Capítulo 1

1855 Words
A primeira coisa que notei ao voltar a consciência foi a dor. Sim, dor. A queimação constante dentro do meu corpo. Era como se labaredas de chamas estivessem consumindo cada pedacinho do meu corpo. A voz de Nathaniel ao longe, também não me passou despercebida, mas a dor era tão forte naquele ponto; que eu não conseguia focar em nada ao meu redor. Mãos suaves me pegaram e eu gritei. Ao me mover, a dor se possível multiplicava. Meu corpo estava em chamas. Eu não saberia dizer naquele momento se eu era uma tocha humana, ou se minha pele já estava derretida e eu virava larva. Eu nem saberia dizer se eram as mãos quentes e reconfortantes de Nathaniel que me carregavam e me colocavam com extremo cuidado ao chão. Quando a dor das chamas abrandou um pouco, eu respirei. Era como respirar o ar depois de passar por um afogamento, mas fiz isso cedo demais. As chamas agora se foram, somente para dar lugar a uma dor diferente. Eu sentia como se algo estive rasgando minha carne lentamente. Grunhi gritando novamente e senti meus dedos apertarem e arrancarem algumas gramas do chão. — Pare de rasgar minhas costas! - não aguentei segurar o grito quando não pude mais suportar. — Merda, o vestido! - uma voz estridente e infantil ecoou próximo a mim. Eu pude distingui e ouvi-la muito bem. Mas, mais do que isso; eu queria manda-la a merda por pensar em vestido enquanto eu estava sendo rasgada naquele momento. — Escute, Rosemary! Irei me aproximar e rasgar seu vestido. Não me acerte. Isso irá te ajudar. Suas asas precisam ser libertas. - processei vagamente o que ela disse. Vestido? Não acerta-la? Asas? — Rápido. - ofeguei ao sentir mais uma pontada dolorosa. Dane-se o que ela tinha falado. Eu só queria que aquilo passasse. Pude ouvir o som do tecido se rasgando, desapertando o pano em minhas costas. Pude ouvir outros sons também. Grunhidos, barulhos de lâminas e gritos. Algo definitivamente estava acontecendo ao redor, enquanto eu estava perdida em minha própria dor. Ofeguei ao sentir mais uma pontada forte em minhas costas, mas dessa vez minha mente foi capaz de focar em outra coisa, em alguém. Nathaniel!  Eu não precisava vê-lo para saber se ele estava no meio daquele barulho infernal. Ofeguei abrindo os olhos e tentando me focar em algo que não fosse minha pele queimando e se rasgando. Minha cabeça virou para o lado e observei a cena que se desenrolava a minha frente. Estava embaçada, pois meus olhos estavam repletos de lágrimas, mas mesmo assim ainda consegui localizar Nathaniel se mover rapidamente entre os corpos. Suas asas negras saiam de suas costas e ele tinha em mãos uma espécie de espada. Localizei Nicholas e Glinda no meio da luta, e várias outras pessoas também. Eu não sabia dizer quem estava do nosso lado ou não, mas me peguei torcendo para que aquelas três pessoas saíssem ilesas.  Eu conseguia diferenciar vagamente os anjos, por conta de suas asas brancas. — Ela está quase pronta! Se preparem. - a voz fina que eu tinha escutado antes ecoou novamente e eu me virei para encarar olhos verdes brilhantes. A moça de feições pequenas ofegou quando meus olhos se cravaram nos seus e sua boca se abriu para murmurar algo em uma língua desconhecida. Ela quase cantava, enquanto suas mãos pairavam sobre mim. — Estou tentando diminuir a dor, mas não sei se consigo. - seu resmungo ecoou, enquanto ela me olhava brevemente, antes de focar em suas mãos. Quis dizer que não estava funcionando, pois eu ainda podia sentir as dores sobre meu corpo, mas não quis ser insensível ou afastar a pequena mulher. Eu não queria ficar sozinha, essa era a verdade. — Você precisa se levantar. Suas asas sairão em breve. - seus olhos se cravaram em mim novamente e eu pisquei processando suas palavras. Definitivamente eu tinha escutado ela falar em asas. As pequenas mãos pararam de pairar sobre meu corpo, e eu a vi se estender em minha direção, em um pedido mudo para que eu pegasse. Meus dedos se tocaram com as mãos suaves da pequena mulher e fui suspensa pela mesma, que revelava ter uma força incrível. Minhas pernas tremeram, quando enfim, sustentou meu corpo e eu quis gritar com a pontada em minhas costas. Ouvi um ofego vindo da franzina mulher de olhos verdes e um som estridente vindo das minhas costas. A dor ainda estava presente, mas tinha aliviado um pouco. Senti como se algo saísse de mim, de trás de mim, e o som de vento cortando o ar.  Eu conhecia aquele som. Era o som inconfundível que Nathaniel fazia sempre que suas grandes asas apareciam. Olhei chocada sob o ombro, somente para ver uma parte das grandes asas que saiam de minhas costas. Minhas asas. Eu ainda não conseguia acreditar, mesmo vendo elas ali. Eram grandes, imponentes e lindas. Pelo que pude ver eram diferentes. Eu conseguia ver o lado direito tomado pela cor n***a, enquanto o esquerdo era de um branco incrível. Como asas de anjos! — Nathaniel, ela está pronta. - a voz inconfundível de Glinda ecoou e eu a olhei por um breve momento. Muito breve, pois meus olhos pousaram em Nathaniel automaticamente. Buscando-o, precisando dele... confirmando que ele estava vivo e bem.  Nathaniel ainda se movia rapidamente, golpeando quantos ele conseguia com uma lâmina afiada que estava em suas mãos, mas ao ouvir a voz de Glinda ele parou para me procurar. Seus olhos me procuraram por um momento, por um breve momento, até que ele me encontrou. O sorriso que ele deu foi capaz de mandar embora qualquer dor que eu estivesse sentindo, e aquecer meu corpo.  Eu retribui o sorriso apaixonado. Esquecendo tudo e todos, pois ele estava ali, sorrindo para mim e era como se existisse nós dois e aquele sorriso me prometia que tudo ficaria bem. E bom... Eu acreditei, mas descobri cedo demais que eu estava terrivelmente errada.  Parecia que o mundo tinha parado e todos se moviam em câmera lenta. Observei em completo choque, o lindo sorriso de Nathaniel morrer aos poucos e em sua face surgir uma careta de dor.  — Não! - gritei ao ver que ele tinha sido atingido. Suas pernas se colapsaram e ele caiu em seus joelhos. Tentei correr em sua direção, mas meu corpo não obedeceu.  Cai sem forças ao chão, enquanto observava a pessoa que tinha lhe machucado se preparar para acabar com sua vida.  — Nathaniel! - seu nome saiu de meus lábios em um grito desesperado e sofrido. Quis fechar meus olhos para não ver aquilo. Eu não estava pronta para perde-lo. Eu nunca estaria. Era c***l demais, se depois de tudo que passamos, que tivemos que passar, o destino nos afastasse desse jeito. Isso não estava certo. Chorei olhando a cena. Chorei, observando impotente, o homem que eu amava perder sua vida. Chorei. Por um momento, deixei que a tristeza adentrasse meu coração e logo depois o ódio. Minhas vistas se pintaram de vermelho e eu desejei o sangue daquele que se preparava para arrancar de mim o homem que eu tanto amava. Estava prestes a me levantar e buscar minha vingança, quando de repente Nicholas se materializou ao lado de Nathaniel e com um único golpe, arrancou a cabeça do homem que planejava ceifar a vida do meu meio demônio. Minha respiração saiu entrecortada de meus lábios e minhas mãos se fecharam em punho, arrancando algumas gramas do chão. Ele estava vivo. Pelo jeito que seu corpo despencava ao chão, denunciava que ele estava gravemente ferido, mas ainda estava vivo. Todo o meu ser se encheu de esperança sem que eu pudesse evitar. — Precisamos sair, agora. - Glinda improvisou uma barreira entre Nathaniel e os poucos seres sobrenaturais que lutava do nosso lado, e Nicholas pegou Nathaniel em seus braços o trazendo até mim. — Nathaniel, você precisa nos tirar daqui. Você está fraco e vai ficar mais fraco ainda. Mas nesse momento, é o único que pode nos tele transportar. Os olhos de Nathaniel se prenderam nos meus por um momento e eu vi ele assenti, antes de sentir a sensação estranha que era ter meu corpo se movendo no espaço e tempo. O gemido sôfrego dele ecoou, assim que colocamos nossos pés no chão. Eu não sabia onde estávamos e na verdade pouco me importava isso. A única coisa que me importava era Nathaniel e o quão pálido ele estava ficando. Seus olhos estavam fechados e sua expressão estava congelada em uma careta de dor. Meus olhos vasculharam seu corpo e pararam em seu peito. Prendi a respiração enquanto observava com extrema agonia seu peito se mover para cima e para baixo. Mãos quentes me empurraram para o lado, tentando chegar próximo do corpo de Nathaniel e um som animalesco ecoou. Demorei um tempo para perceber que aquele som tinha saído de mim, de meus lábios. De certo eu estava olhando para todos os rostos conhecidos e desconhecidos, enquanto arreganhava meus dentes. Meu corpo ainda queimava, mas dessa vez era de fúria.  Como puderam deixar que ele se ferisse assim? Eu queria matar todos os envolvidos nisso! Não deixei de pensar em todos aqueles instintos assassinos que me dominavam, aquela definitivamente não parecia eu. Mas eu também pouco me importava com isso naquele momento. — Rose, precisamos chegar até ele. - ouvi voz de Glinda e prendi meus olhos nela, quando a mesma deu um passo à frente. — Caso contrário ele vai morrer. Me custou cada grama do meu ser me afastar e deixar que ela e outras mulheres se aproximassem do corpo de Nathaniel, que a esse ponto estava desmaiado e perdia cada vez mais sangue. As mãos de Glinda pairavam sobre ele e eu vi uma fumaça n***a e densa sair de suas mãos e envolve-lo. Observei em silencio o ferimento fechar e ao mesmo a voz dela começar a ecoar em um cântico antigo. — Não está funcionando. - Glinda rosnou com uma careta e eu senti meu corpo gelar. — Se reúnam, precisamos de toda a força possível. - eu não sabia o que ela queria dizer, mas de repente vi as mulheres se aproximarem formando um círculo em volta de Glinda e Nathaniel. Com suas mãos estendidas a eles as mulheres começaram a entoar o cântico que saia dos lábios de Glinda em um coro sincronizado. — O que está acontecendo? - sussurrei próxima a Nicholas, meus olhos ainda em cima de Glinda e Nathaniel. — Nathaniel foi ferido por uma arma angelical. É uma arma poderosa, que mata tanto anjos, quanto demônios. Ele pode não ter morrido na hora, o que foi praticamente um... milagre. - notei o canto da boca de Nicholas se curvar em uma careta. — Por ser filho de Lúcifer, um arcanjo, ele é forte, mas o ferimento causado pela lâmina... - ele balançou a cabeça, olhando-o com pesar e evitando me encarar. — Ele está morrendo aos poucos. Meus olhos se arregalaram quando ouvi aquilo e voltei minha atenção para Nathaniel.  
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