Capítulo 1 - Azul marinho.

2019 Words
Emily Santory Alguns meses depois… O vento gostoso bate no meu rosto, debruço meus braços no guarda corpo da varanda do meu quarto e dou uma olhada na favela. Eu gosto dessa vista. Imensidão de casas juntinhas, coladas uma na outra. Algumas com paredes sem reboco, outras pintadas com cores primárias… Cada uma com o seu jeito simples de ser. Não é romantizando a pobreza, mas hoje eu sei apreciar a beleza da favela. Sinto o meu bebê chutando e me afasto um pouco do guarda corpo, passo a mão esquerda no meu barrigão. A aliança de ouro com a inicial do meu marido, chama atenção. O azul marinho do meu vestido curto, dá um ênfase ainda maior na aliança, por se tratar de cores diferentes. Estou grávida de um menino, como eu e o meu marido desejávamos. Agora temos um casal de filhos, a Lara e o Felipe. Já estou no último mês de gestação, não vejo a hora dele nascer. Principalmente o Farinha, que não consegue dormir direito. Na última consulta, o médico nos informou que a qualquer momento ele pode nascer. Estamos nos preparativos para a vinda dele, o quarto já está pronto, foi montado tudo como eu queria, a decoração ficou perfeita. Minha bagagem para o hospital já está pronta, só falta chegar a hora da bolsa estourar, igual ocorreu com a Lara. Inalo o perfume masculino e noto a presença do Farinha. Esse é o único perfume que eu não enjoo, então ele só tem usado esse, ultimamente. Ele coloca a mão em cima da minha e cola o seu corpo nas minhas costas. Ele dá um cheiro em mim e eu dou um sorriso de lado, viro um pouco o rosto e molho nossos lábios em um beijo quente, rápido e molhado. Farinha entrelaça os dedos nos meus, sinto sua mão fria por estar na rua e com a minha mão direita, eu toco em seu rosto. Farinha: Aconteceu alguma coisa? Como é que tu tá? Vi tua ligação e já vim correndo pra cá. Emily: Tá tudo bem, eu só queria a sua companhia - Falo abraçando-o e encostando a cabeça no seu ombro - Tava resolvendo alguma coisa importante? Farinha: Tava, mas não tanto quanto vocês. Falando nisso, cadê a Vitória? Ainda não vieram trazer ela? Emily: A Mi falou que trás ela amanhã de manhã. Lara foi dormir na casa da Milena. Segundo ela, estava com saudade do primo e da tia, não vi problema em deixar ela ir lá, mas o pai já está doido para buscar. Farinha: Ela falou que a Vitória só ia dormir uma noite lá. Emily: Uma noite a mais não faz tanta diferença assim, é só mais um dia e não uma semana, tem calma - Falo dando uma risada - Ela sente falta de brincar com o Arthur. Farinha: Tá errado esse bagulho, menina tem que brincar com menina. Brincadeira de menino e menina não existe. Emily: Claro que existe, amor. Eles são duas crianças, e são primos, tá? Não começa, pelo amor de Deus. Farinha: Vou buscar a Vitória - Fala desfazendo o abraço. Emily: Fábio… Farinha: E tu vai junto. Bora, vai com essa roupa “mermo”, não tô a fim de esperar. Como eu sei que ele não vai desistir, eu simplesmente saio da varanda, pego o celular em cima da cama e desço as escadas com ele. Aceno para o Salsicha que está com o Gordão em frente a minha casa e entro no carro. Coloco o cinto com um pouco de dificuldade e ele dá partida. Neg0 com a cabeça, o que custava ter esperado até amanhã? Ela está em boas mãos, mas não vou contrariá-lo, se ele acha melhor nós irmos buscar ela, ok! Farinha pega atalho para Heliópolis, rapidinho chegamos na casa deles e descemos do carro. Ele cumprimenta os seguranças e ajeita a glock na cintura. Eu evito olhar para os homens, apenas cruzo os braços enquanto um deles fala com o Terror pelo rádio. Depois da autorização, eu e o Farinha entramos na casa. Me abaixo um pouco e abro os braços para abraçar Lara, mas ela me deixa no vácuo e corre para abraçar o pai dela. Disfarço abraçando o Arthur que veio me dar um abraço. Emily: Tia tava com saudade de você - Digo passando a mão no cabelo dele. Arthur: Eu também - Desfaz o abraço. Lara: Veio me buscar, papai? Farinha: Vim, o pai já não aguenta mais entrar em casa e não ver você, minha princesa - Pega ela no colo e Lara dá uma risada seguida de um beijo na bochecha dele. Milena: Oi - Diz sorrindo se aproximando da gente. Ela me entrega a bolsa com as coisas da Lara. A aparência da Milena está impecável, como sempre. Terror chega na sala logo em seguida e vai cumprimentar Farinha. Emily: Olá, tudo bem? A Lara se comportou? Milena: Tudo tranquilo. A Lara não deu nenhum trabalho. Emily: Ótimo, eu ia esperar cê levar ela amanhã, mas o Farinha quis vim hoje buscar, aí já sabe, né? Milena: Sim - Fala e ri. Terror: Cês só vieram buscar ela? Aproveita e fica pro almoço, Milena tá preparando um rango pra nós, né amor? Milena: Sim, só não sei se vai dar bom. Antes que eu pudesse responder, o Farinha fala por mim, ele recusa o convite do Terror. Eles se dão bem, nos negócios. Mas como cunhados, a relação não é tão boa assim. Ele parece não curtir muito o fato do convívio dos dois, com certeza ainda m0rre de ciúme da irmã, só não toca mais em assunto, tenta evitar briga. Farinha: Não, tô com pressa, preciso resolver uns bagulhos lá na boca, só passei pra pegar a Vitória. Valeu pelo convite, quem sabe na próxima. Terror: “Demorô”, qualquer dia passa aqui pra nós trocar uns papos. Farinha: Pode deixar, fica na paz vocês aí. Milena: Cês também, vão com Deus. Emily: Tchau, obrigada - Falo sorrindo e saio de lá com Lara e Farinha. Coloco a bolsa dela no banco de trás e ajeito Lara na cadeirinha, mas ela começa a cismar pedindo para ir na frente com o Farinha. Lara: “Quelo” ir com o papai. Emily: Filha, o seu pai vai dirigir e a mamãe não pode te levar no colo. Lara: Papai, “quelo” ir aí com o senhor. Farinha: Tira ela da cadeirinha e trás ela pra cá. Emily: Não, você vai dirigir. Farinha: Faz o que eu tô pedindo, ela vai passar a viagem toda insistindo pra vim na frente. Bufo e tiro ela da cadeira, entrego para ele e eles se ajeitam no banco do motorista. Ela coloca as mãozinhas no volante e sorri, Farinha dá partida para Paraisópolis. Desço do carro com a bolsa e Farinha desce com a Lara, entramos em casa e fomos direto para o quarto. Ele vai até o banheiro e eu fico com ela. Lara: Quero ir no parquinho, depois do almoço - Fala subindo na cama. Emily: O seu pai não quer te ver na rua. Ele me deixou proibida de sair com a Lara, a não ser que seja de carro. Farinha não quer que ninguém a veja, para não tirar foto, ou decorar o rosto dela e querer fazer algum m4l a criança. As pessoas sabem que ele tem uma filha, mas ele não quer que ela seja vista por ninguém. Eu não fui contra a vontade dele, porque sei que está fazendo isso para a segurança dela. Quem sabe quando ela estiver maior, aí ninguém vai se dar conta de quem ela é, pelo menos é assim que ele pensa. Lara: Nunca que eu vou poder sair? “Quelo” sair dessa casa - Diz cruzando os braços. Emily: Mas você já saiu, amor. Tava agora mesmo na casa da sua tia. Lara: Mas só fiquei “dentlo” da casa, a gente não saiu - Fala fazendo bico - Eu “quelo” ir no parquinho. Emily: Quando a mamãe falar “não” é “não”. Aprende a me escutar! Já tô perdendo a paciência com você - Digo tirando as coisas dela da bolsa - Cê tem que entender que nem tudo que você quer, tá no nosso alcance de fazer. Cê não pode sair na rua, filha. Tem piscina lá em baixo, o seu pai comprou um mar de brinquedos pra você, tem balanço lá fora, tem bicicleta, tem tudo! Você ainda insisti em ir pra rua? Não vai. Foi só eu falar isso para o Farinha sair do banheiro e a Lara começar a chorar, ele pega ela no colo e balança. Farinha: Pô, não precisa falar assim com a garota - Diz passando a mão no cabelo dela. Emily: Mas é claro que precisa, eu já falei milhares de vezes que ela só pode brincar dentro de casa. E você não reclama, porque essas são suas ordens. Farinha: Mas não precisa falar desse jeito, porr4. Ela é uma criança ainda, quer brincar igual todo mundo, explica os bagulhos direito pra ela. Emily: Eu já expliquei, já cansei de falar pra ela que é perigos0 ir pra rua. Farinha: Mas se tu falar desse jeito, ela nunca vai entender, truta. Chega de mansinho e explica numa boa, não precisa de ignorância. Emily: Eu não fui ignorante. Farinha: Na moral, Emily. Não vou discutir contigo, parceira. Só faz o favor de pegar um biquíni pra ela, vou descer pra piscina - Fala e ela para de chorar. Vou até o quarto dela, levo as coisas que veio da Milena e pego um conjunto de biquíni. Eu simplesmente odei0 ter que ficar batend0 boca com ele por causa da Lara, é sempre assim. Entrego o biquíni para ele, o deixo trocando ela e entro para o banheiro. Coloco as mãos sob a pia de mármore e começo a ter uma crise de choro. Minha gravidez veio junto de uma bipolaridade imensa, tem hora que eu acho que estou de TPM. Eu sei que todo casal tem brigas, mas a verdade é que eu estou de saco cheio de sempre discutir com ele por causa da Lara, ela é um pingo de gente e mesmo assim, consegue mexer com tantos sentimentos que habitam aqui dentro de mim. Enxugo as lágrimas com a toalha de rosto quando escuto ele batendo na porta. Ele sabe o quanto eu estou sensível, como também tem hora que estou irritada, aborrecida, e acabo descontando um pouco nos outros. Farinha: Emily, abre aqui. Emily: Já vai - Digo fungando e abro a porta em seguida, noto que ele deixou a Lara em cima da cama e veio sozinho. Farinha: Vem cá, cara. Não falei por m4l contigo, me desculpa - Fala me puxando para um abraço e beija a minha cabeça - Coloca um biquíni também, bora tomar um banho de piscina, “vamo” bronzear um pouco o Felipe. Emily: Não gosto quando você fala daquele jeito - Digo com a cabeça afundada em seu ombro. Ele suspira e passa a mão pelo meu braço, em seguida aperta um pouco e enrola a ponta do meu cabelo com o dedo. Farinha centraliza uma das mãos na minha barriga e o bebê começa a chutar. Farinha: “Vambora” descer pra tomar um sol, coloca teu melhor biquíni e mostra pra mim que eu sou um cara sortudo por ter a mulher mais linda e gostosa do meu lado. Dou um sorriso largo e taco um beijo molhado nele. Farinha mais do que ninguém, sabe tirar um sorriso do meu rosto e levantar minha autoestima, mesmo eu estando gord4 por causa da gravidez. Ele desfaz o abraço e tira a camisa, deixando a Glock que está na cintura, escondida no quarto, fora do acesso da Lara. Troco de roupa, coloco um biquíni preto deixando o barrigão a mostra e passo protetor, tanto em mim, como no meu marido e na minha filha. Coloco um óculos de sol e descemos para a área da piscina.
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