Você chegou mais rápido do que eu imaginei

1000 Words
Como era de se esperar, Heitor não absorveu com facilidade a informação. Teve uma dificuldade enorme para assimilar o que eu dizia. Tive de explicar mais três vezes para que Heitor pudesse compreender do que eu estava falando. Na última vez, um longo silêncio tomou conta da chamada. Pensei que ele estaria chorando, mas logo voltou com uma voz fria, como se tivesse tirado todas as emoções dele e guardado em algum lugar muito seguro. Não sei se deveria ficar preocupada ou feliz com a forma que ele reagiu, não que eu pudesse realmente fazer algo para o ajudar naquela situação onde estava recebendo notícias tão difíceis tão longe de casa. No fim, Heitor apenas me avisou que estava voltando ao Brasil, pediu para eu tomar conta de tudo até ele chegar e desligou a ligação sem dizer muita coisa. — O que eu faço com essa informação? Nem para dizer quando, como vem. Espero que ele não faça uma loucura. Ele é bem racional, não é? Eu espero que seja, porque algo me diz que Letícia será completamente irracional quando souber do que está acontecendo. Não tenho sequer confiança que posso lidar com ela. — Estava falando sozinha enquanto andava pelos corredores tentando organizar os pensamentos no meio dessa tempestade que eu estava metida. Quem passava por perto me olhava como se eu estivesse completamente louca, talvez tivesse. Cheguei na sala de emergência pensando como contaria aquilo para Letícia de alguma forma que ela não surtasse completamente e perdesse o juízo que já não existia desde o começo. Abri a cortina aflita, Letícia estava dormindo abraçada com Mel na cama, mas minha filha estava com os olhos arregalados assistindo pela 173737383 vez o filme Frozen. Não entendo como ela consegue. De qualquer forma, respirei aliviada de não precisar contar agora. Tinha esperança que o seu irmão explicaria a situação quando chegasse ao Brasil. Sabia que a relação deles não era a melhor, mas no fim, eram irmãos afinal. Nos momentos difíceis poderia contar com ele para isso. — Filha, Heitor não poderá te ligar hoje. Ele teve que fazer uma viagem de emergência, mas logo você terá uma grande surpresa. Foi o que me disse pelo menos. Então, porque não vamos comer alguma coisa e depois voltamos para cá? Acredito que sua tia vai dormir um bocado hoje, ela tomou muitos remédios que fazem as pessoas dormirem. — Mesmo no meio do caos, me sentia mais calma ao pensar que estava bem o suficiente para me preocupar com minha filha. — Vamos, mamãe. O que comeremos? — Mel me perguntou tentando escapar das garras da sua tia, para minha alegria, ela não perguntou nada sobre o que estava acontecendo. — Não sei, o que gostaria de comer hoje? — Respondi ajudando ela sair dos braços de Letícia, que estava completamente apagada por conta das medicações, não percebeu sequer a fuga da minha filha. Que babá boa essa. — Quero torrada de queijo! — Mel escolheu me entregando o celular nas minhas mãos, coçando os olhos. Deve ter jogado mais do que deveria. — Então vamos procurar, mas acho que não encontre isso aqui.— Concordei segurando a mão de Mel, enquanto andávamos para fora do hospital. — Que tal um pedaço de bolo e um suco? Caso não tenha torrada? Por sorte, tinha uma padaria próxima, comprei um sanduíche com pasta de frango e salada, a torrada parecia tão sem graça naquele momento. Pedi uma jarra de laranja e jantamos ali. Acreditei que Mel perguntaria alguma coisa, mas ela não fez qualquer questionamento. Será que achava normal viver no hospital? Não posso dizer que não, é parte da rotina dela desde sempre. — Vamos ficar no hospital com a sua tia até alguém chegar para ficar com ela. Tudo bem para você? — Não sei que horas Heitor chegaria, mas não podia deixar Letícia sozinha. Se acordar e descobrir o que está acontecendo, sem ninguém ao seu lado para ajudar, o que aconteceria? Não sei se poderia acalmar ela, mas ao menos, não estaria sozinha. Marieta com toda a certeza faria de tudo para que a sua neta não estivesse sozinha ao receber uma notícia dessa. Chegamos no hospital, como esperado, Letícia dormia profundamente ainda. Conversei com as enfermeiras, consegui uma poltrona, lençóis e travesseiros. Fiz uma espécie de cama para Mel. Pensei que ela demoraria para dormir, mas logo que comecei a contar uma história, ela adormeceu completamente. Enquanto as duas dormiam no mesmo leito. Eu andava de um lado para outro do hospital. Não havia realmente nada que eu pudesse fazer? — Você é a responsável pela senhora Marieta? — Um enfermeiro me parou no meio do corredor. Senti o frio passando por meu corpo. Só conseguia pensar o pior naquela situação. — Precisamos da assinatura dos responsável e que responda esse questionário, como ela chegou indo direto para emergência, não fizemos ficha. Poderia responder ela? — O enfermeiro me entregou uma prancheta, respirei aliviada. — Falei com o médico sobre a troca de hospital e especialistas na hora. Ele deu algum retorno? — Perguntei enquanto assinava as informações que eu sabia, algumas eu nunca perguntei. — Sim, apenas poderá ser movida depois das 24 horas. Sobre os especialistas, Kleber ainda está analisando quem ele pode chamar e falará com a senhorita sobre as suas indicações na visita da manhã. — O enfermeiro respondeu chateado, acredito que não era muito animador o plantão da noite. Concordei, não havia muito o que dizer, terminei de responder o questionário e entreguei. Algumas coisas eu apenas chutei, espero que não dê problema. Olhei pela janela, o sol já estava nascendo. O céu estava completamente laranja, parecia uma pintura à mão. Senti alguém me abraçando por trás, nem precisei me virar. Conhecia aquele perfume muito bem. — Você chegou mais rápido do que imaginei. — Respondi sem tirar os olhos da janela. Encostei minha cabeça no seu ombro. Quando tempo fazia que eu não sentia aquele perfume tão perto de mim?
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