Malia Miller
Cinco anos depois
" Penitenciária feminina"
Chorei o que nunca imaginei chorar, pedi o que nunca a passou pela minha mente, fiz coisas que um dia pensei ser improváveis de fazer, experimentei do mau para o pior, mas agora não sentia mais nada. As noites naquela cela acompanhada somente como a minha dor, as minhas lágrimas e o ódio crescente dentro de mim, percebi que ninguém era por mim como um dia fui para eles, não havia sequer alguém que se importasse comigo presa naquela penitenciária, ninguém me amava como os amei. Agora seria minha vez de fazê-los conhecer o desprezo.
Os primeiros meses foram terríveis; agressões frequentes, xingamentos e ameaças. Todas as noites sentava-me abaixo daquela janela com grades para olhar o céu estrelado e imaginar mil e uma justificativa para que ninguém aparecesse para me visitar, os primeiros meses foram torturantes a ponto de fazer-me entrar em uma quase depressão. O segundo ano aqui dentro fez-me finalmente entender que as pessoas do lado de fora, não se preocupavam com os que estão aqui dentro, fez-me perceber que deveria lutar para ficar viva nesse lugar. Com três anos e meio presa, estava de uma sala cercada por grades e lutando pela minha sobrevivência e redução maior na minha pena. Foram dois anos e meio lutando contra presidiárias, dois ano e meio proporcionando o divertimento de policiais e até mesmo juízes que tinham passatempos por gostar de nos ver lutando para alguns anos a menos presas nesse inferno. Hoje, como os meus vinte e três anos, posso sair dessa penitenciária me sentindo diferente e preparada para causar dor naqueles que me causaram o mesmo sentimento, pronta para ferir lentamente aqueles que viraram as costas para mim num momento em que mais precisei. Lia Miller havia sido enterrada naquela cela de penitenciária.
Saindo por aqueles enormes portões de metal com uma pequena mochila nos meus ombros portando todos os meus pertences, pude encontrar-me com aquelas estradas desertas e escuras. Não tinha celular, não haviam avisado ninguém que seria posta em liberdade, obviamente estaria a mercê da minha sorte. Seguindo em sentido a estada que me levaria para a entrada da cidade, amarro a minha jaqueta na minha cintura e coloco a mochila nas minhas costas.
Passar anos ausente do mundo, faz com que se sinta um estranho tendo de se adaptar com tudo a seu arredor, faz com que a poucas coisas que sabia, se tornassem nada com o passar do tempo. Precisaria-me readaptar a tudo a minha volta, precisaria redescobrir tudo que um dia soube e que devo aprimorar, pois foram cinco anos presa numa penitenciária que não proporcionava nada sobre o que acontecia longe daquelas grades.
Ouvindo um carro se aproximando, paro de andar e ponho-me no canto daquela estrada deserta aguardando que o veículo se aproxime. Parando ao meu lado, pude ver a placa de táxi e um homem aparentando ter cerca de trinta e oito anos.
— O que uma garota como você faz andando por essas estradas? Aqui é muito perigoso minha jovem.
Abrindo a porta para que entre no seu carro, o homem sorri gentilmente. Não confiava em mais ninguém que estivesse a minha volta e que fosse chamado de ser humano, não acreditava numa carinha amiga que pudesse levar-me ao fundo do posso, não deixaria que me fizessem baixar a guarda, pelo menos não novamente. Entrando no seu carro no banco traseiro,deixo a minha mochila ao meu lado enquanto mantinha os meus olhos presos naquele homem que aparentava estar casado, o que me fazia acreditar que a sua carga horária era longa e difícil.
— Por que uma garota como você estava andando por essas estradas? Aqui não é um lugar muito seguro — de forma amigável,o homem questiona atento a estrada.
— Você é casado? — sabendo que havia o pego de surpresa, sorri de forma que o tranquilizasse.
— Não... divorciado há um ano...
— Qual o motivo do divórcio? — o fazendo engolir em seco com a minha pergunta, soube que ele havia feito algo que fosse motivo o suficiente para um fim de casamento.
— Onde você quer parar? — pergunta tentando mudar de assunto.
Com cautela, ergo um pouco a minha perna e pego um pequeno canivete no meu tornozelo e o escondo contra o meu corpo. Apesar de não ter uma resposta vinda dele, pude imaginar mil e um motivos para seu divórcio e, para decidir se ele merecia uma vida futura, precisaria da sua resposta que demorava a vir, por sentir o medo que emanava do seu corpo. A suas mãos apertavam o volante enquanto tentava controlar a sua tremedura, a sua respiração desregulada podia ser ouvida por mim, sabia que o seu coração batia duas vezes mais que o normal.
— Você não me respondeu... Por que se divorciaram? — insisto me aproximando por trás do banco do motorista em que ele estava.
— Traição... A traí com a minha chefe — responde com a voz tremula e a suas pupilas dilatadas devido o medo que sentia.
— Sabe por que estava naquela estrada? — o homem n**a — acabei de sair da prisão — sorrio de lado.
O sentindo pisar no freio fazendo-me ir de contra o banco do motorista, cubro a sua boca com um das minhas mãos e no momento em que ele tentaria se soltar, coloco o canivete contra o seu pescoço o fazendo abaixar as mãos e se render a mim. Naquele momento, descobri que havia me transformado em alguém que jurei não ser, descobri que aqueles que jurei cuidar, transformaram-me num monstro que não se renderia por lágrimas ou por declarações sentimentais que servem apenas para enfraquecer. Amar é para os fracos.
— Passei cinco anos presa numa cena imunda, cinco anos lutando contra outras presidiárias para conseguir a minha liberdade, cinco anos para descobrir que todos ao meu lado me traíram e desprezaram-me como se não fosse ninguém... — sussurro no seu ouvido mantendo o meu olhar na estrada iluminada apenas pelos faróis do carro.
— Por favor moça! Eu tenho filhos...— implora no momento em que tiro a minha mão da sua boca mantendo o canivete no seu pescoço.
— Que pena! Mas eu não tenho — sussurro no seu ouvido novamente e corto o seu pescoço sentindo o sangue espirrar no para-brisa e sujar as minhas mãos.
Saindo do carro, abro a porta ao seu lado e o empurro para o banco passageiro. Desativando o freio de mão, empurro o carro para fora da estrada o escondendo no meio de uma mata. Pegando a chave da ignição, abro o porta malas encontrando um galão de gasolina.
— Você está com sorte, Malia! — sussurro para mim mesma.
Jogando gasolina sobre aquele carro e dentro dele, após encontrar um isqueiro no porta luvas, faço uma pequena trilha com o restante de gasolina e acendo o isqueiro o jogando no chão, podendo ver o fogo tomar direção ao carro que explodiria em poucos segundos, o que me deu tempo apenas de voltar a estrada seguindo o meu caminho. Ouvindo o estrondo da explosão, sinto um sorriso se formar nos meus lábios enquanto seguia o meu destino para o lugar onde mora as pessoas que causaram a minha destruição.
Cerca de meia hora caminhando, pude encontrar um supermercado vinte e quatro horas, o que me fazia perguntar o porquê de ter esse estabelecimento no meio do nada. Com as minhas roupas sujas pelo sangue daquele homem, suspiro sabendo que não iria arriscar-me a voltar para aquele inferno novamente, ainda mais sabendo que se voltasse, não sairia mais. Entrando naquele supermercado, pude sentir o olhar apavorado da mulher.
— Está tudo bem garota? Está ferida? — me enchendo de perguntas, a mulher se aproxima tentando tocar em mim,porém me esquivo.
— Sim, apenas preciso de alguns curativos — assente.
Ao se virar de costas para mim, pego uma garrafa sobre o balcão e lhe acerto a fazendo cair inconsciente no chão. A arrastando para trás do balcão, olho para as câmeras que faziam a vigilância daquele lugar, mas as ignoro saindo em direção a um dos corredores do mercado. Encontrando uma parte com algumas peças de roupas, pego uma blusa limpa e a visto enquanto permanecia com a minha em mãos.
— Você está fazendo muita merda para um noite só, Malia — digo a mim mesma voltando para o caixa.
Revirando as gavetas do balcão, encontro uma arma carregada; Glock nove milímetros. Com um sorriso, atiro contra as duas únicas câmeras da entrada do mercado, voltando o meu olhar para a mulher desmaiada, aponto a arma na sua direção e disparo duas vezes. Apesar de não querer ter a matado, não voltaria para aquela prisão por um depoimento de alguém que permiti viver.
— Era eu ou você!
Saindo daquele estabelecimento após pegar o celular da mulher chamada Suzan, disco o único número que guardei na minha mente por esses anos e que sempre recebia ao vê-lo numa visita: o único que tive contato durante esses anos.
— Luke? — chamo por seu nome ao atenderem minha ligação.
— Harley! Onde você está? — a surpresa na sua voz faz-me deduzir que nem mesmo ele sabia da minha libertação.
— Estou num mercado antes da penitenciária. Preciso que venha me buscar aqui — me sentando no calçada daquele lugar, suspiro profundamente.
— Chego em cinco minutos! — apenas confirmo e encerro a ligação.
Não procuraria Ricardo, Erick, Lorena ou até mesmo Logan, pois ambos viraram as costas para mim há cinco anos, ambos desprezaram-me apagando-me das suas vidas no momento em que não compareceram na porta do meu julgamento, excluíram-me quando fui transferida para a penitenciária feminina e passei cinco depreciativos anos sem ver o fim do dia e o início da noite.
Com o dinheiro das corridas, comprei uma casa fora dessa cidade que só me traz más lembranças, ficava a quarenta minutos da cidade. Por mais que não soubesse do que me aconteceria a cinco anos atrás, vivia com a sensação de que precisaria preparar-me de todas as formas, pois a decepção seria enorme, a dor que sentiria seria tão intensa que me faria odiar todos os que amava e me aliaria àquele que me via como inimiga e que desejei o destruir. O impossível aconteceu quando recebi a sua primeira visita, naquele dia enxerguei que havia grandes chances de tê-lo como o único que me visitaria e que cuidaria de mim como pudesse dentro daquele lugar. Luke demonstrou interesse em mim, seja bom ou mau, mas não me importava, pois a certo tempo deixei de me ver como boa samaritana, deixei de acreditar que os bonzinhos vencem, quando, na verdade, ambos apenas se fodem. A minha visão do mundo mudou, minha perspectiva para essas pessoas foram destruídas como um castelo de areia.