P. V. Solomon
Eles aguardam pacientemente que eu continue.
— Kiara treina desde que era pequena. Ela possui uma habilidade impressionante no manuseio de espadas e pequenas adagas, além de ser uma exímia lutadora. No reino, está entre os melhores soldados, superando até mesmo o meu pai, o general. — Vejo, mais uma vez, a incredulidade dominar os seus rostos.
— Ela é tão boa assim?
— Sim, majestade. Foi ela quem salvou o príncipe no ataque passado e levou uma flecha no ombro para defendê-lo.
— Mas como não ficamos sabendo de nada disso? — pergunta a rainha.
— Poucos têm conhecimento das suas habilidades. Em todo o reino, acredito que apenas quatro pessoas saibam disso.
— Pelo que vejo, o meu filho não é uma dessas pessoas — diz o rei.
— Não. O príncipe não tem conhecimento do passatempo da princesa, por isso preciso que não digam nada a ele.
— Isso depende. Qual é a situação atual dela?
— É delicada. O ferimento foi muito profundo, e ela perdeu muito sangue. Quando saímos de lá, estavam aguardando a reação dela.
— Isso foi muito imprudente da parte dela — diz o rei, bravo.
— Sim, querido, mas foi graças a ela que Lien pôde voltar bem para nós — diz a rainha, acariciando os ombros do rei.
— Eu sei. Você tem noção do tamanho da dívida que temos com ela agora?
— Eu sei, querido, mas tenho certeza de que vamos poder retribuir tudo o que ela tem feito por nós.
— Majestade, tem como mandar uma mensagem para o príncipe Dylan? Gostaria de saber se ela já melhorou.
— O príncipe Dylan sabe?
— Sim. Eles já treinaram juntos algumas vezes; são bons amigos.
— Claro! Mandaremos uma mensagem e também um curandeiro para avaliar a sua situação — diz o rei, levantando-se. — Não posso permitir que nada aconteça à minha futura nora.
— Obrigado por seu apoio, majestade.
— Entendo a situação, mas uma coisa me intriga: por que os pais dela não sabem sobre isso?
— Na verdade, o rei sabe, e aposto que o príncipe Dylan já lhe enviou uma mensagem avisando. Mas a rainha não sabe. Ela nunca aprovou isso, e foi por isso que Kiara sempre treinou escondida.
— Mas por que ela não contou a Lien? — pergunta a rainha.
— Não sei, majestade. Somente ela pode responder essa pergunta.
Esperamos quatro dias por notícias de Kiara. A cada dia que passava, eu me sentia pior. O sentimento de impotência era horrível. Quando o curandeiro voltou, respiramos aliviados.
— Como está a princesa? — pergunta o rei.
— Ela já acordou, majestade. Está bem, consciente e se recuperando.
— Graças a Deus! — digo, aliviado.
— Ela ficará de repouso por um tempo, mas os curandeiros do rei Alexandre Mandrack estão cuidando dela muito bem. Não precisam se preocupar.
Um peso enorme saiu das nossas costas com essa notícia. Saber que ela estava bem era maravilhoso.
Nunca pensei que teria tanto medo de perder alguém na minha vida, mas Kiara, para mim, era mais do que uma amiga. Ela era minha irmãzinha querida, que sempre estava comigo, aprontando as mais loucas travessuras.
P. V. Princesa Kiara
Enquanto cavalgava, percebi que Solomon estava distante, praticamente em outro universo.
— Você está distraído.
— Estava lembrando de algumas coisas.
— Estava lembrando daquele dia, não é? — digo, olhando nos seus olhos.
— Sim. Você nos assustou bastante.
— Vamos esquecer isso. Só quero guardar lembranças boas.
— Você está certa.
Cavalgamos mais um pouco e retornamos ao palácio. Os nossos amigos já haviam retornado ao seu reino, deixando um vazio para trás. Resolvo ir até o campo de treino. Não queria ficar no palácio; provavelmente, mamãe me encheria a cabeça com os detalhes do casamento. Então, monto novamente e disparo para lá.
Ao chegar, havia a movimentação de sempre, mas hoje eu queria gastar energia. Vou até onde as mulheres treinavam, troco de roupa para não ser reconhecida, pego as minhas adagas e vou atrás de Rock. Encontro-o com alguns soldados. Aproximo-me lentamente e coloco o cabo da adaga na sua cintura.
— Defenda-se! — digo para ele.
Num movimento rápido, ele saca a sua espada e desvia da minha adaga.
— É bom saber que você ainda está ágil, velhote — digo. Vejo os soldados formarem uma roda ao nosso redor para assistir à luta.
— E você está cada dia mais petulante.
Avanço na sua direção apenas com as adagas. Abaixo-me quando a sua lâmina passa perto do meu pescoço, giro e acerto um chute no seu joelho, derrubando-o no chão.
— Quer que eu tome um chá enquanto você se recupera?
— Essa sua língua ainda vai ser sua perdição — diz ele, avançando na minha direção.
Desvio do golpe da sua espada, mas sou jogada ao chão quando tento acertá-lo. Com um movimento rápido, levanto-me.
— Pode vir — chamo. Ele para e me olha.
— Que tal de mãos limpas? Com a espada, fico preocupado com o seu pescoço — diz ele, rindo.
— Se você acha que a sua coluna ainda aguenta...
— Quantos anos você acha que eu tenho?
— Não sei, mas aposto que alguns.
Ele parte na minha direção, tenta acertar um soco no meu peito, mas desvio e acerto um chute nas suas costas. Ele volta e tenta novamente me dar um soco. Preparo-me para desviar, mas, no último minuto, ele muda a sua posição e me acerta um chute nas pernas, derrubando-me.
— Eu disse que essa sua língua era sua perdição — diz ele, estendendo a mão.
Pego a sua mão e, com um movimento rápido, o derrubo e torço o seu braço atrás das costas.
— Anda esquecendo das lições que me deu? Nunca confie no seu inimigo, lembra? — digo, rindo. Solto o seu braço e o ajudo a se levantar.
— É claro que o aluno tinha que superar o mestre. Se não, o meu trabalho não seria perfeito.
— Ainda estou longe disso.
— Você já me superou faz tempo — diz, rindo.
Rock era uma pessoa maravilhosa, solitária, mas um bom amigo.
— Achei que não teria a oportunidade de ver você antes de ir embora — diz Lien, chegando de surpresa.
Congelo no lugar. Ele estava atrás de mim. Olho para Rock, desesperada. Como eu iria sair dessa situação agora?