Ando de um lado para o outro inquieta, tremendo por causa do frio, - e de nervoso também - na sala de espera, aguardando alguém dar um sinal de vida do moço que eu atropelei.
Um senhor de jaleco branco surge no corredor e eu prendo a respiração assim que ele faz um sinal para que eu o acompanhe até sua sala.
– Cadê o rapaz? – Pergunto assim que adentro a sala que só tem a mesa do médico e uma maca vazia.
Claro, é a sala do médico, não a necrotério aonde está o cadáver do rapaz.
– Está no quarto – o médico interrompe meus pensamentos e eu solto todo ar que estava guardando.
– Vivo né – digo e ele solta um leve riso assentindo – tudo bem, só que agora eu preciso ir – digo me levantando, tirando meus cabelos molhados da cara e colocando atrás da orelha, mas o médico hesita.
– Tem uma lista de remédios, se você for arcar com eles – ele dá os ombros e me entrega uma lista de antibióticos, comprimidos para dor.
– Por Deus, ele vai precisar disso tudo? – O médico assente – mas você não disse que ele estava bem? – Meus olhos se arregalam.
– Bom, ele quebrou um braço, e fraturou duas costelas, tomou quatro pontos na testa – o médico diz e eu levo a mão á boca – Foi você quem atropelou? – assinto.
–Eu quase o matei, por Deus, eu sou um monstro – digo e o médico aperta meu ombro – mas, eu vou arcar com... Todas as despesas, remédios... – digo me levantando – Eu posso ver ele? Ele está todo quebrado né – pergunto e o médico assente, mas hesita na minha última pergunta.
Acompanho-o até o corredor, aonde ele abre a porta do quarto silencioso, e eu entro em choque ao ver o rapaz na cama todo enfaixado e com gesso no braço, fico ali em silêncio ao leito dele e choro cobrindo o rosto como uma criança que fez m***a e agora não sabe como resolver.
O médico nos deixa sozinhos quando vê os olhos dele se abrirem lentamente, e ele me olha sério.
Fico por alguns minutos o observando, pensando no que eu vou fazer, com ele, com meu emprego, com Addam, com a minha mãe quando ficar sabendo... Com a minha vida.
–Olha, eu sinto muito – digo e ele pisca, porque é só isso que ele consegue fazer no estado em que está.
Mas de algum modo sei que ele não está gostando da minha presença - não que ele devesse sorrir - oh céus, eu estou em choque.
Será que ele tem família, filhos? E se a mulher dele quiser me bater, será que já foram avisados? Meu Deus.
Meu celular toca fazendo eu me desesperar ainda mais para abaixar o volume do toque. d***a, eu sempre me esqueço de alterar esse toque da Britney Spears.
É Mabel. E no desespero para fazer o celular para de tocar eu atendo – alô, – digo me retirando do quarto, fechando os olhos fortemente afastando um pouco o celular do ouvido.
– VINTE MINUTOS JANE! VINTE MINUTOS DE ATRASO, VOCÊ ESQUECEU O CAMINHO?! – ela berra do outro lado da linha e eu suspiro.
– Aconteceu um imprevisto – digo um pouco baixo, e ela faz aquele maldito silêncio esperando eu me explicar.
– Não quero mais ouvir sua voz Jane – Ela grunhi, e sei que agora ela está com os punhos cerrados, e mordendo o maxilar tentando manter o controle – escute, nós recebemos uma ligação da governanta da casa do senhor Whitmore. Ela está indo para o hospital, parece que sofreu um acidente. A reunião foi adiada, estou esperando ela me ligar com mais informações, onde você está? – eu demoro um pouco para responder, observando pelas persianas, o moço dentro do quarto arqueando a sobrancelha – Jane, você está aí ainda?
– S-Sim – gaguejo.
Não pode ser. Não mesmo.
– Já está chegando?
– N-Não, eu estou aqui no hospital – digo sentindo minhas pernas bambearem.
– Fazendo o que aí Johnson?
Quando Mabel me chama assim é porque acabou de perder seu único fio de paciência.
– Mabel, eu atropelei um cara a caminho da editora – digo e há silêncio do outro lado da linha.
– Jane, eu não... – pelo corredor vejo surgir o médico novamente, mas dessa vez acompanhado de uma mulher alta, de meia idade e eu guardo o celular encerrando a chamada.
– Senhorita Johnson, essa é a governanta da casa do senhor Whitmore, o homem que você atropelou – o médico nos apresenta e eu empalideço de vez, mas mantenho o controle e estendo a mão para apertar, mas ela não retribuí o aperto de mão então recolho o braço.
– E-Eu, vou arcar com todas as despesas – digo antes que ela possa dizer o quanto fui imprudente ou agarre os meus cabelos por ter arrebentado o chefe dela com meu carro – Eu sinto muito, não queria machucar ele nem quebrar a perna e o braç...
– Não são de remédios que eu preciso – ela responde e eu arqueio a sobrancelha – O Senhor Whitmore tem uma filha, e ela precisa de uma babá.
– Você está sugerindo que eu cuide de uma criança? – interrompo.
– A filha dele – ela me corrige – Ele cuidava dela, porém agora, creio que o mesmo irá ficar inválido por um tempo e não irei conseguir uma babá do dia para noite – ela diz com palavras firmes como se estivesse com pressa.
– Eu não posso simplesmente cuidar da filha de um estranho, só porque... Olha, não dá, eu tenho um... Um emprego – digo gaguejando sentindo-me uma perrapada por conta da minha roupa toda encharcada e meu cabelo molhando grudento por conta do laquê que usei ontem, comparado a mulher dos cabelos cor de marsala, impecáveis. Ela veste uma saia lápis social preta, uma camisa branca e um blazer cinza, os óculos de armação vermelha bem alinhado no rosto branco e sobrancelhas por fazer... Ela cheira gente com classe.
– Você trabalha aonde? Eu posso te arrumar um atestado – ela diz como se fosse a dona do universo com aquele par de Prada nos pés.
– Eu faço estágio remunerado na editora WTM – retruco.
– Ah, que ótimo, me deixa adiantar uma novidade, você vai ser demitida, WTM, faliu. – arqueio a sobrancelha mais uma vez – Você atropelou seu chefe senhorita Johnson, e já que agora você não vai ter nem um emprego, nem dinheiro para arcar com os remédios, vai ter que cuidar da filha do Senhor Whitmore – acabo por me sentar num dos bancos ali do corredor sentindo minha pressão baixar, observando pelas brechas da persiana do quarto o meu chefe que eu quase matei.
– Eu acho que eu vou desmaiar.