-Exatamente – Concordou Safar – vá para trás do tablado enquanto ninguém ainda está presente.
Tristan apenas passou pela mulher e foi em direção a porta. Quando Eurípedes apareceu ao seu lado. Começaram a andar tendo os sinos marcando os passos até o tablado. Seus pés descalços tocaram a madeira fria do degrau e logo estava em cima dele. Ninguém a vista.
Andou pelo tablado até as cortinas para no fundo. Olhou para trás e viu Eurípedes parado o observando passar pelas cortinas. Do outro lado era pequeno, mas acomodava as cinco mulheres vestindo verde claro. Brumália sorriu ao vê-lo. Calídece arrumava o lenço em rosto, mas o cumprimentou com um aceno assim como Alethea sentada em um banquinho. Agatha entrou atrás passando por ele e sorrindo.
-Está lindo – Exclamou Alethea surpresa – não esperava que ficaria tão bonito de azul celeste.
-Acho que dessa vez não teremos maldições – Murmurou Calídece agradecendo em silencio.
-Estou nervoso – Contou Tristan percebendo sua mão tremer – acho que não é uma boa...
Sua boca foi tampada com certa agressividade por Brumália que levou seu indicador aos lábios pedindo silencio. Agatha foi até a cortina e espiou alguma coisa. Alethea puxou sua mão para que entrasse mais nos bastidores. Sentaram-se no em um banco e Tristan pode ter usa boca livre.
-Nunca diga isso em voz alta – Repreendeu Calídece tensa – nunca, entendeu?
-A outra dançarina disse a mesma coisa e foi queimada inteira – Lembrou Brumália – os Deuses não gostam daqueles que se prontificam para fazer algo e se acovardam no final.
-Eu nunca me prontifiquei para isso – Falou Tristan sério.
-Mas vai fazer – Retrucou Agatha voltando a ficar mais perto – não queremos má sorte hoje, ouvi que teremos mais clientes hoje.
-O que vamos apresentar? A Senhora nunca nos mandou fazer algo tão em cima da hora – Murmurou Calídece preocupada.
-As mulheres que vieram com a Senhora Safar me perguntaram se eu sabia apresentar uma dança em homenagem a Poseidon – Lembrou Tristan prestativo – vocês sabem?
-Homenagem a Poseidon? – Perguntou Alethea confusa – que estranho.
-Por quê? – Perguntou Tristan – é um uma divindade.
-Normalmente homenageamos Zeus – Explicou Agatha pensativa – uma homenagem a outra divindade poderia ser visto como desafio.
-Será por causa de Epires? – Sugeriu Calídece – ele não nasceu no Litoral de Vênus? Tem o maior templo a Poseidon dentre todas as pólis.
-Um claro desafio a Epires – Entendeu Brumália sorrindo com maldade – a Senhora é mais diabólica do que eu imaginava, a cada dia fico ainda mais surpresa.
-Eu sou o único que não entendeu? Já ouvi sobre guerras e Deuses, agora estão dando a entender que homenagear outra divindade é muito perigoso? Tudo nessa época é perigoso? – Questionou Tristan ainda mais confuso – quanto mais me explicam mais confuso fico, não digam nada.
-Acho que realmente está estressado, sabe o que pode te ajudar? –Falou Donatília entrando pela cortina lateral com uma garrafa – um pouco de álcool.
-Dona nossa salvadora – Comemorou Alethea esticando as mãos para a garrafa já destampada – vinho!
-Peguei emprestado – Contou Donatília – você está lindo Trista.
-Trista? – Exclamou Alethea entregando a garrafa para Agatha – já está dando um apelido?
-A senhora o nomeou assim – Explicou Donatília – e agora seu nome é esse.
-Então quer dizer que você ficará conosco – Comemorou Brumália – estou feliz.
-A Senhora me disse que depois de hoje me soltaria – Lembrou Tristan sentindo seu estomago se contorcer com os olhares das mulheres – fui enganado de novo, não é?
-Quando o seu dono te dá outro nome passa a ter ainda mais domínio sobre você, ou seja, se ela te registrar como Trista você será dela – Falou Brumália – mas então você ficará conosco.
-Não – Sussurrou Tristan sem ar.
Não agora. A sensação de ter algo esmagando seu pulmão, mas sem a possibilidade de falar o fez paralisar. Seu futuro iria ser ali? Jamais. Respirou fundo, mas a sensação continuou. A garrafa redonda apareceu, sem pensar duas vezes Tristan agarrou o objeto e o virou garganta abaixo. Brumália tentou pará-lo, mas ele virou o rosto engolindo mais. Afastou o gargalo já sentindo aquilo cair certeiro em sua lucidez.
-Não deveria beber assim – Repreendeu Calídece segurando o riso.
-Tristan quantos dedos você vê? – Perguntou Agatha fazendo o número dois com os dedos em frente ao jovem
-Dois – Respondeu Tristan revirando os olhos – não estou bêbado.
-Isso e bom – Murmurou Alethea olhando pela cortina – a Senhora já está recebendo os clientes ávidos, Eurípedes acabou de segurar um que vinha na nossa direção.
-Eu não faço ideia do que estou fazendo, sinto que estou apenas seguindo o fluxo sem ter real sentido – Desabafou Tristan – queria saber o que posso fazer para voltar para casa, só queria ver uma vidente que me dissesse como voltar.
Sem aviso Tristan começou a fungar. Se chorasse borraria a maquiagem e isso poderia acarretar punição para si e para aquelas mulheres que seriam tachadas de inaptas para o trabalho. Donatília se ajoelhou diante dele e segurou suas mãos.
-Está tudo bem – Tranquilizou Donatília sem jeito – por ora está tudo bem, não sei daqui a alguns minutos ou horas, ou até amanhã, mas nesse exato momento tudo está bem, você está seguro.
Palavras calmas em um momento de pânico. Seu coração pareceu entender e começou a se acalmar. Sentiu suas mãos serem apertadas com mais força. Relaxou o corpo e concordou com a cabeça. Levou a mão ao lenço e o tirou um pouco da boca. De repente um tambor o fez tencionar a coluna. Todas se posicionaram em pé um pouco apreensivas. Estava começando?
-Tristan você é o principal, então todos os olhos estarão em você – Avisou Alethea colocando o lenço no rosto em uma tiara simples nos cabelos.
Vendo as se arrumando rapidamente desfez aquela calmaria. Então tudo desapareceu.
Seu corpo se aqueceu rapidamente. Sua visão embaçou. Mordeu o lábio sentindo o sabor amargo de algo entrando sua garganta. Algo agarrou seu braço e o puxou para além das cortinas que apenas sentiu o leve toque delas. Então foi praticamente jogado e a sua volta estavam as mulheres com os lenços para cima, quase em uma pose de uma coreografia do Youtube. Aquilo o fez sorrir.
Não conseguia olhar nada além da luz a sua frente. A luz vinha de algum lugar que escurecia o além delas. Não havia ninguém. Sua mente estava em paz. Ao primeiro som do tambor seu corpo se moveu.
“Deverá ser mais ondulatória e vibrante”
Seu quadril se mexeu sozinho ao som duro do tambor. Ao longe a melodia o abraçava e o convidava para dançar. Seus braços se levantavam e alcançavam o céu. O álcool estava em suas veias queimando as e fazendo seus movimentos mais fortes, mas ao mesmo tempo suaves. Seu abdômen ondulava a medida que ele começou a rodar.
As mulheres faziam quase um solo ao seu lado sempre vibrando os lenços sobre ele quando então elas sumiram e ele não percebeu. A tristeza voltou como uma onda cobrindo sua performance de sentimento. Os sinos lhe lembravam o sinalizar do fim do almoço na faculdade. A luz artificial das lâmpadas da biblioteca que passava horas atrás de respostas que nem a internet conhecia.
A saudade de casa ditava seus movimentos a medidas que o ritmo era impulsionado pela percussão que parecia mais animada com o que via. Tristan se entregou de corpo e alma ao que o seu corpo sentia, a cada nota e melodia, a cada sensação que seus pés tinham na madeira e da velocidade que seu quadril se movimentada.
As mulheres voltaram e ficaram duas de um lado e três do outro. Tristan não pensava apenas movimentava o corpo. Ele pegou o quadril para frente e foi imitado pelas mulheres.
Ele se pós a frente e como um rio começou a mover o corpo com mais lentidão quase de proposito o ritmo tornou se quente. Suas mãos foram para seu corpo o tocando no quadril e cintura. Os braceletes que refletiam a luz advinda de algum lugar soaram com os sinos e pingentes coloridos. Ele levantou a perna mostrando sua coxa ao público.
Cruzou os braços acima da cabeça e começou a mexer as pernas quase como se andasse parado. Virou se para as mulheres que pareceram entender a situação em que o jovem se encontrava e o cobriram com os lenços a fim de levá-lo para atrás das cortinas, porém Tristan não havia terminado. Livrou se das mulheres e com os lenços jogados sobre seus ombros. Ele começou a andar com imponência até o meio.
-Onde ele está? – Murmurou Brumália preocupada quando sentiu um puxão na sua saia a fazendo vira-se para o jovem.
-Onde estamos? – Perguntou Tristan curioso levantando o rosto para o céu noturno.
Salpicado de estrelas. Milhares de pontos brilhantes no céu. Era belo demais para ficar apenas olhando. Tristan levantou a mão como se pudesse tocar as estrelas, como se por força de vontade pudesse desejar voltar para casa. Seu corpo estava cansado. Sua mente estava cansada. De repente alguém bloqueou sua visão. Ia pedir para que quem quer que fosse saísse, mas os olhos castanhos o fizeram sorrir.
-Heleno? Como me encontrou? – Questionou Tristan embaixo do tecido azul celeste.
Brumália foi até a porta para vigiar enquanto Heleno cumprimentava o amigo. Sentou se ao seu lado e avaliou as vestias do outro.
-Epires me mandou ir a todas as casas de entretenimento dessa cidade, não sabia que existiam tantas, se eu te encontrasse deveria pagar a quantia para tê-lo mais perto e explicar o plano – Respondeu Heleno percebendo o arquear das sobrancelhas do outro – você pintou os olhos?
-Qual é o plano? E sim pintaram, disseram que era para dar um ar de mistério e profundidade, mas sei lá deve ter funcionado – Falou Tristan suspirando ainda grogue.
-O dia da Primavera será daqui a alguns dias, no dia você irá sair... – Contou Heleno calmamente.
-Isso eu já sei – Interrompeu Tristan impaciente – me conte como eu vou sair daqui para o dia da primavera.
-Que impaciência – Exclamou Heleno contrariado – enfim já cuidei disso, aquela senhorita vai nos ajudar, vou pagá-la para isso.
-Como? – Perguntou Tristan curioso inclinando a cabeça na direção do outro e tendo as joias refletindo a luz das velas.
-Não posso dizer ainda – Disse Heleno superior.
-Você ainda não sabe, não é? – Brincou Tristan suspirando.
-Desculpa – Murmurou Heleno de repente fazendo o outro encará-la confuso – eu vi alguém sendo levado durante a noite, digo agora eu sei que estava sendo levado, mas não dei importância, se eu tivesse ido atrás talvez todo esse problema não se iniciaria.
-Problema? Que problema? – Questionou Tristan preocupado com o que não sabia.
-Você é de Epires, sua propriedade, ou seja, ninguém além dele tem o direito de tocá-lo, mas o Senador o fez e se Epires quiser pode pedir ao Imperador uma resposta a esse crime de roubo – Explicou Heleno tenso – e isso começaria uma guerra.
-Vou ignorar o modo como falou pela minha sanidade mental, mas preciso voltar se a Senhora descobri que estou aqui ela vai me degolar – Disse Tristan ríspido se levantando e arrumando a saia azul celeste.
-Cuidado – Avisou Heleno vendo o jovem parar á porta - o modo como dançou parecia algo vindo do próprio Olimpo e nós sabemos quem vive lá e pode causar muitos problemas.
-Não é como se Zeus fosse vir aqui – Retrucou Tristan antes de sair em direção a Brumália que lhe deu uma piscadinha.
-Procure no dia da Primavera alguém vestindo verde esmeralda em frente a este estabelecimento – Lembrou Brumália antes de entrar atrás do jovem – temos que ser rápidos, não queremos que ninguém desconfie...
Eurípedes apareceu das sombras para acompanhá-lo até a Senhora sentada na maior almofada com Calídece e Alethea vestindo lenços esverdeados. Os olhares recaiam sobre si e o sorriso da Senhora era deslumbrante. Ela havia ganhado muito dinheiro e não desistiria da sua mina de ouro assim tão fácil.
Tristan caminhava de vagar encarando Alethea para não cair, Eurípedes afastava as mãos dos clientes sedentos para que o outro conseguisse andar. O fato de ninguém poder tocá-lo o deixava ainda mais cobiçado. Chegou em frente à Senhora e fez uma reverencia com o tilintar dos pingentes na tiara. Seus olhos a encararam e ela abriu um espaço ao seu lado. Um leve empurrão e Tristan estava sentando-se ali com as pernas de lado.
-Meus caros convidados – Exclamou a Senhora colocando sua mão no ombro do jovem – devo agradecer a presença de todos essa noite, agora aproveitem do temos de melhor, música!
Tristan podia sentir sua pele queimar com os olhares. O álcool em suas veias o acalmava para não perguntar se alguém ali havia perdido algo quando olhando em volta focou em alguém. Ele tinha olhos prateados e uma taça perto dos lábios. O homem estava no fundo e havia outras mulheres desconhecidas por si a sua volta. Ele jogou moedas em uma almofada e as mulheres as recolheram rapidamente, mas ele parecia irritado com alguma coisa. Bufando Tristan interrompeu o olhar para o que tinha a sua frente. Uma bandeja com taças e frutas, além de pão e doces.
-Coma – Ordenou a Senhora sem olhá-lo apenas sorrindo para qualquer um que olhasse em sua direção.
Estando com fome e cansado o rapaz esticou a mão para uma uva e a trouxe para a boca, mas lembrou no último segundo do lenço. Impaciente desprendeu a ponta do da coroa em sua cabeça o deixando cair parando na altura de sua barriga. Colocou a uva na boca e mordeu. Mastigou lentamente apreciando a acidez adocicada da fruta.
Eles gostam mesmo de uvas, pensou sorrindo para si mesmo. Sentiu algo em seu pé e encarou Brumália com os lábios comprimidos e o lenço no rosto. Encarou a Senhora que não tinha o mesmo sorriso satisfeito no rosto, na verdade era um sorriso de quem teve uma ideia que não necessariamente te fará bem.
Ela levou a mão até sua tiara e tirou o lenço azul leste do seu rosto. De coroa ele franziu a testa confuso pegando outra uva e levando a boca que foi recebida pelos lábios quando encarou a frente. Todos o observavam. Engolindo em seco o jovem colocou os lábios na uva e a mordeu afastando se dela com lentidão e sorrindo ao abaixar o rosto. Ter uma sensação de poder naquela situação era por causa do álcool só podia.
Sem aviso a Senhora segurou seu queixo. Em pânico Tristan colocou as mãos na almofada quase de joelhos para não cair. Ela sorriu com superioridade logo o soltando. Em uma almofada um pouco longe a Senhora Safar bebericava seu vinho e conversando baixo com as mulheres que ela havia trazido. Como não parecia que nada aconteceria Tristan resolveu conversar com Brumália que havia tirado o lenço também.
-Brumália – Chamou Tristan tendo os olhos castanhos da mulher focarem em si – acho que o efeito do álcool passou.
-É diferente, aquele vinho na verdade era uma espécie de bebida diferente, mas chamamos de vinho, é uma rápida sabe? Bate e vai embora –Explicou Brumália enlaçando o braço alheio com o seu sem se importar com o pó dourado no corpo – não está com dor de cabeça? O ar noturno ajuda bastante, mas amanhã vai acordar podre.
-Não vale a pena beber isso – Resmungou Tristan provocando risadas na mulher – é sério! Estou enjoado.
-Na verdade te deu coragem para dançar hoje – Retrucou Brumália se aproximando ainda mais do outro – está vendo todos esses clientes? Tem mais homens hoje do que deveria, todos aqui queriam te ver, aprece estranho ter tantas pessoas sendo que apenas 1 dia de diferença com o Senador, mas as notícias voam muito rápido.
-E se ele aparecer? – Perguntou Tristan preocupado vendo a amiga pegar uma uva e oferecer.
-Ele não vai – Tranquilizou Brumália vendo o amigo aceitar a uva – mesmo que aparecesse, você é conhecido como Trista e não Tristan, parece pouca cosia, mas ninguém aqui vai dizer que são a mesma pessoa.
-Nem as que me viram? – Perguntou Tristan oferecendo uma uva para Brumália que aceitou mastigando a.
-Não se preocupe – Falou a Senhora calmamente atraindo a atenção dos dois que sorriram amarelo – você é meu agora.
Tristan balançou a cabeça concordando apenas para voltar aos cochichos com a outra que não voltou a encarar a Senhora durante toda a noite. Tristan espiava os convidados rapidamente e percebia que o mesmo de olhos prateado ainda o encarava. Aquilo estava ficando deveras estranho.
-Senhora – Cumprimentou uma voz atraindo a atenção de todos.
Tristan levantou seus olhos para o estranho a sua frente. Alto devido ao ângulo que o via. Olhos prateados. Era o estranho que ficava observando o. a Senhora por outro lado o avaliou e sorriu.
-Olá, estou muito feliz que tenha vindo esta noite – Falou ela como se realmente o conhecesse – está aproveitando?
-Estou gastando uma fortuna então acho que você o está aproveitando – Retrucou ele sorrindo sugestivo para a mulher que concordou colocando o leque em frente ao rosto como se estivesse com vergonha – e quem seria este exímio dançarino?
-Este é Trista – Apresentou ela orgulhosa colocando sua mão sobre os cachos do jovem que franziu o cenho desconfortável – o adquiri a pouco tempo, mas me rendeu sua presença então me valeu cada centavo.
-Agradecido pelo elogio, mas ele está disponível? – Disse o homem passando seus olhos prateados sobre o jovem desejo – é o mais belo que já vi.
-Infelizmente não – Negou ela superior – ele é precioso demais para ser usado dessa maneira.
-Nem por uma quantia substancial? – Perguntou ele apontando para um baú onde estava se sentando – ou mais é claro.
-Não estou em sentindo bem – Murmurou Tristan enjoado de repente.
-Está voltando – Explicou Brumália preocupada – estranho, não deveria ter uma segunda onda de enjoos, Senhora, desculpe, mas Trista não está se sentindo bem, com licença.
Brumália se levantou se se importar em como sua saia estava um pouco amassada. Agarrou o braço do jovem e o levantou. O som melodioso dos sinos presos ao seu corpo o acompanhou até o quarto das mulheres sendo escoltados de perto por Eurípedes.
Tudo rodava de maneira absurda. Nada tinha uma forma verdadeira. As pontas se esticavam tentando se soltar da original. O caminho se mexia como uma cobra sob seus pés. Paredes se moviam para lá e para cá sem saberem qual direção tomar assim como seu senso de equilíbrio destruído por alguns goles de um líquido estranho.
De repente Epires surgiu a sua frente e diferente de tudo até ali ele não se movia, estava perfeitamente imóvel e com os detalhes bem-marcados o encarando satisfeito. Algo macio o envolveu e tudo o que realmente se lembrava era de Epires se agachando ao seu lado.
-Você é meu – Falou Epires de forma firme acariciando a face do desfalecido no colchão – volte para mim.
Ele odiava aquilo de perder a consciência. Havia alguém em algum lugar com poder para isso que estava rindo dele ou melhor gargalhando, apostando alto para ver qual seria próxima vez que o mandaria para a inconsciência.
A luz o acordou sem delicadeza como um castigo pela noite anterior. Virou se na cama e cobriu a cabeça com o travesseiro macio. Passos muito próximos o irritavam. Sua cabeça doía como inferno e apenas o lampejo de luz ao levantar um pouco o travesseiro o acertou como uma marreta.
-Trista – Sussurrou uma voz conhecida – alguém fecha as cortinas? Obrigada, você precisa comer, vai ajudar com a ressaca.
-Arg – Grunhiu Tristan levantando o travesseiro e percebendo uma maravilhosa escuridão.
-Leite de c***a ajuda muito – Contou Brumália mantendo o tom de voz baixo quase não passando de um sussurro ao mostrar para o outro um copo – beba tudo.
-Obrigada – Murmurou Tristan tirando o travesseiro do rosto e sentando se como podia vendo tudo continuar rodando um pouco.
Agarrou o copo e bebeu um pouco. Não tinha um sabor diferente do leite de vaca, apenas mais suave, quase tímido. Perfeito para alguém que não aceitaria nada com muito sabor ou tempero. Depois de três goles o leite se foi. Seu estomago agradeceu a leveza do líquido deixando o menos enjoado. Sua visão começou a melhorar focando no rosto de Brumália que sorria para si, mas seus olhos levavam algo mais sombrio.
-Ele já acordou? – Perguntou Calídece aparecendo em seu campo de visão com as mãos na cintura – a Senhora quase cortou nossas gargantas ontem, você vomitou desesperadamente e teve febre, achávamos que iria morrer.
-A Senhora ficou preocupada – Contou Brumália segurando as mãos de Tristan – e nós também, me apeguei a você.
-Ela se preocupou com o dinheiro que perderia por ele morrer – Exclamou Alethea sentando-se se ao lado de Brumália – ainda bem que não morreu, senão nós morreríamos junto.
-Acho que você teve uma reação alérgica – Sugeriu Donatília se aproximando com um prato em mãos – coma.
-De novo? – Perguntou Tristan vendo o cubo de coloração amarelo alaranjado – tudo bem, acho que algo leve vai cair bem no estomago, principalmente depois do leite de c***a.
Tristan pegou o cubo e colocou na boca sentindo o dissolver na língua. O sabor de damasco era refrescante a adocicado. Quando voltasse compraria damascos para comer. Donatília continuou oferecendo o pratinho e Tristan pegou outro atrás do outro. Era viciante comê-los. A cada novo colocado na boca sentia um sabor diferente e igual ao mesmo tempo. Ao cair no estomago caia com leveza. Tudo aprecia melhor com algo doce. Foi quando acabou que ele se deu conta que havia comido os seis cubinhos de damasco.
-Nossa – Murmurou Tristan – como isso pode ser tão bom?
-É por isso que geralmente comemos alguns deles e não todos de uma vez – Falou Agatha surpresa ao ver o pratinho vazio – espero que não passe m*l.
-A Senhora me mandou te dar todos, os clientes elogiaram seu corpo ontem e ela o quer mais... digamos, curvilíneo – Disse Alethea segurando o sorriso – o efeito do doce já está fazendo efeito, parece que ganhou um pouco de coxa.
Tristan analisou suas roupas. Estava com um manto longo até os pés. Quem o havia trocado? Tal pensamento o deixou desconfortável então apenas decidiu ignorara-lo por enquanto. Tocou sua coxa por cima do tecido e percebeu que estava um pouquinho maior.
-Por hoje a Senhora nos mandou de deixar descansar, volte a dormir – Falou Brumália empurrando o jovem para a cama que foi sem questionar – daqui a alguns dias será o dia da Primavera, será um dia especial para todos nós.
Ele adormeceu novamente. Sem sonhos. Sem esperança concreta, mas uma fagulha que poderia começar um incêndio a qualquer momento.