O rapaz alto havia desperto com o sol que brilhava intensamente pela sua janela. Levantara-se da cama se espreguiçando, enquanto seguia o caminho para o banheiro. Fazendo de sua higiene matinal, se olhara no espelho vendo sua fisionomia levemente envelhecida.
Quanto tempo havia se passado desde que olhou pela última vez no espelho?
Anos, talvez.
Ou apenas encarava o espelho sem dar tanta importância ao que via, como se tivesse tornado uma máquina automática. Suspirando, começou a se despir e entrou no chuveiro para tomar um banho gélido. Por conta do calor do verão, suara a noite toda o deixando angustiado. E pensar que antigamente adorava o verão, porém por causa dele, passou a preferir o inverno.
Precisava sair logo, o seu trabalho esperava por si.
Na verdade, ele esperava por si.
Balançando os cabelos molhados, enrolou a toalha na cintura após terminar seu banho e seguiu para o quarto. Vestira da calça jeans preta e a camisa de malha fina branca, deixando para vestir o blazer após seguir à cozinha e preparar o café com leite.
Apesar dos ruídos vindo da rua, a casa parecia silenciosa. Talvez a solidão o fizesse se sentir de tal maneira.
O rapaz alto pegou o copo com café pronto e o tampou para beber no caminho. Segurando as chaves do carro, saiu da casa indo até o automóvel, e assim dirigiu pela cidade moderadamente movimentada.
Enquanto dirigia, olhava em volta bebericando da bebida quente notando os casais andando. A pequena ponta de saudade gritou em seu peito.
Todavia não era necessário o desespero, em alguns quilômetros chegaria até aquele sujeito.
დ
Malas estavam sendo feitas para que um jovem rapaz partisse. O alfa assistia a esposa e filho arrumando as roupas e pertences, sentindo a emoção de que seu primogênito havia crescido. Crescido o suficiente para viver na cidade vizinha onde cursaria a faculdade.
Mesmo que a distância fosse curta entre as cidades, o alfa desejava que o filho não partisse. O mundo era perigoso, principalmente para sua família. E para piorar, não havia explicado a situação para seu filho, por conta do seu próprio medo.
A delta percebia o olhar do companheiro, e fora até ele acariciar de seus cabelos descoloridos, abrindo o melhor sorriso que conseguia.
— Ele vai ficar bem, — O sussurro da delta soara como música aos ouvidos do alfa, que lhe olhava mordendo o lábio inferior. — Ligaremos uma vez a semana e mandaremos mensagens todos os dias.
— Eu sei, mas..., e se começar? — Alfa sussurrou, puxando a esposa para perto da janela, ficando mais distante da porta do quarto do filho — Estaremos longe e não sabemos como ele vai reagir, seria melhor esperar o cio...
— Takashi, eu também estou preocupada — A mais alta falava ainda segurando a mão do companheiro enquanto observava de seus olhos amendoados que brilhavam em reflexo de sua fisionomia. Era somente olhar para aqueles olhos que se apaixonava cada vez mais por seu esposo — É impossível ele não passar por algo, já que é a primeira vez que sai da cidade. Fizemos o nosso melhor para protegê-lo, mas chegou a hora dele viver.
— E se alguém se aproximar dele? Pense nisso, ele é um sangue puro — O mais baixo acariciou o rosto da delta, que enrubesceram. Sua pele alva ganhava aquela coloração que a mantinha jovial e bela. Mesmo a admirando daquela forma, não diminuía nervosismo do alfa — o cheiro dele vai atrair muitos, e se alguém o morder... grr.
— Iremos visitá-lo sempre que pudermos — A mais alta puxou o marido para um abraço — Ele vai ficar bem, ninguém vai fazer nada. Se pudesse eu também o seguiria para ficar de olho, mas temos...
— Que demonstrar a confiança sobre ele. — Completou o outro concordando. O filho pedia tanto pela confiança dos pais, que tal frase chegara a se tornar um lema para os pais. — Tudo bem, mas sabe que irei ficar atento às mensagens.
— Mãe — O garoto aparecia, seus olhos esverdeados observavam aquela cena e sorria, já sentindo uma ponta de saudades de seus pais. — Instala aquele aplicativo no meu celular, para chamada em vídeo da qual me falou.
— Claro. — A mais alta se soltou do marido, que proferiu um suspiro aliviado.
Claro que o filho sabia da preocupação dos pais, e por esse motivo tentaria manter o máximo de contato possível. Quão atencioso ele era.
Uma vez que eles iriam acompanhar o filho até o dormitório da faculdade, os três agilizavam na arrumação para que fossem dormir mais cedo. Takashi, o alfa, não resistiu em abraçar apertado o filho, que logo fora retribuído pelo jovem.
O casal havia omitido toda a realidade que se encontrava fora da cidade, assim como os betas conhecidos ali evitavam comentar sobre isso. Isso porque o pequeno Yushiro era um garoto com linhagem direta de um alfa puro sangue com um delta, e isso lhe traria muitos problemas quando entrasse no cio.
Tal era a maior preocupação dos pais, até aquele momento o rapaz não vivenciara o seu cio. Nenhuma vez. Não sabiam o motivo exato, arriscavam pensar que seria por conta de sua genética, ou a própria cidade dos betas que era calma e desconexão com os instintos. As hipóteses eram diversas.
A partir do momento em que entrasse no cio, o seu aroma doce despertaria uma chama em qualquer alfa, ou até mesmo em ômegas. A parte ciumenta dos pais não queria entregar o filho, pois Yushiro acreditava e ansiava pelo amor.
E se alguém que não obtivesse tais sentimentos mordesse o pequeno garoto? Aquilo seria um terror para a família.
— Ah – Yushiro olhava para a mãe que lhe devolvia o aparelho — Obrigado Mãe.
— Não se esqueça heim, qualquer coisa de estranho sempre nos ligue.
— Eu sei, eu sei — O garoto soltava uma risada baixa, ainda abraçado ao pai. Takashi afagava os cabelos escuros do menor, como se cada toque lhe provasse que o filho estava crescendo e se tornando um adulto. Ainda assim era a sua criança — Mas vou ficar bem, é a única faculdade que tem o curso de artes plásticas.
— Por que teve de puxar isso de Chieko? — O alfa fazia bico nos lábios, o que ocasionou risadas. A esposa sorriu acariciando o rosto do filho.
— É um talento que merece atenção. Está fazendo o certo.
— Obrigado Mãe.
Yushiro se encontrava ansioso para sair de casa e, finalmente, sanar a sua curiosidade sobre o mundo fora dos muros da cidade pequena. Pensou tanto naquele dia que até se programou.
Sabendo que não conseguiria dormir por conta da ansiedade, Yushiro fora dormir tarde na noite anterior e acordou cedo, para que sentisse mais sono e dormisse mais rápido.
— Pegou o frasco de perfume? — O alfa aparecera no quarto do filho, o mesmo apontava para a caixa com três vidros pequenos com um líquido azul. — Não se esqueça de passar após o banho todos os dias.
— Não esquecerei.
O garoto estava animado demais para sentir sufocado com os cuidados do pai. E até que gostava do aroma que aquele perfume tinha, mesmo não sabendo do motivo de ter que usar diariamente.
Takashi o confeccionava no laboratório em que trabalhava. Por conta dos betas serem híbridos mais fracos, tinham a tendência de desenvolver doenças que precisavam de medicamentos. Takashi era quem pesquisava e desenvolvia as fórmulas. O perfume seria mais uma de suas invenções, que disfarçaria o cheiro de seu filho para não chamar atenção.
De toda e qualquer forma ficava feliz em poder ajudar o filho, mesmo que ele não saiba como.
Durante o jantar da família conversavam animados, Yushiro demonstrava a ansiedade enquanto via as fotos da universidade pelo celular. Mostrava os dormitórios e o refeitório, onde dizia que poderia se alimentar bem ali, sendo essa uma das preocupações da delta.
Estudar e se esforçar era o seu objetivo, para que um dia seus pais se sentissem orgulhosos de si.
Quando anoitecera, os três dormiram juntos na cama do casal. Os pais zelavam o sono do filho, que segurava ambas as mãos com os dedos entrelaçados. O alfa cariciava os cabelos negros do primogênito, que suspirava sem despertar.
Parecia ter sido ontem quando entrou no quarto totalmente ansioso para ver a esposa com o recém-nascido nos braços. Recordara com um sorriso terno de quando Yushiro dera seus primeiros passos. As primeiras palavras que o chamava de “papa”, a forma como fugia para seus braços quando recebia alguma bronca da delta. Ou então quando tinha pesadelos e vinha para a cama dos dois se deitando entre os pais, semelhante aquele mesmo instante.
— Ele cresceu rápido, não é? — Sussurrava Chieko, olhando para o filho da mesma forma pensativa que o marido. Não conseguiam deixar de tocá-lo, mesmo que uma caricia supérflua. A pele macia de seu filho e suas feições, até mesmo sua forma de agir, os faziam recordar de si mesmos anos atrás. — Queria que ele fosse aquela criança que gostava de brincar com tinta.
— É, sem que crescesse tão rápido — Olhava o primogênito e ria, sentindo os olhos marejarem. — Ele é tão parecido com você.
— Tem suas qualidades também, — A delta segurou a mão livre do alfa, que desviara o olhar para si. Os dois sorriram cúmplices, uma forma que eles haviam encontrado para se compreenderem além daquela mordida, e então voltavam a olhar para o filho adormecido. — É o nosso menino.
— Nosso menino.
დ
Acordavam ao som da música que Yushiro havia colocado como despertador. Os três resmungavam e se espreguiçavam até poderem se levantar para tomarem banho. A delta fora a primeira a ir, queria preparar o café da manhã para o filho enquanto o mesmo se arrumava. Apesar de todos estarem ansiosos por aquele dia, pareciam fazer tudo de forma lenta para prolongar a despedida que viria mais tarde.
Yushiro se banhava e arrumava a roupa em seu corpo, passava o perfume azulado em seu pescoço do jeito que o pai havia lhe ensinado alguns anos atrás. Arrumava a franja não a deixando cair sobre seus olhos, encarando de seu reflexo abriu um sorriso largo e ajeitava o boné sobre a cabeça.
Estava apresentável o suficiente para não chamar atenção. Apenas ser um aluno normal com pequenas ambições.
Saindo do banheiro fora para a cozinha onde seus pais o esperavam, e se sentou para tomar do café da manhã. Takashi explicava ao filho sobre os papéis que havia recebido da faculdade via e-mail. Apontava o prédio do dormitório, assim como o número do quarto que estavam transcritos na folha, e o entregou a pasta com demais documentos que poderia vir a precisar.
O garoto sorria largo e escutava com atenção, já que teria de se virar sozinho pela primeira vez.
Tão breve todos estavam dentro do carro partindo da pequena cidade dos betas. Os três mantinham a conversa animada no carro, fazendo o filho rir sem se sentir ansioso em demasia. Cantavam ao som do rádio e brincavam com as palavras em um jogo. Apesar do trajeto para a cidade de Daishihon não ser demorada, eles queriam tirar a tensão de uma viagem de 40 à 50 minutos.
Assim que passaram pelas primeiras casas, notaram que a cidade vizinha era pequena. Olhando para o horizonte, já se podia ver o pequeno muro que cercava a faculdade. Apesar de levemente assustador, nada tirava a animação de Yushiro.
Em frente dos portões daquele local, o porteiro se aproximou do carro e pediu a identificação do estudante transferido, ele o esperava para liberar sua entrada. Assim que lhe foi permitido, Takashi dirigiu pela estrada de pedras brancas contornadas por fileiras de árvores, guiando o caminho para mais longe dos portões.
Logo surgiam as construções.
Primeiramente via-se um largo prédio de três andares, sua pintura era rosada e tinha colunas gregas à sua frente guiando a entrada. Olhavam aquela construção totalmente boquiabertos por sua grandeza, o que gerou uma enorme expectativa sobre o que viria a seguir. Em sua volta haviam belos jardins com variedades de plantas, dando um ar feminino e delicado.
Mais adiante na estrada ao oposto, estava uma construção igual, de cor azulada tendo ao seu redor um jardim levemente cuidado. Assim que pararam naquele prédio, enxergaram ao longe algumas quadras de esportes.
Yushiro olhou a folha em suas mãos e sorriu largo, aquele era o dormitório masculino.
O casal saíra do carro, sendo recebidos por uma brisa suave e fria, que espalhara o cheiro da delta para os poucos alunos que estavam pelo campus. Takashi abraçara a esposa de maneira possessiva, rosnando para os curiosos.
Devido as regras da universidade, o casal não poderiam se demorar ali. Ajudaram a tirar as malas do carro e abraçaram Yushiro, acariciando de seus cabelos. O garoto sorria com as bochechas coradas pela demonstração de afeto. Beijando-lhes a face, eles se despediam.
— Lembre-se de mandar mensagem quando for dormir e nos contar como foi o seu dia. — Takashi avisava passando os braços em volta da cintura fina da delta, oapuxando contra si sentindo a pequena corrente elétrica passar pelos corpos. Aquilo renderia em algum chamego mais tarde.
— Claro pai. — O garoto estalara um beijo na bochecha do casal novamente e sorriu. — Amo muito vocês.
— Nós te amamos mais. — Chieko voltou a abraçar o filho e selava sua testa. Tentava de todo jeito evitar chorar na frente do menor, mas não havia jeito. Era a primeira vez que se separavam daquela maneira. — Seja um bom garoto e estude certinho, e sempre que puder mande foto de seus quadros.
— Pode deixar mãe, eu os manterei a par de tudo.
Não se demorando muito, a saudade já apertava no peito dos pais. Olhando sempre para o rapaz que um dia era uma criança manhosa pedindo por colo, os dois entravam no carro e seguiam o caminho para a cidade onde moravam.
Yushiro reprimiu a vontade de chorar, amava tanto os pais e sabia que os mesmos deveriam estar demasiadamente preocupados consigo. Claro que sentia uma ponta de medo em não se adaptar aquele lugar.
Mesmo assim não iria desistir.
Pegou suas malas e adentrou o dormitório, suspirando com a grandeza daquele lugar. No hall de entrada haviam longos corredores nas laterais, e ao centro uma mesa circular como recepção. Parecia o hotel em que havia ficado hospedado quando fizera a prova de admissão para a universidade.
Caminhou firmemente até a recepção encontrando uma jovem garota com cabelos descoloridos, olhos bem delineados com a maquiagem enquanto abria um largo sorriso.
— Bom dia em que posso ajudá-lo? — Yushiro se atropelou levemente nas palavras em pensamento, assim preferindo apenas entregar o papel com o número do quarto. A garota lera o mesmo e digitava algo em seu computador, pegando uma chave — Eu lhe acompanharei até seus aposentos.
— Ah obrigado.
A recepcionista levantou-se e saiu do balcão, indo para a escadaria logo atrás. Yushiro segurou das malas e a seguiu, atento à explicação sobre os horários das aulas, refeições e o toque de recolher.
— O sino bate às 23h em ponto, então os inspetores e chefes dos andares passam pelos corredores para assegurar que todos estejam em seus quartos.
A garota sorria e parou ao final da escada. Yushiro arregalara os olhos ao ver uma pequena sala com sofás e uma televisão grande que havia ali. Parecia um lugar bem cuidado e, um tanto quanto, luxuoso. Logo tomaram o rumo para o corredor à esquerda que era extenso.
— Os alunos que são pegos fora de seus quartos são levados para a diretoria, onde o vice-diretor dá algum trabalho extra para ser feito.
— Entendi. — Era tudo o que conseguia dizer. Os corredores estavam desertos. Ao meio do corredor pararam em frente ao quarto 202, onde a moça abriu a porta e adentrou junto com o garoto.
— Aqui é seu quarto, — O mais baixo olhava em volta e encontrara um cômodo levemente espaçoso. Ao lado direito havia uma cama com cômoda toda enfeitada, provavelmente de seu colega de quarto. A da esquerda estava simples apenas esperando pelos objetos trago pelo novo inquilino. — E seja bem-vindo à nossa instituição, senhor Yushiro.
— Obrigado.
A jovem se curvou depois de entregar a chave do quarto ao mais baixo, e assim se retirou do local. Yushiro fechou a porta e passou a explorar o quarto, havia apenas um banheiro que era espaçoso até.
Do lado de fora do quarto, uma pequena sacada que dava vista às quadras esportivas. Suspirou e sorriu largo ao pegar o celular e tirar várias fotografias do quarto, para mandar ao seus pais. Assim que imagens foram enviadas, pegou suas malas e começou a tirar seus pertences.
───────•••───────