No caminho de volta, Ricardo foi dirigindo o carro, enquanto Ella e Helena conversavam no banco de trás. Ella não queria tirar o brilho que começava a surgir nos olhos de Helena, mas não tinha escolha. Helena tinha apenas 19 anos, mas já havia sofrido demais nas mãos do crápula que fora seu irmão.
Suspirando, Ella começou:
— Helena, preciso te contar uma coisa. Quero que saiba que sinto muito por isso.
— Ella, você está me assustando...
— Você sabe que, no nosso mundo, as mulheres jovens não ficam solteiras por muito tempo, não é?
Ao ouvir isso, a cor do rosto de Helena desapareceu, e lágrimas começaram a escorrer.
— Ella, meu pai prometeu que não me casaria outra vez. Não depois de tudo que passei nas mãos do seu irmão! Eu não mereço passar por aquilo de novo. Mulher nenhuma merece! Nada e nem ninguém me fará passar por isso outra vez. Eu não me casarei de novo!
— Helena, sinto muitíssimo, mas nem mesmo seu pai pode decidir isso por você. Nem você mesma... Você já está casada.
Helena riu — um riso histérico, descrente.
— Isso é impossível, Ella! Eu não me casei com ninguém!
Mas, no fundo, ela sabia que, no mundo delas, aquilo era bem possível.
— Você assinou alguns documentos logo após a morte do meu irmão, não assinou?
— Sim... assinei. Oh, Ella, como pude ser tão i****a?
Helena começou a chorar, a respiração falhando entre os soluços.
— Prefiro a morte. Vou me m***r antes de deixar outro homem tocar em mim novamente.
— Você não pode — disse Ella, com a voz falhando. — Ele me mandou te dar um recado: se você encontrar qualquer maneira de se livrar desse casamento, sua irmã tomará o seu lugar.
— Oh, Deus, Ella! Ela ainda nem completou 16 anos... Que tipo de homem seria capaz de forçar uma menina, quase uma criança?
— Não sei. Os homens do nosso mundo têm um senso de honra e moral estranhos, Helena... Eu sinto muito por ser a porta-voz dessa notícia, mas achei melhor eu do que ele contar a você.
Naquele instante, um calafrio percorreu o corpo de Helena. Ella nem precisou dizer o nome. Ela já sabia. Estéfano.
O homem que, mais uma vez, roubara sua liberdade.
O homem que transformaria sua vida em um inferno outra vez.
Se Otávio tinha sido capaz de subjugá-la, Estéfano a reduziria a **.
— Quando devo me juntar a ele? Tenho pelo menos mais uma noite de paz? — Helena perguntou, soluçando.
— Não sei. Acredito que não.
Durante o resto do caminho, Helena se perguntava o que fizera para que o destino fosse tão c***l com ela. O que fazia com que ela não tivesse direito a manter sua sanidade, seu corpo livre de cicatrizes?
Quando, enfim, o carro parou no lugar que deixaria de ser seu lar em breve, Helena se despediu de Ella e desceu. Mas, ao olhar para frente, lá estava ele.
Seu pesadelo em forma de homem.
Estéfano vestia preto da cabeça aos pés. Suas feições eram duras como pedra, o rosto impassível, sem mover um único músculo. A cicatriz na bochecha o tornava ainda mais aterrorizante aos olhos de Helena.
Ela ainda chorava. Não os soluços desesperados do carro, mas um pranto silencioso — o de uma mulher que sofria e temia o homem à sua frente.
Sem dizer nada, Estéfano abriu a porta do carro e fez um gesto para que ela entrasse.
Helena, que aprendera a duras penas a obedecer, entrou sem olhar para trás. Não se preocupou com seus pertences, suas roupas, seus objetos pessoais. Nada daquilo fazia mais sentido.
Já não importavam os cremes para cabelo que comprara depois de três anos.
Nem as roupas novas.
Nem a caixa de chocolates que, pela primeira vez, pudera entrar na padaria e comprar.
Agora, o homem que dirigia aquele carro iria também dirigir sua vida.
Restava saber se ele era tão r**m quanto Otávio... ou pior.
Só de pensar na noite que a esperava nos braços de Estéfano, lhe arrepiava até a alma.
Ela não o achava f**o, mas o temia desde a primeira vez que o viu.
Quando o carro parou, Helena desejou com todas as forças estar morta. Sentou-se no chão do veículo e se encolheu. Sabia que não adiantava. Ele a arrancaria dali com facilidade, mas ela simplesmente não tinha forças para sair.
Ouviu a porta se abrir. Sentiu a presença dele. Sabia que ele estava parado ali, esperando. Mas permaneceu encolhida, uma bola humana.
Sabia que era uma visão ridícula para o homem que a observava.
Mas, Deus... ela sentia tanto medo.
Ela só queria que ele a levasse de volta.
Foi arrancada de seus pensamentos pela voz dele. Uma voz rouca. Intensa.
— Levante-se daí. Não costumo dizer as coisas mais de uma vez, menina. Faça um favor a si mesma e nos evite problemas.
Ao ouvir isso, Helena se obrigou a levantar. Foi rapidamente empurrada para dentro da casa.
Passou pela propriedade sem notar nada. Seus olhos estavam cegos para qualquer detalhe ao redor.
Somente quando chegou a uma sala, sentou-se no sofá. Encolheu-se mais uma vez.
Estéfano a observava.
Que tipo de vida ela teria levado nesses últimos anos para reagir assim? Mesmo nas circunstâncias em que se encontravam, ela o temia demais.
Ele sabia que era intimidador. Mas aquela reação...
Aquela mulher parecia alguém que fugia de um monstro.
Estéfano soltou um longo suspiro e decidiu sair de casa.
Não queria perder a paciência.
Nem fazer algo de que pudesse se arrepender depois.
Helena permaneceu encolhida no sofá. Quando percebeu que estava sozinha, pegou uma manta e se embrulhou.
Chorou até não ter mais lágrimas.
A exaustão venceu.
E, finalmente, dormiu.