Quinze anos se passaram depois das confusões de Bruna e Vitória. Era aniversário de Guilherme e todos estavam reunidos em uma pizzaria. Nem todos puderam ir, mas mesmo assim a mesa que reservaram era bem grande.
— Aquele seu amigo doido vem? — Júlia perguntou.
— Ele não é doido. Só... diferente.
— Doidinho.
Guilherme revirou os olhos e ela sorriu.
— Como se você nunca tivesse tido dezoito anos na vida — disse carrancudo.
— Tive, mas não era desse jeito.
— Vamos mudar de assunto — falou estressado.
— Cuidado com ele. — Bebeu o refrigerante e não olhou na direção de Guilherme.
— Como assim?
Ela sorriu e não respondeu. O garoto suspirou frustrado. Odiava quando ela fazia isso. Logo viu a família de Bianca se aproximar e sorriu olhando Emily. Ela sorriu de volta. Eles parabenizaram ele e Emily sentou ao seu lado. Estava com uma menina loira. Uma amiga que pediu para levar.
— Como é estar fazendo dezoito anos?
Guilherme deu de ombros.
— Nada do que esperei...
A menina sorriu.
— Ah, mas deve ser ótimo ser dono do seu nariz — a loira comentou.
— É exatamente esse o ponto. Posso responder pelos meus atos agora, mas isso não quer dizer que eu tenha total controle da minha vida. Ainda nem decidi o curso da faculdade por exemplo...
As duas riram.
— Não ia fazer direito também? — Emily perguntou.
— Ainda não sei.
— Acho que você ficaria bem de terno e defendendo pessoas. É a sua cara.
Guilherme sorriu. Ele sempre a defendeu quando eram menores, por isso disse aquilo.
— Talvez seja um dom.
Emily sorriu e ele ficou um momento olhando o rosto dela. Não tinha olhos azuis como a mãe e avó, mas era um tom de mel forte que ele achava incrivelmente bonito.
Logo foi obrigado a desviar o olhar da menina, pois sentiu um tapa nas costas e ser sacudido com violência.
— Finalmente vamos poder entrar nas melhores festas e pegar as melhores gatinhas!
— Deixa de ser sem no.ção, Pedro! — brigou.
— Ah! Esqueci que o senhor sério não gosta de falar dessas coisas. Prefere gatinhos?
Guilherme o encarou com fúria e ele riu.
— Relaxa, cara. Estou brincando. — Sentou perto dele.
Já se arrependia de ter chamado o garoto...
Pedro comeu mais pedaços de pizza do que todo mundo ali junto. O loiro estava vendo a hora que ele ia vomitar de tanto que comeu. Comeu e falou besteira o tempo todo.
— Nem mastigando você para de falar? — disse irritado.
— Minha mãe disse que eu só não nasci falando porque os bebês ainda não têm essa capacidade, mas se tivesse, os médicos ficariam loucos comigo.
— Não duvido. Qualquer um fica — disse rabugento.
Emily deu uma risadinha e Guilherme olhou em sua direção. Ela estava com catorze anos, mas parecia ser mais velha do que isso. Tanto que quando o Pedro a viu pela primeira vez, falou tanta bobagem, que o Guilherme quase bateu nele com violência. Ela ainda era uma menina e não queria o amigo falando dela daquele jeito.
— Você reclama, mas insiste em convidar ele — cochichou.
Guilherme suspirou. Era verdade. Toda vez que convidava o Pedro, se aborrecia, mas nunca deixou de convidar.
Apesar das coisas que Pedro fez e falou, a noite foi ótima. Mesmo com toda a bobagem que Pedro falou a noite toda, Guilherme se divertiu muito.
— Esse seu amigo é tão bonito...
— O Guilherme?
— É. Ou o outro também é seu amigo?
— Não. Ele é amigo do Guilherme. É um sem no.ção.
Emily e a amiga estavam na casa dela. Depois de comer muito na pizzaria, Emily convidou a garota para dormir na sua casa.
— Mas não é feio também.
— Só que é um i****a.
— Ah! Mas o Guilherme não, não é mesmo? Ele parece um príncipe encantado.
Emily ficou encarando a amiga em silêncio por um longo momento. Tinha as sobrancelhas levantadas.
— Ele nunca vai se interessar por você.
— Por que não? — disse sorrindo. — Posso ser mais nova, mas não quer dizer inexperiente.
— Sua porca nojenta!
A garota deu uma gargalhada alta e Emily resmungou um palavrão.
— Quer apostar?
— Não.
— Por que não? Está com ciúmes?
— Não se meta com ele.
— Hum... estou achando que está com ciúmes.
— Vai se ferrar!
****
Laura lavava a louça do almoço quando Guilherme apareceu.
— Está tudo bem? — perguntou olhando o rosto do filho.
— Sim.
— Tem certeza?
— Aham...
Laura cerrou os olhos, mas não perguntou mais nada. Se ele quiser falar, vai ser por vontade própria.
— Vou fazer o vestibular hoje.
— E já decidiu o curso?
— Sim. Acho que direito é bom.
Laura sorriu.
— E também meu pai vai poder me ajudar nas dúvidas e tudo mais...
— Claro que vai — disse sorrindo.
O celular do garoto fez barulho e ele leu a mensagem. Laura o observou disfarçadamente. Tinha a testa franzida e logo arregalou os olhos. O que será que ele leu?
— Vou lá. Depois a gente se fala.
O garoto saiu de casa meio desnorteado e Laura suspirou. Era difícil saber o que acontecia com Guilherme. Ele nunca falava nada do que sentia. Lucas que conseguia conversar com ele quando via que a coisa estava feia.
O loiro caminhava rápido pela rua. Seguia para a faculdade para fazer a prova. Sua cabeça trabalhava a mil. Depois do seu aniversário, começou a receber mensagens da amiga de Emily. Mensagens na maior parte pornográficas. Até foto dela sem roupa ele tinha recebido. Não sabia o que fazer para ela parar. Já tinha dito que não tinha interesse, mas ela continuava perseguindo. E não adiantava bloquear ela, pois arrumava um número novo e mandava coisas a ele. Ninguém sabia o que estava acontecendo e ele tinha até medo de contar. Se alguém descobrisse uma coisa dessas, capaz de ele se ferrar, pois, a menina era menor de idade.
Nem mesmo o Pedro sabia. Até porque não duvidava que o garoto ia querer ver tudo e ainda por cima ir atrás da menina. Eram dois loucos. Ele e a garota. Eles sim se mereciam...
Guilherme fez a redação e estava voltando para casa quando ouviu alguém chamar. Ficou tenso na mesma hora e virou o corpo na direção da voz lentamente. Logo relaxou. Não era a louca, era Emily.
— Oi.
— Fez a prova?
— Sim.
— Está tudo bem?
— Aham.
— Mentiroso.
Guilherme desviou o olhar e não falou nada.
— Eu queria te perguntar uma coisa.
— O que? — Voltou a olhar ela.
— A Raissa te mandou alguma mensagem?
— Por quê?
— Aquela desgraçada pegou seu número no meu celular sem minha permissão. Eu nunca daria seu número a ela. Sabe disso, não é?
— Eu sei.
— Mandou ou não?
— Sim.
Emily balançou a cabeça em negação. Tinha um olhar de fúria crescente, que fez Guilherme se arrepender de ter contado. Isso porque ela não fazia ideia do que tinha nas mensagens...
— Você não tem interesse nela.... Não é?
— É claro que não! Ela é uma menina.
— Ela é mais velha do que eu. Um ano, mas é.
— Ela tem dezesseis?
— Sim.
— Mesmo assim. Eu não quero nada com ela. Mesmo que fosse mais velha.
— Ainda bem, pois ela é louca.
— Por que será que arrumamos amigos desse tipo?
Os dois riram.
— Pelo menos seu amigo não roubou seu celular e me mandou mensagem.
— Não foi por falta de vontade.
— Sério? — disse surpresa.
— Sim. Ele achou que você fosse mais velha.
— Ele não parece ser do tipo que se importa com idade.
— E não é mesmo.
— Então ele não falou nada porque você brigou com ele.
— Foi. — Cruzou os braços. — Por quê? Quer alguma coisa com ele?
— Deus me livre!
— Que bom. Já estava começando a ficar preocupado. Vai que está ficando igual a sua amiga?
— O que ela te disse?
— Que sou o cara mais bonito que ela já viu na vida. Que pareço um príncipe de contos de fadas e estava doida para ser minha princesa.
Emily jogou a cabeça para trás em uma gargalhada escandalosa. Guilherme sorriu. Apesar de toda a situação esquisita que passava, conversar com Emily o acalmou.
****
Semanas se passaram e nada da menina parar de perturbar Guilherme. Ele não contou tudo a Emily. Até porque era uma vergonha. Pelo menos ele achava o que a menina fazia um absurdo.
Já tinha se matriculado na faculdade e começado as aulas. O lado bom de ser mais velho do que a Raissa, era não cruzar com ela pelos corredores da faculdade, já que a menina ainda estava no ensino médio.
— Cara eu preciso de férias.
— O curso acabou de começar, Pedro.
— E daí? Estou cansado.
Guilherme revirou os olhos. Não eram do mesmo curso, mas sempre se encontravam no intervalo.
— Se não gostou do curso, mude.
— Não posso. Meu pai não deixa. — Fez careta.
— Mas não é seu pai quem tem que decidir. É você. O futuro é seu.
— Você sabe que meu pai é um mala.
— Claro que sei. Você tem mesmo a quem puxar — disse sarcástico.
Pedro mostrou a língua e Guilherme balançou a cabeça em negação. Parecia um garotinho de seis anos...
— Aquela sua amiga gatinha faz dezesseis, dezessete quando?
Guilherme o encarou com raiva.
— Só uma pergunta...
— Não te interessa! Já falei pra ficar longe dela.
— Você é muito chato, cara! O que tem de m*l nisso?
— Tem que você é um i****a pervertido! Fica. Longe. Dela.
Pedro deu uma gargalhada alta quando Guilherme falou pausadamente e com os dentes trincados.
— Se você assumisse que gosta da menina, eu até pararia com isso, mas você não assume...
— Ela é minha amiga.
— E não pode ser mais que isso?
— Cala a boca, Pedro! — falou alto.
O garoto riu com gosto. Adorava irritar Guilherme. E era sempre com o mesmo assunto. O loiro ficava fora de si quando ele falava de Emily.
— Isso só pode ser amor — implicou.
Guilherme fechou as mãos em punhos e respirou fundo para se controlar. Ele gostava muito da Emily sim, mas não achava que era da forma que Pedro colocava. Desde pequeno ele colocou na cabeça que tem que proteger a menina e isso não mudou agora que estão mais velhos. Ainda acha que tem que protegê-la. Principalmente de idiotas como o Pedro.
****
No fim das aulas Guilherme praticamente correu para fora da faculdade para não cruzar com Pedro de novo. Não queria discutir pela milésima vez o mesmo assunto e não queria se irritar mais com o garoto. Mas ao se aproximar do portão, parou bruscamente ao ver Raissa em pé com os braços cruzados.
— Não é possível — resmungou.
O loiro voltou para dentro da faculdade. Não sabia o que era pior, escutar o Pedro ou encontrar a Raissa. Ela não tinha procurado ele desse jeito, mas não parava de mandar mensagens a ele. Todos os dias tinha alguma coisa, mas Guilherme não respondia.
— Que foi cara? Parece que viu um fantasma.
— É como se fosse... — resmungou.
— O que viu?
— Nada.
— Falou sério! Agora fiquei curioso.
— Te conto se me ajudar.
— Como?
— A amiga da Emily está no portão. Provavelmente me esperando.
— Por quê?
— Ela me mandou mensagem e deve ter vindo falar diretamente comigo.
— E por que não vai lá?
— Não quero falar com ela. Eu já disse que não quero nada com ela, mas ela insiste.
— Poxa... você tem uma sorte danada... a amiga e amiga da amiga.
Guilherme o acertou com força.
— Ai!
— Que droga, Pedro! Estou falando sério.
— O que quer que eu faça?
— Vai lá e cumprimenta ela. Pergunta o que ela faz ali e se disser que está me esperando, diga que já fui embora.
— Se ela não disser?
— Puxa assunto e dá um jeito de dizer que saí mais cedo. Que conversou comigo no intervalo e eu te contei que ia ser liberado hoje.
— Ok. Deixa comigo.
O garoto se afastou e Guilherme respirou fundo. Sabia que não era uma boa ideia confiar em Pedro, mas ficar ali esperando ela ir embora não estava nos seus planos. Queria ir para casa logo.
Observou de longe os dois conversando e depois de um tempo irem embora juntos. O Pedro não vai fazer isso! Pensou irritado. Se bem que era melhor assim, pois desse jeito, talvez ela parasse de persegui-lo.
Esperou mais um pouco e então foi até o portão. Olhou para os dois lados da rua e não viu nenhum dos dois. Suspirou e foi embora para casa.
Ao chegar encontrou seu pai sentado no sofá vendo televisão.
— Oi pai.
— Oi, filho. Como foi a aula hoje?
— Foi tranquila.
Lucas ficou em silêncio olhando o garoto. Ele podia se parecer com o pai, mas a péssima maneira de mentir era puramente igual a mãe.
— Sei.
— Estou com fome. — Seguiu para a cozinha para fugir do olhar do pai.
****
Emily estava fazendo um dever de casa quando Agatha abriu a porta do quarto, chamando sua atenção.
— Tem uma amiga sua aqui.
— Quem?
— Raissa.
Emily revirou os olhos.
— Manda entrar.
Agatha saiu do quarto e em alguns segundos a menina apareceu.
— Jura que está fazendo isso?
— Até onde eu sei, os professores passam pra que a gente faça — falou com uma sobrancelha levantada.
— Só os nerds fazem.
Emily revirou os olhos e continuou escrevendo no caderno.
— Queria te pedir uma coisa...
— O que? Não vou te dar as respostas.
Raissa riu.
— Não quero saber desse dever i****a.
— Por isso repetiu de ano.
A menina a encarou com raiva.
— O que você quer?
— Será que você não poderia chamar seu amigo pra um cinema?
— Pra que?
— Ele não está me respondendo e queria encontrar com ele para conversar.
— Conversar... — Riu com ironia. — Eu sei que não é isso que você quer.
— E daí? Pode ou não marcar?
— Não. Se ele não está te respondendo, deve ter algum motivo. O que claro, não pode ser porque você disse coisas boas a ele...
— Não acho que seja isso. Ele é tímido.
— Ele pode ser tímido, Raissa, mas não é burro. Se não caiu nas suas cantadas porcas, é porque não está nem aí pra você.
Raissa a olhou furiosa depois do que escutou.
— Se não quer me ajudar, vou dar meu jeito.
— Deixa ele em paz.
— Não me diga o que fazer!
— Então não venha me pedir mais nada — falou por entre os dentes. — Principalmente em relação a ele.
A garota saiu do quarto furiosa e não respondeu. Emily passou a mão no rosto com raiva. O que será que ela disse ao Guilherme?
— O que aconteceu? — Bianca entrou no quarto perguntando.
— Essa maluca!
— O que tem?
— Ela pegou meu celular sem me pedir e roubou o número do Guilherme. Está perturbando ele e ainda veio me pedir ajuda — disse emburrada.
Bianca ficou em silêncio um longo momento olhando a menina com as sobrancelhas levantadas.
— E está irritada por que?
— Porque ela deve estar falando um bando de merdas a ele.
— E daí?
— E daí que é uma sem no.ção!
— Só não estou entendendo uma coisa...
— O que?
— O que você tem com isso? É problema deles dois. Eles que se resolvam.
— Mas é por minha culpa que ela tem o número dele.
— Ela poderia ter descoberto de qualquer jeito. Só foi mais fácil por você. Não é culpa sua.
Emily não respondeu. Se sentia enfurecida pelo que a menina estava fazendo. Tinha certeza que ela falava muita besteira para o Guilherme.
Bianca nem piscava olhando a neta. Já tinha visto esse olhar em Ana anos atrás e sabia exatamente o que queria dizer...