Cap14: Indícios

1754 Words
Dificilmente conseguiria esquecer as lembranças de um passado marcado, tanto em minha pele,como em minha mente. Inevitável não sentir que algo estava errado, inevitável não pensar na desistência de um plano completamente arquitetado,era inevitável não sentir aquele sentimento profundo e intenso que vive dentro de mim, que causa uma alteração em meus batimentos cardíacos. Ele estava marcado em mim de todas as formas,seu nome estava gravado em minha pele,seus contrastes estavam em minha mente, não havia um centímetro sequer que não estivesse vivido em meu subconsciente. Com a arma em mãos e sendo coberta por baixo de minha jaqueta, suspirei pesadamente sentindo a brisa fria bater contra meu corpo causando-me arrepios,estava anoitecendo e o temporal se tornaria tempestuoso. Então,com cautela,girei a maçaneta da porta a encontrando aberta e adentrei aquele hall de entrada, seguindo para a sala de estar,o encontrei, sentado em uma das poltronas enquanto folheava um livro, que conhecia muito bem,e bebia de uma dose de whisky que se encontrava sobre a mesinha de centro. Ele parecia estar me esperando,era como se tivesse aguardado por minha chegada,por minha abordagem e por minha grosseria. Acho que,apesar de ter mudado de personalidade,ele ainda não se surpreendia com minhas decisões,pois mesmo que estejam cientes de que todos seriam mandados para o mesmo lugar, não haveria como ele descobrir ser o próximo. Agora, precisando presenciar essa cena, compreendi que já não havia mais nada que o fizesse se importar, não existia nenhuma promessa a ser feita ou a ser comprida; ele apenas me esperou como prometido,me aguardou até o último estante. — Apesar de saber que não tardaria a vir atrás de mim,sempre me imaginei sendo o último — murmurou mantendo o olhar sobre as folhas daquele livro. Em passos calmos e colocando a arma em minha cintura - sabia que ele não tentaria nada - aproximo-me sabendo que não deveria abaixar a guarda de tal maneira, não deveria ser diferente consigo, porém não conseguia fazer a p***a do meu coração o renegar, não conseguia fazer com que meu corpo desprezasse o quão minha mente lhe desejava. Confuso? Você não imagina! Por mais que - no interior de minha mente e corpo - tente pensar em desistir,em ir embora dessa cidade e seguir com minha vida, existia um propósito, existia um motivo para insistir,como se meu destinos dependesse desses atos maquiavélicos. — Sempre acreditei que você teria ido embora, voltado para Londres e para sua vidinha decadente — comentei sentando-me de frente para si em uma poltrona daquela sala de estar. — Tinha motivos para ficar aqui...— exitou e, finalmente,ergueu seu olhar até mim — por que não fez nada ainda? Por que não está agindo como a destemida Harley? Sou diferente deles? — questionou fechando o livro, porém ainda o segurava por entre seus dedos. — Não,a única coisa que me faz agir desta forma com você se deve ao fato de não existir medo do que possa acontecer, não existir nada além do que a certeza de que suas chances são mínimas — expliquei sustentando seu olhar. Arriscado,pois Erick era um bom lutador,seu treinamento militar o fazia ser tão bom quanto eu. Porém, olhando no fundo de seus olhos, enxerguei algo que mexeu com minha mente,fez meu coração ter uma alteração de frequência cardíaca: o homem à minha frente era incapaz de me machucar,incapaz de revidar a qualquer ato que venha a cometer contra si. — Ainda me pergunto como você destruiu sua vida dessa forma,como se deixou levar pelas influências de pessoas que lhe cercavam! Você sempre foi tão inteligente, sempre foi alguém dominante de si — voltando seu olhar para o livro em suas mãos, Erick murmurou melancólico. — Você sabe a resposta desta pergunta,sabe o que me levou a escolher esse caminho — afirmando,desviei meu olhar para a pequena estante no canto daquela sala de estar, havia uma fotografia: uma foto minha. — Quando você passará a assumir suas consequências,suas responsabilidades? Não use desculpas para justificar seus atos,pois se fosse seguir essa sua lógica,também deveria ser um criminoso,um assassino a sangue frio — elevou sua voz o suficiente para me mostrar o quão havia se irritado. — Me poupe, sua moral é mais suja do que o desaterro sanitário! — Esse é a p***a do seu problema, Malia! Acha que tudo se resolve descontando sua raiva por impulso, acha que suas frustrações iram embora descontando em outras pessoas — deixando seu livro de lado, Erick se levantou e se aproximou de mim — quando deixará de ser a coitadinha que sofreu o abandono do pai? Quando deixará de ser a coitadinha que se envolveu com drogas e coisas ilegais para chamar atenção? — prendendo meu corpo com o seu enquanto me mantinha sentada, Erick me desafiava com seu olhar. Por mais que desejasse dizer que ele estava equivocado,seria hipocrisia da minha parte. Não,se me perguntasse se esse é meu motivo por ser quem sou,por ter me transformado nesse ser detestável, obviamente daria essa resposta. O único motivo por concordar com Erick é o fato de todos, exatamente todos possuírem uma visão de mim, uma opinião formada que esclareça minha decisão em relação a essa vida que escolhi. Assim como eu,o homem à minha frente tem o direito de me julgar,tem o direito de me acusar por decisões erradas,mas nunca,em hipótese alguma poderá me acusar de infantilidade,de coitadinha e de querer chamar atenção,pois isso nunca se encaixaria em mim. — Nunca quis e não quero chamar a atenção, não sou a p***a de uma menina infantil! Eu cresci,enxerguei esse mundo fodido como ele realmente é; compreendi que a vida é uma disputa por poder,uma disputa onde não importa quem é o mais certinho ou quem é o errado,e sim quem tem disposição para passar por cima de qualquer pessoa. Para conquistar seus objetivos ,você atropela quem está à sua frente e jamais derrama uma lágrima por ela — a indiferença em minha voz,causou um olhar indecifrável no homem à minha frente,porém,em momento algum deixaria que isso me abalasse. — Você distorce as coisas,procura enxergar o que lhe convém e o que está a seu favor — Erick se afastou elevando suas mãos até seus cabelos os puxando para trás e suspirando pesadamente. — Quando precisei de alguém, ninguém apareceu. Quando tentei me aproximar, todos me afastaram. Quando protegia aqueles que juraram me amar, ambos me abandonaram. Quando pensei que estariam comigo,me vi sozinha no escuro mais sombrio que já tive contato. Acho que está mais do que na hora de enxergar as coisas como elas realmente são, não? — me pondo de pé,senti meu corpo tremer e uma queimação atingir meu estômago,o que fez-me curvar para frente sentindo uma dor aguda. Havia dias que não me sentia bem, dias que as dores vinham e iam. Não procurei um médico e não procuraria,pelo menos não no momento em que estou vivendo, acredito que se for algo grave,estaria sendo um favor. Não tinha em mente cometer algo contra minha vida,longe disso,mas se for causado por algo que não dependerá de mim, o tenho como um bônus no qual me favorece. Não acredito que possa reconstruir minha vida, não acredito que possa recomeçar de uma forma totalmente diferente,pois sou alguém que não pode se regenerar. — Quando você começará a buscar por respostas certas? Quando ouvirá os dois lados da história? — erguendo meu olhar para si,o encontrei de costas para mim,o que lhe impedia de me ver daquela forma. — Tive de ficar um mês na prisão,tive que assistir meu julgamento sem ter alguém para dizer que continuaria ao meu lado,passei a p***a de cinco anos em uma penitenciária imunda, um lugar que tive de lutar para sobreviver. Cansei de ser boazinha para as pessoas,cansei de dar chances para se explicarem...— tendo minhas palavras interrompidas por uma série de tosse,e ao tirar minha mão de meus lábios,senti minhas pernas falharem fazendo-me sentar novamente naquele sofá. Sangue! Era a única coisa que sujava minha mão tão branca como uma folha de papel. Estava pálida,fraca e dolorida. Meu corpo não estava tão disposto como antes,como quando adentrei essa casa e encontrei meu alvo. Então minha mente entrou em colapso,pois sangue tinha significados negativos,indicava possíveis doenças graves e terminais. Estava realmente doente e, certamente, não teria muito o que fazer. Assim como também não faria nada. Erguendo meu olhar, encontrei Erick me encarando com um olhar diferente,um olhar no qual mexeu com todas as minhas estruturas,um olhar no qual não gostaria de receber,pois tive esse sentimento dentro de mim,tive o desprazer de me preocupar com os outros e apenas me fodi. — Isso é sangue, Malia? Você está doente? — se aproximando e sentando-se ao meu lado, Erick encarou minha mão com espanto,o que me levou a crer que meus lábios também estavam sujos. No momento em que senti seus dedos em meus cabelos,foi inevitável não fechar meus olhos e baixar a guarda. Erick era a minha criptonita, porém tentava deixar isso em segredo e somente no interior de minha mente. Mas naquele momento,naquele instante em que me vi fraca o suficiente para não conseguir o afastar, não pude esconder, não pude resistir sua breve e delicada carícia. Usando o restante de minhas forças, levantei-me daquele sofá e me afastei tomando direção a saída daquela casa. Não conseguiria levar Erick para aquele galpão,pois tinha consciência de que iria desmaiar em poucos minutos. Mesmo ouvindo chamar por meu nome, apressei-me em adentrar meu carro que se encontrava estacionado em frente e sair dali, tomando rumo para um hotel mais próximo. E em menos de vinte minutos,estava entrando em um quarto alugado por algumas horas,o que foi tempo o suficiente para que caísse sobre a cama de lençóis brancos podendo sentir uma dor me rasgando por dentro,era como se dez facas estivessem me cortando de dentro para fora. Tinha a certeza de que meus gritos incomodariam os outros hóspedes, assim como também sabia que,se não tivesse avisado na recepção,algum policial poderia bater na porta desse mesmo quarto. — O que está acontecendo comigo? — murmurei para mim mesma em um questionamento doloroso e sem fôlego,pois as dores eram intensas e não conseguiria lhes controlar. Sentindo a minha cabeça se juntar à dor que sentia na área abdominal, tive a conclusão de que seria apenas o começo daquilo tudo. E,tendo uma crise de tosse se misturando com sangue coagulado,me permiti fechar os olhos me entregando a fraqueza que se abatera sobre mim. Se tornou questão de segundos para tudo à minha volta se dissipar em uma escuridão profunda.
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