Inferno pessoal

4948 Words
Quando se questionara se Gabriel agiria estranho, Theodore deveria ter se questionado também. Daria um crédito a si mesmo, pois, não imaginara que ao pisar no pátio da escola o seu estômago se reviraria só de ansiar ver o alfa. Estava muito ansioso. Por isso, queria fugir. Era simplesmente desagradável se sentir daquela maneira. Nem conseguira ficar sentado debaixo da tabebuia como de costume, indo direto para o corredor aguardar na porta da sala onde poderia encarar o chão esperando o tempo passar. Se ficasse no pátio poderia encontrar Gabriel, e não fazia ideia de que cara fazer. Com certeza ficaria corado. Faria alguma careta estranha? Não queria. Desejava passar tranquilidade, fazer uso da mesma cara de p*u que fizera na noite anterior ao se encontrar com o seu melhor amigo. Fingir que nada aconteceu. Isso seria maldade demais, não seria? Não poderia fingir. Algo, de fato, aconteceu. E foi muito bom. Coçando a nuca, o ômega percebia o quão patético estava sendo. Fugir de Gabriel só poderia dizer que algo estava errado. Não fizeram nada de errado. Talvez fazer aquilo na escola... É. Fizera alguma coisa certa no ambiente errado. Mas não era esse o ponto que queria chegar. — Ei, Theodore! Bom diaaa! Balançando a cabeça para afastar os pensamentos quando ouvira Pedro o chamar, Theodore erguera os olhos e sorria gentilmente para os dois rapazes do primeiro ano que se aproximavam ao longo do corredor. — Eaí meninos. — Lilian me passou o recado sobre sábado. — Dizia Pedro sorrindo todo alegre. Deveria gostar, e muito, de Lilian para sorrir daquela maneira só de mencioná-la — E estamos pensando em nos reunir nas arquibancadas nesse sábado pra fazer uma torcida organizada. O que acha? — Uma torcida organizada? — É... Digo vocês vão competir as quartas de final já, não é? — Se conseguirmos vencer o time que jogaremos de manhã, acho que de tarde já irão disputar as quartas. — Ponderou Theodore concordando com a cabeça. — Ah, Lilian disse que tinha um colega de classe do time, não é? — É ele aqui. — Sorria Pedro abraçando o outro garoto que lhe acompanhava. Theodore o olhava atentamente e arregalava os olhos. — Uou, não fazia ideia, foi m*l Bruno. O garoto de estatura mediana e ombros curvados abrira um sorriso cansado. — Tudo bem, sou acostumado a não marcar presença. Theodore queria dizer “eu sei”, mas limitou-se em uma careta de pesar. Bruno tinha uma postura semelhante a de Nicolas, tirando o fato de que ele nunca se destacava na quadra. Sua presença era quase invisível durante os treinos. Por não saber trabalhar bem com sua falta de presença, o técnico acabou o colocando no banco dos reservas. — Está ansioso pra pisar na quadra sábado? — Nem me fale, sinto que terei um piriri na hora. E isso me deixa ainda mais nervoso. — Antes da partida começar posso te ajudar a se aquecer, e então farei alguma coisa pra te relaxar. O que acha? Bruno abrira um preguiçoso sorriso. — Faria mesmo? Eu ficaria muito grato! Não tinha como não rir diante da semelhança entre ele e o seu melhor amigo. A aura preguiçosa era grande demais. Será que Bruno teria algum talento escondido como o seu capitão? Theodore sentia que seria o caso. — Tudo bem. Então, sobre a torcida, o que pretendem fazer? — Ah, Lilian já tinha bolado alguma coisa essa semana e ficamos ensaiando até o final da aula. — Sussurrando para Theodore, Pedro espreitava os olhos desconfiados — Quando perguntei se você já sabia disso ela fugiu do assunto, então saiba que nossa representante é uma ninja disfarçada de anjo. Theodore reprimira o riso. — Terei isso em mente e ficarei em alerta com ela. — Certo. Ah, então resolvi detalhar o que pretendemos fazer, já que Bruno comentou algo sobre o capitão do time não gostar muito de barulhos. Os três se aproximaram e inclinavam-se sobre os papéis que Pedro apresentava. Theodore ficara surpreso que o vice representante de turma do primeiro ano tivesse tanto capricho em detalhar uma simples torcida de time. As posições de cada um, o espaço que pretendiam ocupar nas arquibancadas, os equipamentos que pretendiam levar, a letra da torcida e até os momentos que consideravam oportunos para torcer. Bruno dava alguns pitacos pontuais sobre os momentos que considerava ideais para certos gritos de terra. Até mesmo o tempo de duração deles fora trabalhado. Tudo isso a partir de sua observação no banco de reservas. Theodore não tinha como se surpreender com aqueles meninos. Parecia que a sala de Lilian era repleta de pessoas inteligentes e talentosas. Todos esses talentos eram usados e direcionados pela sua representante de turma. Certamente Theodore fizera amizade com uma pessoa que agia feito um ninja... Ou melhor, seria uma líder ninja. — Acha que podemos fazer isso? — Vou conversar com Nico e com o professor, e ver o que eles acham. Se Nico souber de antemão da torcida, acho que ele não vá se irritar. — Foi o que pensei. Mas será que nossa turma vai ser o suficiente? Os times das outras escolas parecem ter torcidas bem maiores. — Ganharemos no quesito organização, foi o que Lilian disse. — Sorria Bruno, que logo abraçara Theodore pelo ombro o chacoalhando — E além disso, temos o nosso bonitão aqui que com certeza terá sua leva de fãs se juntando a nós. Leva de fãs? Theodore? O ômega rira. Ele não tinha fãs. Uma ou outra pessoa é que conversara consigo desde a história do Orkut, mas não eram tantas pessoas assim. Duvidava muito que essas pessoas tivessem coragem de juntar à torcida do primeiro ano, que era sua apoiadora oficial. — O seu irmão bem que poderia se juntar a nós. Já que o representante deles é o Mckenzie. — Seria bom até se a turma do Theodore se unisse. Mas Lilian disse que essa primeira partida vai ser essencial pras outras turmas nos assistirem e desejarem fazer parte. Eu tô te dizendo, ela pensou em tudo. — Você realmente gosta dela. — Murmurava Theodore, rindo quando as bochechas de Pedro ficaram rosadas. — Veja só como eles parecem estar se divertindo muito. Os três garotos ergueram os olhos para o pequeno grupo de Mckenzie parados no corredor. Theodore enrijecera os ombros no mesmo instante em que encontrara Gabriel ao lado de Sadie, tendo seu braço agarrado ao da garota. Um gosto amargo subira em sua boca, o fazendo desviar os olhos só para bufar. — Algum problema? Estamos conversando com o nosso representante. — Questionava Pedro parecendo confiante. Parecendo. Pois, Theodore sentia o braço dele tremer, já que ainda estava em seus ombros. Estaria aquele garoto tomando coragem para lhe defender? — Problema algum. Parece que o Theozinho finalmente fez novos amigos, podendo deixar os outros em paz. Sadie apertava o braço de Gabriel, descendo os dedos até o pulso do alfa. Observando aquilo com um espreitar de olhos, Theodore retribuíra ao olhar de Gabriel. Se havia qualquer sinal de nervosismo antes, ele se fora. Havia se esquecido por completo do empecilho que ainda existia em seu caminho. — Então que tal você deixar o Theozinho em paz também? — Resmungava Pedro, apertando o abraço no ômega. — Por acaso é o novo namoradinho dele? Está o defendendo com unhas e dentes. Ah... Era aquela história de novo. Sadie sempre apertaria a tecla do namorado de Theodore. Sempre. Enquanto Theodore não arrumasse alguém para firmar um relacionamento, ela não sossegaria. Recordou-se da conversa de Lilian na noite passada. Ficava feliz com suas palavras sobre ter o próprio tempo para criar coragem e enfrentar Sadie, ou qualquer outra pessoa que tentasse brigar consigo. E era grato também. Todavia, Theodore queria ser mais forte. Depender menos das outras pessoas, em especial de Nicolas, para se defender. A briga era sua e de mais ninguém. Lilian queria que Theodore visse o próprio brilho, e ele também passara a desejar por isso. Erguendo os ombros em uma atitude corajosa, Theodore retribuía ao olhar de Sadie abrindo um sorriso ladino. — E você? Já arrumou um namorado para deixar de cuidar da minha vida? — Theodore olhara direto para Gabriel — Ou será que ele ainda não sabe? Gabriel dera um passo sendo segurado por Sadie, prestes a responder o ômega. Mas sua boca se calara também. — Não quero que você o seduza como fez com o meu primo. Esperarei que coloquem uma coleira no seu pescoço. Não se deixe abalar. Não baixe a cabeça. Respire fundo e mantenha a calma. Ela quer te desestabilizar. — Você tem tão pouca confiança assim? Por acaso, está se rebaixando? — Me rebaixando, se toca viado! — Então pode arranjar um namorado tranquilamente. Porque mesmo que tenha outra pessoas mais bonitas em sua volta, ele continuará olhando pra você. — Abrindo um sorriso ladino, Theodore cruzava os braços. — Preciso realmente te ensinar esse tipo de coisa? É tão tapada assim, Sadie? Thunder saíra de trás da garota, segurando a gola do moletom de Theodore com ferocidade. — É melhor controlar a tua língua, já que teu homem não tá aqui pra te defender. — Tem certeza? A resposta de Theodore fora um mero sussurro quando Gabriel surgira segurando o punho de Thunder para afastá-lo. O olhar gélido do alfa certamente causara algum medo no jogador, apesar de não deixar transparecer. Arrumando o moletom, Theodore sorria vitorioso. Tinha visto o alfa se desvencilhar dos braços de Sadie no mesmo instante que Thunder havia corrido em sua direção. Porém, imaginava que ele o tiraria dali para conversarem, e não que agarraria ao colega de time. Afinal, Theodore também estremecera com aquele olhar. Virando-se para os dois meninos do primeiro ano, Theodore sorria para eles. — Vamos conversar com o técnico sobre esses detalhes. Assim vocês conseguem se organizar ainda hoje sobre isso. — Está fugindo seu bosta? — Gritava Thunder ainda sendo contido por um Gabriel silencioso. Fora a vez de Theodore olhar friamente para aquele grupo. Um olhar ladino sobre o ombro, apesar da ponta dos lábios sutilmente levantada mostrando um toque de malícia. — Quem está no banco deveria se comportar, se não jamais pisará na quadra. Seja um bom garoto, Thunder. Lançara um último olhar para Gabriel, talvez repleto de significados que torcia para o alfa compreender. Sim, seria aquele mundo que ele entraria. Onde todos iriam falar m*l de si. Um mundo onde ficar em silêncio era uma condenação ainda mais penosa. Theodore avisara Gabriel na noite anterior de que ele deveria se posicionar. Avisara, pois sabia que Sadie não esconderia as garras afiadas contra o seu pescoço. Para a sua tristeza, Gabriel parecia ainda não ter se decidido. Apesar de na noite anterior ter dado a entender o oposto. Porra, Gabriel o masturbou até gozar! O excitara tanto que deixou naquele estado. E ainda dissera que provaria seus sentimentos. Seria daquela maneira? Provaria seus sentimentos somente quando estivessem à sós? Gabriel parecia esconder alguma coisa. Theodore sentia isso. Ao mesmo tempo confiava nele, pois ele sempre estava lá. Como um príncipe encantado pronto para salvá-lo. Estava ficando confuso demais. Quando os três garotos se afastaram daquele corredor abafado, Pedro olhara preocupado para Theodore, que tinha seus punhos cerrados e trêmulos. Inclinando-se para lhe sussurrar, Pedro tentava afagar os ombros do ômega para acalmá-lo. — Tem certeza de que está tudo bem em falar aquelas coisas? — Tá tudo bem. Não fiz nada de errado, nunca dormi com alguém que não quisesse. Então porque eu deveria ficar com o r**o preso entre as pernas? Um sorriso surgia nos lábios de Pedro e de Bruno. — Estamos contigo, cara. Dessa vez Theodore sobrevivera com ajuda de seus mais novos amigos. E quando passara pelos corredores para ir até a sala dos professores, um olhar determinado brilhava em sua face. Se era um jogo intenso que Sadie e Gabriel queriam.. Era o que teriam. 「 • • • 」 Ser mordido por uma pessoa era a coisa mais estranha do mundo. Desde a sua infância Milles fora ensinado e aconselhado a ser cuidadoso com a mordida, pois, deveria fazer quando amasse muito a pessoa. Admitia, pelo menos, que focaria nisso só quando fosse adulto e responsável. Até chegar lá, se permitiria se divertir com as garotas para ter mais experiência e não ter um casamento meramente chato. Pelo menos na cama. No entanto, jamais imaginaria que o momento em que morderia alguém acabaria daquela maneira. Com ele sendo mordido. Por um ômega gay. Alguém que ele detestava. E, para melhorar a sua auto flagelação, o sujeito que parecia ser sua alma gêmea. Era o combo perfeito para a ruína de Milles Mckenzie. Seu ombro doera a noite toda desde que fora mordido. Apenas uma compressa com água quente aliviava a dor, e ainda assim se sentia incomodado. Desde aquela fatídica noite Milles tivera de ser extremamente discreto em casa. Ao invés de usar a porta da frente, tivera de escalar uma árvore para chegar até sua varanda, caso contrário sentiriam o cheiro de Nicolas impregnado em si. Evitara comer na mesa junto com seus familiares, afirmando precisar de concentração para estudar para o vestibular. O que era uma grande mentira da qual todos sabiam, mas pais sempre mantinham uma esperança para se agarrarem. Na escola, tentara ficar o mais longe possível do capitão, o que fora uma tarefa difícil. O cheiro dele parecia sobressair entre os demais, garantindo que fosse a primeira pessoa a saber de sua chegada. Seus olhos buscavam a figura baixinha, para se manter por perto. Só que, p**a merda, a pessoa que o mordera fora justamente Nicolas. O baixinho de paciência curta que parecia se divertir em infernizar a vida das pessoas. Logo ele. Para a sua onda de reclamações, Nicolas parecia não fazer ideia do que fizera naquela noite. Agira como sempre fazia, ignorando sua existência quando em público e o provocando quando sozinhos. Era como se nada tivesse acontecido, agindo plenamente enquanto o próprio Milles tinha de lidar com o intenso desejo de ficar perto dele. Pois era isso que seus instintos e a maldita mordida queriam que ele fizesse. Ficasse perto. O dominasse. Mas o orgulho berrava. Ele era quem estava sendo dominado. O conflito interno de Milles era tão atordoante, que mau dormira nas noites seguintes. Revirava-se na cama pensando em alguma saída para aquela situação tão deplorável. Pesquisara na internet, lera revistas, tentara buscar ajuda em livros, mas nada parecia dizer o contrário de “se conecte ao seu par”. Não queria. Não queria se conectar a Nicolas. Nem fodendo. Quando aquele maldito baixinho começara uma briga com os meninos do time de vôlei, Milles fora incapaz de agir de imediato. Sentia o prazer que o ômega estava tendo. Era o nível da ligação que eles tinham a partir de agora. O alfa sentiria tudo. Até mesmo o seu corpo reagira instintivamente para protegê-lo, como se absolutamente ninguém pudesse tocar o seu ômega. Naquela quinta-feira de tarde, Milles estava completamente cansado. Seu treino estava ridiculamente horrível, não conseguindo se concentrar de tão sonolento que se encontrava. O técnico já havia lhe dado várias broncas, mas nem dera ouvidos. Só pensava em matar um certo ômega baixinho que destruíra a sua vida. — Você está doente por acaso? — Perguntava Gabriel enquanto eles descansavam do treino. Milles suspirou pesado ao se jogar no chão e encostar-se na parede do ginásio enxugando o suor com uma toalha. — Lutar contra isso aqui — Sussurrava apontando para o curativo em seu ombro — É mais complicado do que você acha. — Eu queria te perguntar sobre isso, mas não parece muito confortável em falar. — Não é questão de estar confortável. Eu também não entendo. — Fazendo uma careta, Milles bagunçava os cabelos irritado, virando-se para o seu melhor amigo — É uma coisa doida. — Sou todo ouvidos. Fora a brecha que Milles necessitava para disparar o seu desabafo. — Apesar de eu não querer, e não quero mesmo, ficar colado no r**o desse infeliz, isso aqui não deixa. Se ele fica irritado, eu sinto. Se ele fica feliz, eu sinto. Se ele quer ser fodido, provavelmente vou sentir e irei me candidatar pra f***r ele. Gabriel arregalava os olhos para o amigo, reprimindo o riso com uma tosse discreta. — Ok... Então a mordida faz com que você queira fazer coisas que geralmente não gostaria. — Se fosse apenas a nossa disputa seriam outros quinhentos. Isso é golpe baixo. E ele ainda tem a cara de p*u de fingir que não lembra de nada. — Theo disse que ele realmente não lembra. — Meu r**o! — Gritara o alfa, chamando a atenção dos demais. Gabriel fizera um gesto para não se preocuparem, e logo Milles continuara, dessa vez mais brando — Eu estou desejando ele desde que fui mordido, Biel. Eu quero aquele maldito ômega de quatro pra mim numa cama. Estou enlouquecendo porque tento reprimir isso. — Já que você disse que não ficaria de quatro por ele. — Lembrara Gabriel. — Exato! Gabriel concordara com a cabeça entregando uma barra de cereal para Milles, que aceitara a abrindo ruidosamente e a mordendo com raiva. — Ficar indo contra teus instintos, então, está te deixando nesse estado? — Não só isso. Quando estou jogando, se foco na bola é como se meus instintos me driblassem pra proteger ele. — Milles suspirava enquanto mastigava, observando a confusão nos olhos do amigo. — Quando percebo, estou protegendo ele com o meu cheiro. — Tá zoando? — Queria. Isso gasta minhas energias, porque ele não para quieto na quadra. Sempre pulando e sendo feroz... Argh! — Por que raios os seus instintos iriam proteger ele? Digo... Nicolas sempre usa aqueles adesivos, pelo que entendi. — Ele não tem usado desde que me mordeu. Eu sinto o cheiro dele de longe, sei quando está por perto. É isso que faz uma ligação, apesar de ser incompleta. — Terminando de comer a barrinha, Milles estendera a mão para Gabriel. O moreno arqueara a sobrancelha como se incompreendesse, mas o seu melhor amigo parecia saber que tinha outra em sua mochila. Revirando os olhos, Gabriel entregara a outra barrinha para Milles. — Não quero que ninguém sinta o cheiro dele. É bom demais, atrativo demais. Só de pensar que outros alfas podem sentir seu cheiro e vir pra cima do capitão... Eu fico louco. É como se ninguém pudesse tocá-lo. Só eu. — Mas nem você quer tocar nele. — Agora sabe porque estou nesse estado lindo e maravilhoso. Mas chega de falar de mim, quero saber de tu. Como foi a f**a ontem à noite? Imediatamente os olhos de Gabriel esbugalharam e ele ainda cuspira a água que bebia, engasgando-se tendo um acesso de tosse logo em seguida. Milles abrira um sorriso ladino ao perceber ter acertado um ponto. — Como sabe disso? — O cheiro dele tá impregnado em você. — Os outros podem sentir isso? — Estou sensível, graças ao peido do capeta. Então, o que rolou? Gabriel abraçou os joelhos encarando Theodore conversando com Nicolas e o treinador. Suspirou brevemente antes de confidenciar o que teria acontecido na noite anterior após conversar com o ficante, não escondendo sobre o assunto de Sadie. Milles nem se surpreendia que sua irmã mais nova se intrometera no assunto, apesar de ter sido aconselhada a não fazê-lo. Sua teimosia era impressionante, se não fosse lerda. Era tão claro quanto dia que Gabriel gostava de Theodore. Bem, até ele fora cego se não fosse sua própria confusão com o capitão. Desde aquele domingo as coisas ficaram cristalinas como água. — E o que tu achou? Curtiu? Queria fazer mais alguma coisa ele? — Seria mentira dizer que não. Eu meio que perdi o controle, sabe? Aquilo que você falou sobre o cheiro do capitão... Eu te entendo, porque na hora Theodore liberou um cheiro que.. c*****o, como era bom. — Dá vontade de f***r ali mesmo, não é? — É, apesar de eu não dizer essas palavras. — Ria Gabriel. — É simplesmente incontrolável. A voz dele me chamando, cada reação parece acrescentar pra tudo ficar mais intenso ainda. Mas não queria que tudo terminasse ali mesmo. Ele merece algo mais... Apropriado. — Ele não é virgem, Biel. Um rosnado escapara dos lábios do moreno. — Apagarei qualquer lembrança que ele tenha com o teu primo. E pare de mencionar ele. Theodore está comigo agora. Milles erguera as mãos em rendição, ainda mastigando a barra de cereal. — Mas as coisas não estão fáceis agora, pelo que me falou. Parece que o Theozinho está esperando uma atitude sua. — Eu já disse pra tua irmã que não to afim dela. O que mais posso fazer? Gabriel parecia estar em algum dilema desconhecido por Milles. E tudo o que podia fazer era lhe dar algum conselho misterioso, já que haviam limites. Afagando seus ombros, o alfa sorria para o amigo. — Theodore está ficando popular, e a galera sabe que ele é ômega. Se tu ficar enrolando, independente do quanto ele goste de você, poderá se cansar e escolher outra pessoa. Alguém que queira segurar a mão dele e ir contra a maré. Se quiser ficar com Theodore, segura na mão dele e assuma. — Você está realmente me dando esse conselho? — Faça isso antes que algum i*****l morda ele. Esse é meu conselho. Dando tapinhas nas costas de Gabriel, Milles se levantara para voltar ao treino. Era muito mais fácil escutar os problemas dos outros para dar conselhos, do que receber conselhos e tentar enfrentar os próprios problemas. Mais tarde, após o treino terminar e Milles sair do vestiário devidamente vestido, ele deixara o ginásio deparando-se com o aroma adocicado no ar. O mesmo aroma que decorara nos últimos dias. Seus pés buscaram o dono do tal cheiro, o fazendo atravessar o pátio indo até a janela do prédio onde estudavam. Estando aberta, Milles pudera ver Nicolas e os outros dois garotos cumprindo o castigo dado pela coordenadora. Milles rosnava em perceber que lá estava ele o observando de longe. De novo. Por que tinha de agir como sua sombra? Por que tinha que desejar aquele maldito? Sentando-se no gramado antes que fosse visto, o alfa recostou-se na parede e fechara os olhos. Poderia dormir ali mesmo. Sentia que podia relaxar. Talvez fosse por Nicolas estar por perto o suficiente para baixar a guarda por alguns instantes. Será que sua insônia seria um sinal de que se tornara dependente do cheiro de Nicolas? Pelos céus, tomara que não. Tampouco aquilo importaria naquele momento. Só queria descansar por alguns minutos antes de ir para casa. Seria o suficiente por ora. Meros minutos, pois sabia que não poderia dormir por longas horas. E assim permitira. Sob a presença de Nicolas a poucos metros de distância, escondido, aquele alfa dormia. Quando abrira os olhos novamente, uma hora havia se passado e o cheiro do ômega estava mais forte. Olhando para cima, percebia Nicolas o observando da janela, com sua cara de poucos amigos como de costume, apoiando o queixo sobre a palma da mão e o cotovelo na janela. — Que soninho gostoso, hein grandalhão. Milles revirou os olhos ainda entorpecido da soneca que tirara. Levantando-se do gramado, ajeitou a mochila em suas costas virando-se para o capitão. — Graças a um certo alguém, não tenho tido boas noites de sono. — Está me culpando por alguma coisa? Pois tenho dormido muito bem ultimamente. Revirando os olhos já sentindo o sangue ferver em raiva, Milles deixava as mãos nos bolsos das calças e bufava. Ato que sempre fazia quando o assunto era Nicolas. — Sem sentir um pingo de remorso, não é? — E por que eu deveria? — Fingir demência não é sua praia, Nicolas. Sabe muito bem o que fez. — Não deve ter sido algo relevante a ponto de eu me lembrar. Principalmente por se tratar de você. — Nada relevante? — Esbravejara o alfa, ficando ainda mais irritando por notar que Nicolas nem se movera ou se surpreendia com sua raiva. Era como se nada o atingisse. — Seu bosta, tem noção do que fez comigo? Do que está fazendo comigo? — Não tenho. E nem pretendo ter, me parece perda de tempo. As mãos de Milles foram direto para a gola da camisa de Nicolas, que ainda assim não se movera, permanecendo naquela pose preguiçosa e desinteressada. Estando tão perto dele, Milles sentia ainda mais seu cheiro, e o desejava ainda mais por notar seus lábios finos e os ossos de seu peito graças aos primeiros botões abertos de sua camisa. Como ele poderia não saber? Não era nítido o quão deplorável estava? Lutando contra sentimentos que não queria ter, por culpa dele? Por culpa da mordida que ele lhe dera? — Você joga sujo, capitão. Eu sei que você sente a mesma coisa que eu sinto, mas não precisava chegar a esse ponto. Isso pode destruir a minha vida... Não. Já destruiu a minha vida. A voz de Milles soara rancorosa, deixando nítido seus sentimentos. Os olhos refletiam a fúria flamejante em um fio avermelhado. Queria dizer muito mais, só que existia uma maldita ligação o impedindo. Impedia de odiar profundamente aquilo que desejava. O cheiro de um alfa se tornara presente. Milles sentia, mas não conseguia se mover. Estava preso em seus próprios sentimentos tornando-se fraco diante da última pessoa que desejava ver sua vulnerabilidade. Os dedos apertavam a gola da camisa de Nicolas, seus olhos escuros e felinos o fitavam cansados. Antes que sua presença fosse notada pelo alfa que se aproximava, Nicolas erguera a mão livre e mergulhava seus dedos aos cabelos loiros de Milles. O puxara o suficiente para esconder seu rosto em seu peito, sem perder a postura desleixada na janela. — Qual é Nicolas, vai ficar aí batendo papo com o Theodore? A gente tem outro banheiro pra limpar, seu babaca. Nicolas apenas olhara sobre o ombro em direção de Thunder, um olhar afiado o suficiente para fazê-lo retroceder alguns passos e lhe dar as costas depois de xingá-lo. Milles, por outro lado, estava petrificado. Fora protegido por Nicolas. O seu amigo nem reconhecera a sua presença ou seu cheiro, acreditando ser Theodore. Não acreditava naquilo. De maneira alguma acreditava naquilo. Por tudo que era mais sagrado, aquilo mexera consigo. Sentia de perto o cheiro de Nicolas, fazendo seu coração bater acelerado e seus instintos berrarem. Seus dedos afrouxaram o aperto em sua gola, tocando suavemente sua pele. Podia notar estar ficando confortável e relaxado com a mão dele em seus cabelos. Tudo o que menos queria. — É a segunda vez que você pede minha atenção, grandalhão. — Sussurrava Nicolas ainda olhando sobre o ombro, vigiando se os meninos estariam por perto — Por acaso já está caindo de joelhos por mim? — Seu desgraçado... Milles rosnara desejando fortemente empurrar Nicolas, mas tudo o que pudera fazer fora voltar a cerrar os dedos na camisa dele. O ômega suava pelo esforço feito em limpar os banheiros, o que liberava ainda mais seu aroma. Milles simplesmente não queria sair dali. — Já que estamos nessa disputa, nada me impede de ganhar vantagem. — Voltando a olhar para o alfa, Nicolas suavizara o aperto em seus cabelos podendo ter os olhos castanhos de Milles sobre os seus — Foi o jogo que você quis jogar, Milles. Eu te beijei naquele dia pra que entendesse o seu lugar e deixasse o meu melhor amigo em paz. Mas você veio atrás de mim, e começou essa disputa. O alfa não respondera, apenas engolira em seco aquelas palavras jogadas na sua cara sem um pingo de delicadeza. Não que devesse esperar algo parecido de Nicolas. Jamais. — Me recuso a perder pra você, só isso. — Você já está viciando em mim, seu bosta. — Sorria Nicolas com escárnio em sua voz, e sem soltar os seus dedos dos cabelos de Milles. — Mas dou o braço a torcer. Parece que eu fiz alguma coisa contigo. — Ainda tem coragem de dizer que fez alguma coisa? — Não se preocupe. Vou assumir a responsabilidade pelas minhas merdas. E então, tão inesperado quanto qualquer outro ato vindo de Nicolas, o alfa se surpreendia quando sua cabeça fora empurrada em direção do ômega e sua boca capturada pela dele. Milles era beijado por Nicolas sem que nenhum deles perdessem a consciência. Era como se nada demais tivesse acontecido. Para o inferno pessoal, e talvez deleite, de Milles o beijo dado era do jeito que gostava. Ou pelo menos de um dos jeitos que gostava, já que quando se tratava de Nicolas, tudo parecia uma estreia prazerosa. Os lábios dele se moviam lentamente naquele ósculo, mas sua língua era curiosa em explorar a boca do maior. Os dentes do ômega mordiscavam os lábios do alfa, rasgando a pele para que o gosto de ferro se mesclasse naquela brincadeira. Tudo o que Milles pudera fazer, fora retribuir ao beijo como um louco desesperado. Sentindo o gosto do capitão se mesclar ao seu, surgindo a necessidade de ter muito mais daquilo. Entretanto, quem dominava era Nicolas, já que ele mesmo não tinha qualquer força para aquilo. Um beijo glorioso e gostoso por ser lento, mas sedutor em sua singularidade. Nicolas brincava consigo perigosamente. Quando afastou-se findando o beijo, o capitão o virou de costas e o empurrou mandando-o embora. Milles o olhara sobre o ombro, vendo sorrir em escárnio ainda apoiando o queixo na palma da mão parecendo preguiçoso. Milles teria sua vingança. Principalmente por ter conseguido dormir, finalmente, naquela noite.

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