Bem, eu sabia que eu devia fazer amigos, já que eu era até uma pessoa comunicativa, mas não conseguia evoluir para algo mais íntimo. Não tinha amigos de infância, não tinha uma melhor amiga ou melhor amigo. E isso meio que fazia falta... Suspirei, sentindo o calor me sufocar um pouco, mesmo não estando tão quente quanto de tarde. Voltei ao quarto, tomando um banho frio.
Saí bem mais relaxa e despreocupada depois do banho super frio e relaxante, e da minha cantoria rotineira. Eu gostava de cantar no banho, como uma boa adolescente feliz. Era divertido, principalmente quando a água era fria e eu tremia de leve enquanto cantava alguma música que possuía muitos gritos e screamos. Enrolada na toalha felpuda e branca do hotel, fui até a minha mala, que eu não desfizera, e com preguiça de vasculhar algo para vestir, peguei apenas um vestidinho, meio arroxeado que marcava bem minha cintura, era um vestido de verão, alegre e leve que ia até um pouco acima dos joelhos. Coloquei uma sandália preta nos pés. E decidi descer para comer alguma coisa.
Entrei no elevador, e acabei dando de cara com o garoto que havia dito ‘hey’ para mim enquanto jogava vôlei. Como havia umas cinco pessoas junto conosco no elevador ele se limitou a sorrir para mim, um sorriso malicioso que acabou me deixando vermelha. Ele era bonito; estatura mediana, meio magro, com dois enormes olhos azuis. Feito bolinhas de gude. Sem graça com o contato visual ininterrupto, desviei olhar. Quando a porta do elevador se abriu, eu saí dele rapidamente. Pensando em deixar o carinha de elevador para trás. Mas não pude me conter, acabei olhando para trás. Uma garota o tinha parado logo na frente do elevador, abraçada a sua cintura. Mas ele ainda olhava para mim. Típico galinha.
Andei pelo hall, com o dinheiro para meu futuro jantar, que seria algum lanche por aí, na minha bolsinha de lado. Sem saber o que fazer, resolvi dar uma volta. Caminhei pela rua, próxima a praia, andando devagar. Minhas sandálias fazendo um barulho conhecido aos meus pés. Observando como só parecia ter casais no caminho. É dia dos namorados e eu não estou sabendo? Estamos em pleno novembro!
Quando cheguei em uma rua razoavelmente vazia comecei a sentir passos atrás de mim. Gelei na hora, odiava a sensação de ser seguida. Apressei o passo, sentindo um frio terrível na espinha. Querendo encontrar logo alguém. Não me atrevi a olhar para trás, mas comecei a sentir uma espécie pânico crescente. Me controlei para não correr, até que senti os passos ainda mais rápidos, meu perseguidor estava a poucos passos de mim. Então, sem poder me conter, comecei a correr. Senti que a pessoa atrás de mim começava a correr também. Uma mão me girou, me puxando para uma parede e me prensando nela. Soltei um grito agudo.
– Bu! – Uma voz gritou junto comigo e depois desatou numa risada escandalosa. Respirei fundo de alívio, sentindo meu coração socar entre minhas costelas, apertando os braços e controlando o susto, a mão no coração. Depois comecei a sentir raiva e dei tapas a torto e a direito sobre a figura a minha frente. Até ele se encolher, ainda rindo.
– Seu i****a! – Igor ainda ria, esfregando o braço onde eu tinha batido. – Quer me m***r de susto?
– Sua cara foi hilária!
– Não foi hilária. Eu poderia ter morrido! E se eu tivesse morrido, você também estaria morto. Porque eu iria te m***r!– O que foi que eu acabei de dizer mesmo? Que d***a sem sentido... Mas isso foi um incentivo, já que ele começou a rir ainda mais. Raivosa, esperei ele parar de rir:
– Para de ser melodramática. Você só se assustou um pouquinho... – Então ele fez uma careta de pânico, bizarra e engraçada, seus traços se contorcendo numa falsa imitação de medo, talvez tentando me imitar. Acabei soltando uma risadinha e bati novamente no braço dele.
– e******o. – cambaleei, recomeçando a andar. Ele começou a andar na minha frente, ainda soltando risadinhas. Maldito! Realmente me assustou... – Porque estava me seguindo?
– Eu não estava te seguindo...
– Imagina!
– Certo. Eu apenas vi você saindo do hotel sozinha e vim perguntar se você gostaria de companhia. Isso não é seguir.
– Se eu disser que não quero companhia, você vai ir embora?
– No. – ele me cutucou com o cotovelo e eu revirei os olhos.
– Você gosta de ser chutado, é isso?
– Claro que não! Só que o difícil me atrai. – ele começou a andar a minha frente, virado na minha direção.
– Você não desiste fácil, não é?
– Não. – Finalmente chegamos a uma rua mais movimentada. As pessoas passavam e algumas nos notavam, sorrindo. Os casais se dispersavam entre a rua em que havia uns 5 restaurantes/lanchonetes. Paramos, ele me encarando. Esperando o que eu iria dizer. Suspirei, derrotada:
– Certo. Vamos comer! Que tal o...
– Mc Donalds?
– Você aprende rápido. – Mordi o lábio e ele me puxou para uma loja de fast food. Segurando minha mão. Lá estávamos, mais um casal no estranho dia dos namorados. Em pleno novembro!
– Isso não é um encontro, não é? – o analisei melhor, vendo sua blusa azul e a bermuda jeans bem assentada. Os cabelos estavam em uma desordem casual, a pele dele ligeiramente bronzeada exalava um cheiro de perfume masculino forte e marcante. A atendente que nos serviu o olhava frequentemente e acho que um sanduíche meu nunca veio tão bem caprichado.
– Claro que não... – ele disse, a expressão séria. Mas a ironia era clara em sua voz. – Não foi planejado. Eu não planejei. A não ser que você tenha planejado quase morrer de susto no meio da rua.
– Você é tão engraçadinho...
– Fico feliz que estejamos nos dando bem.
– e******o. – murmurei pela milésima vez. Abocanhando meu X-Bacon. Ele se limitou a rir, colocando uma batatinha na boca, mastigando lentamente. Então ele parou, concentrado, olhando para mim e desatando a rir logo em seguida. Engoli rapidamente, confusa.
– O que foi?
– Está sujinho ali ó. – ele apontou para meu rosto com o queixo. Constrangida passei a mão no rosto freneticamente, tentando limpar.
– E agora?
– Ainda ta sujo. – ele riu novamente e se inclinou na minha direção. Passando o dedão pela minha bochecha, fazendo o contorno do meu lábio inferior. Senti o rosto queimar. Ele sentou-se em seu lugar novamente, lambendo o dedo. – Agora sim, está limpo.
– Ér... Obrigada. – voltei a comer, agora em silêncio.
Percebi que ele não parava de me olhar, isso me incomodava. Ele me analisava com seus olhos grandes e poeirentos. Como se pudesse ver através de mim. Como se pudesse ver tudo que eu tentava esconder. E seu sorrisinho irônico me inquietava, não só por ele parecer ler meus pensamentos. Mas porque eu não conseguia deixar de achá-lo atraente com isso. Ele era bonito, mas ele era mais perigoso do que só bonito. Ele era divertido e até seu jeito irritante era atraente. Ele parecia meio que irresistível. O jeito de falar, andar, agir, sorrir, olhar... Era... Meio que apelativo para mim. Não de uma forma r**m. E o pior, eu estava falando com ele a menos de duas horas. Não era possível me sentir tão afetada. Eu nunca fui assim. Demorava séculos para me sentir atraída por um garoto, tanto que logo passava. Eu só havia beijado três garotos a vida toda. E o último já fazia quase um ano. Sim, definitivamente sou desejada, certo?
– Não sei muito de você. – ele quebrou o silêncio, me fazendo estremecer. A voz passou pelos meus ouvidos e percebi que o refrigerante na minha mão tremeu de leve.
– Pensei que soubesse bastante.
– Foi pra tentar impressionar.
– Quer dizer que não está mais tentando me impressionar?
– Pelo contrário... É só que você não parece ser do tipo de garota que se impressiona fácil.
– Isso você tem razão. – bebi o refrigerante, querendo aliviar a garganta seca.
– Então... O que me diz sobre você? – Percebi que ele não desistiria fácil.
– Certo. Lá vamos nós... Tenho 15 anos, me chamo Malu. Tenho duas irmãs. Meus pais são divorciados e vejo minha mãe nos feriados prolongados e férias. Moro com meu pai há uns 3 anos, desde que eles se separaram. Ele vai passar dois meses aqui, por conta de trabalho, enquanto eu e a noiva dele ficamos de férias. Eu gosto de praia, mas tenho medo do mar. Gosto de skate e... Adoro ler. Francamente, sou bem estranha.
– Você sabe andar de skate? – Tanta coisa pra perguntar, sobre minhas irmãs, minha vida infeliz com meus pais. E ele vai perguntar sobre meu skate.
– Arran.
– Uau! Eu não sei andar nem de bicicleta direito. – ri baixo de sua expressão surpresa.
– Skate é fácil. É sério.
– Fácil pra quem sabe.
– Já quebrei o tornozelo por causa do skate.
– Como?
– Eu tenho uma grande propensão, ou seria mania? De fazer coisas estúpidas e imprudentes.
– Como aceitar jantar com um estranho, que você achou que fosse psicopata e retardado logo no primeiro contato.
– Por aí... – ele riu baixo.