Capítulo 11

1360 Words
Assim que o tremor parou, Lissa ficou esperando ainda ali, para ver se algo havia acontecido. Ela sabia que aquele tremor na terra não era normal que aquilo significava que algo havia mudado. Se não era nela, em que deveria ser? Ou em quem? (Trecho do livro Pequeno Guerreiro da Lua, grande valente terrestre, de Antonella Bella Valentini). ∞∞∞ Nenhuma posição era suficientemente confortável naquela cama. Eu fitava o teto com os olhos vidrados, pois não conseguia dormir e para piorar a situação, uma coruja parecia ter se aconchegado próximo a minha janela. “Ótimo!” Eu estava acordada parecia fazer mais de duas horas e os acontecimentos do dia não paravam de retornar à mente. Afinal de contas, não era sempre que o destino resolvia ser sarcástico ao tornar um desconhecido impertinente em meu chefe. Muitas questões borbulhavam em meu cérebro, enquanto eu encarava o teto como se pudesse visualizá-las. Até que os compassos dos ponteiros sob a mesa na lateral da cama me despertaram do devaneio. Estendi o braço sem sair da posição e capturei meu pequeno relógio de bolso, que marcava quatro horas e meia da manhã. "Mais de quatro horas sem dormir?"- exclamei. Eu deveria acordar às sete e meia para não me atrasar, mas meu cérebro estava disposto a me contrariar. Levantei da cama e fiquei andando pelo quarto como se fizesse um bebê dormir nos braços. Olhei ao redor procurando algo para me distrair. Foi quando eu percebi que uma das minhas malas ainda não tinha sido desfeita. Então, tomei aquela tarefa como minha distração até que o sono resolvesse aparecer. A mala estava tão lotada que ao encostar-se à trava, ela praticamente explodiu. Olhei para aquele monte de tecido multicolorido e comecei a separá-los por cor e dobrá-los perfeitamente, como nunca antes fizera. Oras! Já que eu estava começando a escrever um novo capítulo da minha vida, então a palavra organização seria incluída, mesmo que nos demais não tivesse sido. Ao amontoar os vestidos nas estantes do armário, constatei que eu só podia estar com a sanidade mental comprometida, pois quem em sã consciência organizava armários às quatro e meia da manhã e ainda dividia por cores? Absolutamente e incontestavelmente ninguém! Ninguém era tão estranho quanto eu, isso era claro. Quando voltei para pegar a segunda leva do meu depravamento, o pequeno quadro que eu pintara dias antes de partir reluziu em meio aos vestidos e o urso Rocco. Segurei a pintura como se pudesse entrar naquela cena e sentir o cheiro das margaridas do jardim e o aroma do café recém-passado. Aquilo aqueceu meu coração como um abraço de reencontro. Posicionei o quadro ao lado da janela de frente a minha cama. Assim, todos os dias eu acordaria com aquela vista e encontraria forças para continuar. Porém, como meu dicionário mental não havia postulado o que significava a palavra delicadeza, ao voltar para a minha tarefa, meu pé enroscou em um dos meus pares de sapatos desorganizados sob o chão. Como era de se esperar, eu caí como se um piano fosse empurrado do segundo andar de uma residência. Provavelmente o barulho não seria pior do que o impacto do meu corpo ao piso de madeira. "Por que não podia ser delicada uma vez na vida?" - choraminguei. - Srta. Antonella? - perguntou Augusta ao escancarar a porta com o horror perpassando pelo seu semblante, provavelmente tentando decifrar qual era o meu problema. Pelo menos, era nisso que eu pensava, ao acordar a casa inteira com a minha brilhante ideia de arrumar o armário às quatro da manhã. Se Augusta quisesse me internar num hospital psiquiátrico eu a entenderia, pois eu mesma estava a ponto de fazer isso. - Perdoe-me Sra. Augusta! Eu não conseguia dormir, então tive que procurar algo para fazer. - disse ainda de joelhos para completar a humilhação. -Não se preocupe senhorita! Eu também não estava conseguindo dormir. Só ouvi o barulho, pois passei pelo seu quarto enquanto ia em direção à cozinha. - disse ela com um ar de divertimento. "Em que momento a sorte resolvera aparecer em minha vida? Pois eu não havia notado até aquele momento." Eu me sentia a pessoa mais afortunada da terra ao ver a sorte que tive em ser hospedada por aquela preciosidade em forma de mulher. - Gostaria de me acompanhar? - disse ela ao perceber que eu estava sem fala. - C-claro Sra. Augusta. - disse eu já me levantando e indo ao seu encontro. Quando meu pé encostou-se ao chão uma dor excruciante irradiou pelo meu tornozelo. "Não! Por favor, sorte volte!” - Senhorita. - disse ela me apoiando em seus ombros enquanto me colocava sobre a cama - Consegue mover o tornozelo? - perguntou enquanto apalpava a região. - Acho que sim - disse tentando mexer - Mas é bastante doloroso - fazendo uma careta. - Parece que torceu o tornozelo. Fique aqui vou buscar algo para imobilizar seu pé. - disse ela já saindo do quarto. Naquele meio tempo eu ficava pensando em como faria com o tornozelo comprometido justo no segundo dia de trabalho. Conclui que daria uma péssima impressão, já que o primeiro dia também não foi ao meu favor. “Eu estava perdida!” ... - Obrigada por estar fazendo isso por mim senhora. - declarava enquanto ela terminava de enfeitar meu pé com faixas pouco elegantes. - Não precisa me agradecer. Apenas estou fazendo meu trabalho - disse com um sorriso de uma mãe acolhedora. - Não só por isso, mas por tudo doutora! - ela assentiu demoradamente como se recebesse as palavras em sua alma. - A senhora terá que atender seus pacientes de forma sonolenta por minha causa. - Não se preocupe senhorita, amanhã ficarei mais tempo na farmácia do que no consultório e terei Srta. Jade para me auxiliar - disse ela sentando-se ao meu lado. - A senhora trabalha em dois locais? - perguntei com curiosidade. - Sim - declarou. - Como consegue? - a questionei enquanto eu a admirava ainda mais. - A farmácia era do meu marido - ela fez uma pausa - Antes de nos casarmos eu consultava nas residências das minhas pacientes, até que elas começaram a fazer fila na frente da minha casa. Então, quando me casei, meu marido construiu um consultório atrás de sua farmácia. Nós trabalhávamos muito bem juntos. - ela ficou pensativa. - Mas depois que ele faleceu, não consegui dar conta de trabalhar nos dois locais. Assim, atualmente eu intercalo os dias entre a farmácia e o consultório. - terminou ela. - Senhora, se me permite perguntar, como se tornou uma... - Médica? - adivinhou ela. Eu assenti. - Foi através de um periódico - ao perceber minha incompreensão, prosseguiu - Havia uma biografia de uma estudante de medicina nos Estados Unidos e eu fiquei muito interessada em saber mais sobre aquilo, pois naquela época as mulheres ainda não podiam estudar nas Universidades daqui do Brasil e era o meu maior sonho me tornar uma médica. Então, aos 17 anos, depois de convencer meu pai, lutei muito para conseguir a aprovação na Universidade nos Estados Unidos. - Oh céus! A senhora morou sozinha nos Estados Unidos aos 17 anos? - indignada. - Sim!- constatou ela, rindo - E quase não me formei, pois na metade do curso a Companhia do meu pai faliu e ele já não tinha mais condições de me manter lá. - E então? - curiosa. - Então o imperador ficou sabendo da minha dificuldade através dos jornais e arcou com todas as minhas despesas. - Oh mio! - murmurei pasma. Ela riu da minha reação e logo após deu um bocejo. - Acho melhor deixá-la agora - comentou enquanto me ajudava a me deitar. - Tudo bem! - concordei mesmo ainda indignada com o exemplo de vida daquela mulher. - Boa noite Ella! - Boa noite Dra. Augusta- despedi. Assim que ela fechou a porta, tudo o que se passava pela minha cabeça é que aquela história não poderia ser esquecida. Precisava ser republicada, precisava voltar novamente para os papéis e palavras. Eu não sabia como faria aquilo, mas não deixaria aquela história morrer.
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