Capítulo dois

1389 Words
Tobias Fiquei quieto olhando para ela. Não sei porque ainda tenta acobertar esse abusador. Está na cara que ele é violento o tempo todo. Talvez tenha medo do que ele possa vir a fazer. — Tem certeza? — Sim. — Certo e você acha que vai ter algum problema quando chegar em casa? Ela demorou a responder e pareceu ficar mais nervosa ainda. — Não sei. Acho que não. — Sei. — Eu peço mil desculpas, senhor Becker. — Já disse pra me chamar de Tobias. — Desculpe. Não achei que ele fosse ficar sabendo disso. — Qual o problema com esse trabalho? — Pra mim nenhum. Eu amo trabalhar aqui. — E ele? — Prefere que eu fique em casa, mas preciso ajudar também. Temos dívidas e ele não consegue pagar sozinho. — Que dívida? — Estamos pagando a casa. — Entendo. E você acha que vamos ter problemas com o acontecido de hoje? — Acho que não… Não senti segurança no que ela disse, mas não posso invadir. Se ela me pedir ajuda, aí sim vou com unhas e dentes. — O senhor vai me mandar embora? Revirei os olhos quando me chamou de senhor. Já falei mil vezes que não quero que me chame assim. — Por que eu faria isso? Ele deu show, não você. Você é a melhor secretária que já tive. — Ela ficou vermelha e me fez sorrir. — Na verdade, ele nunca mais vai pisar aqui. Vou agora mesmo informar ao porteiro e os seguranças. — Obrigada por não me demitir. *** Depois desse episódio lamentável, tive que entrar em outra reunião. Ainda bem que esse infeliz veio no intervalo entre uma e outra. Se aparecesse no meio da reunião, não sei o que faria com ele… No fim do dia, me despedi da Maíra com certo receio. E se aquele troglodita machucar ela por estar trabalhando aqui? Já ouvi tanta coisa sobre violência doméstica… E é tudo tão horrível que fico muito preocupado. Ela não merece. Cheguei em casa e a Renata estava lavando a louça. — Boa noite — falei me aproximando. — Boa noite, senhor Tobias. Outra que é difícil de entender que não quero ser chamado de senhor. Mas pelo menos não me chama pelo sobrenome. — Renata, de onde você conhece a Maíra? — Ela mora perto da minha casa. Algum problema? — Então é sua vizinha. — Sim. Está tudo bem com ela? — Por que essa pergunta? — Não sei… o senhor chegou perguntando e fiquei preocupada. — Teria motivos para ficar preocupada? — Não… — Tem certeza? Se são vizinhas, você deve conhecer o marido dela, estou certo? Renata demorou a responder. Estava de costas para mim e secava o mesmo copo desde que perguntei sobre a Maíra. Tudo muito suspeito e não estou gostando. — Conheço sim. — Então sabe dizer se ele bate nela? — Por que essas perguntas? O senhor viu alguma coisa? — Vi. O próprio foi lá na empresa e armou um barraco. — Não acredito… vai demiti-la? — Por que eu faria isso? Ele que foi até lá. — Mas ele pode voltar já que descobriu o endereço. — Todos já estão avisados da proibição da entrada desse verme. Agora me diga, ele agride ela? — Eu não sei. Só sei que ele é esquentado. — O que isso quer dizer? — Ele briga com todo mundo na rua. — Se ele é esquentado desse jeito, como não é violento com a Maíra? Renata ficou em silêncio. Ela sabe de alguma coisa e não quer me dizer. — Aí senhor Tobias eu não quero me meter nisso… Eu indiquei a Maíra porque ela estava precisando muito de emprego e é a pessoa mais doce e humilde que já conheci, mas nem tudo são flores… — Esse cara bate nela, Renata? — falei alterado. — Eu realmente não sei dizer com certeza. Respirei fundo para me controlar. Preciso saber o que acontece e o que esse cara faz com a Maíra. Tudo me leva a crer que a coisa é muito séria. *** No dia seguinte, quando cheguei, a Maíra não estava. Achei estranho, pois sempre chega antes de mim. Mas vou esperar. Imprevistos acontecem, não é mesmo? Pode ter acontecido qualquer coisa que tenha a impedido de chegar na hora. Qualquer coisa… Será que aquele cara fez algo com ela por trabalhar aqui? Será que não vai deixar ela voltar? Ou prendeu ela em casa? Como vou trabalhar com esses pensamentos? O elevador apitou, me dando um baita susto e quando as portas se abriram, suspirei aliviado ao ver a Maíra. — Bom dia — Bom dia, senhor Becker. — Tobias. — Tobias. Sorri ao ouvir finalmente ela dizer o meu nome. — Está tudo bem? — Está sim. O ônibus demorou um pouquinho hoje, peço desculpas por isso. — Não tem problema nenhum. Ela sorriu e seguiu para a sua mesa. Fiquei a observando por um momento. Parecia tudo normal com ela, mas a minha intuição dizia que tinha algo errado. Muito errado… O dia passou e acabei esquecendo o assunto, por enquanto. Estava em uma ligação quando a Maíra entrou com o café que tinha pedido. Fiz sinal para que ela colocasse em cima da mesa e assim o fez. Segurei a sua mão e puxei para perto, dando um beijo de agradecimento. Maíra ficou vermelha e os meus olhos pousaram no seu pulso, o que fez ela puxar o braço com pressa, pedir licença e sair rapidamente. Mas não adiantou nada tudo isso, vi perfeitamente marcas de dedos no pulso dela. — Certo. Ligo em breve. — Encerrei a ligação e fui até a Maíra. Ela estava digitando algo no computador. Não me importei e me aproximei, segurando a sua mão e olhando mais uma vez aquela marca. Maíra puxou o braço e cobriu o pulso com a blusa. — Foi seu marido não foi? — Eu bati na maçaneta da porta. — Claro. A maçaneta tem dedos agora — falei com ironia. Ela não respondeu. Encarava a tela do computador sem piscar. As mãos entrelaçadas em cima da mesa, apertadas fortemente. Suspirei, revoltado. Também ouvi falar sobre o negacionismo nesses casos. O que me preocupa, é que começa com apertos ou empurrões e pode muito bem evoluir para um assassinato. — Tudo bem. Então as mãos da maçaneta. Tome cuidado com esse tipo de maçanetas, elas podem machucar muito mais do que isso. Maíra finalmente me olhou. Falei com ironia, mas também deixei um recado por entre as linhas. — Às vezes tentamos encobrir maçanetas desse tipo por achar que foi sem querer. Ou que foi só uma vez. Que não vai mais acontecer… só que infelizmente vai acontecer de novo, mesmo que você negue ou não queira aceitar. A maçaneta que faz esse tipo de coisa, não consegue se conter. Ela ficou em silêncio. Ainda me olhava e vi perfeitamente os olhos cheios de lágrimas. Nesse momento senti uma forte vontade de pegar ela no colo e levar para casa. Mas infelizmente não posso fazer isso. Ainda. *** Algumas semanas se passaram e não voltamos ao assunto. E nem tivemos mais surpresinhas, mas isso não quer dizer que não vá voltar a acontecer. A qualquer momento ele pode se irritar e fazer pior do que um aperto no pulso. Depois de uma vida, finalmente consegui falar com o Mick, meu advogado. Contei toda a situação da Maíra a ele, mas como pensei, se ela não denunciar, não adianta eu me meter. Inferno! Mesmo assim pedi a ele para anotar tudo que acontecer, porque em algum momento eu vou convencê-la e esse infeliz vai pagar. — Pode deixar que estou guardando tudo que você conta, mas pra realmente irmos a fundo nisso, ela precisa confirmar tudo isso. — Eu sei. Só guarde isso que em algum momento ela vai confirmar. — Ok. Desligamos e logo liguei para outra pessoa. Teria que fazer uma viagem a Nova York para tentar fechar um contrato internacional e isso estava me deixando nervoso. Preciso ficar lá por um dia ou dois e temo que nesse tempo, aquele canalha convença a Maíra a não trabalhar mais comigo. O que é muito provável acontecer, a menos que eu a convença a ir comigo. Acho que é uma boa ideia.
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