Igual à noite passada, o apartamento de Jasmine parecia um forno de tanto calor que estava. Assim que chegara a casa, Jas tinha aberto todas as janelas, mas mesmo assim o calor continuava insuportável.
Tomou um banho e vestiu a roupa mais confortável e mais fresca que tinha e caminhou até à cozinha. Havia restos do jantar de ontem, e era isso mesmo que ela iria comer. Não tinha vontade de fazer jantar só para sim, e para dizer a verdade, cozinhar não era o seu forte.
Tirou um prato e colocou toda a comida que estava guardada dentro do mesmo, colocou vinho num copo enquanto a comida aquecia e por fim dirigiu-se até à varanda. Colocou o prato e o copo na mesa da varanda e sentou-se na cadeira a apreciar a vista dos carros a passar na rua. Sabia que aquela não era uma grande vista, mas por um lado até lhe trazia uma certa paz. Conseguia ver uma boa parte da cidade dali de cima e por momentos até deu por si a gostar um pouco da sua vida.
Do outro lado da rua por entre as sombras, Zyan estava a observá-la enquanto ela comia o seu jantar. Deu por si a apreciá-la.
Cabelo castanho escuro pelo meio das costas, pele clara e um corpo cheio de curvas, todas elas nos lugares certos. Não podia negar, era uma mulher e tanto. Mas não era para apreciá-la que ele tinha ali ido.
Repreende-se a si mesmo e respira fundo. Gesto que se arrependeu de imediato. Pelo simples gesto que fizera, sentiu o odor doce e suave que vinha dela, uma mistura de amêndoas e flores. Mas junto a isso também veio o cheiro da sua transição próxima. Conseguia perceber-se isso, meia humana ou não, ela iria passar pela transição.
Passaram mais de meia hora ali. Ela na varanda e ele nas sombras a observá-la, ela depois do jantar tirou tudo da mesa da varanda e as levou até à cozinha. Vê-la afastar-se da varanda e fechar a porta de vidro atrás de si deu a Zyan uma vontade incontrolável de ir atrás dela para onde quer que ela fosse.
Mas o que estava a acontecer com ele?
Zyan deu por si a pensar. Que sentimento era aquele, que vontade era aquela que ele nunca tinha sentido antes? Talvez proteção, talvez por saber que ela estava próxima da transição. Talvez por saber que provavelmente, ela iria depender dele para passar a transição, por saber que estava encarregue da sobrevivência da filha do seu melhor amigo.
Deu um passo para fora das sombras e continuou a observar todos os movimentos que ela fazia dentro de casa. Era sexy, não podia negar. Talvez se fosse outra mulher no lugar da filha de Vitor, ele tiraria bom proveito daquela situação.
Jasmine terminou de arrumar tudo e voltou a ir de encontro à porta de vidro. Aquele era o seu momento de paz, espreitar pela janela e imaginar tudo o que lhe estava guardado para o futuro. Imaginar uma vida melhor do que a que tinha, era o seu escape para não endoidecer.
Passou os olhos por todas as luzes da cidade e no momento em que ia a sair da janela para o seu quarto, viu um homem. Um homem estava encostado ao muro do outro lado da rua a olhar diretamente para ela. Provavelmente era coisa da sua cabeça, mas ficou ali por mais alguns minutos a olhar para aquele homem sombrio para ter a certeza que era mesmo para ela que ele olhava.
E sim, era! Ele desencostou-se do muro e deu alguns passos na direção do prédio com os olhos fixos nos dela. Ela estremeceu. Não só por medo, mas também por outra sensação desconhecida que ele lhe transmitia.
Como se acordasse do transe em que se encontrava, saiu com pressa de perto da janela e deu por si a verificar se todas as janelas e se a porta de entrada do seu apartamento se encontravam trancadas. Apenas por precaução!
Pegou no telemóvel e meteu-se na cama. Era nestas alturas que não gostava de morar sozinha. Se morresse nas mãos daquele homem, ninguém iria sentir a sua ausência.
Mas quem seria aquele homem? E ainda por cima a olhar para mim...
Pensou!
Pensou também em ligar à única pessoa que tinha na vida, António. Mas não o queria preocupar aquela hora da noite. Não havia necessidade, talvez aquilo tivera sido coisa da sua cabeça. Talvez o homem estivesse a ver uma outra coisa no prédio.
Por isso, não havia porque ligar ao seu amigo por coisas de que nem tinha provas...
Deitada na cama também deu por si a pensar em como sentia falta de alguém ao seu lado. Não que estivesse a falar de um relacionamento, mas uma amiga. Claro que tinha António, mas sentia falta de uma mulher para ter certas conversas que com ele não se sentia confortável em ter.
Enfim... Depois da maior parte do medo passar e de ver que não lhe iria acontecer nada de mais, aconchegou-se na cama e largou o telemóvel. Amanhã seria um novo dia de trabalho e precisava de descansar.