Abro os olhos aos poucos, faço todo o possível para não chorar assim que o reflexo da minha mãe surge a minha frente. Eu tento reconhecer onde estou mas não consigo pensar em mais nada, só em Vasco me batendo.
- Fefé minha filha, você está bem? Ai meu Deus, eu fiquei tão preocupada, eu pensei que fosse te perder meu amor - minha mãe vem até mim com olhos marejados e me abraça.
Eu não consigo falar nada, apenas sei chorar por mim e pela minha mãe que está extremamente assustada, o que eu vou falar para ela? Não existe uma mentira que cubra os meus hematomas. Eu não sei se estou chorando pelos hematomas que tenho ou pelo meu coração que está extremamente destruído.
- Graça a Deus que a polícia chegou há tempo de salvar vocês, se não fosse o Vasco, eu não sei o que teria acontecido com você - minha mãe sussurra ainda me abraçando.
Eu não estou entendendo nada, como assim assalto? Eu me recordo de Vasco me estar sufocando mas depois disso, não me recordo de mais nada, como se tivesse um branco em minha mente.
- Assalto? - sussurro com muita dificuldade. Minha garganta arde e dói intensamente, como se tivesse algo prendendo a minha respiração.
- Sim meu amor, vocês sofreram um assalto, Vasco foi esfaqueado e está no quarto ao lado, ele resistiu ao assalto, ele foi esfaqueado porque tentou salvar você, minha filha, eu pensei que fosse perder você - minha mãe continua falando enquanto lágrimas caiem de seus olhos, mas até agora eu não estou entendendo absolutamente nada.
- Água, peço água - consigo sussurrar com muito esforço.
Minha mãe logo trata de procurar pela água, ela sai do quarto e vai atrás da minha água, nesse meio tempo, aproveito para processar o que aconteceu comigo e tento recordar dos últimos acontecimentos. Primeiro, eu me recordo de ter saído com Vasco depois de já termos feito as pazes. Segundo, nós saímos do restaurante porque, ele não gostou da minha roupa e achou que todos estavam olhando para mim, e segundo a mente doentia dele, eu vesti aquilo só porque quis provocar os homens daquele lugar. Terceiro, nós discutimos e muito, quase terminei com ele, mas, mais uma vez, ele conseguiu me driblar e nós terminamos fazendo s**o. Quarto, nós dois discutimos mais uma vez, porque segundo ele, eu estou interessada num moço que eu nem sequer sei o nome dele, num momento eu estava vendo fotos de Khensane e seus amigos no i********: e no outro eu estava sendo espancada pelo meu até então namorado.
- Toma filha, eu trouxe água para você beber - minha mãe entra abruptamente no quarto, trazendo consigo uma garrafa de água mineral e um copo.
A chegada inesperada dela, me desperta do transe em que me encontrava há minutos atrás, a minha viagem a aquele circo de horrores que, foi a noite passada é interrompida, mas de uma coisa eu tenho certeza, eu não posso continuar com o meu namoro, desta vez eu vim parar num hospital com a garganta e alguns costelas quebradas, mas quem me garante que, a próxima vez terei tanta sorte assim?
- O Obrigada mãe - consigo falar com muita dificuldade.
A dor na minha garganta é tanta, mas tanta que acho que ficarei uma semana consumindo só líquidos, do jeito que está inflamada é bem provável que, eu vá chorar ao tentar engolir qualquer coisa sólida nos próximos dias. Assim que tomo a água, as ideias começam a ficar claras demais na minha cabeça, Vasco me espancou até desmaiar e fingiu que sofremos um assalto.
- O... Onde está Vasco? - questiono olhando para os lados.
Não pensem que pretendo voltar com ele, nunca faria isso, nem que me pagassem, eu quero olhar nos olhos dele e ver se ele tem a coragem de fingir que aquilo foi um assalto, eu quero enfrenta-lo, eu quero ver se ele terá a coragem de manipular as coisas dessa vez.
- Ele está na outra sala, o corte foi profundo e ele teve que tomar alguns pontos - minha mãe explica.
Ela está com olheiras profundas de alguém que ficou a noite inteira chorando, o rosto e o nariz dela estão vermelhos. Se ela está nesse estado todo vermelho, como será que eu estou, depois dos socos que levei.
- Um espelho, eu preciso de um espelho - sussurro desesperada.
Eu preciso ver o meu rosto, as dores que estou sentindo, não são só na região do tronco e pescoço, mas eu sinto dores por todo o meu rosto, sinto como se o mesmo estivesse inchando e sinto meu lábio superior inflamado, o que aquele doente fez comigo? Eu não me recordo de ter levado socos nessa parte do meu corpo, será que ele teve a coragem de continuar me batendo, mesmo depois de eu já estar desmaiada? Atendendo ao meu pedido, minha mãe tira um pequeno espelho rectangular de sua bolsa e me entrega. Assim que me entrega o mesmo, ela coloca as mãos na boca, como se estivesse com medo da minha reacção. Com as mãos trémulas, levanto um pouco o pequeno espelho, visualizo as primeiras marcas, elas estão por todo o meu pescoço, está mais do que visível que são dedos e que alguém tentou me sufocar, as marcas estão perfeitamente alinhadas e formam uma espécie de coleira roxa em meu pescoço. Levanto mais um pouco o espelho e começo a me desesperar, o meu rosto está inchando como imaginei, o meu olho esquerdo está inchando e roxo, o meu lábio superior tem um corte, como se eu tivesse batido com os dentes.
- Aha! Ah! O que fizeram comigo, o que fizeram comigo? - me desespero virando a cabeça de um lado para o outro, procurando mais hematomas.
Minha mãe se desespera junto comigo, seus olhos enchem de lágrimas assim como os meus, ela tenta se aproximar de mim, mas a impeço de chegar perto de mim, eu estou me sentindo envergonhada e culpada. Como eu deixei isso acontecer? Como pude permitir que alguém me tratasse assim? Como deixei de a situação saísse de controle dessa forma.
- É tudo minha culpa, é tudo minha culpa - sussurro para mim mesma, abanando a cabeça de um lado para o outro - Se eu não tivesse usado aquele vestido, nada disso teria acontecido - sussurro ainda em meio às lágrimas.
Minha mãe ignora o meu pedido de ficar longe de mim, me envolve em seus braços e me permito chorar sem pudor.
- Escuta uma coisa minha filha, você não tem culpa de nada, nunca se culpe por sofrer uma agressão, você é a vítima nessa história e não a culpada - minha mãe levanta a minha cabeça e profere essas palavras olhando directamente em meus olhos marejados - Nunca, você é ouviu, nunca se culpe por sofrer uma violência como essa, nada justifica essa agressão que você sofreu, nem que estivesses nua, ninguém tem o direito de agredir você por isso, você me entendeu? - ela questiona com olhos ainda vidrados em mim.
Eu não consigo encerrar ela sem sentir vergonha de mim, volto a abraçar minha mãe e escondo minha cabeça entre seus braços. Fico nos braços da minha mãe, até adormecer novamente. Quando desperto, estou mais calma que antes, posso me permitir observar o quarto em que estou. As paredes do quarto são dum azul claro mais para branco, só pelo tom das paredes, vê-se que não estou num hospital público, mas numa clínica, o quarto tem uma mesa pequena do lado da cama e um sofá que suponho que seja para a visita descansar, mas acho que o hospital falhou no tamanho do sofá, pois, minhas amigas estão apertadas e de qualquer maneira no mesmo.
- Meninas, Sandy - tento acorda-las, elas estão uma em cima da outra, a qualquer momento elas vão cair. A minha garganta está muito dolorida, minha voz não sai muito audível - Debby, Vanessa - chamo por elas mais uma vez, desta vez Sandra escuta e desperta num rompante, assustando as outras e todas caiem de uma vez, igual a uma massa de bolo no chão.
Todas no chão tentam levantar, mas parece que estão amarradas numa massa de bolo, a confusão delas arranca uma risada dolorosa de mim, só minhas amigas, para fazerem uma confusão dessas num hospital.