Um anjo estendeu a mão

1133 Words
Fiquei petrificada ali. Nunca tive tanto medo na minha vida de uma resposta. Quando o médico veio andando devagar na minha direção, eu pude ouvir as batidas do meu coração que batiam feito tambor no desfile de sete de setembro, sentir o suor descendo pelo meu rosto, parecia que o mundo inteiro estava em câmera lenta. — Caroline? Caroline? Trago notícias sobre a pequena Melissa. Sua filha teve outra parada, felizmente conseguimos trazer ela de volta com um pouco de dificuldade. Uma garota forte, mas foi muito para o corpo dela. Temo que possa causar alguma sequela. Pelo que vi na ficha dela, não é a primeira vez que ela passa por dificuldades e sua vida é colocada em risco. Temos que conseguir a medicação o mais rápido possível. Seu corpo está muito fragilizado. Nosso tempo está contado. Cada minuto que passa sem essa medicação, o risco para vida da menina aumenta. Não quero pressionar, mas não tenho outra opção. Farei meu melhor para deixar ela o mais estável possível, mas não sei até onde serei capaz de fazer isso. — O médico tinha um rosto cansado e preocupado. Era óbvio que o tempo era crucial naquele momento. Mesmo que ele não tivesse me dito aquilo, a situação toda era óbvia. — Obrigada por cuidar da minha filha. Pensarei em uma forma de resolver isso. — Agradeci com um sorriso amarelo. Meu coração estava recheado de sentimentos mistos, raiva, ódio, tristeza e até decepção. Sentia que podia explodir a qualquer momento. Naquele momento, depois de ouvir o que o médico havia dito, eu odiei meus pais biológicos e adotivos com todas as forças. Senti raiva também do pai de Melissa que era um canalha que não poderia contar nem se quisesse. Amaldiçoei os políticos que não se importavam com a saúde e deixavam ela a míngua. O gestor irresponsável que deixou faltar a medicação que minha menina precisava. Acima de tudo, eu me odiei, por não ser capaz de fazer nada além de assistir minha filha sofrendo, lutando pela vida desde que nasceu. Eu havia falhado na missão antes mesmo de começar. Dinheiro era mais importante do que um dia pensei. E eu não tinha. Minha filha sofria por isso. Meu celular tocou naquele momento em que eu amaldiçoava o universo, me tirando daquele vórtex de raiva e culpa, era uma mensagem de propaganda do aplicativo de alugueis de imóveis que eu havia alugado o cubículo. — É isso! Sim! Já sei o que fazer. — Ao ver a mensagem, uma ideia me surgiu na mente. Era uma aposta de chances baixas. Não posso negar, mas não conseguia pensar em outra forma. Na mesma hora entrei em contato com a locatária do cubículo. Expliquei toda a situação que eu estava vivendo com a minha filha para ela. Tinha ciência que ela não era culpada, mas eu precisava tentar. Depois de muita conversa, ela finalmente aceitou. Fiz o cancelamento do aluguel. A locatária me devolveu parte do dinheiro na minha conta do banco. Se tivesse estornado, eu não teria acesso, meu pai já havia bloqueado o cartão. Agora eu tinha o valor da medicação, mas não tinha mais um lugar para ficar. Achei melhor não pensar nisso naquele momento. Um problema de cada vez para resolver. Primeiro, vamos comprar a medicação e cuidar de Melissa. Depois resolvo onde dormiremos. A locatária havia dado uma semana para sair do lugar. De qualquer forma, não poderia ficar lá, não fazia bem para minha filha. Teria que que sair. Agradeci ter conseguido o dinheiro de volta. Com o dinheiro em mãos, rapidamente consegui o remédio tão necessário. Quando entreguei a medicação nas mãos do médico, pude ver o alívio percorrendo seu rosto. Pensei que minha filha ficaria curada instantaneamente, mas eu estava equivocada. Melissa teve que ficar internada na upa por um bom tempo. Por sorte, acabei desabafando com uma mulher idosa chamada Marieta, que trabalhava na limpeza. Sensibilizada com a nossa situação, ela me ofereceu sua casa para deixar as nossas coisas até encontrar um lugar para ficar. Foi um alívio enorme. Dormi no banco do hospital todos os dias que Melissa teve que ficar lá. Eu aproveitei esse tempo para baixar o valor dos itens que eu havia colocado para vender. Eu precisava de dinheiro antes da minha filha ter alta. Com ele iria alugar um lugar para gente ficar, dessa vez, seguro para ela. Os dias voaram, mesmo passando arrastado, não sei como explicar. Os dias eram longos, mas ao mesmo tempo as horas passavam de par em par. — Quando a princesa vai sair? Soube que ela teve uma grande melhora. O hospital todo só fala dessa menina. Todos encantados como ela é tão linda quanto a mãe. — Marieta, a funcionária da limpeza que estava me ajudando disse animada. — Não sei, o médico disse que seria hoje ou amanhã. — Respondi cabisbaixa. Passamos cerca de dois meses naquele lugar, usando o hospital para ter comida e teto. Agora era hora de sair e não tínhamos para onde ir. Não havia conseguido vender tantos itens como pensei que conseguiria, mesmo depois de baixar o preço. — Pensei que estaria saltitante de alegria, a bebê está se recuperando bem e está crescendo tanto. Ela chegou tão magrinha aqui. Parecia um ratinho sem pelo. Esperava que você estivesse não se contendo de alegria com a notícia de sua alta.— Marieta me olhou confusa. Fazia sentido ela não entender a minha reação. — Eu estou feliz, apenas preocupada, para ser sincera, consegui vender algumas das minhas coisas, você sabe, mas não é o suficiente para manter a medicação, casa e alimentação. Tudo é tão caro. Tentei encontrar um emprego, mas não consegui. E eu não sei o que fazer. Mesmo se eu conseguisse um emprego, como faria para cuidar da minha filha? — Desabafei olhando para o céu. Eu que vivi uma vida de luxo, nunca pensei como a vida era difícil a vida daqueles que não tinham nem o suficiente para comer. — Minha pequena, fique na minha casa até conseguir se organizar. Ela não é grande, a localização não é boa, mas desde que minha filha foi embora, moro sozinha, a casa passa o dia vazia, eu só chego a noites, vai ser bom ter uma companhia. E acho que duas crianças não deveriam ficar na rua desse jeito. — Marieta sempre me tratava como uma criança, no fundo, também me sentia assim. Uma criança fingindo ser adulta. Ela dizia que eu parecia com sua filha quando mais nova, desde que me conheceu, de alguma forma, sempre está tomando conta de mim. — O que acha? Não é grande e não tem luxo, mas é um lugar limpinho e seguro para o bebê. Vamos comigo. Eu vou te ajudar nessa fase difícil.
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