CAPÍTULO 2
RIO DE JANEIRO
THÉO
—Tudo bem, tudo bem, já vou levantar—digo sem nem abrir os olhos, pois sei que o rosnado ao meu lado pertence à linda pitbull que deve estar com fome.
De fato assim que abro os olhos, lá está ela sentada no tapete me olhando, levanto-me passando por ela que me segue até a tigela de ração, encho e volto para o quarto para tomar um banho e começar o meu dia.
Escolho uma das minhas muitas camisas pretas e uma calça jeans da mesma cor, arrumo a minha barba e cabelo, pego os meus óculos escuros, e quando vou pegar a minha arma vejo o crachá dela, eu havia me esquecido totalmente que tinha que ir entregar isso, pego o crachá e coloco no bolso da calça.
Entro no meu carro, um jetta preto blindado, mais uma das minhas paixões, e sigo o caminho do trabalho dela, assim que entro me dirijo para o balcão de atendimento.
—Bom dia—digo a mulher à minha frente, retirando os meus óculos.
—Bom dia—ela diz sorrindo sensualmente, eu até investiria, ela tem cara de safada, mas meu dia está realmente cheio.
—Talvez você possa me ajudar Fabiana—digo lendo seu nome no crachá pendurado bem próximo ao decote, que expõe uma parte dos s***s volumosos.
—Com o que precisar—ela diz.
—Preciso falar com Carolina Machado—digo e vejo o sorriso sumir no rosto da mulher.
—Ah a Carolina, ela não veio hoje, disse que está no hospital com o filho doente, o que eu duvido muito—ela diz.
—Sabe em que hospital ela está?—inquiro.
—No central, mas se veio só atrás dela, me dê licença preciso trabalhar—ela diz saindo de trás do balcão.
Acho que ela não gosta muito da marrenta não.
Guardo o crachá no bolso e saio do lugar, eu estava atrasado, poderia ter deixado o crachá com a tal Fabiana, mas sem motivo o guardei e agora estou estacionando o carro em frente ao hospital central.
Caminho até a recepção onde já sou conhecido pelas atendentes.
—Delegado, bom dia o que o traz tão cedo aqui, não sabia que havia tido ocorrência—Marta, uma senhora baixinha e rechonchuda me diz sorrindo.
—Não houve mesmo, estou procurando um paciente, na verdade a mãe do paciente—digo.
—Isso eu posso ajudar, qual o nome do paciente?—ela inquire.
—Na verdade, só sei o nome da mãe do paciente, Carolina Machado—digo.
—Deixa eu ver aqui—ela diz digitando no computador antigo à sua frente.
—Eu sei que você consegue—digo rindo.
—Certo achei, quarto 318, ala oeste—ela diz.
—Te devo uma—digo piscando para ela e caminho em direção ao quarto.
Assim que eu entro vejo as camas espalhadas, um quarto com no mínimo seis pacientes e os seus acompanhantes, passo olhando por todas até que a vejo dormindo sentada na poltrona ao lado da cama de um garotinho que dorme também, me aproximo devagar, e pego o prontuário no pé da cama do garoto, leio as informações, pneumonia, falta de ar, bronquite alérgica, passo os olhos pelo nome do garoto Leonardo Machado Motta, 5 anos, nome da mãe Carolina Machado, mas quando os meus olhos passam pelo nome do pai dele, as lembranças me invadem Roberto Motta, vulgo Beto, o endereço da mesma comunidade, não podia ser.
—Além de um babaca, é intrometido também? O que tá fazendo aqui?—ela inquire se levantando e tirando o prontuário da minha mão.
—Não sou intrometido coisa nenhuma, sou um delegado, posso estar onde eu quiser—digo.
—Isso não lhe dá o direito de ler algo que não te pertence—ela diz me olhando.
—Você tem razão, me desculpe, acabei ficando curioso para saber o nome dele—digo olhando o pequeno garoto que ainda dorme.
—Podia ter me perguntado, mas isso não explica o que faz aqui—ela diz.
—Vim devolver isso—digo estendendo o crachá.
—Meu crachá, eu nem vi que tinha perdido, ainda bem que trouxe, senão aquela vaca da Fabiana ia me cobrar cinquenta conto pela segunda via—ela diz pegando e colocando na bolsa, agora pude entender a cara da tal Fabiana quando falei o nome da Carolina.
Quando eu ia dizer algo o médico entrou.
—Senhora Carolina, o seu filho já está de alta, mas não se esqueça das minhas recomendações, ele não pode estar exposto a umidade, mofo, lugares empoeirados ou com pouca ventilação, precisa das sessões de inalação e os antibióticos que receitei—o médico diz.
—Tudo bem doutor, vou providenciar obrigada—ela diz e o médico sai da sala.
Ela se aproxima do garoto e o acorda, que me olha e sorri.
—Oi garotão—digo.
—Oi—ele diz.
—Já trouxe o meu crachá agora pode ir—ela diz.
—E como vocês vão para casa?—inquiro.
—Eu me viro—ela diz.
—Eu posso ajudar—digo.
—Não preciso da sua ajuda, muito obrigada—ela diz.
Mas que garota insuportável, dou um tchau para o garoto e saio pelo mesmo caminho que entrei.
Quando passo pela recepção Marta me chama.
—Achou a moça?—ela inquire.
—Era melhor não ter achado—digo.
Assim que coloco o pé para fora do hospital a chuva forte cai, esse clima maluco a pouco estava sol e agora caindo o mundo.
Caminho para o meu carro e entro, perco algum tempo respondendo umas mensagens, então a vejo na porta do hospital com o menino, ela o protege com a sua jaqueta, mas a chuva está muito forte, ela começa caminhar com ele no colo em direção ao ponto de ónibus, aquela cena me irrita, acelero e paro o carro na sua frente.
—Entra no carro—grito.
—Não preciso da sa ajuda—ela diz.
—Entra no carro sua irresponsável, o seu filho está com pneumonia, olha a chuva—digo e ela continua parada.
—Não, eu vou de onibus.
Puta que pariu garota teimosa da p***a, puxo o freio de mão e saio do carro dando a volta, abro a porta do carro e olho para ela.
—Se você quer carregar a culpa pela piora do seu filho tudo bem, mas eu não vou carregar—digo pegando o menino que me estende os braços e colocando no banco de trás, sem alternativa ela bufa e entra no passageiro.
Volto para o carro e coloco em movimento.
—Que fique claro que só aceitei a carona por causa do menino—ela diz.
—E eu só ofereci por causa dele—digo.
—Babaca—ela diz.
—Irresponsável—digo.
O silêncio toma conta do carro, então o pequeno garoto diz.
—Mamãe, ele tem uma arma, então ele é um bandido?—o garoto diz apontando para arma no meu coldre.
—Não garotão eu sou um delegado da polícia—digo olhando para ele através do retrovisor e ele sorri.
—Pode deixar a gente aqui—ela diz apontando para uma padaria no pé do morro.
—Você mora na padaria?—inquiro.
—Não, mas você não pode subir o morro—ela diz.
—Carolina, você não me conhece, mas para que saiba não há nenhum lugar que eu não possa ir, eu vou subir, só me diz o lugar exato—digo e entro na comunidade.
—Você é maluco, eles vão encher o carro de bala—ela diz.
—Eles sabem quem eu sou, e além disso o carro é blindado—digo.
—Vai nos matar—ela diz.
—Corre menos perigo comigo, do que andando na rua, onde é sua casa?—inquiro e ela aponta para uma viela, paro o carro e ela desce, eu desço do carro também e o garoto me olha sorrindo.
—Tio quer ver meus super heróis?—ele diz.
—Não Léo, ele é ocupado demais—Carolina diz.
—Na verdade eu adoraria ver seus heróis Léo—digo e ele pega na minha mão me puxando para uma escada que leva ao andar inferior.
Assim que ele abre a porta da casa, me deparo com um lugar escuro, arrumado, limpo, mas escuro, sem ventilação, as paredes exibiam o mofo, mesmo aparentando ser um lugar bem cuidado, era notável as condições precárias.
—Nem adianta dizer pra não reparar, porque já tá reparando—Carolina diz colocando a bolsa sobre a cama de casal no canto do cômodo, uma pequena cozinha com geladeira, fogão e uma pequena mesa, no outro canto, a cama dela, um guarda roupa e a cama do pequeno garoto do outro, tudo isso em apenas vinte metros quadrados.
—Achei aconchegante—digo.
—i****a—ela diz.
Fico olhando os bonecos do pequeno garoto, enquanto a vejo prender o cabelo e colocar água para ferver.
—Toma café?—ela inquire.
—Você me oferecendo alguma coisa? Tomo sim—digo.
—Eu não sou tão m*l educada—ela diz.
—Mamãe estou com fome—Léo diz.
—Vou ver o que temos aqui, com essa loucura nem passei na padaria—ela diz.
—Eu posso ir até a padaria—digo olhando para ela.
—Não precisa se dar ao trabalho—ela diz.
—Não é trabalho, e eu estou com fome também, você faz o café e eu busco os pães—digo saindo pela mesma escada em que entrei.
Chego à mesma padaria na entrada do morro, as pessoas me olham desconfiadas, o dono da padaria um velho conhecido me olha e inquire.
—Delegado Ferrer, alguma confusão por aqui?
—Não bola, hoje só estou de visita—digo pagando pelas coisas que comprei, e saindo de lá, assim que volto para a casa dela, paro na escada quando a ouço falando com uma mulher.
—Bruna, como vou fazer? O médico disse que ele precisa de cuidados, remédios, não pode ficar perto de mofo, umidade, olhe para essa casa, eu não tenho dinheiro nem para comprar outro inalador, por que o dele queimou naquele dia que estourou o gato que os moleques fizeram aí na rua—ela diz.
—Carol eu ficaria com ele, mas você sabe que eu preciso trabalhar também, mas se você sair do emprego como vai se sustentar?—a tal Bruna inquire.
—Eu não sei, eu realmente não sei—Carolina diz, mas para de falar assim que me vê entrando com as sacolas.
—Trouxe de tudo um pouco, eu não sabia o que vocês gostavam—digo.
—Bruna esse é o…—Carolina para se dando conta de que nem sabia o meu nome.
—Theodoro Ferrer—digo.
—Ele é delegado, tia Bruna—Léo diz.
—Delegado?—a tal Bruna inquire assustada.
—Sim, mas não estou a trabalho hoje—digo.
—Tô com fome—Léo diz e sentamos na pequena mesa para comer.
Observo o cuidado dela com ele, e vejo o quanto a vida pode ser injusta com as pessoas.