Estou sentado em uma mesa impecável de um restaurante requintado, o tipo de lugar que jamais imaginaria pisar por conta própria. O terno que uso é elegante, caro. Foi entregue em minha casa com uma mensagem clara: "Vista-se bem. Você terá um encontro importante". Estou agitado, mas tento manter a calma, mexendo no nó da gravata como se ela estivesse me sufocando.
À minha frente, está Don Vincent Bertizzolo, o homem que comanda tudo com uma aura de poder que transborda da postura ereta e dos olhos penetrantes. Ao seu lado, Antony Mancini, o consigliere da família. Ele me observa com um meio sorriso, a expressão enigmática, enquanto descreve para o Don a forma como nos conhecemos.
— Você é bem jovem. Quantos anos tem? — Don Vincent me pergunta, a voz suave, mas carregada de uma autoridade que me faz endireitar a coluna.
— Vinte e dois anos — respondo, tentando não soar nervoso. Sei que essa é a idade em que eles costumam recrutar. Jovens que ainda podem ser moldados, como argila nas mãos de um escultor habilidoso.
Ele me encara por um longo momento, como se estivesse lendo minha alma.
— Se aceitar nossa proposta, fará parte da família. Cuidamos dos nossos, mas, uma vez dentro, não poderá sair. — A intensidade em sua voz me faz engolir em seco.
Essas palavras soam como uma sentença. Uma promessa e uma ameaça ao mesmo tempo. Fico em silêncio por um momento, tentando processar tudo. Eu já vi o suficiente para entender que essa gente é leal de um jeito doentio. Vi a forma como seus homens agiram no cemitério, ferozes e atentos como cães de guarda. Eles parecem dispostos a dar a vida por esse homem. Isso é confiança, mas também é uma prisão.
— Por que vocês são tão fechados? — pergunto, tentando decifrar o mistério que os envolve.
Antony dá uma risada baixa, quase divertida.
— Eu disse a você, Vincent. Esse rapaz é um achado.
— Por enquanto, é tudo que precisa saber. Se aceitar, você será treinado para a posição. Começará fazendo pequenos trabalhos e, se se destacar, poderá se tornar um Capo — explica Don Vincent, a voz calma como se estivesse apenas comentando sobre o tempo.
— Capo? — questiono. Não sou um completo ignorante sobre o mundo deles, mas essa palavra carrega um peso maior quando dita por ele.
— Sim, um líder de homens. Por enquanto, nenhum dos nossos tem a frieza necessária para isso, mas algo em você me diz que é diferente.
Eu me pergunto se ele vê algo que eu mesmo desconheço. O olhar do Don é como o de uma cobra prestes a atacar, calculista e frio, mas com uma tranquilidade assustadora.
— Entendo. E que tipo de trabalho eu faria? — pergunto, meu coração batendo forte contra as costelas.
— Tivemos algumas baixas recentemente. Uma guerra que enfrentamos deixou alguns buracos na nossa segurança. Você será treinado como soldado — responde Antony, sua voz mais séria agora.
— Soldado? — repito, tentando entender completamente o que isso implica.
— Isso mesmo. Soldados são nossos homens de confiança, aqueles que garantem nossa segurança — Don Vincent diz, seus olhos nunca deixando os meus.
Fico em silêncio por um momento. A ideia de ganhar mil dólares por mês parece surreal para alguém como eu, que sempre lutou para sobreviver. Mas o que está em jogo aqui é mais do que dinheiro. É a minha vida, minha liberdade, meu futuro.
— Posso pensar? — pergunto, tentando ganhar tempo.
Don Vincent assente, um movimento lento e calculado.
— Claro. Se aceitar, passará um tempo afastado, treinando. Não verá ninguém durante esse período. Será necessário para absorver o que precisa aprender.
Tudo isso soa tão orquestrado, tão cuidadosamente planejado. Nada nesse homem é por acaso. Ele calcula cada palavra, cada gesto.
Respiro fundo e pergunto, hesitante:
— Eu não vou acabar ajudando em roubos ou algo do tipo, vou?
Há um momento de silêncio total antes de gargalhadas preencherem o ar ao redor da mesa. Don Vincent ri, e até Antony sorri.
— Não, claro que não — diz o Don, tentando conter o riso.
Mas eu não vejo graça. Continuo sério, minha mente ainda girando.
— Por que vocês precisam tanto de seguranças? — insisto.
Don Bertizzolo pousa a taça de vinho sobre a mesa, sua expressão mudando para uma seriedade irritada.
— Encerramos a conversa! — Ele se levanta, dando o assunto por finalizado, sem se preocupar em responder minhas perguntas. Para ele, sou um simples peão, alguém que precisa ser testado antes de saber demais.
Não preciso que ele me diga duas vezes. Levanto-me imediatamente, e Antony tira a carteira do bolso, jogando algumas notas sobre a mesa. Ele me faz sinal para segui-lo, e eu obedeço, ainda tentando assimilar tudo o que foi dito.
Lá fora, o sol bate forte. Antony coloca a mão em meu ombro enquanto caminhamos em direção à Mercedes preta do Don. Ele me olha com uma expressão séria.
— Nossos negócios estão quase totalmente legalizados. Don Vincent tem trabalhado duro para isso, mas ainda lidamos com pessoas perigosas. Nossa família tem inimigos, e precisamos estar sempre preparados. É por isso que estamos te oferecendo essa chance.
Essas palavras me trazem um alívio momentâneo, mas sei que é um alívio falso. Legalizar quase totalmente não é o mesmo que estar completamente limpo. Sei que, se aceitar, estarei mergulhando de cabeça no crime organizado, mesmo que seja de uma forma mais velada.
— Entendo. Vou pensar — respondo.
Antony aperta meu ombro com mais força.
— Rapaz, você cresceu sem um pai. Perdeu seu irmão cedo, e sua mãe afogou suas mágoas na bebida até o fim. Estamos te oferecendo a chance de ser parte de algo maior, de ter uma família de verdade. E você ainda precisa pensar?
Suas palavras são como um soco no estômago. Eles sabem tudo sobre mim. Ele investigou cada detalhe da minha vida, e agora usa isso para me convencer. Fico sem palavras, apenas o encaro.
Antony dá um tapinha no meu ombro antes de se afastar. Ele entra no carro, e a porta se fecha atrás dele. A Mercedes parte, seguida por outro carro de escolta.
Fico parado, observando os carros se afastarem. O cartão de Antony ainda está no meu bolso, pesado como uma pedra. Meu coração bate descompassado, e sinto um frio na espinha. O que estou prestes a fazer? Entro no jogo deles, aceito esse "trabalho", ou continuo minha vida batendo de porta em porta, buscando uma saída?
As promessas são tentadoras. Mas sei que, se aceitar, não haverá volta.