Após horas de vôo que pareciam intermináveis, Pamela chegou ao quarto que ocuparia na universidade. Ela foi bem recebida por Camila, sua colega de quarto, que se encarregou de explicá-la todos os pormenores antes de deixá-la a sós para tomar banho. A moça esperou a banheira encher, e colocou um dos dedos do pé para averiguar a temperatura da água. Ao achar tolerável, submergiu todo o corpo, esperando até que a água morna relaxasse os seus músculos doloridos.
Pamela não sabe ao certo quanto tempo passou na banheira, e lembra de ter escutado a porta abrir e fechar umas duas vezes, mas o que de fato a deixou preocupada foi um barulho suspeito que veio do quarto.
Gemidos abafados.
Murmúrios incoerentes.
Barulho de cama rangendo.
Alguma coisa estava errada, e ela precisava impedir antes que destroçassem seus pertences que continuavam na cama. Ela se levantou da banheira, vestiu-se com o seu roupão azul-claro e caminhou vagarosamente para fora do banheiro.
A cena grotesca que encontrou á sua frente a fez esquecer de como respirava por quase um minuto inteiro.
Um homem posicionado entre as pernas de uma mulher, chocando o seu quadril ao dela sem a menor piedade. Ambos estavam nus, e foi possível visualizar os s***s bem desenhados da outra moça que ainda estava de olhos fechados e lábios entreabertos quando Pamela os flagrou.
- Mas que diabos está acontecendo aqui?- Pamela gritou.
Os dois se assustaram com a presença dela, e no fundo, sentiu uma enorme satisfação por isso. A garota estava muito vermelha, corada do pescoço as bochechas, e a raiva indescritível que sentiu ao ver o casal transando em sua cama só aumentou ainda mais quando percebeu que um de seus livros estava jogado ao chão.
- Saiam da minha cama ou eu juro que arranco o couro de vocês dois.- Ela trincou os dentes.
A primeira a ficar de pé foi Malu, que instintivamente cobriu os próprios s***s.
O outro, ela pôde perceber, que o cinismo era inabalável.
O sorriso era torto, esbanjando malícia, e os olhos castanhos e insondáveis.
- Sou Henrique, irmão da Camila. Uso o quarto da minha irmã na ausência dela, não sabia que tinha chegado uma aluna nova.-
- Quer fazer o favor de não pisar no meu livro!- Pamela agarrou o objeto, como se pudesse protegê-lo com um abraço.
- E-eu sou a Malu, sinto muito por todo o transtorno.-
- Por favor… Se vistam e vão embora do meu quarto.- Pamela deu de ombros, colocando o livro que tinha nas mãos na mesa de cabeceira ao lado de sua cama.
- Oh puritana…- Disse Henrique, ao terminar de fechar a própria calça.
Pamela parou de caminhar, mas não se virou de frente.
- Eu aconselho mandar alguém trocar o lençol. Bom… Sempre escapa líquido seminal da camisinha.-
- Fora do meu quarto!- Indignada, Pamela agarrou o abajur que estava ao lado da cama de Camila, aproximando-se dele com o objeto, como se fosse batê-lo.
- Calma… Eu só estava te dando um conselho.-
- Quer que eu te diga aonde deve enfiar os seus malditos conselhos?-
- Garota m*l educada…- Resmungou Henrique, saindo sem camisa pelo corredor.
- m*l educada? Ele usa o meu dormitório de motel, suja a minha cama, pisa no meu livro, e eu sou a m*l educada?- Pamela enumera cada um dos fatos nos próprios dedos, se virando para Malu, que terminava de calçar suas sandálias.
- Eu sinto muito de verdade. Bom… Até mais.- A outra garota também foi embora.
...
Meia hora depois
- Desculpa mesmo pelo que meu irmão fez.- Camila pousa o copo de café gelado sobre a mesa do refeitório, colocando uma de suas mãos sobre a de Pamela.
- Não foi culpa sua.- Pamela deu uma tapinha suave na mão da outra.-
- Saiba que eu não dei a chave do dormitório ao Henrique, ele que...-
- Aqui estão suas chaves, irmã.- Henrique joga o molho de chaves na frente de Camila, apoiando as duas mãos na mesa.- Acabei esquecendo de devolver para a sua mesinha de cabeceira.- Ele encarou Pamela com um sorriso mordaz.- Culpa da sua amiga nervosinho.
Pamela revirou os olhos com impaciência.
- Eu nunca te dei o direito de fazer esse tipo de coisa no meu quarto! Eu o proíbo de usar o nosso dormitório para os seus...- Ela olhou com nojo para o próprio irmão.- Encontros amorosos.
- Bom... Eu sempre te digo para fechar a porta. Culpe-se por ser esquecida.-
- Esse garoto é um folgado! Camila, como você o suporta?-
- Não tenho muita escolha.- A outra deu de ombros.
- Não vai me apresentar para a sua amiga?- Ele ergueu a coluna.
- Não me interessa ser apresentada para você, e menos ainda saber o seu nome. Não pretendo ter nenhum diálogo com uma pessoa m*l educada que não tem a capacidade de se desculpar, ou de sentir remorso.-
- Remorso eu tenho do que não faço, gata.-
- Não te dei o direito de falar assim comigo.-
- Não liga para ele, Pamela. O prazer do meu irmão é infernizar os outros.-
- Pamela... Então esse é o seu nome.-
- Nos deixe terminar nosso café em paz, amanhã temos aula e precisamos dormir cedo.- Camila repreende Henrique.
- Como se alguém precisasse estudar muito em uma faculdade de letras.- Henrique riu com desdém.
Camila encolheu os ombros ao ver a expressão de fúria de sua colega de quarto.
- Como é?- Perguntou Pamela.
- Não dê ouvidos a ele, gosta de falar isso para me provocar.-
- Meu pai sempre disse que o curso de letras é para quem não sabe o que quer da vida.-
- Henrique faz parte da aristocracia do nosso prédio. Ele cursa direito.-
- Eu sempre soube o que quis.- Pamela ficou de pé, segurando o seu copo de café.- E você, Henrique? Será que pode dizer o mesmo? Ou será que a sua opinião é a opinião apenas de seu pai.- E com sua deixa, Pamela se retirou do refeitório.
- Como você consegue ser desagradável quando quer.- Comentou Camila, dando um último gole no café antes de sair.
Pamela praticamente correu no sentido das escadas, precisava de seu quarto. Ela sentia os olhos arderem e estava morrendo de raiva por não ter voado no pescoço daquele preconceituoso.
Seu pai, Daniel Santiago, o advogado mais brilhante que o país já teve, um dia lhe disse que todas as profissões são importantes, e que com certeza a sua filha seria boa em qualquer coisa que fizesse, desde que fizesse com amor.
Ela cruzou o corredor um pouco desnorteada, por que diabos aquelas portas marrons eram todas iguais? Olhou para trás apenas por um breve momento para conferir se estava indo pelo lugar certo, e quando se voltou para frente, sentiu-se chocar contra um corpo firme, que a segurou pelos braços para que ela não caísse.
- Me desculpe... E-Eu... É meu primeiro dia, e fiquei um pouco perdida.-
- Não se preocupe, essas coisas acontecem.- Ele deu um sorriso extremamente gentil.
O rapaz era praticamente um Adônis de cabelos negros e olhos azuis piscina. O coração de Pamela por um minuto não pulou pela boca, e ela sentiu que estava boquiaberta diante a beleza radiante do rapaz.
- Sou o Otto. É um prazer conhecê-la.- Ele esticou uma de suas mãos.
- Pamela.- Ela apertou a mão dele em um cumprimento.
- Bom... Se quiser posso ajudá-la com seja lá o que estiver procurando.
- Ah... Não será necessário, eu já achei o meu quarto.- Ela olhou na direção do corredor que dava para a porta de seu quarto.- Mas... Poderíamos caminhar pelo campus, ainda não conheço nada direito.
- Será um prazer. Te mostrarei os prédios dos cursos que ficam aqui perto, as lojas para os universitários e depois poderemos almoçar. O que acha?-
- Acho uma ótima ideia, Otto. E obrigada por tanta hospitalidade.-
- Não precisa agradecer.- O canto da boca de Otto se ergueu em algo parecido com um sorriso.
A fisionomia dele fazia Pamela lembrar de alguém, embora ainda não tivesse assimilado.
Os dois caminharam de volta para as escadas, descendo os degraus até o outro piso. Eles cruzaram a área em comum do prédio em que ficava os dormitórios conversando sobre amenidades e passaram pela outra porta, que dava acesso á rua.
Na área em comum tinha os outros estudantes dispersos pela pequena cafeteria que ficava de frente, e sentados pelos sofás e cadeiras que vinham acompanhados de pequenas mesas para estudos. Sentado próximo à janela que ficava acima de um dos sofás estava Henrique, acompanhado de seus amigos de sempre: André, Thom e Gustavo.
- Aquele ali não é o seu primo com a colega de quarto da sua irmã?- Observou Gustavo, de maneira maliciosa.
Henrique virou a cabeça no sentido em que o casal estava, vendo-os cruzarem á sala e saírem do prédio.
- Bonita a moça.- Comentou André.
- Pufff. Essa coisinha esquisita?- Zombou Henrique.
- Está implicando só porque ela não caiu aos seus pés, como a maioria.- Provocou André.
- Não me sentiria atraído por essa magricela nem se ela fosse a última mulher da face da terra.- Henrique bufou.
- Bom... Toda história de amor começa assim.- Thom cutucou a costela de Henrique com o cotovelo.
- E desde quando você se prende a esses detalhes?- Henrique ergueu uma sobrancelha.
- História de amor?- Gustavo gargalhou.- Que espécie de bicho exótico você virou?
- Bom, eu acredito nisso.- Thom deu de ombros.
- Eu achei a novata gostosa.- Comentou Gustavo.
- Não deveria se referir a uma mulher desse jeito.- Repreendeu André.
- Vocês dois não são homens.- Gustavo disse á Thom e André.- São duas gazelas cobertas de... Como é o nome daquele brilho?-
- Purpurina.- Ajudou André.
- Viu como ele sabe?- Respondeu Henrique, com um sorriso malicioso.
André revirou os olhos, e Thom quase imitou o gesto.
- Isso não me ofende. Um homem não seria menos homem por não se sentir atraído por uma mulher.- André disse secamente.
- Eu concordo.- Falou Thom.
- Estão querendo justificar a atração que vocês sentem por homens?- Gustavo continuou com a provocação.
As vozes de seus amigos debatendo sobre o tema foram ficando distantes. Henrique estava pensativo sobre tudo o que lhe ocorreu naquele dia.
E por que diabos parecia incomodar tanto o Otto ter se dado bem com a garota nova, enquanto ele não?
Ele claramente não tinha respostas claras para isso. Exceto, é claro, o fato de que o primo sempre tentava competir com ele em tudo.
Era isso, Otto queria esfregar na sua cara que podia conquistar a única garota que o menosprezara, a essa altura já tinha se espalhado a confusão entre Henrique-Malu-Pamela.
Mas Henrique não deixaria isso barato. Ele iria mostrar para o seu primo que sempre consegue tudo o que quer, incluindo a garota nova.