Fodshan, (Cheshire) Setembro 1432
— Constance...
— William... — Um corre em direção ao outro. Sempre que estavam juntos pareciam se esquecer do mundo lá fora. — Porquê demorou tanto? Meu pai quase descobre que não deixei de ver vossa pessoa. — Constance era uma moça linda no auge dos seus dezoito anos, cabelos negros como a noite dispostos numa bela cascata até a cintura, já tinha passado da idade de casar mas seguia sendo a moça mais cobiçada da pequena região. William era um belo par de calças, vinte e três anos, alto, elegante, rostro assimétrico, loiro e uns incríveis olhos cinza marca da sua família.
— Perdoe-me minha bela rosa! A senhora minha mãe está cada vez mais esquisita. Os dois fizeram-me prometer que voltava antes do entardecer. — o mais velho fala.
— Seus pais são deveras rigorosos! Sua pessoa é tão diferente... — A moça fala com deleite. Os dois se amavam, e era isso que mais importava... Ou não.
...
Constance era a mais velha de três filhos de uma pequena família de agricultores, seu pai (Matheus) havia herdado um punhado de hectares de terras aradas em Raven Ayes. Sua família apesar de humilde, seu pai era filho bastardo de um Conde, nunca teve interesse em coisas supérfluas se não em providenciar o bem estar e sustento de sua família.
Como forma de tentar justificar sua ausência na vida do filho, ou comprar o amor do bastardo, Conde Baterlby ofereceu a família de Constance outra metade de Raven Ayes tornando assim, Matheus num dos homens mais rico da região. As únicas pessoas que dominavam tal informação eram Constance, sua mãe e Matheus.
Entretanto, Constance não guardava segredos ao seu amado. Desde pequenos, William e Constance são apaixonados, os dois cresceram juntos, brincando para lá da floresta de Reven Ayes. Conforme o tempo foi passando a paixonite de dois adolescentes tornou-se em algo mais urgente, nenhum dos dois conseguia controlar a queimação que sentiam sempre que se tocavam. Seus corpos se ansiavam de tal maneira que William e Constance sucumbiram ao desejo. Nessa mesma noite Constance contou ao seu amado sobre os hectares de terras que seu pai herdara de Conde Baterlby.
William Wrigth era filho único de uma família em ascensão de Northumberland, ou assim faziam as pessoas acreditar. Seus pais não passavam de charlatões, haviam saído de sua terra natal fugindo as dívidas intermináveis que possuíam acabando por se instalarem em Fodshan. Determinados em construir uma fortuna e um futuro diferente para William, viviam das regalias proporcionadas pelos vizinhos, e quem quer que os visse, diria que a família Wrigth pertencia à realeza. Passaram anos fingindo serem algo que não eram até Esperanza, mãe de William encontrar um antigo diário na casa que lhes foi cedida.
Havia um ritual a ser feito para que qualquer pessoa quisesse tornar-se poderosa, próspera e extremamente rica. Esperanza precisava mudar o rumo da vida que sempre teve, era cigana e passou parte da infância como nômada sem nenhum conforto, quando Carlile a encontrou, Esperanza acreditava veemente que nunca mais teria de passar por necessidade, não sabendo ela que estaria apenas mudando de sobrenome pois a vida seria a mesma e às vezes pior que a que ela levava como cigana.
Disposta a fazer tudo para que o filho tivesse um futuro diferente ao que ela teve, Esperanza persuadiu Carlile o tornando obcecado em concluir com o ritual, ritual esse que dentre outras coisas, exigia a morte de um inocente em praça pública. De início os dois acharam uma crueldade, eram tudo menos assassinos. Mas a miséria era algo demasiado perigoso, podia transformar qualquer pessoa fraca de caracter no pior dos seres humanos. E foi o que aconteceu com Carlile e Esperanza, os dois ficaram convictos de que seria uma única vez, uma morte, de uma pessoa qualquer... alguém a beira da morte. — Eles pensaram.
Tinham tudo organizado, incluindo a perfeita vítima, um dos serviçais que há muito andava com problemas nos pulmões, mais dia menos dia o mesmo acabaria por morrer. Mas William, tinha de se atrasar mais uma vez, tudo por conta dos encontros furtivos que mantinha com Constance. William já tinha vinte e três anos, mas continuava agindo como se tivesse quinze fazendo os pais perderem a única oportunidade de se tornarem ricos por conta de uma camponesa que nenhum dos pais a suportava, "demasiado simplória, sem graça, bruxa" — Eles diziam.
Constance era curiosa, inteligente, tinha uma verdadeira paixão pela botânica que a fez ter conhecimentos sobre como curar determinadas doenças com infusões. Seu sonho era abrir o seu Boticário, possuía uma sensibilidade incrível, parecia se comunicar com os elementos. Algumas vezes foi vista dançando à luz da lua cheia no topo da montanha. Era inofensiva, mas as pessoas sempre a associavam com forças do oculto. O que acabou por se tornar numa maldição para sua família.
Era véspera do eclipse da lua vermelha, Carlile e Esperanza esperavam impaciente por William que havia esquecido uma única tarefa que lhe havia sido incumbida:
"Atrair John, até o cimo da montanha"
Não era praça pública, mas todos da região poderiam ver John no alto da montanha que era quase a mesma coisa como ser sacrificado em praça pública.
— Uma simples tarefa! — murmurou Carlile.
— Ele virá em tempo... — diz Esperanza. Como não podia deixar de ser diferente fazendo jus ao seu nome, ela tinha esperança que o seu filho não falharia essa única vez.
— Ei de matá-lo se não me aparece nesse mesmo instante!
(...)
O casaco comprido estava perdurando numa das árvores, William sai do rio em passos majestosos mostrando a sua amada o quão másculo e viril era...
— Não era necessário! — Constance riu ao ver o rabiosque branquinho com as marcas de suas unhas evidenciadas.
— Seja boa. — seu sorriso, foi alvo de um olhar cinza refletindo o fogo que os dois emanavam. Mas a moça estava cansada, seu corpo fora explorado por William várias vezes até a mesma perder a conta. Não que esteja reclamando, não! Ela adorava sentir William se firmar bem no centro do seu prazer com dureza, foi o seu primeiro e era o único que podia despertar tais sensação à ela. Entretanto, precisava do casaco para sair do rio, tinha a sensação de estar sendo vigiada e aquele costumava ser o ninho de amor dos dois.
— William, despacha! Preciso voltar pra casa, e vossa senhoria ainda tem aquela coisa por fazer....
Constance não termina sua frase, William estava em apuros! Correu até as roupas espalhadas no chá, vestindo-se muito rapidamente e sequer despediu-se da moça como costumava fazer.
...
Por conta daquele atraso, Carlile cogitou a possibilidade de sacrificar o próprio filho. Afinal ele e Esperanza eram jovens podiam ter outros. Num momento de desespero, com medo de servir como sacrifício, William conta aos pais sobre a herança de Matheus, dizendo que logo estaria casado com Constance e as duas família seriam ricas, com o poder de persuasão de Carlile, inteligência de Esperanza... Eles finalmente poderiam voltar para Northumberland, aquelas terras valiam milhões de libras.
Acreditando que os pais finalmente aprovariam o seu casamento com a camponesa, William foi se deitar com a esperança de um dia melhor. m*l ele sabia que naquela mesma noite, seus pais fizeram um pacto com forças ocultas que exigiam não só a morte de um inocente mas também um compromisso que perpetuaria por várias gerações. "Para ascender, a família Wrigth teria que matar" — E assim seria.
Esperanza nunca gostou de Constance, e pelo ódio que a mesma sentia pela moça por roubar toda atenção do filho, a marcou como primeira vítima.
Todo mundo sabia dos hábitos da camponesa, e ninguém a via com bons olhos, mas nunca se atreveram a acusá-la sem provas, até que Esperanza na manhã da noite do eclipse da lua vermelha, espalhou por toda localidade que Constance havia feito pacto com d***o e por esse motivo possuía conhecimentos de botânica. Sua família foi retirada dos campos e colocada em praça pública para ser julgada. A cidade inteira estava presente, e não havia vivalma com coragem suficiente para defender Matheus sua esposa e seus filhos.
Constance riu, acreditando que tudo não passava de um m*l entendido. A população estava dividida entre expulsa-los da cidade, ou apreender os bens que a família possuía, que pelo que todo mundo sabia não era muito. Mas havia alguém na multidão agitando e gritando — "Decapita-os" — Todos mostraram-se ultrajados, conheciam Matheus, nunca fizera m*l a ninguém, sempre foi correto e o mesmo ocorria com os filhos e a esposa. Ninguém estava disposto a chegar a esse extremo, até Esperanza sair da multidão apontar o dedo a Constance.
— Ela se deitou com demônio, se deita com o pai e com o irmão! — afirma convicta. — Essa criança que vocês estão defendendo, carrega em seu ventre o anti Cristo!
— Heresia! — ouve-se de alguém mais conservador.
— Sacrilégio! — mais alguém gritou, e só então, a moça teve consciência de que estava metida em sérios apuros.
Desconhecendo a razão do ódio que sua sogra sempre teve por ela, procura por William entre a multidão. Entra em desespero quando não encontra nenhum dos Wrigth presentes. Em verdade ela estava de esperanças, mas esperava por um filho de William, tentou esconder sua gravidez dos pais mas estava com quatro meses. Tentou negar mas Esperanza fez questão de levantar suas vestes e todo mundo viu a protuberância evidenciando a existência de um ser inocente em sua barriga. Fazendo todo mundo gritar em histeria colectiva.
— Decapitem-os! — eles diziam.
Para Constance, aquilo parecia irreal, ela nunca fora maltratada por aquelas pessoas, nem mesmo quando a chamavam de bruxa. Mas naquele momento sua única salvação seria William, este que apareceu no exato momento em que ela começava a perder a fé.
— William por favor, diz quem é o pai do bebê que eu carrego em meu ventre... — ela suplica, mas William esquiva o olhar, com vergonha. Não se sentia capaz de uma vez mais falhar com os seus pais. Nem mesmo que o seu silêncio levasse a morte de vários inocentes.
Aquela paixão que sentia por Constance, não passava de fogo de palha. Ele nunca a amou de verdade, pois se amasse... Jamais permitiria que Constance e sua família fossem decapitados. Ele sequer se importou com o filho que ela carregava. Constance viu seus pais e seus irmãos morrer por conta da paixão que sentia por William, talvez por ela ser o culminar daquilo tudo ela tenha sido a última a ser morta. No fim, aquele amor que ela sentia por William, quente como fogo, mostrou-se ser dez vezes mais letal que o facto de a acusarem como sendo bruxa.
(…)
Fodshan, (Cheshire) Setembro 1978
Não sei o que pensar sobre a informação devastadora que me foi concedida, seria verdade? — Isaac não pode ter descoberto tudo isso em seis dias! — Mas e se fosse?
Um frio gelado corre na minha espinha, aquele medo que eu aprendi a ignorar desde que tive o meu primeiro corvo veio a tona. O segredo que a minha família fez questão de esconder de mim a sete chaves veio a tona. Sabia que a base do comportamento de Thomas tinha haver com uma herança genética distorcida, ele matava porque estava nos nossos genes ter o gosto por matança. Eu não era como eles. Mas também não fui melhor.
Houve uma altura na vida que sentia uma certa atração em infringir dor as mulheres que se relacionavam comigo, mas todas as quais passaram nos meus braços incluindo Amanda, o faziam porque gostavam, era um jogo de mútuo prazer. Tratei algumas como moeda de troca, sim... comprei literalmente a liberdade de Amanda, não para que ela fosse livre, comprei sua liberdade para que se casasse comigo.
Nunca parei para pensar, e se ela não tivesse me traído, mas também não quisesse ficar comigo, eu a deixaria ir livre?
E a resposta seria não. Eu a tratei como se fosse uma mercadoria qualquer... Mas ainda assim, não era como eles. Isso? — volto a pegar nas cartas. — Isso vai muito além do que a consciência de um ser humano pode suportar. Como eles foram capazes? Aquilo era demasiado pesado.
Sentei com as mãos na cabeça, o quebra cabeça estava se montando e com ele os crimes de Thomas começavam a vir ao de cima. Devia sentir-me aliviado e feliz, eu queria vingança, não descobrir que venho de uma longa linhagem de assassinos.