10.

1329 Words
Ele analisou com cuidado a minha expressão, pensando na minha pergunta. Eu mantive a aparência despreocupada para não levantar suspeitas. Existe uma coisa no que eu faço, que me torna extremamente valiosa para o Dom. Uma coisa que nunca falamos, mas que ele sabe que é uma forma de assegurar que ele não se livre de mim. Os segredos que eu colho, durante as minhas missões, são passados para ele, quando necessário. Se eu não julgar necessário, eu guardo dentro da minha cabeça e em um caderno que está devidamente escondido. Eu soube de um governante que matei certa vez, que ele comprou milhares de votos para se eleger, e eu sabia, detalhadamente como e quem ajudou ele nisso. E essa informação poderia destruir o castelinho de muita gente, incluindo o Dom. É inacreditável o que um homem revela para um decote posto no momento certo, ou com a promessa de se enfiar entre as pernas de alguém. Essa simples pergunta, com a quantidade certa de vinho e desejo, já fez homens mais espertos que o Frederico me prometerem fortunas. Por isso eu sabia que a resposta não viria agora. Eu sabia que ele ia sorrir, como fez e que ia beber um gole do vinho, enquanto pensava no que me falaria, que seria valioso para me convencer, sem comprometer a sua família. Eu esperava que ele precisaria de uma boa dose de incentivo, físico talvez, para me entregar um segredo que valeria para mim. Eu sentia a tensão crescer entre nós e sorri para ele, ainda mostrando despreocupação. - É uma pergunta comprometedora, eu sei. - Ele piscou, ainda me analisando. - E tudo bem se não tiver uma resposta. - E aí, eu colocava a coragem do macho alfa em cheque. Se ele não dissesse nada, ele se mostraria fraco e ele queria parecer qualquer coisa, menos fraco. - Na verdade… - Ele começou a reagir, e eu esperei. - Eu quero contar um segredo meu. Isso acontecia também. Quando o ego do homem é tão imenso que ele quer fazer tudo ser sobre ele. - Frederico… vejo que você é um livro aberto. - Eu provoquei e ele me deu um sorriso tímido. - O meu segredo… - Ele se aproximou, trazendo a boca na direção do meu pescoço, e a respiração dele brincou na minha pele. Ignorei isso. Ignorei também o pulsar forte que me tomou entre as pernas. Reações involuntárias que um corpo comum tinha, quando um homem atraente e sedutor, se aproximava. - Eu estou completamente encantado com você. Foi impossível não virar os olhos. Eu falei no ouvido dele. - E agora, imagino que você vai me perguntar, o que você precisa fazer para me ter… Pergunte Frederico. - Eu sabia que ele estava sorrindo, mesmo sem ver. - Já me prometeram ilhas, fortunas e até a cabeça de potenciais inimigos. - Ele se afastou, me olhou e parecia incrédulo. Eu dei de ombros. E ele manteve o olhar fixo em mim. Ele não responderia a minha pergunta hoje. Mas, em breve, quando tivesse confiança, quando eu me tornasse tudo o que ele precisasse, ela me contaria. Ele me contaria tudo. - Talvez você não acredite em mim. - Falei antes de dar um gole no vinho. - Mas, eu sou normalmente vista como um pedaço de carne. Uma carne nobre, claro. Algo inalcançável e com valor inestimado, mas ainda assim, um pedaço de carne. - Era uma constatação que eu fazia em muitas situações, e normalmente eu usava um tom de vítima, sofredora… Não com ele. Algo me dizia que quanto mais vulnerável eu parecesse menos interesse ele teria, e o meu trabalho poderia ser dificultado. Então eu falei como um fato comum, como se isso não me atingisse. - Eu não te vejo dessa forma. - Ele se limitou a dizer e eu dei um sorriso duvidoso. - Eu estou sendo honesto. - Claro que está. - O meu tom sarcástico fez ele negar com a cabeça. - Eu vejo você como alguém que nunca foi devidamente reconhecida, pela sua sagacidade e esperteza. Alguém que precisou ser muito mais em tudo que qualquer um. E não apenas por ser mulher. - Ele conseguiu a minha atenção. Olhei para ele esperando uma explicação. - O que eu sei, sobre você, é um misto de fofocas e nada mais. Uma herdeira que está com a vida comprometida desde sempre. Sobrinha de um homem poderoso, escondida da sociedade. - Essa era a história que o mundo conhecia. Que eu era filha de uma das irmãs do Dom que morreu quando eu era um bebê. Ninguém nunca encontrou a ligação entre a minha história e a dos meus verdadeiros pais. Mesmo que os meus olhos fossem exatamente como os da minha mãe e o meu tom autoritário fosse o mesmo do meu pai. Eles foram apagados da história e ninguém mais falava deles. - O que eu vejo, é que você não só quer mais do que tem… Você merece muito mais do que tem. - Você me conhece faz poucas horas. - Eu tentei descredibilizar o raciocínio dele. - E estou completamente desconcertado pelo ser desafiador que você é. - Tentei encontrar o truque galante dele. Aquilo deveria ser um dos discursos para envolver as suas presas. - Lore… - Ele se aproximou de novo. - Quer os meus segredos? São seus. Quer o meu dinheiro? Te dou até o último centavo. - Eu senti o meu corpo enrubescer. - Quer a minha vida? Pode levar… - Eu precisei me lembrar de respirar. Ele era bom. Ele era muito bom. - O que você quer em troca? - Eu consegui perguntar sem a minha voz sumir no meio da frase. - Eu quero saber o que esconde embaixo de toda essa audácia. - Eu fui obrigada a sorrir. - Quero saber o que te faz sorrir de verdade e o que você sonha… Eu quero saber tudo, para poder ver um sorriso verdadeiro seu. Ouvir uma risada real sua. Eu quero ver os seus olhos brilharem honestamente, ao realizar algo que você, e só você queira. Eu não tinha resposta para aquilo. O meu coração acelerou de uma forma que eu nunca senti. Nem quando estava em vias de tirar a vida de alguém eu sentia aquilo. Adrenalina pura e vivaz corriam nas minhas veias enquanto eu observava incrédula a forma com que ele falava aquilo. Não era um truque de sedução. Eu sentia no meu coração a verdade em cada palavra dele. E aquilo me assustou imensamente, porque ninguém nunca viu por baixo das minhas defesas. Eu fui treinada para ser o que precisassem que eu fosse. E ele viu, além disso. Ele virou o jogo e me desconcertou de uma forma que eu não via como me recuperar. E o pior de tudo. Eu considerei falar. Falar tudo. Eu realmente considerei contar tudo para ele. Quem eu era. Quem ele foi para mim. Falar o que aquela vida maldita tinha me tirado e o que eu tinha feito para conseguir sobreviver. Eu considerei contar que eu era a arma que acabava com as ameaças ao império do Carlo. Eu considerei contar que eu quis beijá-lo mais cedo, e que ainda queria beijá-lo agora, e que eu estava lutando contra essa vontade. Eu queria contar, eu considerei contar e pela primeira vez em anos eu me senti indefesa e vulnerável. Como se alguém tivesse apontado um holofote na minha direção e descascado cada pequeno segredo. Ele pegou a minha mão e a pele dele era quente e macia. Mãos essas que desejei sentir em outros pontos do meu corpo. Respirei fundo. Ele esperou, paciente. Fechei os olhos e respirei de novo, inalando o cheiro dele e tentando afastar as vontades que eu sentia, que cresciam lentamente dentro de mim. Eu precisava assumir o controle. Agora, não depois. Agora. Então eu fiz a única coisa que eu podia fazer. Eu levantei e corri.
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