Narrador narrando
Era 23 de dezembro de 2015, véspera de Natal. Essa data era bem triste para Matheus, pois todos os anos ele tinha que frequentar os jantares chatos em família no dia 24. Ele odiava esta data, pois sempre ficava de canto, sendo ignorado pela família de seu pai e simplesmente não existia. Leonardo sempre arrastava o seu filho para esses encontros chatos, mesmo que fosse contra a sua vontade e mesmo sua família não gostando da presença de Matheus.
E Matheus, todos os anos, ficava em um canto bem distante de propósito lendo um livro ou mexendo em um celular. Ele raramente se aproximava, no máximo para pegar um pouco de comida ou água. Ele tinha que ficar quase a noite toda ali e isso era muito triste porque não tinha onde dormir, mas aquele ano foi diferente. Ele insistiu que não queria ir, o pai dizia que ele tinha que ir porque tinha que ficar perto da sua família. Matheus tentou insistir em ficar, mas Leonardo com um olhar sério, deu a palavra final.
Era 24 de dezembro de 2015. Nesse dia, Matheus ficou dormindo até às sete horas da manhã. Estava fazendo um friozinho agradável no Rio Grande, o céu estava iluminado com tons amarelados e brilhantes e os pássaros estavam cantando lá fora.
Matheus levanta da cama às sete e meia, se espreguiçando. Sonolento, ele começou a dar passos de zumbi em direção ao banheiro, fazendo todos os passos matinais. Ele lava o rosto e depois desce em direção a cozinha. Chegando lá, coloca um pouco de café na xícara e começa a tomar, comendo um pedaço de bolo. Sozinho na mesa, ele refletia o quão triste era aquele dia, ele tinha vagas lembranças de sua mãe e desejaria que ela estivesse ao seu lado.
— Sozinho, de novo — disse Matheus a si mesmo.
A cozinha era um pouco grande e tinha uma janela de tamanho mediano na parte superior.
Matheus estava entretido tomando o seu café da manhã quando apareceu um passarinho cantando na janela. Matheus pegou um pedacinho de bolo e jogou no passarinho para afugentar ele, mas ele voltou e continuou cantando. Matheus jogou outro pedaço e o pássaro voltou, continuando a cantar sua melodia doce, e Matheus ficou vendo aquilo admirado.
Matheus não tinha alguém para abraçar ele e dizer Feliz Natal, nem ninguém para lhe dar presentes ou alguém para ficar do lado dele.
O jantar se iniciou às seis como de costume. Leonardo chegou de carro junto com Matheus e foi bem recebido por todos, abraçou alguns, foi abraçado por outros; já Matheus, como sempre, foi ignorado, ficando no seu cantinho de sempre. Mas, aquele ano era diferente, Matheus não queria ficar ali. Já eram 8:30 e depois de tanto insistir, o pai permite que ele retorne à casa, mas ele teria que voltar de ônibus. Leonardo dá as chaves e dinheiro para Matheus retornar.
Matheus foi até a parada de ônibus mais próxima e esperou uns 15 minutos, até que o ônibus apareceu. Ele pega o ônibus e depois de duas paradas, Lucas entra no ônibus. Lucas ficou até às sete procurando um presente para dar a seu pai, quando foi para a parada perdeu um ônibus.
Matheus estava tão triste e aéreo em seus pensamentos que não notou que Lucas estava no ônibus. Lucas se sentou ao seu lado e ele tomou um susto.
— O que você está fazendo aqui? — perguntou Matheus a Lucas.
— Eu fui comprar um presente para o meu pai — diz Lucas — E você? — pergunta Lucas.
— Tô indo pra casa, vim dos jantares chatos da família de meu pai. Todo ano é a mesma coisa, eu sempre tenho que estar lá. Não sei porque ele insiste, eles não gostam de mim — Matheus disse, meio triste.
— Não quer vir jantar conosco? — perguntou Lucas.
— Não sei se ele aprovaria — diz Matheus.
O ônibus parou em uma rua perto da casa de Matheus, mas Lucas insistiu e Matheus acabou cedendo. Eles foram para a casa de Lucas e, chegando lá, a casa estava toda decorada com vários enfeites natalinos. Tinha uma árvore de natal de um metro toda decorada com pisca-piscas, tinha uma lareira com lenhas sendo consumidas pelo fogo, além dos pais de Lucas. Ryan também estava presente. Já eram 10 horas e todos começaram a se servir, nesta mesma hora os pais de Bianca e ela chegaram abraçando todos e desejando um Feliz Natal. Todos se serviram e ficaram horas conversando de maneira descontraída.
A mãe de Bianca ficou olhando para os olhos e o rosto de Matheus como se aqueles olhos verdes e aquele rosto lhe fossem familiar ou lembrassem alguém conhecido.
Todos estavam reunidos no quintal da casa perto de uma enorme araucária. O jantar foi servido em uma mesa de madeira e tinha de tudo ali: chimarrão, nozes, vinho, refrigerante e um peru assado. Todos começaram a se servir e Bianca se sentou perto da mãe de Lucas.
Ryan tentou sentar perto de Lucas, mas este chamou Matheus para que se sentasse na cadeira ao lado dele.
Ryan ficou com um pouco de ciúmes, essa era a mini vingança de Lucas por causa de Micaele. Ryan ficou meio emburrado a ceia toda.
Nesta hora, Matheus ao perceber tudo, deu pequenas risadas abafadas, e Ryan ficou fitando seus olhos.
Os pais de Lucas ficaram conversando com os pais de Bianca várias horas. Matheus se divertiu muito com Lucas, os dois conversavam muito sobre tudo e já estavam se entrosando na conversa dos adultos, até que Lucas recebeu uma ligação de seu pai. O pai presumiu que ele não estava em casa.
— Quem é? — perguntou Lucas.
— É meu pai — disse Matheus — Ele quer que eu vá para casa — disse com uma cara triste.
— Fica mais um pouco — insistiu Lucas.
— Não posso — disse Matheus.
Para a alegria de Ryan, Matheus teve que retornar para casa. Lucas resolve acompanhá-lo até sua casa, no caminho, eles iam vendo várias casas enfeitadas de todas as maneiras. Matheus notou que enquanto eles caminhavam o r**o de Lucas dava leves balançadas e seus olhos estavam brilhando como cristal, até que chegaram na sua casa.
— Tchau, Lucas.
— Até mais — disse Matheus.
— Até — disse Lucas — Aqui, seu presente de Natal.
Matheus se vira e Lucas dá um abraço bem forte em Matheus, e como ninguém estava vendo dá um beijo na sua bochecha. Matheus ficou todo corado e sem jeito.
— Até mais, Matheus — diz Lucas.
Matheus entra na casa e fica na porta, observando Lucas se afastar. Enquanto caminhava, Lucas se virou e deu alguns acenos a Matheus.
Matheus fica na porta até que a figura de Lucas desaparece completamente. Aquele foi o melhor Natal da sua vida e aquele beijo, o melhor presente. Matheus foi dormir com uma sensação diferente, como se o seu coração estivesse leve. Ele estava sentindo um misto de alegria e vontade de chorar e enquanto estava deitado, um sorriso se formou em seu rosto e lágrimas escorreram de seus olhos.