I

3146 Words
Nina olhava a paisagem do internato pela janela, ali era sua casa desde os 13 anos de idade. Na verdade aquele lugar era mais um convento que qualquer outra coisa. Apesar do silêncio e da rotina um pouco entediante ela gostava daquele lugar isolado e escondido. Ela não sentia falta do barulho da cidade grande, do cheiro enjoativo de fumaça carregado com os mais variados tipos de perfume que irritavam seu nariz desde pequena, o sossego a atraia, a natureza também. Mas não podia negar que sentia falta das conversas na porta da escola, do riso das garotas durante algumas brincadeiras e das poucas amizades que nutria. Estava ali para fugir da atenção masculina, mesmo aos 13 anos começava a perceber os olhares masculinos em sua direção e sua tia adotiva percebeu também alertando seu pai. Desde então ali é seu refúgio, mas também seu esconderijo dos membros masculino da organização que seu pai fazia parte. Na máfia meninas virgens eram moedas de troca e muitas vezes nem mesmo os pais podiam evitar uniões forçadas. Mas apesar da solidão, principalmente depois que sua amiga mais íntima Ella foi embora para um casamento arranjado Nina ainda era grata pela p******o que aquelas paredes lhe davam. Como mulher tinha curiosidade para ser beijada por um belo rapaz, de ganhar chocolate e até mesmo flores, de sentir aquela expectativa e ansiedade dos primeiros romances que as outras garotas cochichavam pelos cantos. Mas ela sabia que não poderia vivenciar isso, nascer mulher na máfia lhe tirava vivências que todas as outras meninas comuns teriam. Seu pai sempre disse que ela seria disputada pelos outros membros da máfia por sua extrema beleza, as vezes ser bonita podia ser uma maldição. Um dia pela manhã Nina acordou tão revoltada que cortou o cabelo, os longos fios lisos que antes batiam na cintura agora estava em um Chanel curto, mas mesmo assim a beleza ainda continuava, na verdade o corte só evidenciou os grandes olhos verdes e porte mignon que chamava atenção dos poucos homens que a viram durantes os últimos anos, suas saídas do convento era restringidas a consultas médicas de rotina, dentistas e compras de roupas. Mas até mesmo a consulta médica havia sido proibida, depois que o assistente da clínica geral que lhe atendia havia enviado um recado escrito por uma das internas para ela, sabia que se fosse pega conversando com alguém teria problemas, seu pai era amoroso, mas sempre deixou claro que não a queria envolvida de maneira alguma com pessoas do s**o oposto ou a enviaria para um lugar mais rígido e sem contato com a natureza. Não desejando passar um castigo, assim entregou o bilhete para a madre e não pôde mais sair para ir ao médico, isso havia acontecido também com o dono da loja em que comprava roupas, ele chegou a enviar sem mesmo nunca ter conversado com ela um aparelho celular de última geração junto com sua sacola de roupa, com um bilhete afetuoso direcionado a Nina. Nina havia ficado chocada com a petulância do homem, mais uma vez informou a madre, assim ficou proibida de ir até a loja novamente, passou a usar as roupas que já tinha e a costurar outras durante a aula de costura que tinham semanalmente. Seu tempo era gasto lendo, pintando, caminhando pela imensa propriedade, e recentemente uma academia tinha sido instalada dentro do convento, aquilo era novidade, mas um dos patrocinadores tinha exigido para as duas que filhas que ali residiam, podia ser um lugar habitado por freiras e jovens, mas era um lugar muito caro. Dessa maneira ela descobriu gostar de praticar exercícios, aulas eram disponibilizadas no painel montado dentro da academia mesmo. Assim ela ganhou mais um passatempo. Quando Nina recebeu uma carta do seu pai informado que sua mão havia sido dada em casamento entrou em pânico, primeiro pensou se tratar de uma brincadeira de mau gosto, ele havia prometido não a negociar como uma qualquer, sempre disse que a amava, e que um dia ela poderia se casar com um rapaz fora da organização e ser feliz. Na carta ele pedia perdão e dizia que não teve escolha, mas os homens sempre tinham. Quem estava sem escolha era ela. Não desejava sair dali para uma casa onde podia ser facilmente maltratada. Ainda tentou ligar para seu pai e implorar para que não a obrigasse, preferia fazer os votos e realmente se tornar freira, mas os telefones estavam todos desligados, Nina não sabia o que fazer, somente que não desejava ser abusada por um homem. Depois de uma semana sem mais nenhuma notícia seu pai apareceu para visita-la, sua fisionomia estava cansada e ela se agarrou a ele chorando. _ Papai, prometeu que não seria obrigada a me casar. O que aconteceu? _ Oh minha filha, falhei miseravelmente em cumprir minha promessa, cometi erros graves e o meu castigo é o seu casamento. _ O que você fez? Ela ainda chorava e seu pai percebeu a decepção em sua voz. _ Desviei dinheiro do chefe, foram poucas vezes, Nina, mas ele é um gatuno esperto e logo me descobriu. _ Deus papai, ninguém rouba dinheiro da máfia, até eu sei disso, como pôde? poderia estar morto. _ Eu preferia, se isso garantisse sua segurança, mas morto seu destino poderia ser ainda pior. Ninguém se casa com a filha de um homem morto por traição, iria viver sem nada, meus bens seriam tomados, querida. _ Não quero me casar, papai, me dá calafrios só de imaginar que vou passar o resto da vida com alguém que não suporto e que temo. _ Meu anjo, não temos opção, sinto muito. Era para termos sido sentenciados a morte. Eu gostaria de estar morto para não vê você entregue a alguém como ele, mas vivo mantenho a esperança de um dia livrar você dele. _ Papai com quem vou me casar? Pedro então olhou para ela. _ Não gostaria de dizer, não ainda, não gostaria de assusta-la ainda mais. _ já estou suficientemente assustada, nada pode ficar pior. _ _ Pode pequena, não desejaria que nem a filha do meu inimigo se casasse com ele. _ Quem é Papai? _ Não sei nem mesmo seu nome, o vi algumas vezes em todos esses anos, não sei o que faz para Xavier, mas recebe muito para isso, todos os pagamentos são enviados por uma conta fantasia para que eu não saiba seu nome. _ Como ele é? Seu pai a olhou com pena. _ intimidador, e... _ Fale papai. _ Tem cicatrizes em um lado do rosto, parece fogo. Ela engoliu em seco. _ Ele é violento? Com mulheres. _ não vou mentir para você, eu não sei, mas ele me causou arrepios, meu anjo. Não podemos esperar nada bom vindo dele. Sinto muito. Nina se agarrou a ele mais uma vez. _ Preciso ir, meu tempo aqui é pouco estou sendo vigiado. Fique firme, quem sabe ele não aceite esse casamento e você possa ficar livre ou a menos seja dada a alguém da sua idade e que não seja violento. Não a quero sofrendo minha menina, mas nesse momento não posso fazer nada, sinto muito. _ Eu sei papai, está tudo bem. Já sabe quando é o casamento? _ Ainda não, mas vai ser logo. São ordens do chefe. A próxima vez que voltar aqui será para leva-la para casa. Depois que o pai passou pelo portão Nina se sentou embaixo do carvalho e tentou não entrar em desespero, isso de nada resolveria a situação, lembrou-se quando sua amiga Ella saiu do convento para se casar, a amiga saiu apavorada, ainda trocavam cartas e nelas Ella relatava que estava bem e o marido era bondoso com ela, as cartas eram vagas porque alguém podia ler e informações precisas podiam colocar ambas em riscos, mas Nina pensava que Ella havia ganhado na loteria e não acreditava que ela também teria a mesma sorte. Lhe restava apenas guardar seu destino. Os dias se arrastavam lentamente, Nina não sabia se desejava logo sua saída dali ou se rezava para que os dias demorassem de alguma maneira a passar, não sabia definir o que era pior, se a angústia de esperar o seu destino se concretizar ou a certeza de que ele chegaria. Ela não nutria esperanças de que seu futuro marido, que nem mesmo o nome sabia se recusasse a casar com ela, homens desse mundo não iam contra a ordem de seu chefe, a palavra de um capo era lei para eles. Seus cabelos já estavam abaixo do pescoço, estava crescendo rapidamente, se tivesse certeza que a falta dele manteria o marido longe dela o rasparia, mas ele poderia ficar furioso com sua ousadia e puni-la. A solidão que antes gostava agora era uma inimiga, não costumava conversar com as outras internas, não tinham afinidades e as outras não eram suas amigas porque ela não fazia parte nem da verdadeira elite, muito menos da nata da máfia. Além do mais achava as conversas das outras garotas supérfluas demais, Nina tinha uma inteligência acima da média, enquanto as outras meninas conversavam sobre moda, roupas, fofocas e as novidades do mundo dos famosos, ela gostava de ler, de discutir temas importantes e até mesmo escutar música clássica. Se pudesse cursaria uma faculdade, mas se antes isso era impossível, agora seria obrigada a simplesmente a cuidar de uma casa e quem sabe a parir crianças não desejadas a cada ano. Ao imaginar que seria obrigada a se deitar que alguém na mesma cama e deixa-lo fazer o que queria com seu corpo, mais uma vez era tomada por calafrios, não era justo ser obrigada a se sujeitar a isso simplesmente por ter nascido mulher, mas sabia que o mundo não era justo, com crianças, mulheres, negros e pobres, podia viver escondida e protegida do mundo atrás dos muros do convento, mas não era uma alienada que não enxergava um palmo além do seu umbigo. Mas todo esse conhecimento não a manteria salva se seu marido resolvesse estuprá-la, nada a salvaria. As informações prestadas pelo seu pai a deixaram ainda mais receosa, um homem capaz de intimidar qualquer outro homem seria capaz de transformar uma mulher em **. Saber de suas cicatrizes também a preocupou, não pela aparência em si, mas pessoas que passavam por experiências traumáticas e ainda por cima precisavam viver com o preconceito sofrido por aqueles que fogem do padrão podem se transformar em uma bomba relógio, destruindo tudo aquilo que está por perto e daqui a alguns dias ou semanas quem estaria mais próxima desse homem seria ela. Estava perdida em seus pensamentos quando bateram à porta. _ Nina, tem alguém no telefone e deseja falar com você. _ Meu pai? _ Não menina, ele não disse o nome, somente que irá se casar com você. Nina sentiu seu coração bater acelerado, não desejava falar com aquele homem, mas não tinha opção, não poderia fugir a vida inteira, era melhor falar ao telefone do que pessoalmente. Nina entrou na sala e a madre superiora permaneceu lá fora, desejava dá privacidade para o casal. Quando pegou o telefone suas mãos tremeram, não deseja imaginar o que aconteceria quando encontrasse o futuro marido pessoalmente. Finalmente criou coragem e respondeu ao telefone. -Sim. _ Nina Valadão? _ Sou eu, com quem falo? _ Recebi ordem do capo para casar com você. Desejo saber se está de acordo com esse casamento? _Qual seu nome? _ Não precisa saber meu nome, pelo menos não ainda, menina. Responda a pergunta que te fiz? Viver ao meu lado será um martírio. _ não tenho opção, senhor, se me negar meu pai será morto. _ As vezes ficar órfão é menos doloroso que um casamento. Ela estremeceu, que tipo de homem era aquele? _ Não viverei sabendo que causei a morte de meu pai, mas você é homem pode dizer que não me quer. _ Não vou contra uma ordem de meu capo, fiz um juramento de honra-lo, não costumo quebrar um juramento. Ele mudou de assunto repentinamente. _ Precisa de algo? Minha propriedade fica longe da cidade, então aconselho a preparar tudo que precise. _ Não, estou bem, não necessito de nada do senhor, tenho meu pai. _ Seu pai não estará debaixo do meu teto para protege-la, mesmo se estivesse não poderia, não de mim, então é melhor que nos acertemos, não me queira como inimigo, não irá gostar, tenho certeza disso. _ Ligou para me a ameaçar? É isso? Já estou suficientemente assustada, não preciso que me apavore, por favor. A voz de Nina tremeu através do medo. _ Não é isso, mas não sou bom em diálogos e você já não está colaborando, preciso que prepare tudo que irá precisar quando nos casarmos, não iremos a cidade e em minhas terras pessoas desconhecidas não entram para fazer entrega. É um lugar frio e precisa trazer com você tudo que uma mulher precisa, não temos farmácias por tempo. Nina demorou um tempo para entender que ele estava falando de coisas íntimas, como absorvente e ficou vermelha. _ O chefe proibiu meu pai de movimentar qualquer quantia em dinheiro, ele só pode gastar com comida, até mesmo minha mensalidade aqui não foi paga no dia de ontem, então vou levar somente o que já tenho. Nina pensou que se lá fosse realmente frio talvez pegasse uma pneumonia e morresse ficando livre de um marido possivelmente violento. _ Vou dá um jeito nisso, e menina, me evite problemas, faça o que eu digo e talvez, só talvez isso possa ser menos doloroso para você. Mais um arrepio passou pelo corpo de Nina, nunca havia escutado uma voz tão rouca e ameaçadora ao mesmo tempo. _ Preciso ir, adeus. E simplesmente ele desligou. Nina ia se casar com um homem que não sabia quem era, nunca o havia visto e não sabia se quer seu nome. Mas ainda podia ficar pior, ela sabia disso. Voltou para o quarto e foi ler o último livro que seu pai havia lhe dado, “O morro dos ventos uivantes”. Ler nesse momento era a única coisa capaz de amenizar sua angústia nesse momento. Passou o dia entre a leitura e os pensamentos sombrios. Quando chegou o momento de se recolher para enfim dormir, o sono não veio, ficou imaginando como seria o dono daquela voz e se ele era realmente tão perigoso quando suspeitava. No outro dia logo após o almoço, mais uma vez chamada a sala da madre, imaginou que seria outra ligação, mas dessa vez não iria atender pois ainda estava se recuperando do telefonema do dia anterior. Mas havia simplesmente uma pequena correspondência. Pegou e subiu para seu quarto, necessitava de privacidade, rasgou e envelope e se preparou para uma carta de seu pai, mas encontrou um cartão de débito e uma carta digitada, sem nenhum tipo de assinatura. Na verdade era mais instruções, do que uma carta, cartas não eram frias e impessoais daquela maneira. Havia instruções para que ela comprasse roupas, calças, blusas finas e para o frio, peças íntimas, qualquer medicamento que precisasse, roupas de cama e até mesmo o que usaria no dia do casamento. Mais nada. Nina não entendia como uma pessoa conseguia um cartão em seu nome e tão pouco tempo e como ele conseguiu todos os seus dados pessoais para fazê-lo, não se sentia confortável em gastar o dinheiro de uma pessoa que nem mesmo conhecia, mas não podia negar que necessitava de roupas adequada, fazia muito tempo que não saia para tal coisa. Tinha consciência que não devia ir na loja que existia próxima ao convento, então voltou a sala da madre superiora e ligou na administradora do cartão para saber de quanto dispunha, iria fazer compras online, usaria o computador que utilizava para as atividades quando ainda cursava o colegial. Nina ficou admirada com o valor exorbitante que podia gastar, com o dinheiro seria possível comprar um carro novo e ainda sobraria, como uma pessoa podia ter tanto dinheiro sem ser o capo. Sabia que a máfia movimentava milhões em dinheiro, mas pouco membros possuíam tanto dinheiro assim em suas contas bancárias, até mesmo os membros do alto escalão não eram milionários, para que seu futuro marido disponibilizasse de tanto dinheiro assim ele precisava ter muito, muito dinheiro, o que deixou Nina ainda mais assustada, pessoas assim faziam o que queriam, e acreditavam que os outros deveriam servi-los, mesmo sem perceber seus olhos encheram de lágrimas. Andava fingindo que não estava com medo, por fora estava a calmaria em pessoa, mas por dentro estava quase entrando em colapso. Em alguns momentos odiava seu pai, se ele não tivesse roubado do capo ela ainda poderia estar segura, ainda poderia manter sua virgindade pelo tempo que quisesse ou podia seguir o exemplo de algumas meninas e fugir para as propriedades vizinhas encontrar um rapaz jovem que morasse por ali e se entregar no calor do momento e voltar para seu quarto as escondidas, era isso que as jovens da sua idade faziam, saiam para as festas, bebiam, cursavam uma faculdade e experimentavam a vida, mas ela estava ali se preparando para um casamento que não queria, e rezando a deus para que seu marido não a violentasse na noite de núpcias, não poderia viver depois de e*****o, era pedi demais. Apesar de todo o medo Nina obrigou se a sentar na frente do computador e pedir diversas peças de roupas, primeiro comprou três jogos de cama, compostos de lençol, fronhas e edredom, com cores vibrantes, já que ia se casar ia pelos fazer algumas coisas que as noivas comuns fazia, pediu toalhas de banho que combinavam perfeitamente com os edredons e cortinas também, alguns tapetes e almofadas, talvez o marido não gostasse dessas coisas, mas ele havia finalizado a carta dizendo ela podia comprar o que quisesse e que poderia zerar a conta que não teria problema. Montou um guarda roupa completo e pediu também itens básicos de higiene, comprou caixas do absorvente interno que usava, já que não sabia quando teria a oportunidade de fazer isso mais uma vez. Por fim pediu malas para que pudesse levar tudo aquilo para seu novo lar quando chegasse a hora. A roupa que usaria no casamento deixou por último, sabia que o casamento seria realizado apenas no civil e que não teria festa, assim depois de muito procurar encontrou um conjunto de calça branca e blusa da mesma cor toda rendada, era sofisticado, mas não exagerado, e a deixaria mais confortável do que um vestido cheio de frufru, quando finalizou e pagou suas compras a realidade a golpeou com força, não era uma noiva feliz, mas sim uma noiva aterrorizada, as lagrimas que tentou segurar com tanto afinco desceram feito cachoeira e ela dormiu de exaustão depois de se esconder em eu quarto para que ninguém presenciasse seu desespero.
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