Como uma flor de aço, Hermione floresceu e sobreviveu à guerra. Às perdas, às dores. Aos traumas. Tudo o que restara foram as marcas. Algumas visíveis, tal qual aquela que ela carregaria no braço esquerdo para sempre, como prova da insanidade de alguém que tinha mais preconceito do que amor ao próximo, ou aquela abaixo do seio esquerdo que ganhou em sua primeira luta contra Comensais ainda quando era uma estudante de Hogwarts. E outras na alma, no coração, na cabeça. O vazio constante por ver amigos morrerem para proteger o mundo sempre estava ali, martelando em sua cabeça. Presenciou amores irem-se por um "bem maior", e a única coisa grande que eles tiveram em retorno foi a enorme rocha memorial erguida nas margens do Lago n***o, com seus nomes e um agradecimento pelos seus feitos. Pouco para quem havia dado a vida para salvar uma sociedade, pouco para ela, que sentia falta de seus sorrisos e rostos. E tudo isso doía demasiado. Por mais que mil anos passassem ela sentiria a falta deles, e reclamaria sua perda. Até o fim dos tempos, de novo, de novo, e quantas vezes viesse e ela escapasse. Porque ela os amava, com toda a sua alma, coração e memória.
Ela sempre foi forte e madura, e muitas das vezes mutável, desta forma conseguiu adequar-se à sua vida pós-guerra. Reerguer tudo aquilo que ruiu com muito esforço, com determinação. Com amor.
Ela era uma mulher quebrada e com sequelas, para sempre seria. Mas isso não poderia impedir que sorrisos se formassem em seus lábios e ela mostrasse que tinha disposição para correr atrás de seus sonhos, de tudo que acreditava ser certo. Buscar a felicidade mais uma vez. Sempre outras vezes, seria assim enquanto seu coração batesse.
Não era uma mulher de desistir das coisas. Os tempos difíceis mostraram isso à ela, que entre ficar e lutar e ir para longe de tudo fazia sim toda a difrença, por mais que implicassem riscos. Algo ela tinha aprendido, afinal. Da forma mais dura no entanto...
Apesar de ainda ter olhos âmbar grandes, observadores e curiosos, boca rápida e esperta, e os cabelos que eram e seriam por toda a eternidade, indomáveis, ela mudou. Internamente ela mudou. Não que ela se importasse com isso. Mudanças são importantes para adequar-se à certas situações. A aceitar alguns casos e acasos da vida. Das suas escolhas.
O tempo foi seu melhor aliado para lidar com tudo.
Ela viu seu melhor amigo pedir enfim a mão de sua melhor amiga em casamento, ela havia sido madrinha do evento que durou um dia e uma noite, algo lindo, iniciando uma nova página na história do menino-que-sobreviveu.
Ela viu seu outro melhor amigo, aquele que ela julgou ser seu verdadeiro amor, se apaixonar por uma garota que ela não gostava, mas que aprendeu a gostar com o tempo.
Ela viu vidas transformarem-se.
Viu Molly superar devagar a morte de um filho, viu George se reerguer após a morte de seus irmão favorito, viu Bill festejar o nascimento da primeira filha, e viu amor surgindo em vários pólos e recomeços em todos os cantos. E sorriu, feliz, ainda que se sentisse incompleta. Ainda que ela visse que nela algo não estava inteiro.
Os castelos de areia que outrora haviam sido derrubados pelas ondas do mar agora foram reerguidos, e com barro. Algo mais sólido, mais difícil de ser destruído.. Mais duro, como as vezes a vida era.
Ela voltou à escola que um dia havia sido um campo de guerra, e concluiu os estudos. Nunca se sentiria a mesma se tivesse deixado-os de lado. Ela começou uma carreira promissora no Ministério da Magia, no Departamento de Regulamentação e Controle Das Criaturas Mágicas. Era admirada, obedecida, e, acima de tudo, respeitada. Por muitos. Aliás, por quase todos. Ela era heroína de guerra. Mulher à frente do seu tempo. Mente mais brilhante da sua Geração. Uma das bruxas mais desejadas da alta sociedade. Requisitada em eventos importantes.. Tão diferente daquela menininha pequena de dentes grandes e cabelo espalhafatoso. Tinha orgulho do que tinha se tornado dos seus princípios e tudo o que conseguira.. Era seu momento agora.
Tinha tudo o que poderia querer. Amigos, família - a original e a postiça -, emprego dos sonhos, respeito, reconhecimento, amor.
Era feliz. Era amada. Era reconhecida.
Mas, quando voltava para casa depois de um dia exaustivo de trabalho, e deitava sua cabeça no travesseiro, ela sentia que faltava algo, um vazio inexplicável que vinha lhe abatendo com mais frequência. Uma sensação de tristeza que não passava e que a consumia. Um pouco mais a cada dia. Como se uma parte da sua vida tivesse sido perdida por ela. E aquilo lhe incomodava muito mais do que gostaria de admitir.
Por vezes o peito doía, parecia afundar clamando pela falta de algo. Algo esse que ela não tinha ideia do que poderia ser. Poderia ser um cheiro, um calor, um olhar, uma palavra. Até alguém, ela não sabia.
Ela iria descobrir o que era, ah se ia.