O começo do fim

4079 Words
        Parecia que quando eu realmente havia conseguido assimilar que Spencer estava do outro lado do país, era tarde demais... As férias tinham simplesmente terminado de forma abrupta, no ano seguinte, eu que estaria indo para a faculdade, aquilo deu um nó em meu estômago, mas nem mesmo o nó foi suficiente para tirar-me da minha cama, eu não queria sair dela para quase nada desde que Spencer havia partido.          A primeira manhã de aulas tinha sido mais de conselhos e vídeos motivacionais do que de aulas e durante à tarde, todos os alunos que concluíam o high school naquele ano, reuniam-se no ginásio, para uma conversa – que era mais um discurso – do Diretor Sanderson sobre nosso ano e nosso futuro fora do Highland Hall.         “O começo do fim...” assim começara mais um emocionante discurso do diretor Sanderson à turma de Formandos daquele ano, o meu último ano. Mas eu estava ali apenas de corpo presente, encarava o grande relógio na parede no ginásio enquanto meu estômago revirava: Spencer estava naquele momento em um dos primeiros testes para titular do time da Columbia, no outro lado do país, e eu estava tão ansiosa que m*l me concentrava nas palavras do diretor. Lindsey por diversas vezes tentou chamar a minha atenção e Mia, com o olhar cansado, apenas sorriu quando em silencio, comemorei lendo a mensagem de texto de Spencer “é isso aí, consegui, obrigada pela torcida”. - Sabia que ele conseguiria – Mia abraçou-me assim que saímos do ginásio – ele é bom, mas não deixa ele saber que eu disse isso. - Eu também – e junto com a alegria, tinha um misto de medo: quem não gostaria de sair com o quarterback titular da Columbia? E então sorri – preparadas para o melhor jantar da vida de vocês? - Claro – Lindsey sorriu jogando os livros no armário – não vejo a hora – deu uns pulinhos empolgadas – e estou doía para ver a Amelie!         Havíamos combinado de ir para o apartamento de Mia e Peter depois da aula. Faríamos algumas compra e depois, pegaríamos Amelie na creche. Parecia que tanto tempo tinha passado, mas na verdade ela tinha pouco mais de um ano. Peter estava se dando bem com a agencia de marketing digital, e o home office o deixava com Amelie pela manhã, deixando-a na creche apenas durante a tarde, onde as aulas de Mia eram disciplinas optativas, o que certamente não renderia reprovação caso ela precisasse se ausentar, e durante a tarde, ele dava duro na oficina do Sr. Ivanov com o avô e Daniel.         Era engraçado como as coisas se arrumavam aos poucos na vida de todos... E a vida de Peter e Mia, entrando nos eixos, era uma agradável surpresa. Assim que chegamos e Mia foi direto dar banho em Amelie e tomar banho também, o calor do fim do verão era quase insuportável, e Los Angeles era campeã em ser a sucursal do inferno nas horas que antecediam chuvas, como previa o noticiário naquela manhã.         Cozinhava distraída quando Peter e Daniel apareceram. Desfiava frango para a lasanha, Daniel ficou na cozinha comigo, abrimos cervejas, logo as meninas voltaram com Amelie e sentia-me de alguma forma, totalmente em casa com eles, era como se fossemos uma grande família. Era fácil encarar Peter e Daniel e lembrar dos dois em frente às garagens em Hidden Hills, jogando bola com Spencer, ou nas festas, ano após ano... Após o jantar, Peter e Lindsey foram lavar a louça enquanto Mia colocava Amelie na cama, ainda tínhamos planos de jogar Monopoly, fiquei com Daniel na sala: - E ai? Como está a escola? – ele me encarou. - Ah, normal – respondi sem dar muita importância. - É complicado – ele suspirou – deve ser, eu acho... – ele riu sem jeito – sempre pensei que vocês dois não ficariam juntos, disse pro Spence que ele estava doido e tudo mais – ele riu novamente – mas aí estão vocês, quem diria. - Doideira, né? – eu ri tentando parecer descontraída. - Não tem medo? – ele franziu a testa. - Tenho – respondi de imediato, não conseguia mentir para ele – tenho muito medo e hoje – suspirei – fiquei com mais medo ainda. - E porquê? – Daniel estava me encarando confuso. - Foi aceito no time – respondi – se dentro do high school isso já é ruim... - Para – ele riu – na faculdade não é bem assim. - É pior – eu o encarei – treinamento de alto nível, academias, etc... - Certo – ele pegou minha mão – sabe que eu estou do seu lado, né? Todos estamos, então, se o Spencer fizer qualquer m***a, e sabemos que ele é quase que um especialista em fazer m***a, estaremos com você. Mas uma das coisas que eu sempre admirei em você foi a sua segurança – ele apertou meus dedos – não seja essa garotinha insegura, isso não combina com você, Mariah. - É muito bom saber disso – eu disse com sinceridade – obrigada, Dan, e eu prometo tentar não ser essa garotinha insegura, prometo! E a Martina? - Está bem – ele sorriu – queria ter vindo também, mas estava meio atolada de trabalho – ela trabalhava em um estúdio musical no centro – aí precisava entregar uns materiais amanhã, sabe como é... - Sei sim – suspirei e sabia, porque eu havia deixado meu trabalho com o papai no ano anterior, e as vezes aquilo não parecia ter sido inteligente, e em outras parecia ter sido a nossa melhor escolha.         Logo o restante da nossa família apareceu e jogamos Monopoly até perto da meia noite. Dirigi lentamente para casa, o que era h******l, afinal, não bastasse a ausência de Spencer, eu ainda precisava lidar com a comum ausência da minha mãe. Encarei as janelas escuras do chalé e suspirei profundamente, pelo menos tinha o Bud para me fazer companhia.         Dormir aquela noite foi mais difícil do que o normal e a chuva pesada durante toda a madrugada somente deixou ainda pior todas as coisas, então, quando consegui por fim criar coragem de sair da cama e me olhar no espelho, eram sete da manhã e minhas olheiras eram tão fundas que eu nem mesmo me dei ao trabalho de tentar disfarçar. Vesti jeans, all star e camiseta e parti com a expressão derrotada para o East Garden, eu ainda tinha algum trabalho a fazer no escritório, mesmo não trabalhando mais por lá, porque tinha prometido a mim mesma não deixar muitas coisas acumulando para que papai e Henry pudessem se virar, já que contratar outra pessoa estava fora de cogitação e Henry, com o fim da escoa, estava com o papai em tempo integral. - Bom dia – disse sem muita empolgação para Henry que já estava atrás do balcão com uma expressão tão terrível quanto a minha – eu peguei café pra você - indiquei a bandeja com dois expressos – acho que estou tentando melhorar nosso dia. - Thomas deu o show da madrugada – ele me abraçou apertado para depois me encarar – a Brenda estava uma pilha de nervos, tinha a prova final hoje, então fiquei com ele, quase toda a noite... Foi uma verdadeira sessão de tortura, não sei como que consegue uma criatura tão pequena ser dotada de um poder quase sobrenatural de gritos e pelos mais variados motivos – ele bocejou. - Nossa – suspirei – deve ser h******l – encarei ele – fora isso, tudo bem? - Sim, tudo bem – ele sorriu – é interessante essa coisa de paternidade – ele bocejou novamente – mas e ai? Você não tem filhos, porque está com essa cara? - Não dormi quase nada – suspirei – o chalé vazio, a chuva, minha mãe não tá... - ... o Spencer não está – ele completou sorrindo debochado. - Também – concordei. - Sabe que tudo vai ficar bem, não sabe? – ele sorriu com bondade. - Sim – sorri de volta – no fundo, eu sei sim.             A verdade era que eu não sabia de nada... Cada dia que passava o que eu mais tinha era uma imensa soma de incertezas e duvidas que se acumulavam no mesmo ritmo que as minhas atividades e tarefas. Papai entrou pela porta com Guadalupe no colo antes que eu pudesse começar o meu trabalho de preparar os documentos para o papai e Henry e logo esquecemos nossos problemas e focamos no trabalho e no revezamento para cuidar da minha irmã enquanto era o turno de Sanchez. Passei o resto daquele fim de semana no East Garden e não me arrependo, exceto pelo fato de que não deixei comida pronta para a semana, então, teria trabalho pela frente.             Spencer conversou comigo todo o fim de semana. Eu sabia que estava tudo bem, e tentei me conformar com aquilo para ver se não enlouquecia... Quando voltei ao chalé no fim do domingo, os Ivanov estavam na casa de praia e fizemos churrasco todos juntos, o que me ajudou a espantar um pouco minha solidão e meu tédio, e a semana arrastou-se lenta e irritante: as aulas não foram diferentes da primeira semana e todos os professores resolviam fazer uma breve retrospectiva de sua própria trajetória de vida, do colegial até a vida acadêmica e alguns detalhes desnecessários sobre a suas vidas pessoais, o que as vezes, fazia com que toda a turma risse, ou apenas, dormisse durante o período.             Quando a segunda feira chegou, trouxe com ela uma grande surpresa na escola: havia um aluno novo, aluno intercambista, garoto estranho – pelo menos era o que ouvíamos pelos corredores do Highland Hall, aquela manhã morna e pacata de segunda feira seria diferente. Professor Rogers foi quem nos apresentou Noah Abramsen, vindo da Noruega, e quando o rapaz entrou pela porta: pele muito clara, cabelos muito escuros, lisos e despenteados e um par de olhos azuis que pareciam fazer o coração da gente congelar. Rosto perfeitamente desenhado, bochechas rosadas e lábios avermelhados: parecia ter saído de um conto de fadas, o que me fez pensar, instantaneamente no Principe Caspian, das crônicas de Nárnia, me fazendo sorrir antes de encarar novamente o rapaz: alto, ombros largos, mas magro, apesar de parecer forte. - Olá – ele disse de maneira estranha, acenando para a turma envergonhado. - Este é o Noah, pessoal – o professor deu continuidade – ele veio da Noruega cursar o último ano conosco – e sorriu – apesar de ter concluído os estudos em seu país, ele vem com o objetivo de entrar na universidade aqui, na América, então, escolheu esse caminho, e estará participando de toda as atividades escolares, e também dos exames e das atividades extra curriculares. - Olá Noah – a turma disse em um coro quase que ensaiado, deixando-o visivelmente envergonhado.             O garoto logo procurou um lugar para sentar-se, fazendo com que toda a sala ficasse olhando fixamente para este ponto, e a semana apenas continuou com todas as atenções da escola focadas no pobre rapaz que m*l falava inglês e não conseguia, nós acreditávamos, nem mesmo ir ao banheiro totalmente em paz. No fim da manhã de quinta-feira, ele aproximou-se de mim e de Lindsey, afim de descobrir como poderia fazer para se engajar em atividades extracurriculares. - Assim, esquisito – disse Lindsey sorrindo – nós éramos do conselho estudantil, mas pularemos fora... Agora vamos nos organizar para a comissão de formatura, quem sabe. - Entendo – ele sorriu – mas o trabalho social no hospital? - Ah, esse você pode participar...             Logo deixei Lindsey e Noah conversando sobre uma alocação dele dentro dos grupos de voluntariado no St. Marry’s, afinal, o projeto continuaria, e estávamos um tanto desfalcados com a saída de Spencer, Maggie, Phil e Ming. Logo – eu tinha certeza – que Lindsey encontraria um bom lugar para alocar o garoto estranho e ele poderia fazer um bom trabalho e ter sua chance de ser bem avaliado pelos recrutadores. - Noah é legal – Lindsey disse assim que nos encontramos novamente na aula de química – ele é esquisitinho, mas é uma graça...             Não deixamos que Noah se tornasse nosso assunto favorito e nos concentramos na aula, afinal, laboratório não era o meu local favorito e eu vivia morrendo de medo de, literalmente, colocar fogo em todas as coisas ao meu redor.             Os professores começaram a passar um pente fino nos alunos logo na primeira semana, avaliar quem era mais preparado, quem tinha mais potencial, quem teria uma boa indicação e reais chances de admissão nas maiores Universidades. Eu fui chamada na quinta feira pela manhã, diretamente na sala do Diretor Sanderson: - Bom dia Mariah – ele suspirou – sente-se, minha querida. - Bom dia – sentei e o encarei – tudo certo? - Ah, sim – ele franzia a testa – tudo certo sim... Eu estava aqui analisando as suas notas, os seus rascunhos, suas atividades extra. - Ah – entendi do que se tratava. - Me diga, você preencheu muitos formulários? – ele perguntou-me. - Para ser sincera, ainda não preenchi nenhum – grunhi sentindo-me derrotada. - Tudo bem – ele sorriu – e porquê? - Não sabia quais eu deveria preencher. - Certo – ele suspirou – chamei você aqui, não que eu costume fazer isso, não mais – ele sorriu – mas a professora Jones tem um método estressante, ela faz os alunos inscreverem-se para todas e bem, eu não acho que seja necessário... Precisamos ser assertivos. - Certo – sorri, mas ainda estava confusa. - Você tem cartas de recomendação – ele largou papéis sobre a mesa. - Cartas de recomendação? – eu não sabia sobre aquilo. - Sim – o professor sorriu – uma é de um grande amigo, Dr. Collins, chefe do departamento de pediatria do St. Marry’s – ele sorriu – muito promissor, indicação para Harvard, aparentemente tem feito um bom trabalho no hospital, aqui consta que além de coordenar todas as atividades dos grupos de voluntariado tem se mostrado boa mediadora de conflitos e com um excelente senso de justiça – ele sorriu – ótimas palavras. - Nossa, eu não sabia que o Dr. Collins... - Cria de Harvard... Mas Dra. Lawrence te indicou para Stanford também – ele sorriu – eu ficaria em dúvidas, é claro, mas tem dois formulários para preencher. - Certo – sorri. - Vai tentar a Columbia também, eu imagino – ele afirmou – e algo mais perto? - Não – sacudi a cabeça – a Columbia sim, mas a distância não é um problema. - Perfeito – ele sorriu – sua última carta de indicação até o momento, é para Harvard, ela é minha, então, guarde essa informação em sigilo. Não costumo redigir cartas de recomendação, o que já torna um diferencial – ele parecia orgulhoso. - Ah, muito obrigada, diretor... - Não me agradeça – ele me encarou sério – preencha os formulários e quero rascunhos da sua carta de apresentação aqui nesta minha mesa, até a semana que vem. - Sim senhor – eu sorria sem parar. - E agora, chame a senhorita Kane, quero trocar algumas palavras com ela também.             Corri o mais rápido que pude para encontrar com Lindsey, e assim que ela correu para a sala do diretor, eu corri o mais rápido que pude até... Bem, era até o banheiro, para dar gritinhos de alegria, mas acabei parando antes, esbarrando em alguém... Noah Abramsen. - Cuidado ai – ele riu – se machucou? - Não – eu ri – ai, desculpa, você se machucou, Noah? – perguntei sem jeito. - Não – ele abaixou-se para juntar a minha mochila que eu havia derrubado – isso é seu. - Obrigada - disse sorrindo – e sinto muito por isso. - Tudo bem – ele respondeu – acho que você estava bem empolgada. - Um pouco – percebi que ele queria conversar. - Não conversamos direito – ele disse e caminhou ao meu encontro – sei pouco sobre você. - Ah – eu fiquei sem jeito, aquele garoto com aqueles dois olhos azuis me encarando era esquisitamente bom – não tem muito para saber... - Claro que sim – ele riu – até onde eu sei, você é um dos grandes projetos do ano... - Quem disse isso? – eu perguntei rindo. - O diretor, me aconselhou a conversar com “pessoas com grande potencial” - Nossa, estou lisonjeada... – eu estava era desconcertada, era mais uma pessoa que eu poderia decepcionar, não saberia lidar com aquilo – o que pretende fazer? - Engenharia Espacial – ele respondeu animado – tenho uma carta de recomendação para Harvard, do meu professor de física do ensino médio, era americano, formado lá. - Nossa – pensei que então, ele tinha duas cartas de recomendação, porque era óbvio que o diretor escreveria uma também – que incrível. - Soube que o MIT poderia ser melhor, mas enfim, tentarei os dois, da mesma forma... Quer tomar um café depois da aula? – ele perguntou despretensioso – Ai podemos conversar...             Fomos interrompidos pela furação Lindsey, porque se alguém tinha um futuro certo, esse alguém era minha amiga, futura médica, que chegou gritando: - Collins escreveu uma carta, ai meu Deus... A Lawrence não escreveu – ela deu ombros – mas enfim, tenho chances... - Para onde? – perguntei animada, pensando ser para Harvard. - Universidade da Califórinia – ele respondeu e me encarou – não posso ir para tão longe, sou apegada demais aos meus pais - sabia que eu tinha pensando em Harvard. - Parrabéns – Noah disse empolgado. - Obrigada, obrigada...             Não respondi a Noah sobre o café, apenas seguimos para a sala de aula e continuamos com todas as coisas que tínhamos pela frente. Um grande alívio era saber que eu não precisava mais frequentar os jogos de football, isso me deixava com mais tempo livre, e tempo era uma coisa que eu estava realmente precisando nos últimos tempos... Sai da escola distraída em direção ao meu carro, e encontrei Noah parado ao lado dele: - Você não respondeu – ele disse rindo. - Tudo bem – eu respondi – sobe aí, vamos tomar um café.             Levei Noah para o Santa Barbara’s e em pouco mais de dez minutos, acho que contei tanto sobre minha vida que ele poderia escrever minha biografia. Ele falou muito sobre a vida dele também, sobre os planos e sobre ter vindo para a América: - ... então, basicamente – ele dizia – minha mãe ficou comigo por dois anos, e casou com esse cara – ele revirou os olhos – e ai eu percebi que não tinha como continuar com ela – ele havia vivido com o pai, até ele casar-se também depois da separação – é como se as coisas não funcionassem mais. - Entendo você perfeitamente – eu disse. - Então meu professor teve esse ideia, e eu gostei – ele disse – achei que mudar poderia ser bom, para o meu futuro profissional e para minha cabeça também. - Às vezes é a melhor opção – respondi, eu mesma tinha pensado parecido horas antes, quando disse ao diretor que distancia não era o problema.             Me despedi de Noah depois de deixa-lo em frente ao prédio onde ele estava morando com uma família americana, essa coisa de intercâmbio era interessante, porque eu nunca tinha pensado nisso? Logo lembrei-me que eu nunca tinha pensado, porque minha realidade era muito distante daquilo tudo até pouco tempo atrás, e que meu pai, provavelmente, teria dito que não, independente da mamãe cobrir sozinha os custos ou não.             Quando finalmente cheguei em casa, percebi que estava ansiosa para contar as novidades para a minha mãe, então preparei o jantar e esperei por ela pacientemente, e assim que ela entrou pela porta, comecei a andar atrás dela e falar sem parar sobre minhas cartas de recomendação e minhas dúvidas, e minhas cartas de apresentação e meus planos, ela apenas sorria orgulhosa e dizia que a decisão final seria minha e que eu não me preocupasse com nada, a não ser com estudar e conseguir entrar.             Quando eu falei com Spencer, à noite, precisei falar que tinha cartas de recomendação e que nenhuma era para a Columbia, ele pareceu desanimado, mas disse que muitos alunos entravam apenas com suas boas notas e excelentes cartas de apresentação, então eu sabia que precisava fazer um excelente trabalho nas minhas cartas. Acabei preenchendo os formulários de inscrição para Harvard, Stanford, Columbia, Universidade da Califórnia e Duke, acabei preenchendo para Duke apenas por saberem que o processo era difícil, queria tirar uma febre do poder das minhas notas e das minhas cartas de apresentação.             Minha mãe pareceu satisfeita de não pagar por quinze taxas de inscrição, então, eu tinha cinco boas opções, de toda forma... Quase não consegui dormir, estava tão ansiosa que não conseguia fechar os meus olhos, e quando o despertador tocou na manhã de sexta-feira, mais cedo do que o normal, porque eu queria pegar documentos na secretaria para enviar para as universidades, eu me sentia como um zumbi. - Preciso de café – foi tudo o que eu disse quando desci as escadas, mas disse para o vazio, logo percebi que minha mãe não estava, precisei fazer meu próprio café...             Essa parte c***l deve ser importante também quando crescemos: fazer o próprio café, fritar bacon ao invés de apenas comer cereal com leite, escolher o pão integral no supermercado ou deixar de gostar de creme de avelã no pão e passar a usar geleias coloridas... Eu não gostava de geleias, até ir morar com a mamãe, ela tinha essa mania de geleias artesanais, de todas as coisas, e eu experimentava todas, e descobri que eu gostava.             Dirigi para a escola pensando em como eu tinha mudado nos últimos anos, e não deixei de me perguntar como eu estaria depois de um ano, como seria minha vida quando que chegasse à faculdade, pensar em faculdade fez minha ansiedade voltar e eu logo estava uma pilha de nervos novamente, o que não deixou eu me concentrar direito nas minhas aulas, fazendo com que eu me sentisse culpada depois, essa era a minha vida, eu sempre tinha alguma outra coisa para sentir, nada vinha sozinho, e aquilo lembrou-me que eu teria terapia na manhã de sábado.             É lógico que eu estava gostando de ir à terapia, fazia com que eu me sentisse bem, e agora com Spencer fora, era como uma “zona livre” para falar sobre o que eu sentia sem ser julgada – principalmente como dramática... Às vezes eu acho que minha mão nunca teve a minha idade, e meu terapeuta, Mark Doller, era um cara peculiar, era muito fácil falar com ele, era como se eu estivesse conversando com o meu irmão mais velho.              O final da sexta feira foi dedicado a meus rascunhos de carta de apresentação. Eu m*l sabia por onde começar, então levei um tempo para colocar as primeiras linhas em um papel, mas parava sempre no fim do primeiro parágrafo e dali em diante, não sabia mais o que escrever, o que era engraçado, considerando que eu conseguia pensar no que falar em uma entrevista, mas escolher as palavras certas para colocar em um papel timbrado e assinar, isso parecia formal demais, assustador demais e principalmente, difícil demais.             No sábado pela manhã, bem cedo, eu resolvi que precisava ir correr na praia, isso me fazia bem, era como se todas as minhas dúvidas, medos e receios fossem filtrados pelo cheiro de maresia e pela areia, voltei para casa me sentindo muito melhor, tão melhor que depois de um banho, com um pouquinho de dedicação e tempo, consegui terminar de formular ao menos um rascunho de carta, então, eu não era um total fracasso, poderia trabalhar nisso durante o domingo também.             Dirigi até o centro para a minha sessão de terapia, Mark repetia diversas vezes que eu me sobrecarregava, mas naquele dia, quando disse que tinha ido correr e que me sentia melhor, ele apenas suspirou orgulhoso “é disso que eu falo, descarregar”, então eu me senti orgulhosa, eu tinha realmente feito alguma coisa boa pela minha saúde mental naquele sábado, e dei continuidade ao projeto das cartas de apresentação quando voltei, pelo menos até Lindsey chegar e bem, consegui algumas coisas interessantes para levar para o Sanderson.
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