— Vamos, Maria — minha mãe me chamou pela décima vez.
Eu estava morta, havia saído na noite anterior com a Alex, minha amiga, e acabei exagerando na bebida.
— Maria… — Ela entrou no meu quarto e começou a abrir as cortinas, a claridade tomou conta do ambiente, e como se isso não fosse o suficiente, ela ainda puxou a minha coberta de uma vez só. — Maria.
— Já estou indo, mamãe — resmunguei ainda meio sonâmbula e ela riu.
Me levantei a contragosto feito um zumbi e fui direto para o banho. Parecia que um caminhão tinha passado por cima de mim.
Depois escolhi uma roupa confortável, pois preciso ajudar na floricultura.
Minha mãe tem uma floricultura num dos melhores bairros de Nova York. Meu pai faleceu quando eu tinha apenas dez anos, em um acidente de carro, ficando dias internado, mas não resistiu. O destino, não satisfeito com o nosso sofrimento, após três anos do falecimento de papai, levou também minha vozinha. Desde então, somos apenas minha mãe e eu.
Vesti um short jeans claro, uma regata azul bebê, um blazer branco por cima e o meu all star azul. Fiz um coque desajeitado no meu cabelo e desci para tomar café.
— Achei que não iria mais descer — mamãe reclamou, me fazendo revirar os olhos, quando entrei na cozinha. — Como foi a noite ontem?
— Até que foi legal — contei.
— Por que você não termina o seu namoro com o Héctor logo de uma vez?
— Estamos bem, mãe. — Sentei para tomar café.
— Já tem mais de um ano e meio que vocês não se veem, isso não é um namoro — afirmou veemente.
— Na próxima semana ele vem me ver. — Tentei tranquilizá-la.
— Espero que dessa vez ele realmente venha.
— Ele virá, mamãe. — Tentei não gaguejar.
A essa altura, até eu já começava a perder as esperanças.
— Vai me ajudar hoje na floricultura?
— Vou sim. — Voltei minha atenção para o café, de modo a encerrar o assunto.
Após nosso desjejum, fui para a floricultura com a minha mãe e, como de costume, passamos o dia todo lá.
As coisas na floricultura estavam indo de m*l a pior, minha mãe fingia que não, e eu fingia que não vinha notando. Os lucros eram poucos, as dívidas foram se acumulando e essa é a única fonte de renda que temos. A vida em Nova York não é nada barata, principalmente porque tivemos que hipotecar nossa casa, a um ano atrás, seria isso ou abdicar da floricultura. E isso eu não poderia deixar, pois ela é a vida de minha mãe. Ela ama o que faz, ama estar entre plantas e flores, organizar arranjos, escrever dedicatórias. Ver um amor nascer por meio de uma flor.
Sai de lá apenas para ir à faculdade.
Sou sortuda em ter conseguido uma bolsa no curso de direito em uma das melhores faculdades do estado. Os custos com os materiais são muitos, mas consigo amenizar os gastos, usando livros de ex-alunos. Eu me esforço ao máximo, é um sonho de minha mãe me ver formada e eu quero que ela tenha muito orgulho de mim.
— Maria — Alex me puxou pelo braço quando me viu passando pelo portão de entrada.
— Oi, Alex, o que foi? — perguntei.
— Tem um novo professor — contou.
— E daí?
— Nossa, Maria, como você é uma chata — reclamou. — Ele é um gato.
— Você sabe que eu tenho namorado.
— Falando em namorado, quando ele vem te ver? — perguntou.
— Na próxima semana.
— Espero que dessa vez ele realmente venha — afirmou.
Alex é minha amiga desde o último ano do colegial, ela conhece a minha história com o Héctor, por isso ela gosta dele, sei que ele já vacilou comigo, mas me jurou que nunca mais iria me trair, e como eu o amo, decidi dar um voto de confiança.
— Senhorita Walker, podemos conversar? — A nossa conversa foi interrompida quando ouvi a voz da diretora.
— É claro, Senhora Moore.
— Até depois, amiga. — Alex me deu um beijo na bochecha e saiu rumando a passos largos para a sala da diretora.
Seguimos para a sala da Senhora Moore em silêncio, tentei me lembrar se tirei alguma nota baixa para estar me chamando em sua sala, mas tamanho o nervosismo não consigo me lembrar de nada. Sempre fui uma aluna exemplar, então acho que não é em relação à nota.
— Senhorita Walker. — Indica o lugar para que eu me sente. — Falta apenas dois semestres para que você se forme.
— Já estou no final do oitavo. — Mexo as mãos um pouco nervosa.
— No próximo ano você não terá mais a sua bolsa. — Me olhou por cima dos óculos.
— Como assim?
— A empresa que doava parte dela, fechou.
Fiquei em silêncio por alguns minutos sem saber como relacionar, como eco suas palavras vão e vem na minha mente, “eu não posso ficar sem a bolsa e-eu… Meu Deus, o que eu vou fazer”.
— Como assim fechou? — Deslizei minha mão pelos fios de cabelo, não é possível que isso esteja acontecendo comigo.
— Na verdade, ela foi comprada por outra empresa, e até então eles nada informaram quanto a continuidade do programa de bolsas.
— Meu Deus! O que eu farei?
— As suas notas são excelentes, você é a melhor da turma. — A senhora Moore me encarou, apoiando suas mãos sobre a mesa. — Mas isso não é o suficiente para te manter aqui sem uma bolsa integral. Veja com os seus pais. De repente eles possam pagar a metade do valor da mensalidade.
— Não, somos apenas minha mãe e eu, e mesmo com a floricultura, não temos o suficiente para pagar esse valor, ainda que eu consiga manter a bolsa parcial.
— Sinto muito por isso.
— Posso ir? — perguntei.
— Claro.
Segui para sala sem rumo, essa notícia me pegou de surpresa, preciso dar um jeito de conseguir um emprego e pagar os dois semestres que faltam.