Ordem

607 Words
O local onde ficava a favela do Toldo também os deixava privilegiados, ao fundo um rio passava, ninguém entraria despercebido, já pela frente , existia a divisa com um bairro nobre do estado de Santa Catarina. A polícia não podia fazer uma invasão sem ferir gente extremamente fina, e César era cuidadoso. Na verdade César Cavallari estava pagando por crimes que precisou cometer para o bem do seu povo, no Brasil ele era considerado um rico excêntrico que havia decidido morar em favela, não um traficante. Paloma já havia descoberto algumas coisas, mas em compensação já eram quatro meses ali e não havia visto nenhuma foto do homem que era seu marido. Mantinha a casa limpa, cuidava das plantas que florescem e do avô, que chegava aos seus últimos dias. A avó e alguns familiares apareciam uma vez na semana, não mais. Quando uma noite ela estava fazendo doces com Zuleika, seu primo Pablo apareceu. _ Tenho ordens, prima. Na próxima semana, César quer vê-la. _ Ele vai ser solto? _ Não.Vai visitá-lo na cadeia. Ela se assustou, mas não se negaria, não porque não tinha escolha, mas porque ele tinha cumprido cada promessa feita, a casa era boa, suas contas eram pagas, e seu avô era muito bem cuidado. Devia ao menos tentar. _ O que ele quer? _ Seus direitos como marido. Disse que tú é mulher dele. E realmente era. _ Pensei que a chefia deixaria baixo, e seria só no papel. Sinto muito, Paloma. _ Seu chefe vai ser ruiim? _ Não sei, uma ou duas mulheres estiveram para na detenção visitá-lo, algumas se recusaram a voltar. Não sei o que ele fez. Agora não tem volta. Alguém do posto gritava da porta. Ela correu para fora, o primo atrás. Quando entraram na porta do quarto, o avô estava no balão de oxigênio. Agarrou a mão dela. _ Não sofra, minha menina. _ Só vou viver meu luto, pode descansar, o senhor foi bom e caridoso. E vou guardar cada memória nossa juntos. Paloma cantou uma música para ele, era um canto do Alcorão, falava do paraíso, das virgens amorosas o aguardando, e da verdade sobre o profeta Mohamed. Seu Guido descansou, de forma tranquila e olhando para quem tinha lhe cuidado e ofertado amor durante a velhice. Mesmo sabendo que ele estava partindo desde que deixaram a Ucrânia Paloma chorou sobre o peito do seu amado avô. _ Tudo bem, Paloma. Vou cuidar de você. Paloma pensou que Pablo não cuidava nem dele mesmo, quem dirá dela. _ Eu sei, avise os outros. Vou vesti-lo. Ele não queria um velório longo. Ela vestiu a roupa dele, toda branca, assim como fez muitas vezes na Ucrânia, conversou com ele durante todo o tempo, o tranquilizando, dizendo que ele podia descansar no paraíso, se existisse algo além , seu Guido saberia que ainda era amado, mas que podia seguir seu caminho em outro local . Graças ao dinheiro do marido ela conseguiu que tudo fosse feito de forma rápida como o avô queira. A avó veio se despedir e alguns familiares também, Dona Lucrécia não chorou, não houve amor no casamento, só resignação, foi obrigada a casar e depois gerar filhos porque era sua obrigação, mesmo que o marido não a forçasse, sabia que a bíblia dizia e fez o que devia ser feito. Toda a família de dona Lucrécia eram católicos fervorosos. Uma lápide bonita foi erguida. Zuleika amparou a amiga e dormiu com ela por dois dias depois do enterro de seu Guido. Paloma se permitiu chorar, olhar recordações e sorrir com as lembranças. Viveu o luto que lhe era de direito.
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