Não é segredo para ninguém que gosto de desafios e profissionalmente colocar o Otávio e a Penélope na cadeia foi algo indescritível, além de ter um sabor de vitória que me fez ter a certeza de que exercer a advocacia é muito mais do que um sonho, é um propósito de vida. Todos os meus estudos, pesquisas e buscas, alertavam-me que de uma forma ou de outra, iríamos conseguir fazer justiça pela Milena e por minha filha recém nascida que foi sequestrada pela Penélope. Obviamente o meu estado de gravidez de risco não me permitiu acompanhar tão de perto o processo, mas fiz o que pude e consegui. Sempre imaginei, mas vivenciei na pele que uma mãe quando quer um acerto de contas, faz até o impossível e eu fiz. Não vou sossegar um dia sequer para manter os irmãos metralhas na cadeia até os seus últimos dias de vida.
Após um ano do ocorrido, finalmente iremos celebrar a união da Milena e do Vicente, além de batizar a minha filha Joana que é fruto de um relacionamento complicado com o Rafael.
Mas hoje além de ser um dia extremamente feliz, também é o dia que irei virar a página da minha vida amorosa conturbada e nada tradicional com o Otto, que é o melhor amigo do Vicente. Ele deveria ser só meu amigo, é assim que eu intitulo ele por aí quando me perguntam quem é o ruivo incrível que está ao meu lado em passeios nada ocasionais. Ele que passou e acompanhante de hospital em um dia que os meus amigos não puderam ficar comigo, a um paquera sem compromisso, seguido por o melhor beijo e sexo da minha vida inteira e por fim, agora será alguém que vou manter nas minhas melhores recordações quando pensar em relacionamentos. Tento pensar que ele será uma recordação boa, assim como estou me lembrando agora quando a Penélope e o Otávio tiveram as suas sentenças finais, talvez isso conforte o meu coração e não me deixe tão nervosa para o momento que irei dizer adeus a ele.
Ok, o Otto é o amor da minha vida, alguém que confio, que sinto muito t***o, o meu porto seguro e que cozinha as melhores comidas do universo inteiro. O que mais uma mulher quer num homem para dividir o resto dos seus dias? No meu caso, é que esse homem seja o pai da minha filha e esse homem se chama Rafael.
O Rafael tem se esforçado, tem trabalhado e estado bem presente na minha vida, o que torna inviável manter os meus beijos e pegações sigilosas com o Otto. Bom, eu sempre sonhei com isso...ser casada com os pais dos meus filhos e é isso que vou em busca, vou tentar construir algo junto com o Rafael, enquanto vejo o Otto partir para ser feliz. De uma forma ou de outra, vamos ser felizes, mas não mais juntos.
Não será nada fácil me distanciar do ruivo que consegue comandar os meus sentidos e a minha alma apenas com um olhar. Ele consegue colocar o meu corpo em combustão em segundos e a adrenalina que eu sento quando estou com ele é viciante. Mas voltando a pensar só nele, ele é incrível demais, merece viver a vida com leveza, merece sair sem as responsabilidades que eu tenho como mãe, ele merecia construir uma família sem os perrengues que eu passo. Ele merece muito mais do que eu posso dar a ele.
Decidimos realizar o batizado da Joana no mesmo dia do casamento da Milena e do Vicente, na fazenda dos pais do Vicente, que é um lugar incrivelmente lindo.
Esperamos a Joana completar seu primeiro ano para poder dar tempo de tudo se estabelecer e, principalmente, superarmos todo trauma que o passado havia imposto à nossa vida.
Estávamos no quarto da Mariana, nos organizando, fazia tempo que não nos encontrávamos só as mulheres para conversar e rir um pouco, nossas vidas estavam corridas e os meninos faziam parte do nosso grupo de tal forma, que estávamos sempre todos juntos. E confesso, esse momento era muito necessário.
A dona Mariinha e a dona Lucinha haviam costurado o vestido de casamento e o vestido de batizado da Joana, elas misturaram a leveza da seda com a renda renascença, e em cada ponto era depositado amor. Incrivelmente, os vestidos foram todos bordado à mão, uma preciosidade em formato de renda que transbordava amor, não havia vestido mais ideal que esse. A renda do vestido da Milena fazia um desenho de umas folhas que se encontravam e formavam flores com as costas repletas de botões. Já o vestido da Joana era repleto de pequenas flores que estavam presentes no vestido de noiva.
Quando eu terminei de abotoar os diversos botões do vestido da Milena, abracei-a emocionada pelas costas.
— Você não tem ideia do quanto eu fico feliz em te ver feliz! — Falei emocionada.
— Que loucura tudo isso, né? Nunca me imaginei vestida de noiva — A Milena respondeu.
— De verdade, às vezes fico impressionada com tudo o que conquistamos até agora e ver você se casando com o Vicente, sem ficarmos preocupadas se vai acontecer algo de r**m, é muito libertador — a Beatriz falou.
— Eu sempre soube que venceríamos! — Exclamei ao mesmo tempo, ajeitando a trança raiz do cabelo da Milena que a Mariana havia feito.
— Eu nem sei do que vocês estão falando, mas quero dizer que você e o Vicente precisam me dar uma sobrinha linda, igual a essa fofa da Joana, bem rápido — a Mariana falou em tom de brincadeira.
Gargalhamos juntas.
— A Joana precisa mesmo de grandes amigas, assim como nós! Anime-se também, Beatriz! — Falei abrindo os braços para receber um abraço apertado da minha Joana.
— Eu e o Marcelo queremos ter vários filhos, mas, por enquanto, estamos muito focados no trabalho. O Otto vai passar um período no exterior, para trazer novidades para o cardápio dos restaurantes, então eu e o Marcelo teremos trabalho dobrado.
Meu coração apertou ao lembrar novamente da despedida mais difícil da minha vida.
— Agora a Mariana fica aí, colocando pilha para eu engravidar, mas o que eu quero mesmo é saber se ela vai ou não assumir esse namoro com o veterinário — a Beatriz falou.
A Mariana revirou os olhos, repleto de lágrimas.
— Vou passar um tempo longe daqui, me concentrando no que realmente importa. Eu nasci para ser livre e quero muito dar andamento aos negócios da fazenda. Vou mostrar que sou capaz. A Milena vai me ajudar a ganhar experiência no shopping.
— Nada a ver você trabalhar no shopping — Comentei.
A Mariana sorriu.
— Vou encarar como um desafio — ela brincou.
— E você, Liz, o que decidiu? Vai mesmo deixar ele ir embora? — a Beatriz meperguntou.
Desviei os olhos, pois percebi que estavam marejados.
— Não é fácil, tem o Rafael — Falei com a voz trêmula.
— Papai, papai — a Joana balbuciou.
— Hoje é um dia de alegria, vamos mudar de assunto, porque o meu noivo está à minha espera e não quero atrasar para perder o pôr do sol — A Milena falou.
— As fotos ficarão incríveis! — a Mariana comentou, animada.
A Beatriz, juntamente com a Mariana, colocou o véu da Milena e quando ela se olhou no espelho, se emocionou. Que dia incrível!
*
A capelinha era pequena, mas suficiente para caber os convidados. Era uma cerimônia extremamente intimista; do jeito que idealizamos, apenas nós e a nossa família de sangue e a família que nos permitimos escolher. Não me imaginei ficar tão nervosa como agora e imagino que esse sentimento esteja no coração da minha melhor amiga, pois ela está parada com os olhos fechados mergulhando na suas mais íntimas memórias afetivas.
— Bora, chegou a hora de dizer o tão sonhado sim — Flo entrelaçando os braços nos braços da minha amiga e começamos juntas a caminhar na direção da capela que estava com as portas fechadas.
— Agora, podem deixar comigo —A mãe da Milena chegou falando nos surpreendendo.
Eu sorri para elas e deixei que a mãe dela entrasse na igreja com os braços entrelaçados. Sei que ela errou e muito, por diversos anos, mas sei que há arrependimento nos seus olhos e uma imensa necessidade de acertar. Sou mãe, sei que as vezes as decisões não são fáceis de serem tomadas e por inúmeros motivos, falhamos e erramos na tentativa de acertar. É assim que vejo a mãe da Milena hoje. Ela está fazendo o melhor dela para ver a sua filha feliz. Cedo ou tarde, ela está tentando.
A cerimônia acabou e logo emendamos no batizado da Joana. O momento que nos tirou muitos sorrisos foi quando ela brincou com a água caindo por seu rosto no momento que o padre a batizava. Nesse momento olhei para o Rafael que estava ao meu lado e sei lá, acho que estou no caminho certo.
*
Quando tudo acabou, o Otto finalmente olhou para mim e fez um sinal para nos encontrarmos. Ele foi na frente e eu o acompanhei até chegarmos atrás da capela. O local estava com o sol baixando bem atrás de nós, formando uma imagem perfeita para um retrato digno de expor ao lado da minha cama e me recordar para sempre dos seus cabelos ruivos pegando fogo enquanto os seus olhos verdes, me devoram. Ele fez um leve carinho no meu rosto e eu cedei, degustando aquele afeto.
— Você está linda, como sempre! — ele falou.
— Eu sinto sua falta — Confessei posicionando uma mão por cima da dele.
Ele respirou fundo e sorriu timidamente.
— Eu também. Nunca vou esquecer da nossa última noite juntos.
— Eu queria que você entendesse que não é algo fácil para mim.
— Eu entendo, por isso, decidi ir embora! Não quero que você se sinta nesse lugar, de que precisa tomar uma decisão forçada.
Ele tentou tirar a mão do meu rosto e eu o segurei.
— Eu não quero que você vá embora. Você é especial, Otto! A Joana vai sentir sua falta.
Ele me beijou abruptamente e eu correspondei na mesma intensidade. Um beijo agoniado e desesperado. As línguas se cruzavam enquanto as mãos apertavam. Nunhum de nós estávamos preparados para esse momento.
Me afastei do beijo para olhar-lo de novo, quero que a minha mente nunca esqueça o quanto os olhos deles me enxergam com admiração. Mas não consigo só olha-lo, preciso eternizar o seu sabor, seu cheiro, sua textura e volto a beija-lo, mas agora chorando.
— Eu te amo, Liz! Mas eu não consigo mais viver nessa divisão e sem saber se hoje você vai me ligar para ficarmos juntos, ou se vai preferir o Rafael… — ele falou segurando o meu rosto..
— Não é preferir o Rafael. Ele é o pai da Joana…
— Não, ele não é só o pai da Joana. Você o ama e precisa seguir com a vida de vocês — ele me interrompeu.
— Eu não sei, Otto, é tudo muito difícil.
— Eu não estou pedindo para você escolher, eu só estou te dizendo para você seguir em frente, porque eu vou seguir.
— Eu…
O beijo de novo sem conseguir terminar a frase, não consigo dizer o quanto eu amo. Não por insegurança dos sentimentos, mas porque eu não posso dar a ele o que ele realmente merece. Só amor, no nosso caso, não basta.
O beijo que era desesperado, passou a ser trsite e agora está se acalmando na conformidade do nosso destino separados.
— Agora eu preciso ir embora, para terminar de organizar as coisas da viagem. Vou sair sem me despedir de todos, chega de sofrimento! Está sendo difícil escolher partir.
— Então, fique — Insanamente insisti fixando os meus olhos nos dele.
— Eu queria muito. Eu queria muito me apresentar para Joana como seu namorado, eu queria muito dormir todas as noites com você, sem sentir culpa, eu queria muito poder cozinhar todos os dias para você e para Joana, sentar-me à mesa, partilhando uma vida em família, eu queria muito te ter para sempre na minha vida.
— Não vai embora! - As palavras saem por minha boca sem a minha permissão. Parece que meu coração entrou em desespero e atropeleou a razão que até segundos atrás estavam fazendo esse processo acontecer naturalmente.
— Mas eu não posso ter nada disso.
— Eu não posso escolher.
— Eu não quero que você escolha. Eu só queria viver algo que não posso. Você tem ideia do que é ficar ao seu lado e não poder te beijar na frente dos outros?
Ele deu um passo para trás com a cabeça baixa.
— Eu sei que é difícil. Tanto que não quis assumir nada com você, porque não era justo te colocar nessa história m*l resolvida.
— Você não me colocou, eu que me coloquei e achei, por muito tempo, que conseguiria. Mas eu não consigo, porque eu te amo.
— Otto…
— Eu não posso, eu não consigo. — Ele respirou fundo, mais uma vez. — Seja feliz, você merece. Você é incrível demais!
Ele voltou para junto de mim e me beijou enquanto chorava.
Então se afastou forçando um sorriso e falou por fim:
— Se tivermos que ficar juntos de novo, nossos caminhos se cruzarão novamente, assim como foi naquela noite despretensiosa que te acompanhei no hospital.
— Em um quarto de hospital, de novo?
Agora ele gargalhou e dessa vez eu que sorrir forçadamente.
— Eu espero que seja em um quarto de motel, assim como foi nossa última vez juntos.
Ele se afastou da mim e eu desabei em um choro estridente, o vendo partir sem olhar para trás. Ele não olhou para trás, a nossa bova vida começa agora.
A Milena se aproximou de mim e me abraçou fortemente.
— Você entende que eu não posso agora o escolher? — Falo quase que incompreensível.
— Você o ama? — Ela perguntou.
— Muito, e de um jeito que nem consigo descrever.
— E por que não decidiu ficar com ele? Ele estava disposto a entrar na sua vida e se encaixar à sua realidade.
— Porque, com ele, meus sonhos precisam ser reformulados e escolhê-lo envolve mudar muitos conceitos, inclusive, do que acredito como família. — Respirei fundo. — Eu e o Rafael estamos nos dando bem, nossa filha está feliz e é isso que sempre sonhei para minha vida.
Ela se afasta do abraço enxundo as minhas lágrimas.
— Então viva a sua escolha e, se no futuro, não tiver que ser, não será. Todos os dias o sol nasce e traz a esperança de um novo dia com novas escolhas. Não acredite que isso seja o ponto final entre vocês dois, o mundo dá muitas voltas. Você pode ser muito feliz com o Rafael e, inclusive, nem lembrar que um dia o Otto existiu, mas também pode ser que no futuro, você precise reformular seus conceitos. Viva o hoje, temos muito o que viver ainda.
— E se eu perder o Otto para sempre? — Perguntei assustada.
— É porque não era para vocês ficarem juntos.
Respiro fundo tentando controlar minhas lávgrimas.
— Olha, eu vou te dizer uma coisa, já saí com muitos caras na vida, mas nada comparado com o Otto, ele é muito especial. Talvez seja por isso a minha insegurança, porque, por mais perfeito que possa ser, nunca vai ser igual a ele.
— Porque ele faz comidas excelentes? — Ela brincou.
Eu gargalhei.
— Porque, além de fazer comidas excelentes, ele é um cavalheiro, é engraçado e com certeza, o melhor sexo que já fiz na vida!
— Achei que o Rafael que era o mago da cama — Ela falou com as mãos na cintura.
— O Rafael é carnal, é desejo, é concretização do que sempre acreditei em formar uma família. Ele é o pai da minha filha, Milena. Não me imagino vivenciando uma guarda compartilhada, ou sequer tendo que dividir a criação dela com outras pessoas que não sei quais são suas reais intenções. Eu já vivencio tanto isso nos tribunais por outras pessoas, que não quero passar pelo mesmo sofrimento. — Suspirei. — Já o Otto sempre será a minha idealização de homem. Ele se tornou meu comparativo do que é extraordinário e é isso que vou guardar no meu coração.
— Você deveria ter dito que o amava.
— Eu não podia, não era justo com ele.
— Eu concordo e te entendo. — Ela deu um beijo em minha testa. — Agora vamos, já devem estar sentindo nossa falta.
E, de mãos dadas, voltamos à varanda que já estava repleta de luzes cordão iluminando a festa. Logo avistei a Joana que que estava no colo do Rafael, apontando para mim. A minha familia estava a minha espera, a espera da minha decisão de escolher o que sempre idealizei. Se era o certo, não sei, mas era o que eu havia escolhido para mim, quer dizer, não mais para mim, agora eu só preciso pensar que tudo o que eu escolher será pela e para a Joana. A minha felicidade virá quando a vê-la feliz e essa felicidade eu só vou encontrar ao lado do Rafael.