25.

1054 Words
Até chegar na Cascata eu mantive a decisão de acabar com a vida do Frederico na minha mente. Os meus pensamentos eram uma espiral de armadilhas de argumentos e soluções complexas para evitar que eu precisasse mesmo acabar com a vida dele. O meu plano era simples. Se ele estivesse ali eu iria distraí-lo por tempo suficiente para desacordá-lo e depois… Eu faria o que precisa ser feito. E, depois, eu poderia definhar em qualquer sofrimento por essa decisão. E aceitaria o meu futuro como a esposa do homem que eu mais odeio no mundo. Existem acordos inquebráveis para quem tem o mínimo de carácter. Eu era uma assassina, um pouco sanguinária e cru3l em um nível pouco aceitável, mas eu cumpria com todas as minhas promessas. E eu dei a minha palavra ao Dom, que seria a lâmina dele e dos seus sucessores. O Eduardo ser um desgraçad0 não me faria quebrar a minha promessa. E depois que o Dom encontrasse o final da sua vida, eu continuaria a servir a família Cavalcanti como assassina e esposa do Dom. Esse foi o meu último pensamento antes de descer do carro. O Fred não estava ali. Faltava algum tempo até o Sol se pôr, e seria o tempo que eu teria para analisar, planejar e decidir como eu o mataria. No porta malas do meu carro eu tinha diversas ferramentas que poderiam matar com muita dor ou nenhuma. E eu não o faria sofrer. Se for possível, ele nem perceberá o que o atingiu. Caminhei até a beira do mirante e analisei a queda d’água. A força da natureza sempre me surpreendia, e aquela vista não era diferente. Implacável e imparável, a água caia com uma força impressionante e me percebi sorrindo com a vista. Eu não voltarei aqui. Esse pensamento foi doloroso. No momento que o Fred me trouxe aqui eu soube que aqui seria o lugar perfeito para finalizar a missão. Completamente deserto e com pontos cegos por todos os lados. Eu não deveria manchar esse lugar desenhado por Deus. Outra peça da minha mente confusa. Eu ignorei o pensamento. A minha decisão estava tomada e eu iria até o fim. Percebi o portão que levava até a beira da água entreaberto. Deixei a curiosidade me conduzir. As correntes que estavam aqui na outra noite tinham sumido. Alguém esqueceu de trancar? Olhei ao redor e eu realmente estava sozinha, talvez não mais em alguns minutos… Passei pela brecha do portão e caminhei pelo caminho curto até a beirada da cachoeira. Ela era imperiosa e a cada passo o barulho das pedras embaixo dos meus pés fazia o meu coração aquecer um pouco mais, quase derretendo o gelo que o envolvia. A umidade do ar era saborosa e a temperatura conforme eu me aproximava foi caindo, até que eu parei. Eu estava a um passo da água e precisei levantar um pouco a cabeça para avistar o topo da cachoeira. Eu era um grão de areia naquela imensidão do mundo. Analisando a altura das pedras, a imponência e força que ela guardava, fazia muito tempo desde que me senti indefesa como me sentia de frente para ela. Eu não sei quanto tempo fiquei ali e também não importava, eu não estava com nenhuma pressa do que viria a seguir. Do que eu teria que fazer muito em breve. Percebi que a escuridão começou quando os raios de sol não estavam mais visíveis de onde eu estava. Se ele vier, chegará a qualquer momento. Suspirei, mais fundo do que achei que fosse capaz. Conforme os segundos se tornaram minutos eu comecei a desejar que ele não aparecesse, até que comecei a quase rezar para isso. Pelo menos eu o veria. E talvez pudesse beijá-lo uma última vez. Senti a minha garganta queimar com o pensamento e sentei na beira da água, tentando me concentrar em qualquer outra coisa que não fosse o Fred ou o que eu teria que fazer muito em breve. Eu não poderia encostar nele, não da forma que o meu corpo ansiava. Se eu fizesse isso eu seria incapaz de cumprir a minha missão. Eu o desejava. E quanto antes eu admitisse isso, melhor. Pelo menos o desejo não era uma emoção descontrolada. Depois de algum tempo ia desaparecer como todos os outros sentimentos e emoções fracas que senti ao longo da minha vida. Sentimentos que nomeei e categorizei um a um durante o treinamento para depois eliminá-los da minha cabeça e do meu coração. O desejo era uma vontade física, completamente diferente de carinho, paixão e saudade. Sumiria, depois de um tempo eu nem me lembraria mais. Encarei a água, piscando quando senti os olhos arderem. Respirei fundo mais uma vez antes de olhar para o alto. Estava escuro o suficiente agora. Ele não viria. Eu senti um sorriso nascer no meu rosto e cobri os olhos com as mãos, sentindo a umidade escorrer. Lágrimas. Respirei fundo de novo, sentindo uma vontade imensa de rir, gargalhar até. A sensação que me dominou era familiar, mesmo que eu me sentisse assim poucas vezes. Era fresca como a brisa da manhã. Alívio, eu estava chorando de alívio. Balancei a cabeça, ainda sorrindo. Eu só poderia estar perdendo a sanidade. Eu estava aliviada que o meu alvo não apareceu. Que ele não morreria naquela noite, pelas minhas mãos. Respirei fundo, enquanto secava as poucas lágrimas que escorreram e levantei, olhando uma última vez para a água caindo, agora completamente escura, iluminada apenas pela luz fraca da lua. - Obrigada pela companhia. - Eu falei, em voz alta, para a cachoeira. Eu devo estar ficando louca mesmo. De novo, a vontade de rir me dominou e eu não lutei. Eu ri, sozinha, da minha própria loucura. A sensação de alívio, gratidão e alegria era uma dádiva depois dos últimos dias. Talvez o universo realmente estivesse cooperando a favor dele, a favor de nós. Eu não poderia fugir por muito tempo, mas hoje eu voltaria para casa, com as minhas mãos e pensamentos limpos. Esse pensamento quase explodiu, junto com o alívio, a gratidão e a alegria. Um misto de dor e desespero tomou a frente das minhas emoções, porque sentado em uma pedra, me observando pelo que eu imaginei ser um tempo considerável, estava o Fred. Lindo, idiot4 e teimoso. O meu alvo.
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