Capítulo 06 - Olhos carmesins

1789 Words
Não gostava deles? É… ele não gostava. Contudo, a sensação de ver os personagens do seu livro predileto em carne e osso era muito… assustadora. Quer dizer, havia ali uma pequena ponta de euforia e surpresa, no entanto também existia algo estranho e assustador. Tipo uma pessoa cética se deparando com um fantasma e questionando a própria sanidade. A pessoa sente um frio na barriga, um arrepio na espinha e sente sua alma sair do corpo pelo susto. Como se estivesse lidando com o sobrenatural inconscientemente. Essa era a sensação de ver Maverick de longe. Tal como descrito, ombros largos, corpo forte, cabelos curtos e castanhos claros… pelo menos foi isso o que Lucian conseguiu enxergar de longe. Estava prestes a dar uma olhada nos irmãos mais novos de Magnus, quando Raven puxou o seu braço ao alcançarem o final da escadaria. Dando apenas um aceno para os convidados, o oitavo príncipe acompanhou a sua irmã para o centro do salão que já estava vazio e pronto para dar início à dança. Assim que os músicos avistaram Raven no centro do salão, eles começaram a tocar os seus instrumentos em uma melodia lenta e harmoniosa. Então… O que ele deveria fazer? Até agora foi fácil fingir ser um príncipe, afinal já leu diversas histórias de princesas e príncipes e sabia como eles se comportavam, mas dançar já era algo completamente diferente. Que ritmo era aquele? Valsa? Tango? Flamengo? Mesmo se soubesse qual estilo fosse, isso não significava que ele saberia como dançar! Ele chegava a tremer por dentro e o seu sorriso parecia forçado e trincado. Se Raven prestasse bem atenção, ela notaria que os seus dedos tremiam também. Assim que Raven segurou a sua mão e o seu ombro, as mãos de Lucian foram para a sua mão e cintura. E então aos poucos eles davam pequenos passos para os lados, como se ainda estivesse pegando o ritmo. — Haha, está nervoso por dançar com a sua irmã? — Não sou um bom dançarino, receio envergonhá-la na frente de todos. — Que mentiroso. Infelizmente não era mentira. A música foi acelerando e aumentando o ritmo, tornando os passos maiores. Para a surpresa de Lucian, o seu corpo se movia praticamente sozinho e em sincronia com Raven. Tal foi o seu assombro quando percebeu tal movimento. Quer dizer, ele estava se mexendo sozinho sem desejar conscientemente cada passo. Os olhos claros de Lucian se arregalaram levemente em surpresa, os seus pés se moviam junto aos de sua irmã e seus braços a giravam elegantemente. A cada giro, os convidados suspiravam fascinados com a dança dos dois. Mal saberiam que Lucian também estava completamente abismado. Desde que acordou naquele corpo, era a primeira vez que algo assim acontecia. Ele não tinha controle algum, se sentia estranho. Raven, por outro lado, não parecia ter notado o seu desconforto. Ela dançava belamente junto dele, arrancando suspiros dos seus nobres convidados. Sendo rodopiada de um lado para outro, com as delicadas mãos de Lucian a segurando prontamente, a coreografia parecia simplesmente perfeita. Em meio ao seu desconforto e surpresa, Lucian girava pelo salão - sem nem saber como exatamente ainda não tinha tropeçado nos próprios pés - passando perto dos convidados até avistar alguém. Um vislumbre apenas. Naquela valsa graciosa, Lucian viu um par de olhos carmesim brilhantes em sua direção. Quando ele parou de rodar e voltou ao centro do salão, os seus olhos procuraram discretamente por aquele par de olhos novamente, sem encontrá-los. Foi uma ilusão? Pensou ter visto aquele vilão ali. Somente ele tinha olhos carmesim tão brilhantes e ardentes. — Algum problema, Lucian? Baixando os olhos para Raven, o príncipe apenas engoliu em seco. — Não é nada. A música chegou ao seu fim e o salão de banquetes foi preenchido pelos aplausos. Os dois irmãos se curvaram agradecendo os elogios, e logo outra música tocou para que outros casais também dançassem. Estando prestes a fugir, Lucian teve o seu braço segurado por Raven. Ela sorria docemente enquanto sussurrava. — Onde pensa que vai? — Ham… ali. — Nem pense em me deixar sozinha aqui, irmãozinho. Ele estava prestes a dar alguma desculpa para ir atrás do dono daqueles olhos carmesins, mas logo os irmãos foram cercados por nobres que elogiavam a sua valsa. Com Raven segurando firmemente o seu braço, Lucian não tinha como escapar daquela armadilha. Os nobres se viravam preferencialmente para Raven, ignorando a presença do príncipe renegado, o que para Lucian foi um certo alívio, pois não queria ouvir elogios tão vazios e falsos. Durante aquele cerco de elogios incessantes, um cheiro adocicado como vinho fez com que Lucian hesitasse por um momento. A sensação era inebriante. O seu corpo de repente parecia responder àquele aroma, como se um animal acordasse do seu mais profundo sono assim que sentiu a presença de alguém próximo. O aroma de vinho era como o canto de uma sereia, que o enfeitiçava para que caísse no mar. Só que ao invés de enxergar uma bela sereia, no fundo do mar teria um par de olhos carmesins o encarando friamente. Virando para olhar sobre o ombro, Lucian encontrava aqueles olhos. Uma postura ereta e elegante, cabelos pretos como carvão e um rosto bem desenhado. Era como se a beleza do mundo, em sua mais perfeição, se tornasse real diante dos seus olhos. — Magnus… O nome escapou dos seus lábios antes mesmo que Lucian percebesse. O ômega estreitou os olhos ligeiramente, continuando a encará-lo sem piscar. Aquela troca de olhares perdurou por meros segundos, mas ela voltou a causar aquela estranha sensação em Lucian. Aquela sensação assustadora e fascinante de que algo era real. Em seu âmago ele queria fugir. Evitar todos os personagens e garantir que ficasse escondido longe de qualquer um que pudesse puxar a corda em seu pescoço. No entanto, era inebriante aquela sensação arrepiante e horrível. A de que um personagem de uma história estava parado bem na sua frente. — Eu, Magnus Grimwood, cumprimento a Vossa Alteza Imperial — Dizia Magnus ao curvar a cabeça. Lucian piscou aturdido ao ouvir a sua voz, melodiosa e sombria. Um arrepio de excitação passou pelas suas costas, e foi necessário alguns segundos para que ele pudesse se recuperar e botar um sorriso em sua máscara de oitavo príncipe e se afastar de Raven para cumprimentar o seu personagem preferido. — Ora, se não é o famoso Grão-duque. Parabéns pela vitória na guerra. Mantendo a cabeça curvada, Magnus mantinha a etiqueta. — É uma honra servir a família imperial. Perfeito! Magnus era perfeito! Não existia fanart no mundo que fizesse jus à sua beleza real. A qualquer momento, Lucian poderia desmaiar de euforia, e ele nem se importaria com tal detalhe já que ele venceu por ver o seu vilão em carne e osso. O cheiro de vinho vinha dele, apesar que Magnus não segurava nenhuma taça de vinho. Queria cheirá-lo mais um pouco. Sua garganta ficou seca repentinamente, como se tivesse uma súbita sede. — Oh, Vossa Alteza! Mais dois rapazes se aproximaram, e pelos traços similares, Lucian soube que se tratava dos irmãos mais novos de Magnus. O arrepio em sua espinha se intensificou, e Lucian arregalou levemente os olhos ao notar que o mais baixo entre eles segurava uma taça em mãos. O cheiro adocicado de maçã respondeu a pergunta silenciosa e secreta de Lucian. — O suco está bom? — Sim, Vossa Alteza. Eu gostaria de agradecer mais uma vez pela sua gentileza. — Sinto que estou por fora do assunto. Há algum motivo para sermos gratos? Uau, Magnus sabia como ferir o ego de alguém. A sua voz soou tão fria e grossa que chegava a ser irritantemente excitante. — Meu irmão, a Sua Alteza imperial foi considerativo com Eugene e reservou uma bebida sem álcool para ele. Magnus ergueu a sobrancelha e lançou um olhar afiado para o príncipe, no entanto, Lucian se manteve na fachada inocente. Sim, ele ainda não esqueceu o que havia escutado antes do baile e faria questão de vingar o personagem parvo do qual ele tinha possuído. — E por qual motivo a Sua Alteza seria tão generoso com Eugene? — Irmão, isso é grosseria — Avisava Jesse com um olhar sério. — Estou apenas curioso, já que o oitavo príncipe é alguém que não parece se importar com tais detalhes. — Sabe, Magnus Grimwood, você é um dos heróis que trouxeram paz para o nosso império. Sei que é um homem muito respeitável — Lucian intervinha, com um sorriso que não combinava com o significado do seu olhar sério. A controvérsia parecia rachar um pouco a sua fachada de príncipe t**o — mas você deveria saber que independente da sua aversão à minha pessoa, eu continuo sendo o oitavo príncipe. Magnus o encarava silenciosamente como se o avaliasse profundamente. Sim, concordava com ele a respeito de Lucian. No entanto, Luciano era Lucian agora, e não deixaria que a sua pessoa fosse destratada de tal maneira. Mesmo pelo seu personagem preferido. Ainda mais se a vida dos dois dependia daquele forasteiro. — Peço desculpas pela minha grosseria, Vossa Alteza. Apesar de Magnus curvar a cabeça respeitosamente, Lucian sabia muito bem que ele não estava nem um pouco arrependido. Talvez ele estivesse desconfiado já que o Imperador enviou uma proposta de casamento em seu nome. Não seria surpresa se Magnus enxergasse a situação como uma tentativa de ganhar o seu favor. Passaria pano para a arrogância de Magnus, caso sua hipótese estivesse certa. Afinal, era por causa de sua arrogância que Lucian realmente gostava dele. — Tudo bem, eu o perdoo. Além disso, não quero que nenhum problema ocorra durante o banquete preparado pela família imperial. Então não precisa me ver com suspeitas, apenas tomei uma medida segura já que você foi o único a trazer um de menor para essa festa. A feição de Magnus se tornou sombria, o que deixou Lucian contente. Sim, ele não era nenhum t**o. Seria atrevido em apontar a falha no arrogante Magnus justamente para que a sua existência fosse reconhecida. Não importava se era odiado desde que Lucian existisse na vida de Magnus. — Então se derem licença, irei me recolher. Por favor, aproveitem bem o banquete — Lucian sorria virando-se de costas. Mas antes que fosse embora de fato, ele olhou para Magnus sobre os ombros — Ah, caso vejam algum rato se escondendo no palácio avise aos criados, eu adoraria me livrar deles. Surpreso, Magnus estreitou os olhos. Lucian saía orgulhoso de si mesmo. Com certeza ele deixou uma forte impressão em Magnus e ainda deixou o cenário com uma frase de efeito. Ha… ele realmente estava vivendo uma fantasia, será que os protagonistas se sentem assim o tempo todo?
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