogar bola é uma terapia. Malvadão: Cê é ru1m pra porr@, parceiro. Sherek: Coé, chefe! Eu dei bobeira de novo no bagulho, assim também não vale. Malvadão: Claro que vale, truta. Tá de fanfarrofagem agora? - Pergunto e me sento cansado em um banco. Sherek me traz uma garrafinha de água bem gelada, quase pedrando de gelo. Tomo a metade, enquanto ele já terminou de tomar toda a sua água. Com o restante, eu jogo nos meus gominhos, que já estão cheios de suor escorrendo para tudo que é lado. Jogo a garrafinha de lado, em cima do banco de madeira. Ponho as mãos nos joelhos e encaro o campinho que está bem tranquilo. Não tem um dia que eu venha aqui e não imagine eu e o Henrique jogando bola. Sorrio de lado e balanço o cabeça. Sherek: No que tá pensando? Malvadão: Em quando o meu menor crescer e poder jogar bola aqui com a gente. Sherek: Rapidinho ele vai crescer e vai poder jogar contigo. - Fala e limpa todo o suor com a sua camisa de time do Flamengo. Malvadão: É… M@l vejo a hora de acontecer isso. O seu filho também gosta de futebol? Sherek: Ama. Ele faz a festa todo domingo quando eu levo ele pra jogar com os moleques lá na quebrada. - Diz tirando um cigarro do bolso. Malvadão: De que é? - Pergunto me referindo ao cigarro. Sherek: Menta. Quer? - Oferece assim que acende. Malvadão: Não, valeu. A Bya não vai curtir muito se eu chegar com cheiro de cigarro em casa. Sherek: Papo reto. A minha mulher também fuma, então eu nem tenho problema com isso. Só não fumamos na frente do pivete. Malvadão: É a Sheila, não é? Sherek: Ela mesma. A gente tinha um caso ano passado, mas ela se declarou pra mim e eu decidi que ia levar o lance mais a sério. Malvadão: E você realmente gosta dela ou só convive por ela cuidar do seu filho? Sherek: Eu acho que sim… A Sheila é meio diferente, tá ligado? Um pouco fechada, não me deixa ser tão próximo dela, mas pelo menos ela dar amor por meu filho, o amor que a mãe verdadeira nunca proporcionou. Malvadão: Pensa pelo lado positivo, cara. Vocês dois estão morando na mesma casa, só precisam de mais tempo. E além disso, ela ainda cuida do teu filho como se fosse dela. Sherek: É, você tem razão. Eu passo muito tempo na boca e nas correrias, mas é o meu trabalho. Se você falar que eu vou precisar fazer a segurança daqui por uma semana, eu vou ter que fazer. É assim que eu levo comida para a mesa. - Eu assinto com a cabeça. Malvadão: Sabe, Sherek, acho que a gente pode trabalhar na ideia de te subir de cargo. Sherek: Tá falando sério? - Pergunta com os olhos arregalados, e acho que pela surpresa, ele acaba se engasgando com a fumaça do cigarro que tragava. Malvadão: Sim. - Digo depois de dar uma breve risada - O que você acha? Sherek: Eu acho o máximo, patrão. Topo toda hora. Malvadão: Podemos ver isso com calma, ainda essa semana. Sherek: Demorou! - Sorri. O celular de Sherek toca e ele atende. Sua feição muda bastante, e eu fico com uma interrogação na mente. Tenho quase certeza de que aconteceu alguma coisa na quebrada, mas não quero atrair pensamentos ru1ns antes de saber o que de fato rolou. Quando ele desliga o celular e passa a mão no cabelo, eu tento encaixar cada palavra que ele respondeu enquanto estava na linha, para ver se descubro alguma coisa, mas de nada adianta. Malvadão: O que rolou, mané? Sherek: Muriçoca acabou de me ligar. - Fala e coça a nuca. Malvadão: Algum bagulho da favela? - Ele assente com a cabeça e começa a falar. Sherek: Muriçoca passou a visão de que tem X9 na área. A outra favela deve tá envolvida na parada. - Estreito os olhos só de lembrar do Tubarão e do que ele é capaz de fazer - Nossa carga da semana apareceu pela metade lá no galpão, e ninguém sabe como isso aconteceu. Malvadão: Como assim “ninguém sabe”? Aquela merd@ é cheia de câmera e de seguranças, não é possível que ninguém tenha visto alguém entrando lá e fazendo alguma coisa! - Me levanto irritado, e passo a mão pelos cabelos. Sherek: É aí que a coisa fica ainda pior, chefe. Muriçoca me passou a visão que alguém desligou tudo, saca? Os seguranças tavam na área da frente, então não dava pra ver o que tava se passando do lado de trás. As câmeras foram reativadas só duas horas depois de desligadas, e esse foi o tempo da metade da carga ter sumido de lá. Malvadão: Tem algo muito errado nessa história, porr@! E nós vamos descobrir. Marca dez e aciona os carros, nós vamos pro Vidigal. Sherek: Jaé, pode deixar. Saio rápido do campinho e sigo até a minha casa. Sem querer preocupar a Bya, eu entro indo direto para o quarto, mas acho que essa minha falta de comunicação acabou preocupando mesmo assim. Ouço os passos dela atrás de mim, mas sigo até o banheiro e já começo a tirar a bermuda e a cueca para entrar no box. Ela me pergunta o que aconteceu, e eu explico em poucas palavras enquanto tomo um banho rápido, só para tirar o suor do corpo. Me troco na velocidade da luz e me despeço dela e do Henrique, garantindo para a minha mulher que irei voltar rápido e em bom estado. Quando saio de casa, Sherek já está com um monte de carros cheios de seguranças em frente à casa do sítio. Eu entro no carro que ele está dirigindo e cumprimento rapidamente alguns seguranças, que se calam após falar comigo. Seguimos o caminho do sítio até o Vidigal em total silêncio, mas qualquer um consegue sentir a tensão que está aqui dentro. Sherek para o carro em frente ao galpão e todos nós descemos armados do carro. Sem perder tempo, eu entro para o galpão e nós vamos até o fundo. Encontro Muriçoca e Pneu sentados de cabeça baixa, com o rádio na mão. Eles se levantam quando percebem a minha presença e nós nos cumprimentamos com um toque. Malvadão: Eaí, qual de vocês vai me explicar melhor que merd@ aconteceu aqui? Muriçoca: Pode ser eu, chefe. Pô, foi tudo longe de nós, tá ligado? A gente não tava aqui quando aconteceu o bagulho, e sim na boca. Tirando os seguranças, não tinha mais ninguém, pelo menos não do nosso conhecimento. Um dos seguranças alegou ter escutado um barulho estranho aqui nos fundos do galpão, um barulho alto. Ele decidiu vim ver o que poderia ser, mas até então não viu ninguém, e voltou pro que tava fazendo antes. Quando eu cheguei aqui com o Pneu, fomos direto pra onde tava a mercadoria, porque a boca principal tava precisando ser abastecida. Quando vi que a carga tava pela metade, achei que o gerente da rua de baixo tivesse pegado alguma quantidade pras bocas de lá, mas os seguranças falaram que ninguém entraram antes de nós dois. Pneu: Foi aí que suspeitamos que alguém roubou a carga, e fomos até lá atrás, nesse matagal que tem aqui perto. Não achamos ninguém, e muito menos vestígio de moto ou carro. Muriçoca: Antes de comunicar aos seguranças do roubo, eu quis primeiro checar as câmeras de segurança. Eu vi que tinha uma diferença no horário, e conclui que alguém tinha modificado as câmeras. Ou melhor, alguém desligou e depois ligou de novo. Pneu: Ou… Alguém removeu as imagens e deixou apenas o antes e depois, isso significa que o “durante” deve tá em algum lugar escondido do computador. Malvadão: Chamem o maldit0 do técnico o mais rápido possível, ele vai saber desenrolar isso! Essa história precisa ser tirada a limpo ainda hoje, saca? Se tem um ou seja lá quantos ratos entre nós, essa merd@ tem que acabar hoje! - Digo em um tom de voz totalmente autoritário, e eles apenas assentem com a cabeça. Muriçoca sai com o Pneu em busca do técnico. Eu e o Sherek entramos para onde está a mercadoria, e eu reparo que realmente levaram aproximadamente cinquenta por cento da nossa drog@, o que já é suficiente para um prejuízo de milhões de reais. Sherek: Chefe, posso estar errado, mas o senhor sabe que gente pequena não ia conseguir fazer isso, né? Malvadão: Claro que sei, Sherek. Isso pra mim tá com cara de ser coisa do Tubarão. Sherek: Tô pensando a mesma coisa, também. Ele tem poder pra fazer isso, e com certeza faria só pra te prejudicar. Malvadão: Tenho quase certeza de que foi ele que armou. Tubarão já tem drog@ de sobra, ele não precisa da nossa. Isso não é desespero, é o aviso de que uma guerra tá prestes a começar. *** Noite// Chego em casa totalmente esgotado. Estava tudo tranquilo demais para ser verdade. Eu sabia que deixar a Danúbia viva iria trazer problemas para mim, só não imaginava que fosse problemas tão grandes. Não me passou pela cabeça que ela formaria um belo par com o Tubarão, os dois são iguais em vários aspectos, e sem dúvida alguma são inimigos fortes e que estão começando a me dar bastante dor de cabeça. Ao entrar na sala, vejo a Bya me esperando. Ela me envolve em um abraço confortante e eu pareço me reconstruir nesse abraço. Eu estava mesmo precisando de alguém que segurasse a minha mão e sussurrasse no meu ouvido dizendo que está aqui para me ajudar, é exatamente isso que ela está fazendo. Ao desfazermos o abraço, nós dois nos sentamos no sofá e ela coloca a mão no meu ombro. Byanka: O que aconteceu? O que te deixou assim? Malvadão: Bya, são coisas da favela… - Digo, tentando me segurar ao máximo para não envolver ela. Byanka: Mas o que foi capaz de te deixar atordoado desse jeito? Se te prejudicou tanto a ponto de você chegar assim, então eu faço questão de saber o que tá rolando. Malvadão: Eu não queria te envolver nisso, saca? Mas ao mesmo tempo, eu não sei se isso vai se encerrar aqui ou se vai persistir, então uma hora ou outra eu iria ter que te contar. Byanka: Envolve a nossa família? - Pergunta já com a voz falha. Ao olhar em seus olhos, percebeu que eles já estão lacrimejados. Malvadão: Sim, envolve. - Respondo após um longo suspiro. - Bya, a Núbia foi pra Rocinha depois do que eu fiz com ela. Byanka: Rocinha? - Indaga, um pouco confusa. Malvadão: Isso, pra Rocinha. Você lembra que eu tive uma desavença com o Tubarão, não lembra? Byanka: Lembro, mas isso já faz batente tempo. Malvadão: É, mas parece que eles não se importam com quanto tempo tenha passado. O objeto dos dois é de acabar a gente. Byanka: Eles? - Pergunta franzindo a testa - Então você tá me dizendo que a Núbia e o Tubarão se juntaram pra prejudicar você e a nossa família? Malvadão: Por incrível que pareça, sim. - Digo fitando a mesa de centro que está em nossa frente - Eles são marido e mulher agora, e começaram a mostrar as garrinhas hoje. Byanka: Foi por isso que você saiu apressado hoje mais cedo? Malvadão: Foi. O Muriçoca ligou dizendo que metade da nossa carga havia sido roubada, dentro do nosso próprio território. O galpão é cercado de câmeras e de seguranças, mas ninguém viu a pessoa entrando lá e pegando a nossa mercadoria. As câmeras de segurança foram desligadas por um tempo, e esse tempo de desligamento foi quando aconteceu o roubo. Tudo indica que a pessoa que nos roubou seja de dentro, porque essa pessoa sabe de tudo. Eles infiltraram um X9 aqui, e estamos começando a me atrapalhar. Byanka: E vocês conseguiram descobrir quem entrou lá e roubou a drog@? Malvadão: O técnico esteve lá no galpão e conseguiu recuperar as imagens, mas os três homens estavam encapuzados e não dava pra reconhecer de jeito nenhum. Mandei puxar as câmeras das saídas da favela, e até então nós só temos o número da placa do carro deles. Byanka: Isso já é um começo, não? Malvadão: Não, Bya. Isso não é nem a pontinha do iceberg pro que ainda estar por vir. Também temos os nossos contatos lá na Rocinha, e a notícia é que agora a Núbia tá mandando e desmandando não favela. Byanka: Basicamente ela tá comandando com o Tubarão? Malvadão: Isso, exatamente! O Tubarão não agiria contra mim sozinho, porque ele não tem muitos motivos pra isso, mas acredito que o que mais pesou foi a influência da Núbia. Ela consegue ser muito manipuladora quando quer alguma coisa, e eu tenho certeza que foi ela que tramou isso e ainda vai tramar muito mais. Byanka: Thiago, eu não sei nem o que falar… Não tenho palavras pra isso, não esperava que essa maluca fosse querer prejudicar a gente pelo que rolou no passado. Malvadão: Eu sei que a Núbia é capaz de fazer muito coisa ru1m só pra conseguir o que ela quer. Ela tem poder, agora. A Rocinha praticamente tá nas mãos dela, porque ela conseguiu fazer toda a menta do Tubarão. Eu não tenho muito o que fazer a não ser entrar pra guerra. Byanka: Guerra. - Ela repete a palavra e neg@ com a cabeça - Olha, eu não acho que essa seja a melhor opção. Malvadão: Mas é. Eu não posso deixar que a Núbia faça o que quiser com a gente. Byanka: E se você não der continuação? Ela só vai guerrear se você tiver disposto a fazer isso também. Se não mostrar interesse, ela simplesmente vai desistir dessa ideia. Malvadão: Não vai, eu a conheço. Núbia não vai desistir até ter o que ela quer, e pode ter certeza que não é só meia carga de drog@. Byanka: O-oque você tá querendo dizer com isso? Malvadão: Tô querendo dizer que isso que ela fez hoje foi só um aviso, mas não o principal objetivo. Ela não vai cansar até me ter nas mãos. A Núbia quer destruir a nossa família. Ela vai começar atingindo a favela porque sabe que me afeta de certa forma, mas depois ela vai querer se aprofundar, ela vai querer ir pro lado sentimental. É aí que entra você e o Henrique. A Núbia vai querer vocês também, Bya, mas eu não deixar isso acontecer. Quando eu termino de falar, sinto a mão de Bya tremendo em cima do meu ombro. Ela é tão frágil é tão sem conhecimento de tudo isso, que chega a me dar uma pena tremenda. Eu seguro a sua mão e a beijo, tocando em seu rosto e o puxando para o meu peitoral. Vai ser preciso muita persistência para poder parar aqueles dois, mas não é nada impossível.
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