CHRISTIAN
Hoje acordei mais cedo que o normal, pois recebi um chamado, visto meu uniforme rapidamente, pego o carro e ando em direção ao endereço que era a BR 460, chegando lá vejo que se trata de um acidente de carro.
— O que aconteceu Capitão? — pergunto ao meu superior.
— Acidente de carro, duas vítimas que morreram com o impacto, os corpos ficaram irreconhecíveis — responde ele com pesares.
— Tudo bem — vou em direção aos destroços para tirar os restos dos corpos das ferragens e quando estava terminando, eu encontro uma bolsa de uma das vítimas um pouco familiar.
— Capitão!
— Pois não, Tenente Carter? — ele vem ao meu encontro.
— Achei isso, pode ser de uma das vítimas.
— Obrigado, irei entregar para a perícia, qualquer coisa eu te aviso.
— Tá bom — volto para o meu trabalho com o coração um pouco acelerado e um sentimento diferente, não dou bola para terminar o quanto antes.
— Bom trabalho pessoal, agora é com a polícia — falo tirando minhas luvas e pego uma garrafinha de água. Encosto-me à viatura enquanto me refresco com a água fresca.
— Vai agora tenente? — pergunta meus companheiros de equipe.
— Sim, eu já estou indo — ando em direção ao carro, mas antes de conseguir abrir a porta, o capitão me chama.
— Tenente Carter?
— Senhor?
— Descobrimos a quem os corpos pertencem — ele fala com calma.
— Quem são? — falo com um bolo na garganta. Um sentimento estranho fez meu estômago se embrulhar.
— Eu sinto muito pelo que aconteceu, a mulher é Lara Dumont Carter e Maia Santos Olivares — ao ouvir essas palavras saindo da boca dele, fico sem reação por alguns segundos.
— O senhor está brincando, né? — falo com lágrimas nos olhos.
— Eu sinto muito Christian, mas infelizmente foi o que aconteceu — ele segura no meu ombro em forma de consolo, mas a única coisa que passa na minha cabeça e anos de felicidade que eu tive ao lado da minha esposa Lara.
— Eu tirei os restos do corpo da minha esposa daquele carro! — grito passando as mãos pela cabeça e começo a chorar como uma criança desesperada.
“Por quê? Por que isso teve que acontecer? Logo com ela! Com a gente!”
Bato com força na janela do carro e os vidros se quebram, machucando minha mão. Tudo perdeu o sentido, eu ouvia vozes tentando me acalmar, mas dentro de mim um furacão me impedia de entender aquelas palavras. Passei o olho pelo local, aquele carro prata todo destroçado, como não reconheci o carro da sua melhor amiga? Como fui tão ingênuo? Meu chão se desfez e me vi caindo de joelhos, minha garganta se fechou e meu coração bateu mais forte do que o normal. Senti como se estivesse tendo um ataque cardíaco e minha vista embaçou. Senti braços fortes me pegando pelo braço, não consegui me manter em pé, minhas pernas estavam fracas e me vi sendo levado para o carro.
Tudo que aconteceu daí em diante foi puro reflexo, Jackson dirigindo enquanto tentava falar comigo, meu corpo tombado no banco do carona, eu passava os olhos pelo movimento do lado de fora do veículo, mas tudo era diferente pra mim, eu olhava sem ver, ouvia sem ouvir, respirava, mas sentia que a vida já não fazia parte de mim. Eu estava parcialmente morto.
Minha vida acabou assim que o nome da minha esposa foi proferido na boca do Capitão.
UM MÊS DEPOIS
— Tenente — Jackson me chama.
— Oi. – respondo sem levantar o olhar dos meus afazeres.
— Hoje é sexta-feira, vamos a um churrasco, tá a fim de ir?
— Não — continuo arrumando as minhas coisas no escritório.
— Por que Christian? Você tem que sair um pouco, precisa viver! Tenho certeza de que a Lara não ia gostar de te ver assim.
— Escuta Jackson – me virei para ele com o cenho franzido -, cuida da tua vida que eu cuido da minha, eu sei o que estou fazendo — pego as chaves do meu carro, junto com a mochila e saí do quartel.
— Desculpe, só queria te ajudar, desse jeito você vai afundar no fundo do poço.
Quando chego ao local que eu deveria chamar de casa subo para o quarto, troco de roupa, pego minha arma que estava no closet carrego com apenas uma bala, depois pego uma fotografia minha e de minha esposa que tiramos no dia do pedido de namoro, e saio de casa mais uma vez. Eu não conseguia ficar ali, não com as lembranças dela por todo lado, não com o cheiro dela nos travesseiros, com o toque dela nas mobílias e de como ela arrumava a casa. Tudo estava do mesmo jeito que ela havia deixado, não ousei a tirar uma agulha sequer do lugar. Tudo aquilo era dela. E tudo aquilo estava me deixando louco.
O peso de tudo isso estava me tirando a paz, não consigo dormir, o pesadelo de tirar o corpo destroçado da minha esposa do carro me atormentava toda noite. Aquela visão, dos corpos, o sangue por todo lado daqueles destroços. O tempo não estava fechado apenas lá fora, mas dentro de mim também e não tardou para a chuva chegar. A água batia com força no carro, o tempo deixou o clima mais carregado do que já estava para mim.
Estaciono o carro num local mais afastado, pego a arma que estava no painel e o destravo e levo em direção a minha cabeça. Eu queria que aquela dor parasse que aquele pesadelo chegasse ao fim. Eu queria parar de sentir tudo aquilo, quando fui apertar o gatilho ouvi gritos desesperados.
Por instinto desço do veículo com a arma em punho e a chuva me encharcou em segundos. Olhei em volta, uma silhueta feminina corria em minha direção.
— Ai meu Deus, socorro! Alguém me ajuda! – ela grita.