Ricardo?

1091 Words
Dias depois... Jéssica Estou ajoelhada na varanda, lutando contra a tranca teimosa da porta com uma chave de f***a que insiste em escorregar das minhas mãos suadas. Cada movimento meu é rápido, impaciente, como se resolver isso pudesse consertar mais do que apenas uma porta emperrada. Minha testa franzida é um mapa de cansaço, e os suspiros que escapam dos meus lábios denunciam uma irritação que não consigo esconder. O metal frio da ferramenta parece zombar da minha pressa, enquanto meus pensamentos vagam inquietos. Dias se passaram desde a última vez que Jason e eu trocamos algo mais do que palavras mecânicas e breves. Eu o evito como quem desvia de um espinho na trilha: com pressa, mas sempre atenta ao perigo iminente. O peso do que acontece entre nós paira como uma sombra constante, sufocando qualquer tentativa de normalidade. Manter a distância é uma tarefa que executo com determinação obsessiva. Me jogo em atividades que sequer precisam ser feitas. Reorganizo os armários pela terceira vez, limpo frestas invisíveis a olhos menos atentos e coloco os livros na estante em ordem alfabética, como se cada gesto fosse uma muralha entre nós. Evitá-lo não é apenas uma escolha; é uma estratégia de sobrevivência emocional. E ele, talvez percebendo o meu isolamento calculado, respeita o espaço. Até hoje. Quando sua sombra aparece na entrada, um arrepio gelado corre pela minha espinha, apesar do calor da tarde. — Parece complicado... Quer ajuda? — Sua voz chega até mim com uma cautela incomum, como se ele temesse quebrar algo ao falar. Levanto os olhos, um tanto irritada com a interrupção inesperada. — Não precisa. Consigo resolver. — Deixe que eu faço. — Ele dá um passo à frente, ignorando minha rejeição com uma naturalidade que me desarma. Solto a chave de f***a, passando a mão pela testa em um gesto que mistura cansaço e exasperação. — Jason, sério, é só uma tranca. Não precisa se esforçar. Ele se abaixa ao meu lado, os movimentos lentos, quase desconfortáveis. — Não é um esforço. Quero ajudar. Observo-o por um momento, os olhos denunciando uma mistura de irritação e desconforto. Finalmente, empurro a chave de f***a em sua direção com um suspiro resignado. — Faça como quiser. Jason pega a ferramenta e começa a trabalhar, o cenho franzido em concentração. Mas não demora muito para que seu esforço o deixe visivelmente ofegante. Seu rosto fica vermelho, e gotas de suor começam a descer pela testa. Tento manter minha expressão neutra, mas o desconforto cresce dentro de mim ao vê-lo tão vulnerável. — Isso deve... resolver — ele murmura, a voz entrecortada pela respiração pesada. — O que foi? — pergunto, incapaz de esconder a preocupação que escapa na minha voz. — Nada — responde, um sorriso forçado atravessando seus lábios, mas não alcançando os olhos. Antes que eu possa insistir, ele se senta no chão, parecendo exausto. — Jason? — Minha voz soa seca, embora carregue uma ponta de preocupação que não consigo disfarçar. — Só... preciso de um momento — ele diz, a fraqueza evidente no tom. Cruzo os braços, hesitando. Finalmente, suspiro e me abaixo ao seu lado. — Você vai acabar desmaiando aí fora. Vem, vou te ajudar a entrar. — Não precisa, estou bem aqui. Ignorando sua insistência, seguro seu braço e o puxo, ajudando-o a se levantar. Ele se apoia em mim, e o peso dele é um lembrete incômodo de sua fragilidade momentânea. Guiá-lo até o sofá exige mais força do que eu espero, mas faço isso sem comentar, mesmo que minha irritação esteja à beira de transbordar. — Eu avisei para não se esforçar. Por que insiste? — pergunto, cruzando os braços e encarando-o. Jason respira fundo, tentando se recompor. — Só queria ser útil... — Útil? E quase desmaiou por isso! — rebato, o tom ácido escondendo m*l a preocupação que ainda brilha em meus olhos. Mas, assim que as palavras saem, sinto uma pontada de culpa se alojar no meu peito. Apesar do meu cansaço e irritação, há algo de profundamente humano na fragilidade dele que me desarma. — Não me faça carregar você de novo. Ele dá um sorriso fraco, mas permanece em silêncio. O peso entre nós é quase tangível, cheio de palavras não ditas e sentimentos m*l resolvidos. — Descanse — finalizo. — Vou pegar um copo de água. Jason Quando Jéssica volta com o copo de água, acompanhada por sua mãe, me levanto, tentando esconder o desconforto que queima sob minha pele. Cada movimento parece carregado de uma tensão invisível. — Obrigado — murmuro, pegando o copo e bebendo rápido, como se isso pudesse dissolver o nó que aperta minha garganta. Mesmo assim, não consigo evitar. Arrisco. — Jéssica, quer dar uma caminhada comigo na praia? Acho que preciso de ar fresco, e seria bom ter companhia. Faço a pergunta olhando para ela, mas mantendo um olho na senhora Williams, esperando que sua presença me dê uma vantagem. Talvez ela a convença. — Por que não vai com ele, filha? — incentiva a mãe, exatamente como eu espero. Uma centelha de esperança acende no meu peito. Mas Jéssica extingue essa chama com um suspiro impaciente. — Não posso, mamãe. Ricardo vem aqui. O nome que ela diz cai como um trovão, partindo minha calma em pedaços, ecoando na minha mente, afiada como vidro quebrado. Ricardo? Quem é ele? Um namorado? Um amigo próximo? Não importa. O simples fato de ela priorizá-lo é como um soco no estômago. Uma onda de ciúme feroz explode dentro de mim, irracional e visceral. Meu peito aperta, como se algo estivesse sendo arrancado à força, e a adrenalina pulsa nas veias. Cada músculo do meu corpo tensiona, mas me forço a esconder tudo isso sob uma fachada de indiferença. — Tudo bem, só foi uma sugestão — respondo, mas minha voz sai seca, quase áspera, longe do tom descontraído que eu havia planejado. Saio antes que qualquer um dos dois possa responder. O ar dentro da casa está pesado demais para suportar. Assim que atravesso a porta, sinto minha máscara de controle se desfazer. Cada passo até o chalé é uma batalha contra o impulso de socar alguma coisa, de gritar até o vazio ouvir. O que eu espero, afinal? Que ela largue tudo e corra para mim? i****a. e******o. Dentro do chalé, fecho a porta com mais força do que o necessário. A solidão me atinge como um golpe duplo: dolorosa, mas familiar. O ciúme continua corroendo meu interior, cada pensamento um campo minado. Por que ela importa tanto?
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